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CAPÍTULO I: NO CASULO HÁ VIDA

1.2 Aprendendo a perguntar

O Professor Mario Cortella foi nosso primeiro docente

quando iniciei o Mestrado.3 Suas aulas revelavam uma memória

esplendorosa ao trazer-nos os fatos e considerações sobre a disciplina de História da Educação Brasileira. Ele sempre utilizava uma estratégia que chamava minha atenção: solicitava- nos que, durante a semana, além dos textos indicados, procurássemos novas experiências para os nossos sentidos, fossem elas na audição, ao ouvir uma nova música, um novo ritmo, fosse por meio da gustação, ao provarmos um novo sabor, fosse na visão, ao conhecermos um novo lugar... Naquele semestre presenteei o professor com livros que já havia publicado. Ele os recebeu com alegria. Duas semanas depois, disse-me na aula que, por coincidência, a Cortez Editora o convidara para escrever um livro de filosofia destinado ao público infantojuvenil e perguntou a mim se eu não gostaria de escrever com ele. Fiquei muito entusiasmada e alegre com a proposta, aceitando-a prontamente. Ao sair da sala, pensei com certo receio que talvez não soubesse escrever sobre o tema e que não estaria a altura daquele excepcional professor. Mas, ao andar pelos corredores da

PUC, veio-me repentinamente uma ideia: “O que é a pergunta?”.

Seria a história de um menino e um filósofo. Voltei e contei-lhe a ideia. Ele aprovou imediatamente. O semestre terminou e quase não vi o professor. Mas, o filósofo e escritor elaborou comigo, por e-mail, a obra O que é a pergunta?.

Fui apresentada ao editor da Cortez. Ali começaria uma longa jornada de amor, parceria e compromisso com essa Editora.

3 Mestrado em Educação: Currículo, PUCSP, 2008-2010.

Era uma vez um menino. Era uma vez um filósofo. Os dois estavam numa escola. O filósofo matando saudade de seu tempo de professor, e o menino vivendo seu tempo de aluno.

O menino viu o filósofo e foi até ele.

- Moço, posso te fazer uma pergunta?

- E o que é uma pergunta? - Puxa, nunca pensei em perguntar-me o que é uma pergunta, mas vou tentar responder (o menino nunca deixava uma pergunta sem resposta). Acho que é quando quero entender algo que não entendo nada. Isso é curiosidade.

- Parece-me que você gosta de dialogar – disse o filósofo.

- Dialogar, o que é isso? (...) - Quando surgiu a pergunta? – indagou o menino. O filósofo pensou que não era sempre que encontrava meninos interessados. - Ela surgiu quando nós, humanos e humanas, passamos a prestar atenção nas coisas, querendo conhecê-las. Ela não se faz só com palavras: quando estico o ouvido para perceber um som, é a pergunta da audição, quando quero captar um aroma, é o olfato a perguntar. Quando dirijo meu olhar para enxergar é a pergunta dos meus olhos: Como será? (CORTELLA & CASADEI, O que é a pergunta? 2008).

Figura 10: Capa do livro O que é a Pergunta?

Minha vida literária começara definitivamente a ser disseminada. O livro O que é a pergunta? teve várias edições e desdobrou-se na coleção tá sabendo?.

A história de uma longa amizade apresentada na coleção tá sabendo?, estabelecida pelo aluno João Augusto da Escola Cecília Meireles e pelo filósofo Joaquim, a qual começara na elaboração da obra O que é a pergunta, abriu outras portas para novos colegas e professores amigos do Joaquim que participam de encontros intitulados Roda de Conversa, em que a idade não é empecilho para o aprendizado. Jovens eram levados a um delicioso passeio, página a página, para descobrirem paisagens repletas de possibilidades para a melhoria de cada um de nós. Nos textos, histórias de vida, ações bem-sucedidas, revelação de talentos são cuidadosamente entrelaçadas para serem colocadas a serviço do bem e da coletividade. Experiências e projetos podem ser disseminados e exemplificados para as crianças e jovens de modo leve e amigo.

Novos parceiros escreveram comigo outros livros da coleção, sempre sob o olhar generoso do filósofo Joaquim (personagem vivido por Mario Sergio Cortella):

 Dra. Lilian Maria Lisboa, professora e autora de livros didáticos, que comigo escreveu o livro Qual a História da História, que objetivou apresentar os principais fatos da história do mundo, colocar em debate o fato de que algumas partes da história são reconhecidas, outras nunca contadas, além de buscar conscientizar os jovens leitores de que todos somos parte da história, que nossas faces são documentos que representam a conjunção das faces dos nossos antepassados.

 Luis Henrique Beust, consultor do MEC e da ONU em Ética e Direitos Humanos, foi parceiro no livro Como se constrói a paz?, que objetivou apresentar às crianças e jovens várias iniciativas sobre paz, trazendo a tradução de uma correspondência entre Einstein e Freud sobre o tema jovem leitor é levado a um maravilhoso e, muitas vezes, triste passeio pelas questões da guerra e da paz, além de conhecer contribuições da ciência, da música, da religião, do cinema, da literatura, das artes para a convivência pacífica. O livro O que é a Pergunta? também inspirou a Exposição Por quê? Porque... Os porquês..., no SESC Osasco, com a indicação de Cortella para eu ser a Curadora de Conteúdo, devido à proximidade com a obra. A experiência de ver concretamente uma exposição, a partir de um livro que se escreveu em parceria, foi de um valor emocional, mental, inestimável. A exposição trouxe para o mundo concreto das crianças aquilo que está no livro, que percorre seus imaginários:

O ser humano é o único ser vivo que inventa e cria coisas diferentes. É o único que consegue dizer o que sente falando, escrevendo, ou fazendo gestos. É o único que sorri, chora, lembra do passado, imagina, cultiva amigos, se reúne em família, trabalha, estuda e pensa sem parar! Mas, se um cientista for abrir o cérebro de um ser humano para tentar descobrir tudo o que ele pensa, o que será que vai encontrar? Nada, além de uma massa cinzenta, parecida com miolo de uma noz, formada por milhares de neurônios interligados. Onde ficam as ideias? (CORTELLA; CASADEI – Painel de Abertura na Exposição: Por quê? Porque... Os porquês - SESC Osasco. SP: 2013.)

De alguma maneira, o velho foi revisitado ao se tornar uma exposição, cinco anos depois. O velho renascia de um jeito novo, com outro olhar, com novas reflexões. O singular da teoria se expandia para o plural de tantas novas possibilidades. E, ao defender a ideia já trazida por tantos pesquisadores sobre as histórias de vida nas pesquisas acadêmicas, reflito sobre o texto acima, em que tantos filósofos já indagaram sobre a magnitude da vida em forma de múltiplos questionamentos.

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