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Capítulo 2 Revisão da literatura teórica e empírica sobre hysteresis em comércio internacional

2.2. Resenha da literatura empírica sobre hysteresis em comércio internacional

2.2.1. Análise em séries de tempo

No que diz respeito ao comportamento dos preços e quantidades importadas (exportadas), a existência de hysteresis deve fazer com que as equações, para as respectivas séries temporais dessas variáveis dependentes, sejam instáveis. Também deve se esperar, nesses modelos, que as respostas às variações da taxa de câmbio sejam assimétricas em razão da diferença entre os custos de entrada e saída.

Na medida em que variações transitórias fossem capazes de produzir mudanças permanentes na estrutura de mercado, deve-se esperar que o termo representativo do mark-up na equação de repasse da taxa de câmbio aos preços se altere. O mesmo deve ocorrer nas equações de quantum importado (exportado), apresentando um comportamento instável relacionado, por meio das variações da taxa de câmbio, a mudanças permanentes dos exportadores nas decisões de entrada e saída dos mercados externos. Na equação de quantum importado, ou exportado, em razão de desvalorizações ou valorizações da moeda doméstica, a taxa de câmbio real ultrapassaria valores limiares, produzindo uma resposta significativa do quantum, importado ou exportado, que refletiria um movimento de entrada ou saída do mercado externo.

O trabalho de Krugman e Baldwin (1987), provavelmente, é o primeiro que leva em consideração essa hipótese. Preocupados com a lenta recuperação dos saldos comerciais dos EUA ao final dos anos de 1980, após a sensível desvalorização da moeda americana posteriormente a 1985, esses autores testam a hipótese de que a persistência dos déficits comerciais é fruto de uma irreversibilidade associada à hysteresis na balança comercial. São estimadas equações para os volumes importados e exportados dos EUA para o período do segundo trimestre de 1977 ao quarto trimestre de 1986. A forma funcional para o modelo econométrico adotado nesse trabalho foi:

t t 2 t 1 i i t cte D TXR Y Q = +α +β +β +ε (26)

em que Qt é uma variável de quantum exportado, ou importado, Di é uma variável dummy,

TXR é uma medida de taxa real de câmbio e Y é uma medida de dispêndio em termos reais. Esses autores testam a proposição de que a valorização do dólar tenha levado a deslocamentos adversos nas quantidades exportadas e importadas por meio da inclusão, em modelos alternativos, de variáveis dummies que estariam associadas a períodos de valorização cambial. Os períodos selecionados foram: (i) o terceiro trimestre de 1984, quando, segundo os autores, os mercados financeiros haviam concluído que a valorização do dólar seria prolongada e (ii) o segundo trimestre de 1985, quando o dólar voltou a declinar. No entanto, em razão da não significância estatística dessas variáveis, as evidências obtidas não deram suporte à hipótese de hysteresis na balança comercial americana.

Baldwin (1988) objetiva testar se a relação entre taxa de câmbio e preços de importações americanas manteve-se estável ao longo dos anos de 1980 e se a natureza dessa instabilidade é consistente com as predições teóricas do seu modelo para formação de preços. Uma formulação estendida para defasagens e agregação da equação (8), apresentada acima, demonstrou que a equação de repasse da taxa de câmbio aos preços deveria possuir a seguinte forma funcional: = − +ε ϕ + α + = N 1 i t i t i i t cte D logC P log (27)

em que Pt é um índice de preços agregado e Ct-i, com i = 1, .., N, é um índice de custos

agregado.

É demonstrado que o termo constante dessa equação estava inversamente associado à elasticidade de demanda das indústrias, e que essa elasticidade, conforme visto anteriormente, estava diretamente relacionada à estrutura de mercado. Sendo assim, seria esperado que com a entrada de firmas estrangeiras no mercado doméstico, houvesse um aumento da elasticidade de demanda, produzindo uma queda do mark-up, e conseqüente instabilidade nesse termo, que seria capturada pela variável dummy Di.

São construídas proxies para as variáveis de custos baseados em índices de preços ao atacado, consumidor e custos unitários do trabalho, para os países que transacionam com os EUA, sendo estimadas equações em que N eram iguais a 7,5,3 30. As variáveis dummies foram construídas para o terceiro trimestre de 1980, primeiro e terceiros trimestres de 1982 e primeiro trimestre de 1983, e incluídas uma de cada vez nos modelos estimados 31. Para a ampla maioria das equações, em que as variáveis de custos foram representadas por

30 Os resultados apresentados no artigo referem-se, principalmente, ao caso de N=5.

composições de índices de preços, os coeficientes associados às variáveis dummies foram significativos estatisticamente em níveis de significância de 5 %, e 10%, e com sinais negativos, favorecendo a hipótese de existência de hysteresis. No entanto, para as equações que utilizaram proxies de custos baseados nos custos unitários do trabalho, os resultados foram ambíguos e na maioria não significativos32.

Uma outra implicação do modelo de Baldwin (1988) seria de que a equação de demanda de importações apresentaria instabilidade. Segundo a predição do modelo, a elasticidade-preço da demanda deveria aumentar em valor absoluto simultaneamente à quebra estrutural na equação de preços. Sendo assim, foram estimadas equações de demanda de importações dos EUA para o período do primeiro trimestre de 1967 ao segundo trimestre de 1987. A forma funcional estimada tem como variável dependente a variação corrente do logaritmo do volume de importações, *

t

Q

∆ , e como variáveis explicativas, a variações correntes e defasadas até seis períodos dos logaritmos dos preços das importações, *

i t

P ∆ , com i = 0,1,..,6, além da variação da logaritmo da renda doméstica ∆Yt.

t t 7 6 0 i * i t i * t cte P Y Q = + β ∆ +β ∆ +ε ∆ = − (28)

Essa equação foi estimada para diversos subperíodos, considerando os pontos anteriores e posteriores às datas de quebras apontadas acima em 1980, 1982 e 1983. A elasticidade-preço da demanda é concebida como a soma dos coeficientes associados à variação do preço das importações. Os resultados das elasticidades, ainda que apontem para um aumento da elasticidade-preço da demanda no período posterior à quebra, não são significativos estatisticamente em um nível de significância de 10%. Somente para o último ponto de quebra, no primeiro trimestre de 1983, o deslocamento dos parâmetros foi estatisticamente significante em um nível de significância de 5%. Baldwin interpreta essa evidência como resultado da entrada de novas firmas em mercados de produtos homogêneos33.

Parsley e Wei (1993) procuram testar duas predições derivadas dos modelos de hysteresis em comércio. A primeira predição seria que, dependendo do nível precedente da

32 A não significância das dummies nessas equações é justificada pelos autores em razão dessas proxies para as

variáveis de custos não captarem a variação dos custos de matérias-primas e commodities, que seria importante fonte de variação dos custos. Para mais detalhes sobre as vantagens e desvantagens de cada proxy para a variável de índice de custos, ver Baldwin (1988, p. 780).

33 Segundo Baldwin (1988) em um modelo de Cournot, em que o produto é homogêneo, cada firma faz face à

elasticidade-preço da demanda multiplicada pelo número total de firmas. Assim, com a entrada de novas firmas no mercado, cada firma faz face a uma curva de demanda mais elástica, porém não há deslocamento da curva agregada de demanda. Para esclarecimentos adicionais ver Varian (1992, p. 290).

taxa câmbio, choques cambiais, de igual magnitude, podem produzir diferentes efeitos sobre os valores importados. Assim, esta relação assimétrica entre taxa de câmbio e importações seria captada pelo seguinte equação de demanda de importações ( Qt*):

t t 3 0 i i t j 3 0 i * i t i * t cte sazonal P Y Q = + + β ∆ + φ ∆ +µψ +ε ∆ = − = − (29)

A variável que representa o efeito assimétrico das variações da taxa real de câmbio no período corrente, Rt, é uma medida de fase dada por:

t = Dt Rt Vt (30) em que Vt = t i t t 1 0 i R R R τ τ = − =

∆ são as variações acumuladas da taxa de câmbio ao longo

de um período τ (com τ =24 meses), sendo Dt = − ∆ <

> ∆ contrário caso 0 0 V e R se 1 0 V e R se 1 t t t t

Assim, o coeficiente µ deve captar esse efeito de sucessivas depreciações, ou apreciações, sobre os volumes importados. Segundo o modelo de hysteresis, esse comportamento recorrente da taxa de câmbio deve alterar as percepções dos empresários levando-os a decisões de entrada, ou saída, do mercado externo, que provocariam deslocamentos da curva de demanda por importações. O sinal esperado para µ é negativo.

A segunda hipótese a ser testada é aquela denominada pelos autores de hipótese de “valor da opção”, relacionada ao custo de oportunidade do exercício da opção de entrada ou saída do mercado quando aumenta a volatilidade da taxa real de câmbio. Assim, de acordo com essa hipótese, a zona de inação aumentaria à medida que a taxa de câmbio se tornasse mais volátil.

A partir da estimativa da série de coeficientes estimados ˆβ , obtidos por meio da t estimação do seguinte modelo de parâmetros variantes no tempo:

3 t 0 i i t j 3 0 i * i t i t * t sazonal P Y Q =β + + β ∆ + φ ∆ +ε ∆ = − = − (33) t = t-1 + ut

A hipótese de “valor da opção” é testada utilizando o seguinte modelo:

(

t k

)

t t E . ˆ =α +υ σ +ε β ∆ + (31)

em que e ˆβ é uma séries de tempo de coeficientes estimados, Et t( t+k) é expectativa da

momento t 34. O coeficiente de interesse é υ e reflete a influência da volatilidade cambial sobre as variações do nível estocástico do volume importado. Essas variações estocásticas representam movimentos permanentes de entrada ou saída do mercado externo. Assim, de acordo com o modelo de hysteresis, deve-se esperar que esse coeficiente seja negativo. Ou seja, quanto maior o nível de incerteza cambial, maior a área de inação e, conseqüentemente, menor o movimento de entrada e saída.

Atentos à necessidade de informações suficientemente desagregadas para a condução de testes empíricos, Parsley e Wei (1993) examinam a hipótese de existência de hysteresis para as importações americanas de oito produtos químicos do Canadá no período de 1980 a 1988, e outras cinco mercadorias do Japão no período de 1975 a 1987 3536.

Ainda que as estimativas para µ em todas equações, menos uma, tenham sido de coeficientes com sinais negativos, somente em três, das treze equações estimadas, essas estimativas demonstraram-se estatisticamente diferentes de zero em um nível de significância de 1% 37. Esses resultados significantes foram encontrados nas equações de produtos

químicos. A escassa evidência de existência de efeitos assimétricos da taxa de câmbio é interpretada pelos autores como proveniente da existência de contratos de longo prazo, que limitam o impacto das variações da taxa de câmbio sobre os preços de importações.

Com relação à hipótese de valor da opção, utilizando quatro medidas distintas para a estimativa de volatilidade, além de em poucos casos os coeficientes estimados apresentarem sinais esperados, em nenhum deles as estimativas foram estatisticamente diferentes de zero em um nível de significância de 10% 38. Sendo assim, Parsley e Wei (1993) concluem que resultados obtidos oferecem pouco suporte à validade da teoria nesse caso.