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Foi feita uma análise qualitativa, na qual “o significado é central e o objectivo é compreender o conteúdo e a complexidade do significado”, o qual deverá ser obtido através de um “processo interpretativo baseado num envolvimento sustentado com o texto” (Smith, 1995: 18). Para tal, foram seguidos alguns conselhos dados por Smith (1995), tais como: ler as transcrições, notando aspectos interessantes nesta interpretação preliminar; anotar títulos de temas emergentes, usando palavras-chave que captem a essência do que é encontrado e produzir uma lista de temas, ordenados logicamente e com possíveis subtemas identificados.

No final deste processo analítico, o material foi convenientemente organizado, tendo sido produzido um quadro comparativo das três entrevistas. As transcrições das entrevistas seguem no Apêndice 3 deste documento.

51 Tabela 3 – Quadro resumo da análise interpretativa fenomenológica

Questão Prof. Marilyn Lowe Prof. Álvaro T. Lopes Prof. Mª de Lurdes

Desafio Educar pais e

professores sobre como as crianças aprendem e se desenvolvem.

Fazer o contacto com a música e com vários instrumentos do ponto de vista do imaginário de cada criança. O aspecto imaginativo da infância; O prazer que os discentes mostram em aprender; A possibilidade do professor chegar ao fundo do pensar e sentir do aluno;

A preparação profunda que tudo isto exige do docente.

Objectivo Construção de uma “audiação preparatória” musical.

Captá-los para a música de uma forma geral e eles perceberem que o piano é um veículo para fazer música.

Despertar o aluno para o som do instrumento; Mostrar a ligação do som aos sinais gráficos; Fazer-lhes entender, através das vibrações simpáticas, que cada som integra em si os respectivos harmónicos. Competência Competência na

coordenação do canto com movimento corporal e respiração. Competência da naturalidade. Ligação viso-motora. Formação Musical Prévia

Sim. Sim. Depende do meio social

da criança. Vantagens

Métodos Tradicionais

Nenhuma. Haver uma proposta de gradualidade, de introdução de conceitos, de percurso na criança. Entrar directamente no campo da música instrumental e de forma progressiva. Desvantagens Métodos Tradicionais

Ensinar muitos elementos ao mesmo tempo; Ensinar notação musical antes do tempo.

A forma como os professores introduzem esses métodos às crianças.

Não integrar os esforços em relação à penetração na Música em si. Objectivo do método criado pelo entrevistado Desenvolver competências de audiação apropriadas à idade em questão, de acordo com o defendido por Gordon.

O aluno sentir imediatamente que o piano é um veículo de alguma coisa que ele já tem dentro dele.

Entender a respectiva globalidade e tudo o que se refere a ser feito por um MÚSICO compositor de grande qualidade.

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Questão Prof. Marilyn Lowe Prof. Álvaro T. Lopes Prof. Mª de Lurdes

Aulas em grupo Sim, porque:

interacção é essencial para actividades que usem competências relacionadas com a voz e a audição;

elas gostam de actividades em grupo; permite a repetição e o reforço das actividades; a brincadeira e o movimento são essenciais na aprendizagem. Sim, porque: alarga o contexto de aprendizagem;

alarga o sentido muito da camaradagem;

desenvolve o sentido crítico.

Sim, porque geram interacção.

Língua materna Não necessariamente, porque as crianças aprendem por imitação.

Sim. Sim.

Canções Tradicionais

Sim, porque:

são um reportório muito rico;

contribuem para o desenvolvimento do canto, da compreensão da frase e das mudanças harmónicas;

contribuem para o aumento da criatividade.

Fundamental, porque: o instrumento é um veículo para transmitir aquilo que eles já conhecem de ouvido; é preciso editar obras que estão escritas para crianças de compositores portugueses.

Essencial, porque é algo ligado às próprias raízes da raça e conotada também com a psicologia topológica.

Conselhos Conhecer a literatura existente sobre a forma como as crianças se desenvolvem e aprendem música;

Aprender como se trabalha com crianças em grupos pequenos; Aprender o valor da improvisação;

Saber que os métodos tradicionais de piano contradizem os actuais resultados de investigação sobre aprendizagem infantil; Compreender porque é que uma abordagem baseada na audiação é importante, estudando a Teoria de Gordon.

Ter bem clara a metodologia;

Fazer muita pesquisa.

Aprofundar a música através do reportório pianístico;

Frequentar concertos; Ter uma boa bibliografia; Aprofundar os

conhecimentos ao nível dos aspectos

psicológicos e pedagógicos.

A análise deste quadro permite tirar algumas conclusões relevantes para o presente estudo. Existem muitos pontos de convergência. Por exemplo, ao nível da necessidade de uma formação musical prévia antes do ensino instrumental propriamente

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dito nestas idades, os três entrevistados concordam que esta deve existir. Todos concordam que as aulas em grupo, actualmente em voga, são muito benéficas para os alunos de piano porque são motivadoras, permitem a interacção e estimulam o sentido crítico. Todos são defensores da inclusão de canções tradicionais no reportório infantil. O Prof. Álvaro afirma que isso é importante para que os alunos possam sentir que o instrumento, neste caso, o piano, é um veículo de transmissão daquilo que eles já conhecem de ouvido. Isto é, segundo este autor, extremamente apelativo.

Em relação à importância de um método ser em língua materna, apenas a Prof. Marilyn Lowe considera que este não é um requisito básico, mas na sua entrevista afirma que o professor terá que ser mediador ou tradutor na passagem de informação que não esteja em língua materna. A criança efectivamente aprende na sua língua materna e não noutra. Por isso, os outros professores consideram-na fundamental na transmissão dos conhecimentos. Se um livro estiver em língua materna isso favorece a aprendizagem sobretudo nestas idades. O Prof. Álvaro refere o exemplo russo, em que os métodos infantis em língua materna abundam e em que há grandes compositores a escrever para crianças. O mesmo deveria acontecer em Portugal, pois existem muitos bons compositores no nosso país e as composições portuguesas incutem o imaginário do próprio país, sendo por isso, de grande valor pedagógico.

Em relação às desvantagens dos métodos tradicionais, a Prof. Marilyn é a maior crítica destes métodos, focando o facto de os mesmos ensinarem muitos elementos ao mesmo tempo, o que não é apropriado ao desenvolvimento; e ensinarem a notação musical antes de as crianças terem actividades preparatórias que lhes permitam ser capazes de compreender os fundamentos musicais. Segundo esta autora, a maioria destes métodos apenas ensina notação musical, não seguindo a mais recente investigação sobre como as crianças aprendem e se desenvolvem e não sendo apropriados ao desenvolvimento. A Prof. Maria de Lourdes foca o facto de estes métodos não integrarem os esforços em relação à penetração na Música em si, ou seja, não ensinarem de forma efectiva conceitos como o fraseio, a qualidade do som e a maneira de o obter, como, por exemplo, ter noções de agógica, entre outras. O Prof. Álvaro, por sua vez, tem uma postura diferente em relação a esta questão. Ele considera que não há desvantagens nos métodos tradicionais. As desvantagens são a forma como os professores introduzem esses métodos às crianças, pois, segundo este professor, um método não é para ser seguido tal e qual está escrito, ele deve servir apenas como um ponto de referência de gradualidade. Pode sempre haver necessidade de recorrer a

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complementos e o professor deve ter competência para saber quando e como o fazer. Ou seja, o método é apenas uma ferramenta. O professor, em última instância é que decide o que o aluno precisa, não é o método.

Em relação aos métodos criados ou desenvolvidos pelos entrevistados, dois deles criaram métodos de iniciação ao Piano. A Prof. Marilyn é autora, em cooperação com Gordon, do método que foi analisado na primeira fase da metodologia deste estudo e que é o Music Moves for Piano. Este método foi criado especificamente para a faixa etária a partir dos quatro ou cinco anos de idade e é totalmente auditivo, não ensinando notação. Segundo a autora, o principal objectivo deste método é desenvolver competências de audiação adaptadas à faixa etária em questão e competências performativas associadas ao uso do teclado, através de rotinas baseadas na audição, no movimento, no canto e na entoação. Por isso, é também uma proposta de aulas em grupo, muito adaptada à nossa realidade actual.

O método criado pelo Prof. Álvaro Teixeira Lopes, juntamente com o Prof. Vitaly Dotsenko, veio colmatar uma lacuna verificada na altura da sua criação, anos 90, relativa à ausência de métodos em português especificamente para piano e com uma proposta de gradualidade, que juntasse peças de compositores portugueses que já existiam, como ferramenta pedagógica. É um método que tem previsto uma parte inicial dedicada à reprodução de ouvido de canções tradicionais, que, no entanto, segundo o Prof. Álvaro, é demasiado curta no caso da sua utilização em crianças entre os quatro e os seis anos de idade, pois este método não foi especificamente escrito apenas para esta faixa etária. A parte inicial é útil, mas as seguintes já não estão adaptadas a crianças tão pequenas.

Em relação ao trabalho específico da Prof. Maria de Lourdes Ribeiro, ela foi pioneira na introdução dos Játékok (Jogos) de Kurtág em Portugal, tendo tido a oportunidade de contactar pessoalmente com este compositor húngaro contemporâneo. Os Játékok (Jogos) não são um método, como a própria afirma na sua entrevista, mas a Prof. Maria de Lourdes Ribeiro considera útil usá-los como tal. Sendo uma proposta não tradicional, o seu uso numa fase inicial de aprendizagem permite à criança entrar na música de uma forma muito mais global, usando a própria imaginação da criança ao incentivá-la a escrever as suas próprias histórias-músicas de forma livre e espontânea.

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