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ANEMIAS MICROCÍTICAS E HIPOCRÔMICAS: COMO DIFERENCIAR ANEMIA POR DEFICIÊNCIA DE FERRO DE BETA TALASSEMIA MENOR?

Utilizando os exames hematológicos é possível observar microcitose e hipocromia, com níveis reduzidos dos índices hematimétricos VCM e HCM relacionados com o quadro de ambas as anemias, além de moderada reticulocitose. Na beta talassemia menor a microcitose é decorrente da formação deficiente de hemoglobina, pela redução da produção das cadeias de beta globina e consequente aumento da concentração das cadeias do tipo alfa, que acabam precipitando, levando à destruição precoce dos eritrócitos, culminando então com o achado freqüente de anemia (81; 83). A partir da identificação destes parâmetros, o individuo portador sofre sério risco de ser tratado com suplementação ou medicamentos à base de ferro cujo tratamento é prolongado, podendo resultar em um acúmulo de ferro no organismo, principalmente no músculo cardíaco, podendo acarretar insuficiência cardíaca, visto que pacientes beta talassêmicos têm uma maior absorção de ferro no trato gastrointestinal em comparação com indivíduos normais (85).

Embora a microcitose e hipocromia sejam características comuns na beta talassemia menor, elas nem sempre estão associadas a uma queda ou redução da concentração de ferro. As dosagens de ferro e ferritina se encontram com valores normais ou ligeiramente elevados (81; 82).

Um aumento nos níveis de concentração de hemoglobina do tipo A2 é o principal achado laboratorial e uma importante característica na diferenciação do portador de beta talassemia menor. Este aumento esta relacionado com a redução

da síntese de cadeias do tipo beta e presença de cadeias do tipo alfa na forma livre, favorecendo a formação de dímeros αδ resultando em tetrâmeros de hemoglobina do tipo A2 (83; 84).

A avaliação dos índices hematimétricos como o VCM e HCM repercute no provável diagnóstico das patologias que cursam com uma anemia microcítica e hipocrômica. Segundo Saénz et al.(1998)(86) valores muito baixos de HCM do que CHCM, tende a identificar um portador de beta talassemia menor em relação à um portador de anemia ferropriva. Este fato também é descrito por Ebrahim Miri- Moghaddam et al. (2014)(99) em um estudo feito com 100 pacientes portadores de BTT (beta talassemia menor) e com 77 pacientes portadores de ADF (anemia por deficiência de ferro). Todos os parâmetros hematológicos, incluindo o VCM e HCM estão mais reduzidos do que naqueles pacientes portadores de ADF, segundo estudo.

No Brasil, Henneberg (2003)(95), com o objetivo de estabelecer padrões eritrocitários de caracterização e diferenciação entre três grupos específicos de patologias diferentes (deficiência de ferro, traço falciforme e beta talassemia menor), através da comparação de valores eritrocitométricos e presença de inclusões citoplasmáticas em distensões sanguíneas coradas, na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), observou que 100% dos beta talassêmicos estudados em sua pesquisa (n=75) apresentaram microcitose e hipocromia com VCM próximos ou menores que 70fL e HCM abaixo de 24pg enquanto que o valor de corte para identificar portadores de deficiência de ferro foram abaixo de 82 fL para VCM e 27 pg para HCM, porém apenas 28,3% do grupo de ferropênicos (N=123) apresentaram valores desses índices semelhantes aos observados nos portadores beta talassêmicos.

Portanto, para fazer o diagnóstico correto da beta talassemia menor é necessário distingui-la da anemia por deficiência de ferro, cujas características se confundem por apresentarem uma anemia microcítica e hipocrômica. Torna-se necessário então, o conhecimento dos valores de concentração de ferro e ferritina e principalmente da quantificação de hemoglobina A2, pois tais parâmetros excluem uma das duas patologias. Porém, os exames para identificar esses parâmetros são processos lentos e necessitam de um laboratório especializado, principalmente no que tange à quantificação de Hb A2. Outro tipo de exame que também requer metodologia complexa e específica é a dosagem de protoporfirina eritrocitária na sua

forma livre ou ligada ao zinco, como forma de definir se a anemia microcítica e hipocrômica é da deficiência de ferro ou da beta talassemia minor, por estar aumentada apenas na primeira patologia (86).

Complementando a solicitação de exames para diferenciação e diagnóstico das anemias por deficiência de ferro é comum encontrarmos o pedido avaliação do metabolismo do ferro, tais como, a capacidade total de ligação do ferro (CTFL), índice de saturação da transferrina (IST), níveis de ferritina, ferro sérico e receptor solúvel de transferrina (sTfR), possibilitando a diferenciação das betas talassemias menores (70).

A fim de otimizar e orientar o diagnóstico das anemias microcíticas e hipocrômicas, reconhecidas em três patologias distintas, das quais, a anemia ferropriva, anemia de doença crônica e a beta talassemia menor, um estudo feito por Matos et al.(2008)(72), no departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, a partir de 159 pacientes portadoresde anemia do tipo microcítica e hipocrômica, foi possível constatar que em pacientes que apresentavam níveis séricos de ferro e ferritina dentro dos valores de referência,mas com elevação na quantidade de hemoglobina do tipo A2, seriam classificados como indivíduos portadores de beta talassemia menor, uma vez que estes parâmetros estabelecem relação importante para um possível fechamento do diagnóstico desta patologia (72).

Saénz et al.(1998)(86) relataram que outro fato importante, retirado de estudos em literatura, é a relação dos níveis de hemoglobina com relação à hipocromia e microcitose, onde é retratado que valores de hemoglobina encontrados abaixo de 10g/dL, associados à microcitose e hipocromia, sugerem beta talassemia menor e não uma deficiência de ferro.

O PAPEL DO RDW NA DEFERENCIAÇÃO ANEεIA FERROPRIVA E β- TALASSEMIA MENOR

O índice RDW, amplitude de distribuição eritrocitária, também é bastante utilizado como um meio de diferenciar a beta talassemia da anemia por deficiência

de ferro. Embora haja controvérsia sobre seus resultados, muitos autores e pesquisadores de hemoglobinopatias o descrevem como uma ferramenta útil no diagnóstico da beta talassemia menor. Segundo Bessman et.al. (1983) (87) o RDW poderia melhorar a classificação dos tipos de anemias com base na heterogeneidade de distribuição do tamanho dos eritrócitos, isto é, se o parâmetro no contador eletrônico mostrasse hemácias heterogêneas, isto definiria uma anemia por deficiência de ferro e se mostrasse hemácias homogêneas seria um indício de beta talassemia do tipo menor. A comprovação deste fato segundo esses pesquisadores foi ao notar que o RDW tende a ter um valor sempre aumentado na anemia ferropriva enquanto que na beta talassemia estes valores se encontram inalterados ou com pequena redução (87). Outros autores também descreveram que na beta talassemia menor todos os eritrócitos são microcíticos devido à síntese deficiente de cadeias beta globínicas. Isto é resultado da mutação que ocorre no gene da beta globina, o que repercute igualmente em todas as células precursoras eritrocitárias, tornando o valor de RDW relativamente constante, diferentemente do que acontece na anemia ferropriva, onde células sanguíneas são produzidas normalmente na medula óssea, não afetada por mutações, isto fornece uma coexistência de células de tamanhos normais e anormais, ocasionando uma anisocitose, ou seja, é observada uma ”população” variada de eritrócitos (73; 89; 90).

Em contra partida, Green e King (1989)(89), utilizando o RDW no estudo feito para diferenciar a anemia por insuficiência de ferro e beta talassemia menor, relatam que este índice se comportaria dentro dos valores de referência na primeira e estaria aumentado na segunda patologia. Alfadhli et al. (2007)(94) também obteve o parâmetro RDW elevado na beta talassemia menor quando comparado à insuficiência de ferro e o considerou como sendo um índice não confiável na distinção entre estas duas patologias.

De acordo com trabalho realizado por Henneberg et al. (2003)(95), foi possível constatar que do total de portadores beta talassêmicos (n=75) compostos por 31 indivíduos do sexo masculino e 44 do sexo feminino, 90,3% e 81,8%, respectivamente, apresentaram índices de RDW acima de 14,5%, valor adotado como o de referência no referido estudo. No entanto, no grupo de ferropênicos (n=123), apenas 68,5% e 75% ultrapassaram o valor de referência. Estes dados contrapõem diversos estudos, os quais citam o RDW como um marcador ou índice

relevante na diferenciação de diagnóstico entre portadores de beta talassemia menor e de deficiência de ferro.

Ainda, em outro estudo realizado por Matos et al. na Universidade Federal de Minas Gerais (2008)(72,76), valores para o RDW dentre os grupos estudados, 83 com anemia ferropriva e 23 com beta talassemia menor, o valor médio de RDW encontrado foi de 16,4% em pacientes com anemia ferropriva e de 15,6% para os beta talassêmicos menor. Embora tenha havido uma leve tendência de maior RDW na anemia ferropriva, não foram verificadas diferenças estatísticas significantes.

Para avaliar a utilidade e confiabilidade do RDW no diagnóstico diferencial das betas talassemias e deficiência de ferro, Lima et al. (1996)(93), estabeleceram valores de cortes para este parâmetro a fim de obter um resultado mais preciso, baseados na especificidade e sensibilidade desse parâmetro. Foram então avaliados 60 pacientes, 50% com beta talassemia menor e a outra metade com anemia por deficiência de ferro. Levando em conta que os pacientes apresentavam anemia microcítica, assumindo um valor acima de 24% e abaixo de 20% para o RDW, foi possível classificar as patologias sendo como anemia por deficiência de ferro e beta talassemia menor, respectivamente. Ao adotar um valor de corte de 21% para cima ou para baixo em ambas as patologias em questão, foi possível estabelecer que 90% dos pacientes com anemia por deficiência de ferro e 77% portando beta talassemia menor, foram diagnosticadas corretamente utilizando o RDW. No entanto, nesse estudo conclui-se que embora diagnosticado corretamente, o RDW não seria um bom indicador de beta talassemia como parâmetro único, necessitando de mais exames que comprovem a doença.

Podemos utilizar a tabela 6 abaixo como um breve resumo da diferenciação hematológica dos achados mais frequentes e ditos como importante relacionando as características da beta talassemia menor e anemia ferropriva.

Tabela 6. ANEMIA POR DEFIVIÊNCIA DE FERRO (ADF) Versus BETA TALASSEMIA MENOR (BTT) VCM e Hb RDW FERRO/FERRITINA Hb A2 GENÉTICA ADF Geralmente menor que 80 fL Elevado Geralmente reduzidos Geralmente baixa (<3,5%) Ausência de herança genética BTT Muito baixo (<70 fL)

Normal Geralmente normais Geralmente elevado (>3,5%)

Presença de herança

genética

Fonte: Atlas Citológico da Academia de Ciência e Tecnologia de São Jose do Rio Preto- SP

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