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2.4 FERRAMENTAS PARA PROSPECÇÃO DE CENÁRIOS

2.4.4 Análise morfológica

morfologia, incluindo não só estudos da botânica, geologia, biologia e de estruturas materiais, mas também o estudo das inter-relações abstratas entre os fenômenos, conceitos e ideias. Alguns anos depois, Michel Godet verificou que a contribuição da análise morfológica seria útil em seus estudos de prospecção. Com ela, é possível decompor um sistema global em dimensões específicas (questões-chave visando o futuro), como por exemplo demográfica, econômica, tecnológica e social/organizacional - cada uma contendo um certo número de hipóteses prováveis (GODET, 2010).

De acordo com Buarque (2003), a técnica de investigação morfológica procura cruzar todas as possibilidades de articulação das incertezas críticas com suas hipóteses, através da organização das combinações sob a forma de matriz ou rede, permitindo visualizar o conjunto articulado para a análise de consistência. Assim, apenas as combinações consideradas consistentes, cujas hipóteses combinadas constituem uma realidade teoricamente robusta, poderiam ser chamadas de cenários (eliminando aquelas que parecem inconsistentes).

Conforme o número de incertezas e de hipóteses, há pelo menos três formas diferentes para se analisar um sistema morfologicamente, duas baseadas em matrizes e uma que forma uma rede de combinações (BUARQUE, 2003). Na primeira, pode- se utilizar uma matriz criando uma coluna para cada conjunto de combinações de hipóteses. Por exemplo, se forem definidas três incertezas (a, b e c) e duas hipóteses para cada uma (a1 e a2, b1 e b2, c1 e c2), chegar-se á a oito possibilidades de agrupamentos (colunas de combinações), conforme demonstra o Quadro 11.

Quadro 11 – Matriz de investigação morfológica

Combinações

das Incertezas I II III IV V VI VII VIII

A A1 A1 A1 A1 A2 A2 A2 A2

B B1 B1 B2 B2 B1 B1 B2 B2

C C1 C2 C1 C2 C1 C2 C1 C2

Fonte: Buarque (2003).

Essa matriz pode ser vista em forma de rede (como uma árvore), em que as linhas viram agrupamentos de estados combinatórios hipóteses-incertezas, estimulando a reflexão sobre a consistência – qualquer elo que se mostre

inconsistente inviabiliza a linha inteira (BUARQUE, 2003).

Dessa maneira, a partir da leitura de cada linha, correspondente a uma incerteza, escrevem-se nas células as hipóteses plausíveis da referida incerteza, até preencher toda a matriz (BUARQUE, 2003). A Figura 9 demonstra a rede para o exemplo anterior.

Figura 9 – Rede de investigação morfológica

Fonte: Adaptação de Buarque (2003).

Como no exemplo da Figura 9, se o grupo tiver uma noção preliminar de uma hierarquia de influência de algumas incertezas sobre as outras, é interessante expressá-la, conforme a ordem de distribuição (A>B>C), na primeira coluna para facilitar a análise (BUARQUE, 2003). Essa rede deve ser repetida de maneira idêntica para todas as incertezas.

A rede é lida de cima para baixo e da esquerda para a direita, procurando-se as conexões de maior consistência, compondo alguns conjuntos que constituem as bases dos cenários (ideias-força). Ao invés de analisar todas as combinações possíveis e de excluir as que não são consistentes, busca-se compor diretamente as combinações de mais altas consistências (BUARQUE, 2003).

Para Godet (2000), a análise morfológica comporta duas etapas:

a) construção do espaço morfológico: decompõe-se o sistema estudado em subsistemas ou componentes através de uma reflexão aprofundada (baseada, por exemplo, nos resultados da análise estrutural). Nessa primeira etapa, interessa também dispor de componentes mais independentes, na medida do possível. Além disso, devem representar o sistema por completo. Deve-se atentar para o número de componentes, pois muitos inviabilizam a análise e poucos empobrecem-na, daí a necessidade

C1 C2 C1 C2 B1 B2 A1

de encontrar um compromisso. Diante disso, deve-se configurar os cenários através da combinação dos componentes, representando o campo dos possíveis.

b) redução do espaço morfológico: certas combinações são irrealizáveis (incompatíveis entre configurações, etc.), o que requer a redução a um subespaço útil, introduzindo condicionalismos de exclusão e critérios de seleção (econômicos, técnicos, etc.). A partir disso, as combinações pertinentes poderão ser examinadas.

Muito estimulante para a imaginação, a análise morfológica permite um varrimento sistemático do campo dos possíveis. Para não ser submerso pela combinatória, é necessário aprender a navegar no interior do espaço morfológico, o que é possível graças a critérios de escolha (GODET, 2000).

Algumas limitações da análise morfológica devem ser consideradas. A primeira parte da escolha de seus componentes. Se um componente, ou algum caminho, essenciais para o futuro, não forem considerados, há o risco de deixar de fora uma faceta inteira de possibilidades futuras – e como essas não são restritas e evoluem ao longo do tempo, a falha de não as considerar potencializa um possível desentendimento dos resultados futuros (GODET, 2006).

A segunda limitação envolve o risco da geração de um alto número de combinações de hipóteses (cenários). Uma solução para isso é introduzir critérios de seleção, restringindo determinados fatores e explorando os subespaços morfológicos úteis (GODET, 2006).

A análise morfológica é um método bastante simples de por em prática, mas a combinatória é intimidativa e essa é, sem dúvida, a razão da sua limitada difusão. Entretanto, a simplicidade do método e a disponibilidade do software Morphol incentivaram o seu uso (GODET, 2000). O software atua através da análise morfológica sequencial (encaixada, envolvida), de maneira intuitiva e interativa. Os níveis, dimensões, variáveis e hipóteses (recomendações estratégicas) são apresentados sob a forma de um paralelepípedo (três dimensões). O conjunto de dados é assim facilmente acessível.

O Morphol permite construir cenários primários interligados a partir de um módulo amigável de seleção de hipóteses: inicialmente, por dimensão (jogos de hipóteses por grupos de variáveis de uma dada dimensão), em seguida, por nível, e enfim os cenários globais primários. Os cenários assim estabelecidos podem ser

compartilhados e discutidos online por um grupo de participantes (GODET, 2001).

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