• Nenhum resultado encontrado

3 Educar sem

ANASTÁSIA PINTO

Diretora do Centro de Pesquisa em Organização e Edu- cação, que trabalha pelos direitos das populações tra- dicionais na Índia.

Adultos responsáveis: Uma criança mal-educa-

da suscita a preocupação dos adultos considerados responsáveis por ela. Seus erros são considerados consequências dos defeitos dos adultos que a ro- deiam, não da própria criança. Portanto, a crítica e correção são dirigidas basicamente aos adultos responsáveis. As crianças são expostas direta e in- diretamente aos contos folclóricos e às histórias da família e da comunidade, aos conhecimentos das consequências de atos imprudentes ou errados, e a ações que despertam a admiração e o desejo de imi- tação. Os erros das crianças são vistos mais como riscos do que transgressões. Quando acontece uma

correção verbal, ela é feita em termos carinho- sos, de afeição e respeito, e são feitos elogios so- bre a sabedoria e bondade da criança, para que ela se sinta segura e amada, e para reforçar sua autoimagem, autorrespeito e determinação de escolher o bom comportamento.

WIllIAM A. WHITE

Funcionário das Relações Indígenas da Univer- sidade de Vitória, Colúmbia Britânica, especia- lista no modo de vida dos Salish, povo nativo da Colúmbia Britânica.

Observação e silêncio: As crianças da comuni-

dade Salish aprendem que devem ficar em silên- cio na presença dos mais velhos em cerimônias tradicionais. Assim, desenvolvem capacidade de ouvir. Os idosos acreditam que uma criança deve ser educada sem críticas rigorosas nem trauma físico e se ela for amada, não vai considerar di- fícil o pedido de ficar em silêncio, enquanto se prepara para encarar a transição para a vida adulta com segurança. As famílias também têm momentos para as crianças fazerem perguntas.

Estratégias de disciplina positiva

Uma das formas para se prevenir a violência nas esco- las, creches e unidades de acolhimento é por meio da capacitação dos profissionais. Códigos de conduta e nor- mas claras devem ser formuladas e implementadas, in- cluindo a proibição de todas as formas de violência.

Além disso, para promover ambientes escolares e de cuidado e proteção livres da violência, as estratégias de disciplina positiva sugerem as seguintes ações:

Estímulo à motivação das crianças para o aprendizado;

Adoção de mecanismos de recompensa e reforço de comportamentos positivos;

Estabelecimento de regras, rotinas e acordos de forma participativa;

Respeito mútuo, com reciprocidade de direitos;

Comportamento exemplar dos adultos;

Atenção para responsabilizar o comportamento em si, não a criança, e para controlar o nível de raiva em situações de estresse;

Envolvimento de toda a equipe no processo de promo- ção da disciplina positiva;

Formulação de um currículo estimulante e desafiador, que instigue o aprendizado;

Promoção da equidade;

Fomento do potencial dos alunos para atuarem como mediadores de conflitos.

De pai para filho

“A exposição à violência é o fator mais comum entre as pessoas que espancam. E isso não depende de classe social, nem de nível de esco- laridade. As pessoas que sofreram violência na infância tendem a reproduzi-la na vida adulta”.

Benedito dos Santos, Antropó- logo, Pesquisador da Área da Infância, Professor de Mestrado em Psicologia na Universidade Católica de Brasília e consultor da Unicef no Brasil.

Um ambiente que acolhe

As crianças aprendem melhor em ambientes em que se sintam valorizadas, respeitadas e seguras. Daí o papel fundamental da escola na construção de uma cultura de não violência.

Garantir um ambiente saudável e uma cultura de paz é fundamental para o desen- volvimento físico, emocional e cognitivo das crianças, o que por sua vez gera um grande im- pacto no potencial de desenvolvimento de um país. Quando se amplia os fatores de risco ao desenvolvimento infantil por meio da tolerân- cia aos castigos físicos e humilhantes, perde-se a oportunidade de romper com uma cultura de violência que retroalimenta fatores de iniqui- dade. Da mesma forma, é preciso que os Estados atuem no enfrentamento das causas subjacen- tes da violência contra as crianças e invistam para fortalecer a afetividade entre pais e filhos e minimizar prováveis fatores de risco como o desemprego, o alcoolismo, a ausência ou inefi- ciência dos serviços de educação e saúde, a falta de infra-estrutura e a desigualdade de gênero, entre outros fatores.

Para melhor compreender o fenômeno dos castigos corporais e humilhantes contra crian- ças, é preciso cobrir algumas lacunas no con- junto de pesquisas disponíveis. A imprensa tem um papel importante para indicar essas bre-

chas e iniciar um trabalho de investigação sobre os seguintes temas:

O que se entende por castigos físicos e hu- milhantes: A definição do que são os castigos

corporais pode variar segundo a cultura em que a criança está inserida. As pesquisas tendem a de- finir o fenômeno como bater com as mãos ou com objetos porque essa é a forma mais preponderante na América do Norte, onde foi desenvolvida grande parte das pesquisas publicadas.

Visão das crianças: Grande parte das pesquisas

sobre o tema é feita com adultos e reflete a perspectiva do adulto. Com todo o cuidado que requer uma abor- dagem direta às crianças para evitar revitimização, seria importante desenvolver instrumentos de pes- quisa que consigam captar o ponto de vista delas so- bre a experiência dos castigos físicos e humilhantes.

Para além do lar: Também seria importante inves-

tigar o uso de castigo corporal por outros responsá- veis que não os pais, como cuidadores, babás, pro- fissionais de educação, saúde e assistentes sociais.

Políticas Públicas: Que políticas públicas te-

riam um impacto positivo na prevenção da vio- lência cometida principalmente dentro de casa? O relatório do especialista independente respon- sável pelo Estudo das Nações Unidas sobre a

Violência contra Crianças, Paulo Sérgio Pinhei-

ro, publicado em 2006, indica uma série de reco- mendações aos Estados para que desenvolvam ou melhorem programas concebidos para apoiar os pais e outras pessoas responsáveis pelo cuidado e pela educação das crianças.

Ele lista alguns serviços que deveriam ser prio- rizados nesse sentido: assistência médica, educa- ção, previdência social, visitas domiciliares, servi-

ços pré-natais e pós-natais, programas de geração de renda para grupos economicamente vulneráveis e programas educacionais para pais enfocando métodos disciplinares não violentos. Também é recomendado que os Estados dirijam especial atenção às famílias em situações particularmente difíceis, como as pertencentes a grupos etnicamen- te minoritários sujeitos a discriminação, famílias chefiadas por mulheres ou crianças e famílias com crianças com alguma deficiência.

Seria interessante pesquisar as relações entre essas políticas públicas de apoio às famílias e o seu impacto na fomentação de uma cultura de paz e de respeito aos direitos das crianças.

P

rêmio e castigo: seria esse um método uni- versal de socialização de crianças? Em diver- sas culturas no mundo, diferentes formas de castigo estão presentes como estratégia para impor o comportamento desejado às crianças e adolescentes e, assim, ensiná-las as regras de pertencimento ao grupo social. O tapa, a surra de cinto e de sandália ou a agressão ver- bal ainda são práticas habituais em casa, nas escolas e unidades de acolhimento e de medi- da socioeducativa, e até aceitas como legítimo recurso pedagógico.

O século 20 testemunhou avanços sig- nificativos rumo à eliminação dos castigos físicos, por meio da aprovação de conven- ções internacionais e normativas de prote- ção. Entretanto, ainda há muitos desafios para que essas diretrizes se traduzam em hábitos pedagógicos cotidianos mais positi-

4

Documentos relacionados