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Aprendizagem da docência e os Ciclos da vida profissional dos

Como já mencionamos, a compreensão sobre o processo formativo do professor implica e reflexão sobre a aprendizagem da docência. Na docência, por sua vez, está implicada a mobilização de uma série de saberes/ fazeres que incidem sobre a ação de ensinar, pois como bem cita Tardif (2002) o professor é alguém que sabe alguma coisa e sua função consiste em elaborar espaços para que outros (seus alunos) se apropriem destes saberes. Nesta direção podemos indicar a ação de ensinar como o foco da aprendizagem docente.

No entanto, cabe salientar as palavras de Garcia (1999) ao indicar que ensinar é algo que qualquer um faz em qualquer momento, porém, isto não é o mesmo que ser professor. Este autor explicita a existência de preocupações mais vastas que contribuem para configurar o papel do professor, pois ser professor implica lidar com outras pessoas (professores) que trabalham em organizações (escolas) com outras pessoas (alunos) pra conseguir que estas aprendem algo.

Desta forma, Garcia (1999) distingue quatro fases no aprender a ensinar: fase pré-treino, fase da formação inicial, fase da iniciação e fase da formação permanente.

Com relação à fase pré-treino este autor refere-se às experiências do futuro professor como aluno em seus processos de escolarização, as quais podem muitas vezes ser assumidas de forma acrítica e influenciar de um modo inconsciente o professor.

Com relação a este aspecto Pereira (2005) indica que mesmo antes da sua escolha ou do exercício da docência, o futuro professor já conviveu aproximadamente 12.000 horas com “o professor” durante o seu percurso escolar, experiências estas e que certamente possuem uma grande influência na construção de modelos e concepções do que seja “o professor”, “a aula”, ou do que seja “ensinar”.

Corrobora com esta visão Oliveira (2005) ao indicar que há imagens (representações) construídas pelos professores ao longo de suas trajetórias de vida que interferem e produzem um tipo de professor e não outro. Essas significações sobre a docência e sobre o professor são construídas desde o momento o sujeito adentra num espaço de sala de aula e mesmo antes de entrar nela. Temos uma

representação do que seja um professor uma aula, uma avaliação, uma escola, enfim, estas imagens se configuram em saberes construídos ao longo de nossas trajetórias de vida.

No que se refere à segunda etapa, a fase da formação inicial é indicada como o período de preparação formal numa instituição especifica, na qual o futuro professor adquire conhecimentos pedagógicos e de disciplinas acadêmicas, assim como realiza as práticas de ensino (Garcia, 1999, p. 25).

No que tange à terceira etapa explicita-a como sendo a fase de iniciação da docência, correspondendo aos primeiros anos de exercício profissional do professor, durante os quais os professores aprendem na prática, em geral através de estratégias de sobrevivência.

Segundo Huberman (1992), esta fase de iniciação (1º a 3º ano de carreira) é descrita como um estágio de sobrevivência e de descoberta. Diz-se sobrevivência, pois nele o professor iniciante confronta-se com a distância entre os ideais e as realidades cotidianas, caracterizando o que comumente é denominado “choque do real”. Um período caracterizado pelo tateamento, pela insegurança do agir docente. Com relação ao aspecto da descoberta, refere-se ao entusiasmo inicial, a experimentação, a exaltação por estar, finalmente, em situação de responsabilidade. Este autor indica que estes dois aspectos, o da sobrevivência e o da descoberta, são vividos paralelamente e é o segundo aspecto que permite suportar o primeiro. Entretanto, menciona a existência de perfis com um só destes componentes impondo-se como dominante, indicando como característica principal desta fase a exploração, a qual pode assumir um caráter sistemático ou aleatório, fácil ou problemático de acordo com as condições do contexto institucional da iniciação do professor, como também de sua postura pessoal e profissional perante a docência.

No que tange a quarta fase na perspectiva apontada por Feiman (apud Garcia 1999) esta se refere à fase de formação permanente a qual inclui todas as atividades planificadas pelas instituições ou até pelos próprios professores de modo a permitir o desenvolvimento profissional e aperfeiçoamento do seu ensino.

Aproximando esta categorização aos estudos de Huberman (1992) podemos indicar que nesta fase se dá o período da estabilização, da diversificação finalizando com o desinvestimento (sereno ou amargo).

Na perspectiva apontada por este autor, o período da estabilização (4º ao 6º ano de carreira) caracteriza-se pelo comprometimento definitivo, da tomada de

responsabilidade, sendo este período de fundamental importância, pois ele constitui- se numa etapa decisiva no desenvolvimento e contribuição da afirmação do eu profissional. Nesta etapa as pessoas passam a ser professores, aos seus olhos e aos olhos dos outros. Este processo de estabilização implica uma escolha e, por sua vez, também em uma renúncia, pois escolher significa eliminar outras possibilidades.

Com relação ao ensino esta fase caracteriza-se com a acentuação do grau de liberdade e de emancipação acompanhado de um sentimento de competência pedagógica crescente.

No que tange ao período da diversificação (7º ao 25º ano de carreira) Huberman (1992) indica que os percursos individuais parecem divergir mais a partir da fase da estabilização, no entanto menciona a recorrência de posturas de experimentação e de diversificação, uma vez que durante esta fase, manifestam-se a busca dos professores por novos estímulos, novas idéias e novos compromissos. Essa busca por novos desafios responderia a um receio emergente de cair na rotina, surgindo da necessidade e do desejo de manter o entusiasmo pela profissão. Este processo tanto pode surgir da monotonia da vida cotidiana, ou do desencanto, subseqüente aos fracassos das experiências na sua profissão.

Desta forma, é possível indicar que esta fase caracteriza-se pelo movimento de reflexão entre o que se almejava realizar o que vem sendo realizado, ou seja, um balanço de sua vida. Entretanto, este autor enfatiza que não há nenhuma indicação na literatura empírica no sentido de provar que a maioria dos professores passa por uma fase assim, até por que os parâmetros sociais como características da instituição, o contexto político ou econômico, os acontecimentos da vida familiar são igualmente determinantes, impossibilitando uma visão generalista de tais questões.

Finalmente, o período da serenidade e do desinvestimento sereno ou amargo (25º a 35º anos de carreira). Esta fase é caracterizada, segundo Huberman (1992), pelo afastamento e desinvestimento na profissão docente, no qual ocorre a diminuição da ambição e, conseqüentemente, o investimento, enquanto que a confiança e a serenidade aumentam. Neste movimento a exigência do professor com relação a sua postura passa a ser mais amena, pois nada mais tem a provar, aos outros e a si próprio, reduzindo a distância que separa os objetivos do início da carreira daquilo que foi possível conseguir até o momento, apresentando em termos mais modestos as metas a alcançar em anos futuros. Com relação ao desinvestimento amargo este afastamento é marcado pelo sentimento de frustração

e de lamentação, no qual o desinvestimento é justificado a partir de queixas sobre o comportamento dos alunos, das condições da instituição, dos colegas passando a tomar uma atitude nostálgica do passado. Esta postura pode ser entendida a partir da contradição estabelecida entre o eu idealizado e eu real, ou seja, o professor ao perceber a distância de seus propósitos iniciais com os atingidos em sua atuação aciona mecanismos de defesa que negam a problemática vivida e a ansiedade dela decorrente levando-o ao desinvestimento na carreira docente.

Assim, tendo em vista tais premissas é possível afirmar que a compreensão sobre os movimentos construtivos necessita levar em conta os processos de avanços e recuos que se dá no decorrer da carreira docente, exigindo a consideração de como foram /são percebidas por estes.

Gostaríamos ainda de salientar que as fases descritas por Huberman (1992) não são seqüências vividas sempre na mesma ordem e tampouco com o mesmo tempo de duração. Elas tanto podem acontecer para alguns, deixando de acontecer para outros, pois “há pessoas que desestabilizam cedo outras que o fazem mais tarde, outras que não o fazem nunca (...) o fato de encontrarmos seqüências–tipo não impede que muitas pessoas nunca deixem de praticar a exploração, ou que nunca estabilizem” (p. 37-38).

Nesta perspectiva concordamos com Isaia (2005) ao afirmar que o percurso docente necessita ser compreendido a partir do entrelaçamento entre as fases da vida e da profissão, envolvendo momentos de crises, recuos, avanços, descontinuidades e relativa estabilidade. Assim, eventos como, escolarização inicial, formação acadêmica, trajetórias institucionais e pessoais, envolvem não só desafios, crises e transtornos, como também geram uma combinação de necessidade e expectativas sociais que necessitam serem levados em conta na compreensão sobre o agir/pensar/sentir docente. O professor e a pessoa que ele é não podem ser dissociados, sob pena de se fragmentar a compreensão que dele se possa ter.

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