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APELAÇÃO AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM TUTELA ANTECIPADA IMPOSSIBILIDADE DE INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ÁGUA POTÁ-

TRIBUNAIS DE JUSTIÇA

APELAÇÃO AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM TUTELA ANTECIPADA IMPOSSIBILIDADE DE INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ÁGUA POTÁ-

VEL POR PARTE DA CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO PÚBLICO. PEDIDO DE PAGAMENTO DA DÍVIDA EM PARCELAS COMPATÍVEIS COM A REALIDADE ECONÔMICA FAMILIAR. PESSOAS IDOSAS E COM DEFICIÊNCIA MENTAL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO POR CONCESSIONÁRIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E ESTATUTO DO IDOSO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE. CORRELAÇÃO ENTRE ES- SENCIALIDADE DO SERVIÇO E O SUPRAPRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITOS À VIDA E À SAÚDE. LEI FEDERAL 8.987/95

E RELATIVIZAÇÃO DA CONTINUIDADE. REQUISITOS CUMULATIVOS DO AVISO PRÉVIO E DA OBEDIÊNCIA AO INTERESSE DA COLETIVIDADE. CONCEITO DE INTERESSE DA COLETIVIDADE. PLEITO EM QUE NÃO HOU- VE INFIRMAÇÃO DO DÉBITO. PEDIDO DE PARCELAMENTO COMPATÍVEL COM A SITUAÇÃO. EXTREMA POBREZA VERIFICADA. O CONCEITO DE INTERESSE DA COLETIVIDADE E O RAZOÁVEL ENTENDIMENTO PELO JULGADOR NO CASO CONCRETO. TRATAMENTO DADO AO DEVEDOR NO CPC. APLICABILIDADE POR ANALOGIA. IMPROCEDENCIA. 1. O fornecimento de água potável, indubitavelmente, caracteriza-se como relação de consumo, amoldando-se aos conceitos de fornecedor e consumidor trazidos pelo Código Consumeirista. 2. O CDC determina que as concessionárias estão obrigadas a fornecer serviços contínuos quanto aos essenciais. 3. A disponibilidade de água própria ao consumo não é mero conforto do homem, é condição mínima de saúde, tanto do homem individualmente considerado, como da população como um todo, na perspectiva do bem comum. 4. O serviço público de prestação de água potável é serviço público essencial, tanto material como formalmente considerado (Lei de Greve). 5. Na Constituição Federal de 1988, tem-se, como elemento socioideológico, a ordem econômica limitada por direitos e garantias fundamentais. A persecução do lucro não se opera de qualquer forma nem a qualquer preço em um Estado Democrático de Direito, ainda mais quando se está diante da prestação de serviço público essencial por concessionária. A von- tade de lucro tem, destarte, um limite: a dignidade do homem. 6. A dignidade da pessoa humana tem como pressuposto de exercício os direitos à vida e à saúde. E a ausência de fornecimento de água potável traz riscos imediatos à saúde e à própria vida. 7. O Código de Defesa do Consumidor garante a continuidade da prestação dos serviços essenciais pelas permissionárias de serviço público. No entanto, a Lei Federal 8.987/95, que trata da prestação de serviços públicos, relativizou o comando principiológico da continuidade. 8. Na possibilidade de interrupção pelo inadimplemento do usuário, há duas condições cumulativas explícitas na norma: que haja prévio aviso ao usuário de que o serviço vai ser interrompido e que seja considerado o interesse da coletividade. 9. Interesse da coletividade não pode ser tomado como simples interesse econômico-financeiro da empresa concessionária. Ao revés, deve ser visto como a síntese dos inte- resses individuais dos usuários, posto que titulares do direito a uma prestação adequada e contínua de serviço público essencial. 10. Se o usuário, podendo pagar a fatura de água, assim não o faz, a concessionária pode interromper o serviço porque, em nome do interesse da coletividade, deve continuar prestan- do o tal serviço regularmente à população. 11. No caso dos autos, as autoras em nenhum momento alegaram que a dívida era indevida nem pugnaram pelo seu perdão. O que se requer é o parcelamento da dívida em montante mensal compatível com a realidade de extrema pobreza em que se encontra esta família. 12. Interromper o serviço de água na casa dessas pessoas é ferir de morte o interesse da coletividade, que não é conceito metafísico e inalcançá- vel; é conceito que deve ser vivenciado pelo intérprete que pretende aplicar o direito com justiça e razoabilidade. 13. De fato, quando o legislador, ao tratar da

possibilidade de interrupção do serviço público por inadimplência, colocou no texto o conceito indeterminado de “interesse da coletividade”, não pode ter sido com outro intuito a não ser aquele de oferecer margem ao julgador para, no caso concreto, poder agir com razoabilidade, sopesando os interesses econômico- -financeiros da concessionária e os interesses da coletividade. 14. Cortar a energia de pessoas que estão em situação de miséria e pedem, apenas, que o débito seja parcelado de acordo com sua realidade, é afrontar, de uma só vez, a dignidade do ser humano e o interesse da coletividade, ferindo a Constituição Federal como também o próprio comando normativo da Lei n.º 8.987/95, quando interpretado sob a força normativa da Constituição. 15. Ou seja, se há aparente contradição entre a norma de ordem pública inscrita no Código de Defesa do Consumidor (quando determina a continuidade de serviço público essencial) e a Lei Federal 8.987/95 (quando permite a interrupção do serviço público por causa do inadimplemento), esta contradição é superada quando simplesmente observamos a inclusão, pelo legislador, de conceito indeterminado apto a per- mitir ao julgador, no caso concreto, sopesar interesses, tendo por norte a força normativa da constituição. 16. A Lei n.º 8.987/95 não determinou a legalidade da interrupção em todas as hipóteses de inadimplemento, mas apenas quando houver prévio aviso e o corte estiver atuando a favor do interesse da coletividade. 17. Percebe-se a preocupação do legislador em possibilitar o adimplemento de dívida por parte daquele devedor que a confessa e que tem interesse real em quitá-la. Se as condições de pagamento requeridas pelas autoras diferem das do Código de Processo Civil, nada mais adequado. De fato, aos desiguais, trata- mento também desigual, em nome da igualdade material. É que o CPC cuida de relação entre partes iguais; o caso aqui trazido trata de relação entre desiguais, sob o manto de proteção tanto pelo Código de Defesa do Consumidor como pelo Estatuto do Idoso. 18. A dignidade da pessoa humana, a essencialidade do serviço de abastecimento de água potável, os direito à saúde e à própria vida, as obrigações sociais das prestadoras de serviço público, bem como a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, do Estatuto do Idoso e da própria Constituição Federal de 1988, são argumentos inteiramente aptos a impor um parcelamento da dívida compatível com o princípio da dignidade da pessoa humana, como também a impedir a interrupção no fornecimento de água potável às recorridas. 19. Sentença mantida. Decisão: Acordam os componentes da Egrégia 3ª. Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em conhecer, mas NEGAR provimento à apelação e manter, pois, a sentença vergastada em todos os seus termos. (TJ-PI, 201000010063015, TERCEIRA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, EDVALDO PEREIRA DE MOU- RA, JULGAMENTO: 03/07/2013)

APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E