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Esta subcategoria alude às vivências dos idosos em relação à aposentadoria, ou seja, na mudança de papel de trabalhador para o de aposentado. Tal mudança implicou numa mudança radical na vida dos mesmos, e na necessidade do cuidado para manter as amizades e atualizar-se no mundo, bem como as conseqüências da aposentadoria na vida das pessoas por meio da introspecção, a reclusão e a liberdade.

A aposentadoria, conforme Walsh (1995), representa um marco e um ajustamento significativo no ciclo de vida individual, bem como nas relações familiares, de modo que se configura como o inevitável processo de resignifcar a própria identidade. Assim, constituiu- se como um divisor de águas na vida das pessoas, como fica evidente no depoimento:

“Minha aposentadoria mudou a minha vida. Agora tudo é diferente, minha aposentadoria foi excelente porque eu fui cuidar dos filhos que estavam nascendo, eu tive filho com 44 e com 48 anos. Daí me aposentei quando nasceu a menina, ai aposentadoria foi muito boa porque daí eu pude vir para a casa, para criar as

crianças, educar. Agora, além da educação das crianças para mim, especialmente, com a aposentadoria eu tive tempo de fazer tricô, fazer tapeçaria, pintura e os diversos cursos que eu faço, nós somos voluntários da escola de pais do Brasil (...).

Atualmente faço crescimento pessoal na universidade e eu sempre participei de muita coisa, até hoje. Mas eu sou assim, eu faço bem uma coisa de cada vez” (Esposa Família Leal).

Constata-se que, além da mudança radical, há o sentimento de liberdade em relação às obrigações do mundo do trabalho e, principalmente, em relação ao tempo, pois conforme Zanelli e Silva (1996), o tempo para o trabalhador é cronometrado pelo trabalho. A possibilidade de se voltar para o lar e para as pessoas da família foi um ganho para a participante, que pôde, inclusive, dedicar-se à maternidade. Nesse sentido, houve pouca dificuldade em adaptar-se a mesma, pois o papel de mãe e dona-de-casa ainda se manteve.Porém cabe destacar que, a família é um caso atípico de ter filhos quando já se está em estágio tardio, inevitavelmente, nesse caso a aposentadoria passa a ter um outro sentido. Zanelli e Silva (1996) afirmam, ainda, que, com a aposentadoria a possibilidade de ter mais qualidade nas relações e o investimento em viagens e lazer são entremeados com o medo da morte.

Assim sendo, o desafio na vida de aposentado está em saber lidar com uma vida com menos obrigações formais, assim como redimensionar seu tempo de modo que o ócio não seja angustiante. Para enfrentar este novo cotidiano, um dos participantes aludiu ao planejamento de atividades diárias, estabelecendo metas:

“Ah traz muitas, a gente tem mais liberdade para passear, para viajar e eu, por exemplo, me dedico muito a fazer glossário de livros espíritas, eu faço muito isto, ai leio

muito. Eu também me dedico à escola de pais, tenho compromisso três vezes por semana

no centro espírita e ainda tenho a maçonaria, eu gosto de me dedicar para as minhas atividades, mas o que eu mais gosto de fazer é me dedicar ao meu glossário, depois quero te mostrar, eu às vezes não to enxergando bem, dói a vista, mas continuo faço cada dia um pouquinho” (Esposo Família Leal).

Neste participante se averiguou que a perda do status de trabalhador produtivo não trouxe grandes problemas para sua auto-estima. Segundo Cerveny et al. (1997), nesse caso houve a apropriação do tempo livre como um tempo pessoal a ponto de, inclusive, manter seus objetivos ainda em meio às incapacidades físicas. Além disso, como afirmam Zanelli e Silva (1996), se há uma diminuição das capacidades físicas, o idoso deve procurar estratégias de manutenção da saúde e das possibilidades de desempenho de atividades, como no exemplo anterior.

É interessante pontuar que o termo aposentar pode ser interpretado como se recolher aos aposentos, ou seja, manter-se recluso em seu lar e excluído do convívio social, conforme o colocado por Zanelli e Silva (1996), que pode ser observado no depoimento que se segue:

“Acho que a gente se aposenta, fica velho e tem que ficar em casa” (Esposo Família Souza).

Esse depoimento traz à tona a confusão de que aposentadoria é sinônimo de envelhecimento, aspecto esse que ainda persiste mesmo com o número crescente de aposentados jovens, pois como se observa no relato anterior, há a concepção de que um é uma conseqüência do outro.

O rompimento com as relações de trabalho, associados ao surgimento de sentimentos de inutilidade e da perda de posição e de amigos, constituem desafios no sentido de buscar novas formas de viver para manter hábitos do tempo em que se trabalhava, tal qual fica evidenciado no exemplo que se segue:

“Porque eu acredito que você se aposentando tem que sair, a gente não deve envelhecer trancado, fechado, mas se comunicando, passeando, rindo, mantendo

as amizades porque se você se tranca você se estaciona e você não pode estacionar porque o mundo vai para frente”.( Esposo Família Fernandes)

Assim, percebe-se que se, por um lado o mundo do trabalho mantém as pessoas conectadas em seus contextos sócio-culturais, proporcionando-lhes socialização e desenvolvendo a identidade pessoal, como Zanelli e Silva (1996) apontam, por outro lado, a quebra com essa realidade repercute em todas as esferas na vida do aposentado, sobretudo, em reavaliar sua identidade, num estágio da vida em que muitos já estão muito próximos do fim, dificultando ainda mais este processo. Nos depoimentos em continuação pode-se observar isso:

“É o tempo, como a gente diz a gente vai adquirindo uma certa experiência né? A gente fica mais voltado para a gente, para dentro da gente (..)” (Esposo Família Gomes)

“A atuação de hoje é mais dentro de casa, no meu tempo de serviço a gente vivia

na rua” (Esposo família Pereira).

Nota-se que o impacto da aposentadoria, nos participantes da pesquisa, deu-se por meio de um movimento de reclusão, seja interior ou para os espaço da casa. Além disso, embora tenha se manifestado de maneira diferente entre as pessoas, é indiscutível sua força e peso no ciclo vital tanto individual quanto familiar.

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