• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 4 – Análise das entrevistas: A trança de Rapunzel

4.3 Anna : “muitas portas se fecharam pra mim, sem razão.”

Anna é uma menina tímida, fala baixo e cora ao falar. Ela coloca frequentemente os cabelos para trás da orelha. Sei dela algumas informações básicas, passadas pela coordenadora da instituição, Angelina. Ela me havia dito que Anna teve várias oportunidades de adoção e não quis ser adotada. Contou-me que é uma menina fechada e Angelina achava que ela pouco contribuiria comigo.

Minha primeira impressão de Anna é diferente daquela que primeiro me foi passada por Angelina. Percebo empatia entre nós e ao mesmo tempo um distanciamento que me colocava no patamar de outras “tias” a quem ela estava acostumada a se reportar. No contexto da entrevista ela corresponde timidamente ao meu olhar interrogativo sobre a vida dela e sua história, mas também com um pouco de desconfiança, ainda que colabore e fale sobre o que lhe pergunto.

Anna diz que foi para a instituição aos cinco anos de idade, junto com seus três irmãos, somente um mais novo que ela. Dos dois irmãos mais velhos, que não foram abrigados, ela não se lembra mais. Dois dos irmãos que foram abrigados junto com ela fugiram no dia seguinte ao abrigamento. Ela tem contato com um destes irmãos na igreja que frequenta e diz que ele é carinhoso com ela. No meio da conversa sobre seus irmãos, ela ainda conta que tem um irmãozinho ainda mais novo, que também não foi abrigado porque estava com uma madrinha. O irmão mais novo que ela e que também estava no abrigo, foi adotado por uma família e ela não tem contato com ele. Vou questionando-me, à medida em que ela vai falando, como foram vivenciadas essas rupturas. Tal qual na história de Alice, aconteceram importantes rupturas de vínculos após o abrigamento e não houve qualquer cuidado de preservação de tais vínculos, ainda que fosse uma promessa “da justiça”.

Ao pensar que dois dos irmãos de Anna fugiram um dia após seu abrigamento, vem à mente que ela e o irmão mais novo não tiveram energia e necessidade de liberdade tanto quanto os dois mais velhos, quase em plena adolescência. Anna e o irmão submeteram-se ao que lhes estava circunscrito naquele momento: institucionalizar-se.

Durante minha trajetória, levei várias crianças até a instituição. A maioria delas ia chorando, debatendo-se, muito revoltadas. A angústia era muito grande, traumática para mim, que estava ali cumprindo uma determinação judicial e não poderia não acompanhar os oficiais de justiça que cumpriam tal determinação de “busca e apreensão”. Talvez, esses tenham sido alguns dos momentos mais monstruosos com que me deparei em minha trajetória profissional. Levar a criança para a instituição e retirá-la da companhia dos pais ou de quem está cuidando dela no momento, romper com tudo o que é conhecido, mobiliza sentimentos de intensa impotência e desamparo, tanto para a profissional quanto para a criança que está sendo “apreendida”. Portanto, a fuga não me soa como um estranhamento, mas o sentimento de Anna, imagino, deve ter sido de intenso sofrimento.

Conforme nos diz Parreira e Justo (2005, p.176), precisamos considerar que a transferência da criança para uma instituição de abrigo será subjetivamente interpretada por ela, sob pressão ambivalente de sentimentos de amor e ódio, decorrentes tanto dos vínculos estabelecidos com as figuras parentais como das reações desses familiares diante de sua situação de sofrimento. Ela tenderá a interpretar os fatos que circundam seu acolhimento institucional como sendo decorrentes da vontade daqueles “personagens que compõem sua história, e não de uma lei propriamente dita que pudesse transcender o arbítrio pessoal e, inclusive, protegê-la de atos de transgressão”. Onde estariam o amor e o respeito pelo indivíduo em sua singularidade, questionam-se esses autores.

Anna revela que sua mãe é “alcoólica” e que seu pai já morreu, quando ela era “pequenininha”. Não se lembra de nada dele, nem do falecimento, nem do enterro. Diz que se

lembra da mãe e que acha que ela começou a beber após o falecimento do pai. Mais uma vez me pergunto: que suporte essa mulher teve para superar o luto pela perda do marido? Ela não pôde cuidar de si mesma, como iria olhar para os filhos? Anna parece ter sido acolhida porque sua mãe não estava “nem morta, nem viva”. Parece que era uma mulher aterrada na melancolia que tentava aplacar com a bebida. As portas afetivas começavam a se fechar para Anna.

Pergunto-lhe o que acontecia quando a mãe dela bebia e ela diz, baixinho: “Nem lembro, tia!” O isolamento afetivo parece ser a única defesa possível para Anna em certos momentos. Tal qual na história de Alice, uma resistência a mim, ou à psicóloga judicial que eu represento ali.

Sobre a sua chegada à instituição ela diz que não se lembra bem das primeiras impressões e, após a fuga dos irmãos mais velhos, ela e o irmão mais novo ficaram ainda mais “grudados”. Ali, ela e o irmão eram a família, poderiam amparar-se. Mas ainda haveria muito terror e separações, tal qual vivenciados por Alice e sua separação da irmã.

Triste, ela nega, quando pergunto se as pessoas que adotaram o irmão levam-no para visitá-la. Sente saudades dele. Fico perplexa com o descaso com o vínculo, antes “grudado” e única esperança de amparo entre Anna e o irmão mais novo. Nós, equipe do judiciário, devíamos “cuidar” melhor desses casos, observar e acompanhar se os vínculos estão sendo mantidos, se o que foi combinado quando da adoção de irmãos separados, está sendo cumprido. Concluo, porém, que por mais que queiramos colocam-nos em um ritmo de trabalho tão extenuante e com condições tão mínimas que se torna impensável agir fora do contexto das determinações judiciais, dentro do contexto emudecedor e ensurdecedor que mencionei neste trabalho.

Pensando em articulação com o que dizem Parreira e Justo (2005) questiono-me sobre estas questões de poder que impregnam as decisões sobre a vida das crianças acolhidas institucionalmente:

Quando pensamos na instituição do Estado-Grande-Pai, na relação intrafamiliar, temos o ideário de proteção à criança e ao adolescente. Tirá-los de um ambiente onde seus direitos não estão sendo respeitados e onde a criança e/ou adolescente correm sérios perigos em relação à sua integridade física e/ou psíquica pode ser visto como uma interdição legítima do Estado, representado pelas leis da cultura. Mas o que dizer da intervenção que separa crianças de seus vínculos constituídos com outras crianças, funcionários e frequentadores da instituição, quando essa separação é imposta pelos altos escalões do poder judiciário ou dos dirigentes das instituições de abrigo, em função de desavenças e/ou posicionamentos políticos que cegam o bom senso e tomam a irracionalidade como guia de decisões, aprofundando ainda mais a desfiliação? O que esperar de um Estado-Grande-Pai que separa os vínculos formados sem dar satisfação, sem dizer aos maiores interessados o motivo e para onde vão? O que dizer de um Estado-Pai-Autoritário que abusa do poder para atestar sua magnitude e fazer prevalecer a arbitrariedade daqueles que o representam? (Parreira e Justo, 2005, p.177).

Tais questões fazem-me imergir nos paradoxos de agente de proteção a serviço do judiciário e de sujeito abrigado que se submete à vontade de uma lei maior que institui sua família como inadequada para cuidar dela e, então, destitui a possibilidade de convivência familiar que ela pudesse conhecer, colocando-a num estado de desamparo e solidão absoluta.

Anna conta que é uma pessoa fácil de fazer amizades e diz que muitas amigas que fez na instituição foram adotadas por pessoas do exterior. Ela, amorosa, diz que ficou feliz pelas amigas terem sido adotadas. Diz que logo “chegou mais gente”. Nesse momento ela me conta das adoções que rejeitou e pergunto o que ela sente em relação a isso. Responde: “Nada”. Insisto e ela diz: “Sem comentário, tia”. Percebo que não querer falar sobre o assunto é imperioso para Anna, seria como tocar na ferida. Entendo ser importante respeitá-la e evitar uma revitimização, no sentido de entender esse conteúdo como muito doloroso para ser tocado. Contudo tento deixá-la à vontade para falar comigo, pois percebo que ela desconfia do lugar que eu ocupo. Tal qual fez Alice em sua fala.

Digo a ela, em seguida, que está em um ambiente seguro e que pode confiar. Ela me diz que “temia por eles não cuidarem direito dela e também de não gostarem dela”. Vejo como meu lugar novamente confunde-se com o da psicóloga judicial. Anna me percebe com certa persecutoriedade, teme contar-me algumas coisas e quando lhe afirmo que pode sentir-se segura comigo, ela consegue se abrir mais. Assim, abro minhas portas para que Anna possa entrar e apresentar-se a mim, pesquisadora.

Pergunto se esses sentimentos, medo de não ser bem cuidada e querida, também aparecem na instituição, com as cuidadoras e colegas e ela diz “não”. Quando menciono as amigas, ela diz que não tem amigas, só tem colegas e que só se abre com uma delas, dois ou três anos mais nova.

Novamente, em interlocução com Parreira e Justo (2005, p.177) pode-se afirmar que crianças ou adolescentes encaminhados para instituições de abrigamento iniciam e passam a viver ali sua carreira de pária ou expatriado. Perdem a filiação anterior, qualquer que seja ela, e não receberão outra que possa servir de âncora para seu posicionamento e direcionamento no mundo. Segundo eles, a instituição de abrigo já se coloca como um lugar de passagem e ainda que a criança permaneça nela por um longo período, dificilmente reconhecerá ali sua própria imagem, “pelos estigmas que pesam sobre os asilados” (p.177). Penso que tais afirmativas mostram que Anna não consegue fazer vínculos seguros nem com os colegas de instituição, tamanha a precariedade e transitoriedade que eles representam, por isso não pode ter amigas, só colegas. Tal qual vi em Alice, as pessoas que possuem convivência dentro do abrigo não podem ser nomeadas, são tias, colegas ou qualquer um que possa partir a qualquer momento seguindo determinação judicial. No abrigo todos são “eles”.

Pergunto então sobre seu sentimento em relação à adoção do irmão e ela responde que “ficou muito triste”. Percebo uma fala de emoção e digo a ela que não tenha medo de se emocionar. Ela me devolve: “Ai tia, é seu olho que tá brilhando”. Digo: “também me

emociono”. Perguntei se os adotantes não quiseram levá-la ou se ela achou que a vontade deles estava “fraca”, e ela diz: “Eles queriam mais meu irmão.”

Passa-me a ideia que nada disso foi dito a Anna e que ela sentiu que eles não a desejavam como desejavam seu irmão. O fato é que ela rejeitou essa adoção para si, por não acreditar que iria realmente ser amada naquela nova família. Ela sofreu mais uma separação, mas não se submeteu a um casal que não a “queria”. Anna também quer escolher, quer falar de si, quer ser vista e ser ouvida. Anna bate às portas e chama por um contato. Anna quer a sua família, seu irmão.

Sobre sua mãe biológica, não sabe mais nada, mas acha que a situação dela só piorou. Anna pensa em procurá-la quando sair do abrigo e, se ela estiver viva, quer ajudá-la. Parece idealizar a mãe que “morta/viva” não pôde criá-la. Possui o desejo de dar amparo para encontrar sua própria filiação. Anna teve que esquecer o que foi ruim lá no passado para buscar mais vida pela frente, para não sucumbir ao isolamento de todos os vínculos. A história que nunca lhe foi contada, que nunca teve a chance de ser elaborada, abre janelas para a idealização, a famìlia perdida e guardada como um “tesouro”.

Ela revela que não pensa muito em como será sua vida após sair do abrigo, acha que vai terminar seus estudos, trabalhar e é isso. Diz “que acha que vai sentir “um pouquinho” de falta da instituição”. Conta-me que não chora. Diz que “é acostumada”. Eu pergunto: “acostumada com as dores?” Ela responde: “No começo não doeu muito.” No começo pode até ter sido bom, ser colocada em segurança e junto com o irmão. Mas o depois... ahh, o depois...

Ao abrigar uma criança, os sentimentos são de ambivalência, apesar de sabê-la protegida, alimentada e segura, sempre me questionei qual será o caminho doloroso da provisoriedade dos vínculos, da exclusão e da perda da liberdade de ser, passando a viver de

acordo com normas comuns à instituição, sem a oportunidade de ser ouvido em sua singularidade. Anna ficou só, tantas vezes ficou só, que se acostumou com o abandono.

Ao falarmos sobre os amores e namorados ouço um “ai.” Já gostou de um menino que foi adotado há uns três anos. Diz-me que tem namorado, mas tem medo da “tia” descobrir. Não pode, mas gostaria de namorar. Encontra-se com um namorado na escola e um dia lhe dirigiu a pergunta “por que ele não desistiu dela se ela fica presa no abrigo?” Ele nada respondeu. É assim que ela se sente: presa no abrigo. Não pode fazer nada, só ir para a escola, para o curso e voltar.

Winnicott (1996, p.184 e 185) considera que o conceito de liberdade conduz a um exame de ameaça à liberdade. Ele diz que tal ameaça existe, e “o único momento adequado para investigá-la é antes de a liberdade ser perdida”. Continua dizendo que a liberdade seria considerada uma questão da economia interna do indivíduo, não seria fácil destruí-la. Portanto, ele diz, “se a liberdade é vista antes em termos da flexibilidade do que da rigidez na organização defensiva, então se trata de um aspecto da saúde do indivíduo, e não do tratamento a ele dispensado”. Contudo, ninguém é independente do meio, e existem algumas condições ambientais que acabam por destruir o sentimento de liberdade mesmo naqueles que poderiam gozá-los. Menciona ainda que uma ameaça prolongada poderia minar a saúde mental de qualquer pessoa e enuncia que “a essência da crueldade é destruir no indivíduo aquele grau de esperança que faz algum sentido a partir do impulso criativo e do viver e pensar criativos”.

Quando Anna se diz presa na instituição remete-me à ameaça prolongada de se não seguir os padrões ditados dentro dela, estaria sozinha no mundo, desamparada materialmente. Pergunto-me por que Anna não foge? Por que Anna não se rebela? Penso que isso não acontece porque Anna achou uma “janela” afetiva neste lugar. Anna namora com a liberdade, enfim. Apesar de presa, Anna cria um afeto diferente, ainda que seja um sonho escondido.

Percebo como Anna ainda deseja, ainda pulsa em mostrar-se e exibe uma chama de vida à espera(nça) de criar novos rumos para sua vida.

Ela se incomoda com o fato de ter me revelado sobre o namorado. Depois me conta também que tem medo de desistirem dela e fala que não quis os pais adotivos por esse motivo. Ela rejeita por temer a rejeição. Sua defesa possível. Deixa-se congelar pela insegurança e não se acredita merecedora de amor. Infelizmente o caráter traumático das separações vivenciadas parece ser compulsivamente repetido por Anna. Ela olha pela janela e vê, mas não confia que portas se abrirão para ela.

Em nosso segundo encontro, Anna chega com seu cabelo ao natural, conversamos sobre isso e ela me conta que as colegas fazem “escova umas nas outras”. Isso me soa como um cuidado fraternal, tal qual os laços fraternais que vão sendo construídos durante a vida para nos dar algum contorno diante do desamparo.

Retomo com Anna a história do irmão mais novo ter sido adotado e de alguns irmãos terem fugido e ela nunca ter pensado em fugir. Ela relata que os padrinhos que a pegavam e ao irmão mais novo, o adotaram. Diz que gostava dos padrinhos, que eles lhe davam “coisas”, mas que não chegou a morar na casa deles. Não sabe por que não... Parece insegura e reticente. O fato de não pensar em fugir, de sentir-se acolhida, pode ter relação com o fato de ter feito laços dentro do abrigo.

Começamos a conversar sobre ela ficar “às cegas” e não saber o que vai acontecer em sua vida em relação à adoção, ou depender do coordenador da instituição ou do Fórum para dar alguma notícia sobre adoção ou sobre outra possibilidade para a vida dela, e Anna diz que acha que isso “ruim”. O meu questionamento surge como um estranhamento que me assola em relação aos casos atendidos. A dificuldade que percebo em meu trabalho relaciona-se à impotência e à escuridão que imperam após a entrega do estudo e do laudo. Nada sabemos a respeito do que sucede nosso trabalho, ou do que acontece em salas de audiência. Algumas

vezes, até consultam os técnicos do setor psicossocial, mas nem sempre e, quando somos acionados, aqueles que foram por nós atendidos mostram-se tão surpresos quanto nós mesmos. Percebo que, aos poucos, desacostumei de bater nas portas para ter alguma notícia, ou manter algum vínculo com o caso atendido, após a entrega do estudo que havia sido determinado. Anna também foi isolando-se, acostumou-se a não ser ouvida, e parou de perguntar sobre novas possibilidades para sua vida. Percebo nossa impotência diante das determinações legais que nos cobrem.

Pergunto sobre a vida social de Anna e se ela gostaria de sair com os amigos, dançar.. Ela me responde que gostaria de ir para o “frevo”, mas nunca foi. Disse que gosta de ouvir música funk, mas não gosta de dançar. Não explica porque não gosta de dançar, fica tímida e penso que a minha violenta presença institucional entra como um ruído. Percebo como a crueldade da instituição e o massacre estão presentes nesse tipo de contato em que ela não se sente livre nem para manifestar seus gostos e desejos. Quando eu pergunto sobre ela sair com o namorado ela sorri e cora, não me responde.

Diz que na instituição é tratada como criança, fica presa. Pergunto sobre como é o tratamento de uma criança, ela não explica, mas continuo perguntando sobre as coisas que ela “não pode” fazer e ela realmente me responde que desejar é proibido, não pode namorar, não pode dançar, não pode usar o computador, não pode ter telefone... me parece mesmo uma prisão.

Diz que o namorado pergunta como ela se sente e que, em determinada ocasião, ele já viajou para a praia e a chamou. Só algumas amigas sabem da existência do namorado. Conta de sua melhor amiga, que tem treze anos e parece-me que na companhia dessa amiga ela se encontra dentro daquele lugar e pode desfrutar de um vínculo amoroso atual e não viver só de lutos pelos outros vínculos já perdidos. Depois pergunto sobre as responsabilidades dentro da instituição, ela fala algumas como arrumar seu quarto e ajudar na cozinha.

Quanto a sua vida social, diz que quando sai para a casa dos novos padrinhos “fica no canto dela”, não gosta de mexer com o computador, não tem facebook porque na instituição não vai poder mexer. Revela que o namorado tem. Pergunto se ela tem ciúmes do namorado, ela responde que sim. Questiono há quanto tempo estão juntos e ela diz que tem dois anos de namoro e depois corrige e diz que tem só um ano. Conta que o namorado não estuda, apenas trabalha, mas ela “não sabe com o quê”.

Pergunto como eles se conheceram e ela diz que foi pela janela do quarto, do qual ele era vizinho. Conversaram pela primeira vez na escola. Ela nunca pensou em fugir da instituição para ficar com ele. Perguntei sobre ela não ter desejado ir para a adoção, sobre imaginar que eles não gostavam dela, se isso não se repetia com ele, o namorado, mas ela “não sabe”. Quando Anna fala de suas “janelas”, lembra-se da madrinha, mas se confessa uma pessoa tímida. Teme confessar seus sentimentos para os adultos e digo que isso se repete em relação a mim também. Tal qual Alice, Anna é desconfiada e não tem facilidade em falar comigo, mostra-se persecutória quanto à minha presença institucional, sente-me como uma psicóloga que pode contar seus segredos para o “juiz”.