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4. ANÁLISE DE DADOS

4.4. Descrição e Análise dos dados obtidos com o questionário aberto final

4.4.1. Análise do questionário final de P1

Esse professor demonstra ser bastante crítico no que tange à sua abordagem de ensinar. P1 afirma que procura ser cada vez mais comunicativo55. Vejamos a explicação

dele:

Como você caracteriza a sua prática no ensino de PLE? Que abordagem de ensino, em sua opinião, predomina em sua aula? Por que?

Embora eu procure ser cada vez mais comunicativo, provocar a interação e trabalhar com diferentes efeitos de sentido que as palavras podem ter em diferentes contextos, ainda acredito que minha(s) aula(s) tenha(m) uma presença considerável de estrutura. Por exemplo, na primeira aula do básico para falantes de espanhol eu peço que os alunos se apresentem em duplas, um ao outro, e depois apresente o colega para a classe (uma atividade comunicativa/interacional). Porém, é frequente eu trabalhar na primeira aula o "alfabeto", para passar aos alunos os diferentes sons que as letras podem ter no Português. Eu faço assim porque os alunos parecem aprovar essa atividade, e porque não consegui bolar outra maneira de trabalhar com as letras e seus sons. Acho que poderia sim deixar para corrigir isso apenas quando o aluno naturalmente ler ou produzir um som de forma inadequada, mas acredito que não custa nada passar um pouco de estrutura em alguns momentos.

Costumo trabalhar o imperfeito do subjuntivo com aquela música "Último dia" do Paulinho Moska, e sempre exploro bastante a temática da música, perguntando coisas que eles gostariam de fazer e nunca fizeram, perguntando o que fariam caso soubessem que o mundo acabaria amanhã etc. Provoco essa interação, mas acho relevante nomear o tempo verbal em um momento posterior, dar o nome "imperfeito do subjuntivo". Pode ser que alguns alunos não se atentem ao nome, mas para outros acredito que isso é sim importante. Com essa música, trabalho também a frequente alternância que fazemos no Brasil entre o futuro do pretérito (eu abriria a porta do hospício) e o pretérito imperfeito (eu abria a porta do hospício). Preocupo-me que eles entendam que é normal usarmos o passado no lugar do futuro do pretérito em contextos de oralidade e escrita informal no Brasil, mas me parece igualmente relevante nomear esses tempos. Não vou cobrar na prova o nome do tempo, mas não custa nada nomeá-lo na aula. Eu não me sinto confortável em dizer que minha aula é comunicativa, porque acredito que um "comunicativo de carteirinha" possa encontrar "falhas" na aula. Agora tampouco me sinto confortável em ser chamado de gramatical, isso seria uma ofensa, rs. Acho que as duas coisas são importantes.

A partir dessa resposta podemos identificar a concepção de ensinar LE de P1, que na sua voz, é direcionada para a comunicativa, mas ele reconhece que existem momentos de sua prática que são mais gramaticistas, conforme se verifica no trecho final de sua resposta:

Por esse trecho entendemos que P1 tem consciência da sua abordagem de ensino, bem como do que ele entende pelo termo. Dessa forma, percebemos que P1 apresenta características da competência teórica, explicada por Concário (2003: 35) com base em Almeida Filho (1999), como o conhecimento acadêmico/teórico sobre língua/linguagem, aprendizagem, ensino, normalmente reconhecido como provenientes de outras pessoas.

Um aspecto que nos chamou a atenção em sua resposta foi o trecho: Eu faço assim porque os alunos parecem aprovar essa atividade, e porque não consegui bolar outra maneira de trabalhar com as letras e seus sons, pois P1 explica por que ensina como ensina, o que é uma característica da competência aplicada, definida por Almeida Filho (2007: 21) como a capacidade de explicar com plausibilidade porque ensina da maneira como ensina e por que obtém os resultados que obtém.

Outro exemplo que ilustra essa competência é sua explicação sobre como utiliza os tempos verbais e suas nomenclaturas, como no trecho:

Com essa música, trabalho também a frequente alternância que fazemos no Brasil entre o futuro do pretérito (eu abriria a porta do hospício) e o pretérito imperfeito (eu abria a porta do hospício). Preocupo-me que eles entendam que é normal usarmos o passado no lugar do futuro do pretérito em contextos de oralidade e escrita informal no Brasil, mas me parece igualmente relevante nomear esses tempos.

P1 explica aspectos de sua prática, bem como a razão de ensinar dessa maneira, o que nos permite identificar também neste trecho, características da competência aplicada, presentes em sua atuação profissional.

Outro aspecto evidente, no que precede a prática de P1, relaciona-se ao planejamento do curso e à seleção de materiais. Indagamos, por meio de questionário final (Apêndice 2) se houve um planejamento inicial. P1 respondeu:

Planejei antes de começar quais seriam os conteúdos. No meio do caminho sempre ocorrem algumas mudanças, mas planejo antes do inicio das aulas o conteúdo e também a data das provas.

Percebemos que P1 está preocupado com a organização do curso e também com relação à avaliação dos alunos, pois explica como fez isso:

Houve a prova escrita que eu elaborei com exercícios retirados de livros didáticos em geral. Houve também seminário como avaliação oral.

Acreditamos que esses aspectos podem ser característicos da competência profissional, pois de acordo com Almeida Filho (2007: 21), aspectos dessa competência se evidenciam em sua prática mostrando que é “capaz de fazê-lo conhecer seus deveres, potencial e importância social (...)”. Nesse sentido, verificamos que o fato de P1 estar atento e preocupado com o planejamento e com a avaliação, é condizente com seus deveres de professor.

Com a aplicação desse questionário também foi possível identificar aspectos relacionados à reflexão de P1, pois em uma pergunta sobre o que mudaria em sua prática, ele respondeu:

Acho essa pergunta difícil de responder. Se houver algo que eu acho que devesse mudar na minha prática, não vou deixar para o futuro, já mudo no presente. É normal que quando muda o semestre/a turma, eu reutilize materiais do passado, mas quase sempre faço adaptações/melhorias/exclusões, de acordo com a prática anterior - o que funcionou bem, o que não funcionou. Por exemplo, quando comecei a atuar e mostrei uma aula minha para o J. [professor visitante de PLE] ele disse "bem gramatical, hein?". E aquilo me incomodou, e passei então a tentar deixar a sistematização mais pro final e trabalhar mais com diálogo durante a aula, despertando vocabulário e forçando os alunos a usarem a estrutura antes da sistematização.

Podemos verificar que P1 está atento às particularidades das turmas, dos materiais utilizados, bem como da sua prática, pois afirma que: É normal que quando muda o semestre a turma, eu reutilize materiais do passado, mas quase sempre faço adaptações/melhorias/exclusões, de acordo com a prática anterior - o que funcionou bem, o que não funcionou. Nessa perspectiva, podemos inferir que P1 está repensando sua prática e, com isso, é possível relacionar esse aspecto à competência reflexiva, que na concepção de Silva e Alvarez (2008: 145), é tida como a capacidade de criar possibilidades de transformação social, e, se possível, por uma vivência de reflexão

coletiva, o professor de LE pode encontrar soluções ou alternativas para os problemas que enfrenta em seu cotidiano.

Com isso, identificamos algumas competências relacionadas ao processo de formação de P1, sendo elas, a competência profissional, a competência reflexiva, a competência aplicada e a teórica, como explicitadas nesta seção.