PARTE I – ESTADO ACTUAL DO CONHECIMENTO
1.3 Anomalias em revestimentos
1.3.1 Principais anomalias, sintomas e causas associadas
A elevada exposição dos revestimentos exteriores dos edifícios às mais diversas acções agressivas torna-os bastantes susceptíveis à degradação e por isso com necessidade de intervenção a nível da sua conservação e restauro (VEIGA et al., 2004). A exposição dos revestimentos com o meio ambiente coloca-os em contacto com diversas acções, como as acções climáticas e os agentes de ordem química, física, mecânica e biológica (MAGALHÃES, 2002).
A correcta identificação das anomalias presentes num revestimento contribui de forma importante para a adopção de acções de reparação adequadas. As anomalias dependem de factores ligados aos materiais e técnicas construtivas utilizadas, de processos naturais ou artificiais da sua alteração ao longo do tempo (factores ambientais e humanos) (VEIGA et al., 2004). Segundo Magalhães (2002), as principais anomalias em rebocos antigos são a humidade, a fendilhação e fissuração, as eflorescências e criptoflorescências, a biodeterioração, a perda de aderência, a perda de coesão ou desagregação, a erosão e a sujidade; Tavares (2009) considera ainda a alteração cromática como anomalia, no caso dos revestimentos coloridos.
De seguida, faz-se uma descrição dos sintomas e das principais causas associadas às anomalias mais comuns em revestimentos (HENRIQUES, 2001; MAGALHÃES, 2002; TAVARES, 2009); entende-se por sintoma a forma de manifestação de degradação ou de anomalia (ABREU et al., 2002).
Humidade (Fig. 1.1)
Sintomas – manchas nos revestimentos; Causas associadas:
Elevada permeabilidade à água dos revestimentos, ou de materiais do suporte; Contacto de zonas da parede com água do solo;
Deficiente posicionamento de barreiras estanques;
Condensação de vapor de água no interior ou superfície do revestimento; Presença de sais higroscópicos que fixam água;
Causas fortuitas (rotura de canalizações, entupimento de tubos de queda, caleiras, etc.).
Fendas e fissuras (Fig. 1.2b)
Sintomas – aberturas longitudinais que atravessam toda a espessura do revestimento (fendas), ou aberturas longitudinais curtas e finas apenas a nível superficial (fissuras);
Causas
Retracção do reboco;
REVESTIMENTOS ANTIGOS
11 Gelo;
Espessura inadequada do revestimento; Erros de dosagem das argamassas; Movimentos do suporte;
Reação com sais presentes no suporte; Absorção excessiva do suporte;
Concentração de tensões junto a zonas de aberturas; Corrosão de elementos metálicos.
Eflorescências e criptoflorescências (Fig. 1.2a)
Sintomas – substâncias esbranquiçadas de aspecto cristalino na superfície exterior do revestimento, devido à cristalização de sais (eflorescências); cristalização de sais solúveis no interior dos poros do revestimento (criptoflorescências);
Causas associadas:
Presença prolongada de água;
Presença de sais solúveis no revestimento, no suporte ou na água infiltrada; Cal não carbonatada.
Biodeterioração (Figs. 1.1b e 1.1c)
Sintomas – presença ou deposição superficial de organismos biológicos (plantas, musgos, fungos, etc.);
Causas associadas:
Presença prolongada de humidade; Falta de ventilação;
Iluminação;
Acumulação de sujidades ou poluentes; Textura superficial do revestimento rugosa. Perda de aderência (Figs. 1.2c e 1.3a)
Sintomas – separação entre as diferentes camadas de revestimento, ou entre o revestimento e o suporte (descolamento, abaulamento, destacamento);
Causas associadas:
Presença de humidade e/ou sais solúveis; Variações higrotérmicas;
Movimentos do suporte;
Impermeabilidade elevada do suporte ou revestimento;
Erros de execução do revestimento (excesso de água na amassadura, falta de humedecimento do suporte, etc.).
REVESTIMENTOS ANTIGOS
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Perda de coesão (Fig. 1.4a)
Sintomas – enfraquecimento das ligações entre as várias partículas do revestimento; pode provocar desagregação, farinação ou pulverização das partículas;
Causas associadas:
Presença de humidade; Cristalização de sais solúveis;
Revestimento fraco (baixa dureza superficial); Acção de organismos ou microrganismos;
Reacção química entre os materiais que constituem os revestimentos e as substâncias presentes na atmosfera.
Erosão (Fig. 1.3b)
Sintomas – desgaste do revestimento com perda de material, ou alteração da sua superfície (modificação do aspecto ou textura);
Causas associadas:
Presença de humidade; Perda de coesão;
Desgaste provocado por agentes de degradação (agentes mecânicos, físicos, químicos, biológicos ou atmosféricos).
Sujidade (Fig. 1.3c)
Sintomas – sujidades na superfície dos revestimentos (deposição de partículas, poeiras, etc.);
Causas associadas:
Escorrência da água da chuva;
Acção do vento com partículas em suspensão; Textura superficial dos revestimentos (rugosidade). Alteração cromática (Fig. 1.4b)
Sintomas – variação dos parâmetros que definem a cor (esmaecimento, deslavamento, amarelecimento, descoloração, deslavamento, escurecimento, etc.);
Causas associadas:
Presença de humidade;
Acções ambientais (especialmente a radiação solar); Absorção irregular da camada de pintura pelo revestimento; Irregularidades na superfície do revestimento.
REVESTIMENTOS ANTIGOS
13 Fig. 1.1 - Exempos de anomalias em revestimentos: a) Manchas de humidade; b) e c) Manchas de humidade e
biodeterioração (fotografias a) e c) de Débora Fernandes)
Fig. 1.2 - Exemplos de anomalias em revestimentos: a) Eflorescência; b) Fissura; c) Perda de aderência
Fig. 1.3 - Exemplos de anomalias em revestimentos: a) Perda de aderência; b) Erosão; c) Marcas de escorrência de água (fotografias a) e b) de Débora Fernandes)
Fig. 1.4 - Exemplos de anomalias em revestimentos: a) Perda de coesão; b) Alteração cromática (TAVARES, 2009)
a) b) c)
a) b) c)
a) b) c)
REVESTIMENTOS ANTIGOS
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1.3.2 A perda de coesão
Um revestimento demonstra perda de coesão quando existe um enfraquecimento das ligações entre as várias partículas, levando à diminuição da sua resistência mecânica; a argamassa torna-se friável em consequência da perda de ligante devida a acções físicas ou químicas (VEIGA et al., 2007; VEIGA, 2011). A perda de coesão pode dar origem a outras anomalias como a desagregação (ou arenização), farinação e pulverização. A desagregação caracteriza-se pelo destacamento grão a grão das partículas do revestimento; a pulverização ocorre quando o desprendimento se dá sob a forma de pó ou grânulos; a farinação ocorre quando o desprendimento ocorre sob a forma de um pó bastante fino (TAVARES, 2009).
Esta anomalia afecta tanto a função protectiva como a função decorativa, pondo em causa a durabilidade do revestimento. As causas mais prováveis para a ocorrência da perda de coesão em revestimentos são as que se referem de seguida (MAGALHÃES, 2002; TAVARES, 2009).
i. Presença de humidade
A presença prolongada de humidade e água nos revestimentos pode provocar à solubilização e dissolução do ligante, levando ao enfraquecimento das ligações entre as várias partículas do revestimento.
ii. Cristalização de sais solúveis ou acção do gelo/degelo
A cristalização de sais solúveis no interior dos poros de um revestimento ou a acção do gelo/degelo pode provocar o aumento do seu volume e, por consequência, dar origem a tensões no seu interior que provocam a desagregação do material. No caso dos sais, as criptoflorescências podem provocar a perda de coesão dos revestimentos.
iii. Reboco fraco, sem dureza superficial
Também as próprias características do revestimento podem contribuir para o desenvolvimento da perda de coesão. Isto acontece quando se trata de um reboco fraco, com pouca dureza superficial e no qual a ligação entre partículas é fraca. Um revestimento com estas características apresenta-se ainda mais susceptível ao enfraquecimento das ligações entre partículas
iv. Acção de microorganismos e organismos
A simples presença de organismos e os produtos que expelem podem ser nocivos para os revestimentos, levando à sua degradação. Os produtos resultantes do seu metabolismo podem ser do tipo ácido, provocando assim a desagregação do material. Outro caso bastante prejudicial é o caso em que os organismos em questão conservam humidade na superfície dos materiais.
v. Reacção química entre os materiais que constituem os revestimentos e as substâncias presentes na atmosfera
REVESTIMENTOS ANTIGOS
15 Os compostos presentes na atmosfera também contribuem para a degradação dos revestimentos, sendo eles naturais ou artificiais. Quando se dão reacções químicas entre estes compostos e os constituintes do reboco, ocorre uma transformação molecular do material, que pode contribuir para a desintegração do revestimento e a formação de subprodutos potencialmente perigosos.
Entre todas as causas, a cristalização de sais solúveis é considerada como a principal causa para a deterioração de materiais porosos (CHAROLA, 2000).