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ANEXO C Entrevista com Gabriel dos Santos Silva

Figuras 9 e 10: Gabriel Santos no dia desta entrevista, na escola Porto Iracema das Artes, fevereiro de 2014. E sendo entrevistado, no mesmo dia.

Gabriel dos Santos

Ele transformou a timidez em milhões de frames, e sem conhecer os ensaios de Walter Benjamin, fala sobre a mágica das imagens

Ficha técnica: produção, entrevista e texto de abertura de Letícia Reis Amaral

Gabriel nasceu no Mucuripe no dia 27 de maio de 1984. Ele sempre estudou em escolas públicas da região. Na última em que esteve, a Escola Bárbara de Alencar, concluiu o ensino médio. Foi nesta época que ele inscreveu-se e foi selecionado para uma das vagas do curso de formação audiovisual da ONG Aldeia. Participou do projeto Escola de Mídia como aluno e depois como monitor. Desde o início se identificou com a linguagem da câmera de vídeo. E assumiu a câmera em muitos vídeos realizados durante as formações, entre eles podemos destacar Barracão, no qual ele foi o cinegrafista. De lá para cá nunca mais parou. Dono de um jeito cativante, simpático e tímido, Gabriel está sempre sendo convidado para a realização de vídeos. O que virou sua profissão. Hoje trabalha como auxiliar técnico e cinegrafista na empresa municipal Porto Iracema das Artes, onde fez a cortesia de dar uma paradinha no trabalho para conceder esta entrevista. A pesquisadora já havia tido outros contatos com Gabriel Santos nas oficinas do Festival de Jovens realizadores no audiovisual do MERCOSUL em 2011 e outros eventos da mesma área.

Pesquisadora – Quando você teve seu primeiro contato com uma câmera fotográfica? Você lembra?

Gabriel Santos - O primeiro contato eu creio que tenha sido aos 13 anos, com a máquina fotográfica de um amigo. Mas também só peguei, não tinha muito conhecimento, fiquei curioso. Aí fui pensando “o que era aquilo?” “O que nós poderíamos fazer com a aquilo?” E aí foi que em determinado tempo, eu estudei na escola Bárbara de Alencar, e foi justamente que veio o projeto da Aldeia.

Pesquisadora - O que você aprendeu nas formações da ONG Aldeia?

Gabriel Santos - Fotografia, conhecimento de câmera, de alguns equipamentos, que eu não tinha conhecimento, não sabia o que era aquilo. Num determinado momento do curso eu fui

pegando mais esse contato. Aprendendo um pouco mais e tendo uma pequena formação, que hoje cheguei onde estou neste momento devido a Aldeia.

Pesquisadora - Nesta época dos cursos de formação o que você mais gostava de fotografar? Gabriel Santos - Fotografar foi pouco. Mas é mais pôr do sol, paisagem, o cair da noite... O pôr do sol eu curtia muito. Nós íamos à praia no Mucuripe.

Pesquisadora - Você acha que tem alguma diferença entre a imagem que você vê com o olho e a mesma imagem depois que você faz uma foto e depois olha a foto?

Gabriel Santos - Tem um diferencial sim, viu? Porque já muda o olhar, não é? Já é outro olhar. Numa fotografia, você vê, tipo, vamos supor: um pássaro parado. Você já vê com o olho, mas na fotografia já é outro olhar. Você já buscou além do que seria a imagem: ampla, bem definida! Isso eu creio que tem toda a diferença. O meu olho para o olhar de uma câmera*.

Pesquisadora - O que a gente percebe é diferente? Gabriel Santos - Totalmente!

*No momento da decupagem desta entrevista a pesquisadora se emociona porque a fala de Gabriel Santos é praticamente a mesma que Walter Benjamin faz, apenas à luz da teoria, quando diz “a natureza que fala ao olho é diferente da natureza que fala à câmera”. A pesquisadora precisa fazer uma pausa para se recompor da emoção.

Pesquisadora - Você acha que entrar em contato com o fazer vídeo, com esse saber de fazer vídeo, mudou alguma coisa na sua vida?

Gabriel Santos - Mudou. Tipo: a imagem te dá novos horizontes. Te abre a mente. Você tenta buscar a melhor imagem. Sempre o fotógrafo e o cinegrafista tentam buscar a melhor imagem. E é isso o intuito de todos: buscar a melhor imagem. De primeiro você assistia uma novela e via aquela cena... Você trabalhando você tem outro olhar já. O conhecimento de como foi feito, o erro, os planos.

Pesquisadora - Para você a imagem tem algum poder? O que podem as imagens?

Gabriel Santos - O poder da imagem, né? Vamos supor, vou te dar um exemplo para você que trabalha com jornalismo. Se eu estou com uma câmera na mão fazendo um travelling, um planozinho, uma imagenzinha qualquer... Se eu aponto pra um determinado tipo, vamos supor, um policial espancando uma pessoa, aquela imagem vai mudar toda a história. Tipo: a imagem muda tudo. Diferente do olhar, só visual. Você olhando não tem aquele valor do que uma imagem. Uma imagem é muito poderosa em alguns aspectos.

Pesquisadora - Você acredita em tudo que aparece nos jornais da televisão?

Gabriel Santos - Não. Nem tudo é verdade. Fingimentos... São edições, não é? O que determina um jornal é a edição. Porque a edição te dá muitos caminhos diferentes. O que se diz não é totalmente verdade. Nem tudo é verdade no jornalismo.

Pesquisadora - Você acha que o Gabriel ficou mais crítico depois desse contato com o fazer imagens?

Gabriel Santos – Sim. Eu já debato com alguns amigos. Tento explicar também. A pessoa vai aprendendo. E vê que aquela coisa não é aquilo, não é desse jeito... Aí acho que todos nós que fazemos o curso de audiovisual sempre ficamos mais críticos. Não é em qualquer imagem que você vai dizer “Ahhhhh!!!!!!” (se admirar) Se o fotógrafo faz uma imagem mais ou menos você vai dizer: “Ah... Ele errou tal [coisa]...” Muitas vezes erram no diafragma, na íris, deixa estourar a imagem. Tem que ver... Pessoas leigas não se tocam. Passa batido, mas pra gente que tem um determinado olhar... Eu assisto muito jornal e eu vejo erros, pequenos erros, até mesmo no áudio.

Pesquisadora - Você lembra dos vídeos que você participou na ONG Aldeia?

Gabriel Santos – Os catadores; Barracão; Costa a Costa e outros. Não me lembro de todos. Pesquisadora - Essa questão do fazer imagens faz parte dos seus planos de vida hoje?

Gabriel Santos - Com certeza. Hoje eu não consigo mais viver sem a imagem, sem o audiovisual, não é? Tipo: marcou. Eu tenho como profissão! Hoje eu estou gerenciando, junto com o Luís Santiago (Entrevistado do Anexo F) e o Pedro Mauro Firmiano, esta escola, que é

a nova Porto Iracema das Artes. Nós somos da parte técnica. Tentamos mostrar aos alunos, ensinar como se deve manusear [câmeras e outros equipamento do audiovisual], junto com os professores. Tipo como um monitor. Isso! Aí, por enquanto, eu estou aí nesse trabalho. Mas eu sempre trabalhei mais em tevê. Com o Valdo (Siqueira) fiz Mortes morridas, sobre a mãe de uma pescadora de Icapuí. E muitos outros que eu não me lembro. Eu trabalho nas produções mas pra mim, não me lembro muito bem. Não tenho um arquivo.

Pesquisadora - Você já viu algum vídeo seu ser exibido numa sala de cinema, ou num festival, ou numa praça?

Gabriel Santos – Assistir, assistir não. Fiquei sabendo... Pesquisadora - E qual a sensação?

Gabriel Santos - Prazeroso! Te dá todo um contexto, uma vontade de continuar fazendo, fazendo. Emocionante, não é? Uma coisa que você participou, passar ali... Algumas pessoas assistindo... É gratificante. É isso que o profissional de audiovisual acho que busca, né?

Pesquisadora - Você acha que as pessoas te perceberam de um jeito diferente depois que você passou a ser um produtor audiovisual? E você mesmo se percebe diferente? Ou não? Quem era o Gabriel antes e hoje?

Gabriel Santos - Antes eu, tipo: não ligava muito. Antes da Aldeia, eu era mais na rua, aquela brincadeira... Só brincadeira. Hoje não. Aí hoje eu já me vejo com um novo patamar, diferenciado, assim com novos horizontes. Buscando mais objetivos. Crescer mais na parte de audiovisual. Tenho mais contatos no audiovisual. As pessoas me chamam para trabalhar com elas em produções audiovisuais variadas. Tem tempo ruim e tempo bom, mas sempre estamos trabalhando.

Pesquisadora – Alguns vídeos que você produziu estão na internet?

Gabriel Santos - Sim: Barracão, entre outros. Fiz também umas produções com o Hugo Carvana, um trabalho sobre municípios para o governo do estado. Bem legal!!!

Pesquisadora - Você acha que o que vocês produziram na Aldeia foi assistido o suficiente pelas pessoas ou você acha que esses trabalhos poderiam ter tido mais repercussão?

Gabriel Santos - Acho que poderia ter mais repercussão. Se tivesse mais apoio de órgãos, governos, ou mesmo da própria Aldeia. Mas o que foi mostrado foi suficiente pra mim, da minha parte foi.

Pesquisadora - Você vai tentar se aprofundar mais nessa área? Em novos cursos?

Gabriel Santos - Com certeza. Tipo: vou ficar nessa área pro resto da minha vida! Foi o que eu escolhi, gostei e estou até hoje. Pretendo só parar no final da minha vida. Eu pretendo, por mim, englobar toda a área, porque você tem que saber um pouco de cada coisa: edição, imagem, direção. Pretendo englobar tudo. Não parar só em câmera.

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ANEXO D