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compartilhamento de conteúdo. São eles: a plataforma do WhatsApp, os administradores dos

23 Disponível em: http://www.cultura.pe.gov.br/canal/literatura/a-sociedade-mudou-e-o-jornalismo-tambem-diz-sheila-borges/

24 O acrônico ANT se refere à formiga, animal ao qual Bruno Latour, em Reassembling the Social: An Introduction to Actor-Network-Theory (2005), compara o pesquisador, posto que ele, de maneira quase míope, rastreia as associações que compõem o social e a sociedade. Em português, tem sido empregado o acrônimo TAR para se referir à Teoria Ator-Rede – expressão comumente utilizada por trabalhos e pesquisas em Comunicação – ou Teoria do Ator-Rede – mais empregada em Antropologia (VENTURINI; MUNK; JACOMY, 2018). Neste trabalho, vamos utilizar a expressão Teoria Ator-Rede ou a sigla TAR.

25 O termo “actante” foi empregado pelo linguista francês Lucien Tesnière durante a primeira metade do século XX e retomado pelo linguista lituano Algirdas J. Greimas na segunda metade do mesmo século para se referir ao papel actancial de uma entidade no texto literário (VENTURINI; MUNK; JACOMY, 2018, p. 7). No capítulo em que trataremos sobre a metodologia, abordaremos com mais detalhes o termo e sua aplicação nesta tese.

grupos e os membros participantes. No que se refere aos membros participantes, registramos que esses atores fazem parte do processo de interação, e isso contribui na dinâmica de circulação de conteúdo. No entanto, a investigação não se deteve à análise de conteúdo da produção desses atores, uma vez que a pesquisa teve como foco o administrador do grupo.

A escolha da Teoria Ator-Rede (TAR) é relevante para analisar esses grupos, compreendendo que a TAR desafia as noções tradicionais das relações sociais entre humanos e não humanos, de modo que o processo relacional entre eles seja tangível (bens, materiais) ou intangível (ideias, valores). É uma abordagem interdisciplinar a partir de diferentes perspectivas, não apenas de um único objeto/múltiplas visões, mas sim múltiplas práticas de conhecimento que dão origem a múltiplos objetos (LAW, 2002, 2004; MOL, 2002;

LATOUR, 2012).

Latour (2012) ressalta que a TAR rompe com os modelos tradicionais de explicar o social, considerando a complexidade e heterogeneidade dos diferentes elementos que compõem uma rede, ou seja, humanos e não humanos, que ele chama de atores-actantes e que são tudo aquilo que gera uma ação e se presta como mediador de uma conexão. Desse modo, eles agem de forma coletiva. A principal ação de um mediador é traduzir, comunicar e fazer um novo link que não existia antes, capaz de promover transformações nos outros atores da rede (LATOUR, 2012; LEMOS, 2021; D’ANDRÉA, 2020).

É nos estudos em ciência e tecnologia26 que Latour e Callon (1981) e Callon (1999) se propuseram a analisar, numa perspectiva sociológica aplicada ao desenvolvimento científico e tecnológico, como se configuram as atividades comunicacionais e como elas ajudam a compreender as relações intrínsecas dos atores que desenham essas atividades. A Teoria Ator-Rede (TAR) está imbricada à Sociologia da Translação ou Tradução (CALLON, 1986;

LATOUR, 2012), que contesta as abordagens tradicionais da Sociologia27, por considerar que as ações que modificam ou transformam a sociedade estão associadas entre humanos e não-humanos.

26 Em inglês Science and Technology Studies (STS).

27 Alguns estudos sobre a sociologia clássica ver DURKHEIM, E. As Regras do Método Sociológico. Tradução de Margarida Garrido Esteves. In: DURKHEIM, E. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1983. ENGELS, F.; MARX, K. Manifesto comunista. Trad. Álvaro Pina. Introdução e organização de Oswaldo Coggiola. São Paulo: Boitempo, 2002. WEBER, M. A ética protestante e o espírito do capitalismo. Trad. José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

podem “autorizar, permitir, produzir, encorajar, consentir, sugerir, influenciar, bloquear, retribuir e proibir” (LATOUR, 2012, p. 72).

A escolha da TAR nos ajudou a compreender as relações híbridas e associativas dos actantes que formam esse mosaico sociotécnico (humano e não-humanos). É também um referencial teórico-metodológico promissor para ambientes controversos, nos quais se enquadram os grupos privados noticiosos de WhatsApp Tiro Certo e Pernambuco News, que articulam interesses e objetivos comunicacionais, compõem forças, compartilham códigos e estabelecem temporalidade para as ações.

Para indicar o produtor de conteúdo como designer de narrativa – no presente estudo, tratando-se dos administradores dos grupos Tiro Certo e Pernambuco News –, buscamos o aporte nos estudos de Vilém Flusser (2007), Donald Norman (2018), Bruno Latour (2014) e Paul Ricoeur (1994, 2000). O termo "design", para o filósofo Flusser (2007), tem uma perspectiva de esquematização, em que o ator "trama algo" e elabora caminhos de forma astuciosa para alcançar resultados. Essa "trama" se associa a quem produz o design, ou seja, quem organiza e desenha o modelo informativo. A esse ator, chamamos de designer. Flusser (2007, p. 182) afirma que esse designer é "um conspirador malicioso que se dedica a engendra armadilhas".

Norman (2018) colabora com o conceito de design a partir da usabilidade28, experimentada pelos actantes para atingir o objetivo comunicacional. Já Latour (2014, p. 6) defende que "sempre que você pensa em alguma coisa como objeto de design, você traz todas as ferramentas, habilidades e perícias da interpretação para a análise dessa coisa". No que se refere à "narrativa", registramos que ela se apresenta, neste trabalho, como objeto do design, numa abordagem interdisciplinar, o que nos desobriga a realizar uma técnica de classificação dos discursos sobre a construção textual ou mesmo sobre a linguagem verbal e não-verbal.

Desse modo, o que chamamos de o "designer de narrativa" é o agir do ator-actante na composição de elementos textuais e figurativos (humanos e não-humanos), elaborados, especificamente, para a plataforma WhatsApp. Essa dinâmica de produção é realizada pelo administrador dos grupos, a quem estamos chamando de designer de narrativa. No entanto, para contextualizar a expressão "narrativa", buscamos em Ricoeur (1987, 1994, 2000) uma reflexão sobre a comunicação experimentada dentro dos grupos.

Essa experimentação está vincula à ambiência digital, ao tempo da produção e à divulgação da narrativa. Para o filósofo, "o tempo torna-se tempo humano na medida em que

28 O termo será mais bem detalhado no capítulo sobre o designer de narrativa.

está articulado de modo narrativo; em compensação, a narrativa é significativa na medida em que esboça os traços da experiência temporal" (RICOEUR, 1994, p. 15). Ricoeur defende que só podemos reconhecer o processo temporal porque é narrado, e a narração é uma forma de estar no mundo e, assim, podermos entender esse mundo e suas complexidades.

Para o percurso metodológico, apoiamo-nos na Teoria Ator-Rede (LATOUR, 2012) e direcionamos a pesquisa a partir de uma abordagem mista, qualitativo-quantitativa, na qual descrevemos os processos sociotécnicos e as controvérsias (VENTURINI; JACOMY;

MUNK, 2018) envolvidas entre os administradores e membros dos grupos e a plataforma WhatsApp.

Por se tratar de um estudo experimental (FONSECA, 2002; GIL, 2007) e sem registro de pesquisa anterior, optamos por três procedimentos técnicos de investigação, usando a plataforma WhatsApp: 1) Prints (fotografias) de telas do celular/notebook dos grupos; 2) Rastreamento (web scraping) das postagens e datificação (método de armazenamento, estruturação, interpretação e significação dos dados) a partir da linguagem Python (ferramenta que tem seu código aberto, open-source, e que pode ser visualizada por qualquer pessoa), de modo que, a partir da classificação da orientação dos dados, realizamos uma Análise de Sentimento; e 3) Pesquisa mista, quali-quanti, através de um questionário aplicado na plataforma WhatsApp e enviado para os administradores dos grupos, e o consequente processo de organização dos dados.

Com esse conjunto de procedimentos, desenhamos o corpus da pesquisa. Contudo, não convém, nesse momento, entrar no desdobramento da coleta, uma vez que a análise será apresentada posteriormente.