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Foram analisadas as distribuições genotípicas para quatro loci autossômicos: Haptoglobina, Catalase, HLA-G 14 pb e HLA-G*0105N. A amplificação dos fragmentos de DNA foi realizada pela reação em cadeia da polimerase (PCR), cujo protocolo encontra-se na

23 tabela 3. O termociclador utilizado foi o PT-100 MJ Research, Inc® para os sistemas Haptoglobina e Catalase e GeneAmp® PCR System 9700 (Applied Biosystems) foi utilizado para os sistemas HLA-G 14 pb e HLA-G*0105N. As sequências dos iniciadores e suas respectivas temperaturas de pareamento estão presentes na tabela 4.

Tabela 3. Concentrações e quantidades de reagentes (em µl) empregados na PCR para os sistemas estudados.

Quantidade por amostra Reagentes

Haptoglobina Catalase HLA-G 14 pb HLA-G*0105N

H2Oa 8,10 12,6 19,40 19,70 Tampão 10Xb 1,565 2,55 2,5 3,0 dNTPc 1,25 1,50 0,25 0,3 Iniciadoresd 0,50 1,30 1,00 1,80 MgCl2 (50 mM) 0,625 0,70 0,75 - Taq polimerasee 0,075 0,15 0,1 0,2 Total 12,115 18,80 25,00 30,00 DNA (40 ng/µl) 1,00 1,00 5,00 5,00 a

água deionizada autoclavada; b tampão com MgCl2 2 mM fornecido pelo fabricante da Taq DNA Polimerase para os sistemas hapto e catalase; tampão sem magnésio para o sistema HLA-G 14 pb fornecido pelo fabricante da Taq DNA Polimerase; tampão com MgCl2 3 mM para o sistema G*0105N fornecido pelo fabricante da Taq DNA Polimerase; c 10 mM para os sistemas hapto e catalase; 20 mM para os sistemas HLA-G 14 pb e G*0105N; d 0,2 µM de cada iniciador para os sistemas hapto e catalase; 10 pmol de cada iniciador para os sistemas HLA-G 14 pb e G*0105N; e 5 U/µl para os sistemas hapto, catalase (Taq-DNA polymerase Biotools) e HLA-G 14 pb; Taq-DNA polylerase Platinum da Invitrogen para o sistema G*0105N.

24 Tabela 4. Seqüência dos iniciadores utilizados para os lócos analisados e temperatura de anelamento (T) dos iniciadores.

Marcador Sequência de nucleotídeos (5’/3’) Referência T Haptoglobina

F3 CAG GAG TAT ACA CCT TAA ATG

S2 TTA TCC ACT GCT TCT CAT TG

C42 TTA CAC TGG TAG CGA ACC GA

C72 AAT TTA AAA TTG GCA TTT CGC C

C51 GCA ATG ATG TCA CGG ATA TC

Yano e cols,

1998 58ºC

Catalase

Sense AAT CAG AAG GCA GTC CTC CC

Antisense TCG GGG AGC ACA GAG TGT AC

Kishimoto e

cols, 1992 60ºC HLA-G 14 pb

Sense TGT GAA ACA GCT GCC CTG TGT

Antisense AAG GAA TGC AGT TCA GCA TGA

Bermingham

e cols, 2000 56ºC HLA-G*0105N

5HLGIN2 CCC AGA CCC TCT ACC TGG GAG

NYGI3 CTC TCC TTG TGC TAG GCC AGG

CTG AGA GG

Hviid e cols,

2002 66ºC

Haptoglobina: o polimorfismo estudado encontra-se no cromossomo 16 cujo produto é responsável pela expressão da cadeia α (16q22.1). Para a visualização dos diferentes alelos (Hp1S, Hp1F e Hp2) são necessárias três PCRs distintas com pares de iniciadores específicos para cada polimorfismo (tabela 5). Os fragmentos foram submetidos a eletroforese vertical em gel de poliacrilamida 6% não desnaturante a 150 V por 1 hora e 30 minutos e corados com nitrato de prata (figura 3).

25 Tabela 5. Pares de iniciadores utilizados para análise da Haptoglobina e seus respectivos tamanhos.

Alelo Par de iniciador Tamanho do fragmento

Hp1S C51 e S2 1,2 kb

Hp1F F3 e C72 1,4 kb

Hp2 F3 e C42 935 pb

Hp 1F-1F Hp 1F-1S Hp 1F-2 Hp 1S-1S Hp 1S-2 Hp 2-2

Figura 3. Genotipagem do marcador genético Haptoglobina (cada indivíduo é representado por três poços).

Catalase: é uma enzima codificada pelo locus 11p13 e encontra-se presente no interior dos peroxissomos assumindo papel fundamental no combate a EROs pela conversão do peróxido de hidrogênio em água (Wanders & Waterham, 2006). A mutação estudada ocorre na posição - 21 da região promotora, resultando na troca de uma adenina por uma timina. A alteração deste nucleotídeo gera uma sítio de restrição detectável pela utilização da enzima HinfI. A PCR produz um fragmento de 250 pb na presença do alelo T que após a digestão enzimática resulta em duas sequências de 203 e 47 pb no alelo A (Flekac e cols, 2008). Os produtos foram digeridos segundo o proposto pelo fabricante e os fragmentos foram visualisados em gel de poliacrilamida 6% não desnaturante a 150 V por duas horas e corados com nitrato de prata (figura 4).

1,4 kb 1,2 kb 935 pb

26 Figura4. Genotipagem para o marcador genético catalase.

HLA-G 14 pb: este polimorfismo caracteriza-se pela inserção/deleção de um fragmento de 14 pb (5’-ATTTGTTCATGCCT-3’) na porção 3’UTR na posição 3741 do éxon 8 do gene HLA-G (Hviid, 2006). O iniciador utilizado amplifica um fragmento de 137 pb quando há a deleção desta sequência e, de 151 pb quando há a sua inserção. Os produtos foram visualizados em gel de poliacrilamida 10% não desnaturante a 250 V por uma hora e corados com nitrato de prata (figura 5).

di ii dd

Figura5. Genotipagem para o marcador genético HLA-G 14 pb (d=deleção; i=inserção).

HLA-G*0105N: este polimorfismo é caracterizado pela deleção de uma citosina na terceira base do códon 129 ou na primeira base do códon 130 no éxon 3 do gene HLA-G. Esta mutação resulta numa proteína truncada não funcional codificada pelo alelo nulo G*0105N. A alteração na sequência de nucleotídeos gera um sítio de restrição detectável pela enzima CFR13I. O fragmento amplificado em PCR pelos iniciadores possui 457 pb e indivíduos sem a mutação podem apresentar dois padrões de banda: 218 pb + 73 pb + 58 pb + 48 pb + 46 pb + 14 pb ou

151 pb 137 pb padrão TT AT AA 250 pb 203 pb 47 pb

27 218 pb + 106 pb + 73 pb + 46 pb + 14 pb. Quando na presença do alelo nulo observa-se um padrão diferente (218 pb + 86 pb + 57 pb + 48 pb + 46), sendo o fragmento de 86 pb responsável pela detecção do polimorfismo (Castelli, EC – comunicação pessoal). A digestão enzimática foi realizada seguindo o protocolo proposto pelo fabricante e os fragmentos foram visualizados em gel de poliacrilamida 10% não desnaturante a 250 V por 1 hora e 30 minutos e corados com nitrato de prata (figura 6).

Figura6. Genotipagem para o marcador genético HLA-G*0105N. Poço 5: padrão de 100 pb; poços 1, 3, 6 e 7: indivíduos homozigotos para o alelo normal; poços 2 e 4: indivíduos heterozigotos para o alelo nulo (G*0105N).

Um banco de dados foi feito com as informações genéticas das amostras. Para manter total sigilo e de acordo com as normas de seguranças do Comitê Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) os indivíduos foram identificados por um código alfa-numérico e em seguida suas genotipagens foram inseridas na planilha.

218 pb 106 pb 86 pb 73 pb 57/58 pb 48/46 pb 1 2 3 4 5 6 7

28 4.5. ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS MARCADORES GENÉTICOS

As frequências gênicas e genotípicas foram estimadas utilizando-se o software GDA versão 1.0 (Lewis & Zaykin, 1997). Primeiramente a amostra foi analisada como um todo e depois separada de acordo com a característica avaliada.

Para análise de associação entre alelos/genótipos de marcadores e parâmetros reprodutivos, a amostra foi subdividida em grupos. No caso do parâmetro “incidência de aborto”, o total amostral foi dividido em: mulheres que sofreram aborto e mulheres que não sofreram aborto. Com relação à fecundidade, foram divididos nos seguintes grupos para análise estatística: mulheres com cinco gestações ou menos e mulheres com mais de cinco gestações. As frequências gênicas e genotípicas foram recalculadas para cada subgrupo e comparadas entre si por meio da análise de diferenciação gênica (Genepop versão 3.4 - Raymond & Rousset, 1995) para avaliar a presença ou não de diferenças estatisticamente relevantes.

29 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1. BIODEMOGRAFIA

A avaliação dos questionários presentes no laboratório de Genética da Universidade de Brasília permitiu a obtenção de dados concernentes a 682 indivíduos habitantes da comunidade Kalunga. A relação homem/mulher na população como um todo foi estimada em 0,88, representando uma predominância de mulheres na comunidade. O encontro de uma maior quantidade de mulheres do que de homens na constituição populacional de Kalunga se assemelhou ao observado para a população brasileira urbana, cuja estimativa é de 0,92 (IBGE, 2000), porém foi distinto do descrito para outros remanescentes de quilombo (Novion e cols, 2003a) e para populações rurais como um todo (1,03 - IBGE, 2000). Provavelmente este predomínio feminino na população estudada se deveu à proximidade de Kalunga a outras cidades, o que pode ter levado homens a buscarem trabalho em fazendas ou cidades vizinhas para auxiliarem na renda da casa.

A pirâmide etária obtida para Kalunga (figura 7) apresentou distribuição semelhante a de áreas rurais, onde há um predomínio de pessoas mais jovens e uma menor porcentagem de idosos. Este fato pode ser observado pelo alargamento da base da pirâmide e estreitamento de seu ápice. Foi observado também um baixo número de indivíduos do sexo masculino nas classes que compreendem as idades entre 25 e 34 anos (classes 6 e 7). Essa descontinuidade é característica de populações rurais e remanescentes de quilombo (Novion e cols, 2003a), uma vez que jovens muitas vezes saem do quilombo em busca de chances melhores em outras localidades. Porém, em grande parte das vezes eles retornam quando mais velhos, o que explica o leve acréscimo observado nas classes 11 e 12 (a partir dos 50 anos). Além disso, aparentemente ocorre o regresso de parte desta população a partir dos 35 anos, o que pode ser resultado do estabelecimento de família ou migração dentro da comunidade Kalunga. De acordo com relatos obtidos na comunidade, há, de fato, migração dentro da comunidade Kalunga, em muitos casos, em decorrência de matrimônio.

30 A taxa de indivíduos com mais de 80 anos encontrada na população de Kalunga foi baixa, o que pode ser explicado pelo difícil acesso e pela precariedade de vida pela qual os quilombolas se apresentam. Somado a isso, o posto médico mais próximo localiza-se na cidade de Cavalcante, há mais de 50 quilômetros das casas mais próximas da área urbana.

Classe Homens Mulheres

0 a 4 anos 6 2 5 a 9 anos 25 21 10 a 14 anos 44 51 15 a 19 anos 62 47 20 a 24 anos 50 74 25 a 29 anos 31 33 30 a 34 anos 30 27 35 a 39 anos 17 29 40 a 44 anos 12 17 45 a 49 anos 10 16 50 a 54 anos 12 13 55 a 59 anos 8 15 60 a 64 anos 5 8 65 a 69 anos 3 3 70 a 74 anos 1 2 75 a 79 anos 2 2 Mais de 80 anos 1 3 Total 319 363

Figura 7. Pirâmide Etária de Kalunga (n=682; classe 1: 0 a 4 anos; classe 2: 5 a 9 anos; classe 3: 10 a 14 anos; classe 4: 15 a 19 anos; classe 5: 20 a 24 anos; classe 6: 25 a 29 anos; classe 7: 30 a 34 anos; classe 8: 35 a 39 anos; classe 9: 40 a 44 anos; classe 10: 45 a 49 anos; classe 11: 50 a 54 anos; classe 12: 55 a 59 anos; classe 13: 60 a 64 anos; classe 14: 65 a 69 anos; classe 15: 70 a 74 anos; classe 16: 74 a 79 anos; classe 17: 80 anos ou mais).

Foi observada predominância de indivíduos com idades entre 0 e 19 anos (classes 1 a 4), o que é similar ao observado em outras comunidades quilombolas e rurais, assim como o que ocorre com a população brasileira como um todo (figura 8; IBGE, 2004). A predominância de indivíduos jovens, especialmente com idade entre 10 e 14 anos, pode, provavelmente, ser explicada pelo alto índice de fecundidade observado nessa população na década de 1990. Porém, o menor número de crianças na primeira classe (0 a 4 anos) pode ser decorrente de erros durante a coleta da dados, uma vez que a pesquisa somente teve acesso a indívíduos maiores de 18 anos e

30 os dados de crianças da comunidade ficaram restritos aos filhos dos doadores das amostras e dados demográficos.

Figura 8. Pirâmide etária da população brasileira (fonte: IBGE, Censo 2000). As classes etárias são idênticas às da figura 7 acima.

A comunidade Kalunga é subdividida em várias regiões (Engenho I, Engenho II, Vão de Almas, Vão de Moleque, Ribeirão dos Bois, Contenda e Kalunga), sendo Engenho I e II e Vão de Moleque os mais próximos da área urbana. Dentre os indivíduos que informaram a região de onde era originário, foram observados 183 nascidos em Vão de Almas e 260 em Vão de Moleque, locais esses onde ocorreram as duas coletas na área Kalunga. Nos demais questionários utilizados os entrevistados não forneceram o local de nascimento dentro da comunidade. Quando as duas populações foram analisadas separadamente foi possível observar uma menor proporção de indivíduos maiores de 50 anos em Vão de Almas (3,2%) do que em Vão de Moleque (8,8%). Essa diferença pode ser decorrente da maior distância de Vão de Almas para a zona urbana, o que dificulta ainda mais o acesso ao sistema de saúde, levando a uma provável menor expectativa de vida. Além disso, as comunidades apenas recentemente começaram a ter acesso ao saneamento básico, o que pode ter contribuído na redução da expectativa de vida de ambas os grupos. As distribuições das demais classes etárias também se apresentaram distintas, demonstrando as diferenças entre os dois grupos kalungas.

31 As diferenças observadas vão além de caracteres demográficos. Quando avaliadas geneticamente estas subpopulações também apresentaram parâmetros distintos, tendo Vão de Almas uma maior contribuição africana do que Vão de Moleque, resultado do maior isolamento a que a primeira esteve submetida (Gontijo & Oliveira, 2004). Marcadores microssatélites do cromossomo Y também indicaram diferenças genéticas entre as duas subcomunidades (Oliveira e cols, 2003). Assim como o observado para os dados genéticos, a demografia indica que cada uma dessas subpopulações teve sua própria história, hoje refletida na composição atual.

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