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2 A CIDADE DE SÃO CARLOS

2.3 Apontamentos sobre alguns bairros existentes em São Carlos

Os bolsões de pobreza de São Carlos estão localizados na área fronteiriça do perímetro urbano e são os possuidores dos maiores índices de vulnerabilidade social da cidade, isto é, uma região caracterizada pela baixa renda, altos índices de violência, desemprego e baixa escolaridade (CAMPOS et al., 2003).

Assim, de modo geral, nos bairros que compõem a periferia de São Carlos, como o Jardim Gonzaga, Vila Monte Carlo, Cidade Aracy I, II e III ou Antenor Garcia, Jardim Novo Horizonte e Jardim Maracanã, as distinções entre cada uma deles estabelecem-se em relação à maior ou menor pobreza. Em comum a todos, conforme já mencionado, encontram-se muito afastados da região central, o que dificulta a satisfação das reivindicações. Além disso, seus membros são, comumente, não só estigmatizados por morarem nesse território, mas também relacionados à periculosidade, entre outras características negativas (LAISNER, 1999; EVANGELISTA, 2009; SATO, 2006; CAMPOS et al., 2003).

Antes conhecida como favela do Gonzaga, o Jardim Gonzaga é uma favela que foi urbanizada recentemente. Em 1977, esse território consistia em um terreno público que fora ocupado por migrantes e moradores de fazendas próximas, os quais não possuíam condições financeiras para pagar os aluguéis de moradias. Inicialmente, as principais construções estabeleceram-se no chamado “buracão”, que é um local com três nascentes e onde são despejados esgotos de casas existentes nesse e de outros bairros (CAMPOS et al., 2003). Em 1990, a partir da mobilização de lideranças locais em prol de benfeitorias, efetivou-se a urbanização e a instalação de serviços básicos – asfalto, água, luz e esgoto – nessa região (LAISNER, 1999).

Em 2002, ocorreram outras transformações no bairro. A partir do “Projeto de urbanização integrado – Gonzaga e Monte Carlo”, apoiado não só pela Prefeitura Municipal, mas também pelo Programa Habitar Brasil do Banco Interamericano de Desenvolvimento (HBB), revitalizaram-se os lugares degradados social e economicamente. Dessa maneira, ações de infraestrutura foram realizadas, em especial aquelas relacionadas à drenagem, rede de água e esgoto, pavimentação, iluminação e contenção de encostas. Além disso, várias casas foram reestruturadas e, aquelas que existiam há mais de cinco anos, legalizadas. Na região, também foram construídos dois conjuntos habitacionais e uma Estação Comunitária (ECO), onde há uma quadra poliesportiva com cobertura, um mini-campo de futebol, um espaço de recreação infantil, uma sala multiuso, área de convivência e uma Unidade de Saúde da Família (USF) (SANTOS; GONÇALVES JUNIOR, 2008).

Ao lado do Jardim Gonzaga, há a Vila Monte Carlo. Trata-se de uma área pública também ocupada por seus habitantes e que, até 1999, não havia passado por um processo de urbanização. É uma área de risco, pois a vila se localiza em um barranco que, em época de chuva, pode vir a desabar (LAISNER, 1999). Nesse sentido, conforme o gestor 4, da Secretaria Municipal Especial de Infância e juventude, é “uma região em que está concentrado um grande bolsão de pobreza do município e onde a juventude está mais exposta às situações de vulnerabilidade, isto é, de drogadição, criminalidade”. Além disso, é uma região muito estigmatizada na cidade, o que dificulta o acesso a empregos nas áreas mais privilegiadas do município.

Por isso, em 2008, neste bairro e objetivando contemplar as demandas existentes em suas imediações (Jardim Gonzaga, Vila Conceição, Cruzeiro do Sul, Cidade Aracy e Pacaembu), estabeleceu-se o “Centro da Juventude Eliane Viviane” (CJ), também denominado de “chacrinha”, já que, em anos anteriores, era uma fazenda privada de recreio. É um espaço de 12.290 m2, arborizado, com horta comunitária, sala de vídeo, cozinha, refeitório, piscina, mini-campo de futebol e quadra poliesportiva (SANTOS; GONÇALVES JUNIOR, 2008).

Ainda na região sul de São Carlos, há a Cidade Aracy. Bem distante do centro urbano, é possível chegar até ela por três vias de acesso, sendo uma delas uma serra íngreme onde acontecem repetidamente muitos acidentes de trânsito. Ademais, é um território onde estão presentes a maioria dos migrantes que vêm ao município (LAISNER, 1999). De acordo com Evangelista (2009), um elevado número de nordestinos ingressou na cidade e passou a residir em tal localidade em decorrência da instalação de uma fábrica de motores transnacional.

Conforme Laisner (1999) e Evangelista (2009), não existem informações precisas acerca do surgimento do bairro, porém, sabe-se que, em 1980, criou-se um loteamento clandestino no local. Hoje, a Cidade Aracy consta como sendo a que mais se expandiu na periferia, de 2 casas em 1991 cresceu para 1200 em 1999, isto é, um aumento de 600 vezes. Em 2000, um dos principais loteadores responsáveis por essa explosão habitacional foi o vice prefeito da época, Airton Garcia, que não só incentivou a invasão de lotes por meio de propagandas, mas também doou outros, pois ele objetivava, em um primeiro momento, desenvolver a região e, a seguir, obter lucros com a comercialização de outros terrenos (DOZENA, 2008; LAISNER, 1999). Ressalta-se ainda que as terras negociadas ou presenteadas possuíam apenas meio lote de tamanho, o que corresponde a um espaço muito pequeno para construção de uma casa a ser ocupada por uma família (SATO, 2006).

Uma estratégia utilizada pelo loteador para valorizar ainda mais as terras consistia em fazer com que um terreno ficasse vago entre outros ocupados. Com isso, os serviços já instalados de água, luz, esgoto e asfalto poderiam já ser usufruídos pelos futuros proprietários de tais lotes ociosos. Por outro lado, muitas dessas terras têm sido alvo de queimadas pela população, pois diversas terras continuam não só baldias, mas também sendo habitat de animais peçonhentos (SATO, 2006).

Além disso, demais danos têm ocorrido nessa região de vulnerabilidade ambiental. A Cidade Aracy é uma área em que “seu solo é fundamentalmente arenoso e de grande permeabilidade, constituindo-se enquanto uma área de recarga do Aqüífero Guarani, maior manancial de água doce subterrânea transfronteiriço do mundo” (SATO, 2006, p.41-42). Assim, além das constantes queimadas, essa região tem sido agredida também pelas emissões de produtos químicos por empreendimentos industriais, escoamento de esgoto “in natura”, depósito de detritos da construção civil e de resíduos sólidos domiciliares, prática de pastagens irregulares, invasões ilegais, extração de madeira, mau cheiro de rios, erosões, desmatamento e assoreamento (SATO, 2006).

Outra dificuldade recorrente que aflige os moradores da Cidade Aracy é a precipitação atmosférica, que “excetuando sazonalmente, principalmente em épocas do ano específicas que coincidem com períodos eleitorais, o bairro tem de dar conta de resolver sozinho seus conflitos, seus problemas ligados à chuva” (EVANGELISTA, 2009, p.137). Salienta-se que os transtornos causados eram piores e foram amenizados com o asfaltamento das principais ruas, mas, ainda assim, as chuvas continuam sendo uma fonte de preocupação nos locais onde não se fez o necessário recapeamento, em especial no Antenor Garcia e Presidente Collor (EVANGELISTA, 2009).

Além da Cidade Aracy, e em oposição a ela, outro espaço alvo de especulação imobiliária está no centro da cidade. Nesta região, desde a década 1960, porém mais intensamente a partir de 1980, está ocorrendo um processo de verticalização não planejada, isto é, a construção de arranha-céus com mais de doze andares para fins comerciais e de serviços em detrimento de casas para moradia. Tais símbolos da modernidade, apesar de serem uma alternativa para ausência de espaços, constituem não só uma fonte significativa de lucratividade ao setor imobiliário, mas também implicam em diversas conseqüências negativas ao conjunto social (DOZENA, 2008).

Um dos principais efeitos desse processo de edificação é que, em virtude da saturação da capacidade de suporte das infra-estruturas já presentes, faz-se necessário o uso do dinheiro público no estabelecimento de novas infra-estruturas. “É a apropriação privada dos

investimentos públicos em infra-estrutura já levadas a efeito e socialmente pagos, sem nenhuma outorga onerosa relacionada à construção” (DOZENA, 2008, p. 85). Consequentemente, privilegiaram-se os especuladores imobiliários e as camadas médias e altas da sociedade, já que seus patrimônios valorizaram-se com o gasto público investido (DOZENA, 2008).

Deste modo, a especulação imobiliária e a predileção por medidas destinadas exclusivamente aos veículos, estão gerando problemas que podem ocorrer em curto e médio prazo, como os congestionamentos de veículos, lentidão nos deslocamentos, retenção de calor, impermeabilização de ruas, aumento da poluição sonora e a carência de infra-estrutura essencial, sobretudo de água e esgoto. De fato, conforme Dozena (2008), essa premissa tem se observado em São Carlos, em que, nos “horários de pico”, as avenidas e ruas centrais encontram-se congestionadas e, por conseguinte, mais propensas a ocorrência de acidentes de trânsito. “Assim, quanto mais à área se submete ao processo de verticalização, mais o sistema viário se torna congestionado” (DOZENA, 2008, p. 88).

Portanto, esta pesquisa está em uma cidade de discrepâncias entre a riqueza e a pobreza. Semelhantemente a outros municípios de porto médio do país, tal conjuntura ocasiona consequências na mortalidade dos jovens e nas políticas públicas adotadas em São Carlos, conforme será demonstrado nos capítulos a seguir.

3 AÇÃO PÚBLICA COM JOVENS: EXPERIÊNCIAS EM SÃO CARLOS

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