• Nenhum resultado encontrado

Aprendizagem versus Comportamento

PARTE I – ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL

4 PROMOÇÃO E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE

2. Aprendizagem versus Comportamento

A aprendizagem difere do comportamento porque, enquanto a primeira diz respeito á aquisição de conhecimento, o segundo refere-se á evidência ou á demonstração observável desse conhecimento. Podem existir fatores (internos ou externos) que nos impelem a não agir da forma que sabemos.

A observação é essencial nesta teoria e Bandura defende que, na aprendizagem por observação, concorrem quatro elementos fundamentais: a atenção, a retenção, a reprodução e a motivação ou o interesse.

 Atenção

Não prestamos atenção a tudo, selecionamos os modelos a que prestamos atenção, de acordo com a idade e o sexo. É mais frequente a imitação de modelos do mesmo sexo e de idades mais próximas de cada indivíduo. Os modelos que apresentam estatuto social mais prestigiado são os mais frequentemente escolhidos para imitação. Por outro lado, a aprendizagem por observação será tanto mais eficaz quanto mais atento o observador estiver ao comportamento apresentado.

A informação proveniente da observação será codificada, traduzida e armazenada no nosso cérebro, de acordo com uma organização por padrões, em forma de imagens e de construções verbais. Os observadores que transformam a atividade observada em códigos verbais, ou imagens, aprendem ou retêm a informação muito melhor do que aqueles que se limitam a observar.

 Reprodução

A reprodução consiste na tradução das conceções simbólicas do comportamento, armazenado na memória, em ações correspondentes.

 Motivação/Interesses

A aprendizagem é diferente da execução de um comportamento. Para que um determinado comportamento aprendido seja executado, o individuo deve estar motivado para o fazer, o que pode ser alcançado através de incentivos.

Segundo o autor, a aprendizagem ocorre, então, em duas fases: 1) a fase da aquisição do comportamento, norteada pela atenção e retenção; 2) a fase de execução do comportamento, determinada por dois fatores, a motivação e o reforço.

Nesta linha de pensamento, Bandura defende que as consequências ditam em grande medida, o nosso comportamento. Só reproduzimos um comportamento se julgarmos que existe algum tipo de benefício, isto é, se estivermos motivados.

Logo no que se refere à segunda fase, Bandura defende que, se alguém estiver motivado para aprender um determinado comportamento, então esse comportamento será aprendido por observações claras. A motivação é entendida como a necessidade ou o desejo de que leva a um determinado tipo de comportamento e encaminha para um objetivo. Perante o exposto, enumera como tipos de motivação:

- Reforço direto: o observador recebe estímulos ao reproduzir o que observou;

- Reforço indireto ou vicariante: em que o reforço é recebido pelo modelo. Observar os resultados obtidos pelo comportamento de outra pessoa pode modificar o nosso próprio comportamento.

- Auto – Reforço: o individuo controla os seus próprios reforços, comparando o seu comportamento com padrões internos. Se tal comportamento estiver contra os seus padrões pode haver sentimento de culpa ou insatisfação, enquanto o comportamento á altura de tais padrões o deixa satisfeito e/ou orgulhoso.

As consequências são determinantes para o comportamento. Ações que geram boas consequências tendem a ser mantidas, enquanto as que geram consequências negativas tendem a ser inutilizadas.

Das teorias de Bandura, surge outro fator de relevo na forma como o individuo aprende, a autoeficácia. Isto é, “a perceção do indivíduo a respeito das suas capacidades no exercício de determinada atividade” (Bandura, 1986 citado por Carvalho, 2013).

A autoeficácia envolve a crença de que com empenho podemos administrar acontecimentos gerando o efeito desejado. Ela refere-se às crenças que o individuo possui sobre o seu valor e as suas potencialidades, refere-se à autoestima, em crer nas próprias habilidades. Não se trata de possuir certas capacidades, mas sim de acreditar que as tem, ou que pode adquiri-las por meio de esforço pessoal.

A este respeito, Bandura assegura que a crença no nível de autoeficácia ajuda a determinar quanto esforço as pessoas vão dedicar a uma atividade, quanto tempo elas persistirão ao se defrontarem com obstáculos e o quão resilientes serão perante situações adversas. Quanto maior a autoeficácia do individuo maior será o controlo sobre a sua vida e, consequentemente, maior será a capacidade de utilizar as suas competências para a resolução de problemas, de ser pró-ativo, de ser ator da sua própria vida.

Sendo o conceito de autoeficácia um conceito fundamental nesta teoria, é importante conhecer as três estratégias que permitem incrementa-la:

“Estabelecer objetivos pequenos e progressivos;

Aquisição comportamental: utilizando um processo formalizado para estabelecer metas e recompensas específicas (reforço);

Instrução e reforço: o feedback da autoinstrução ou manutenção de registos podem reduzir a ansiedade sobre a capacidade do doente realizar uma mudança de comportamento, aumentando assim a autoeficácia” (Glanz, 1999).

4.4.1 - A Teoria Sócio-Cognitiva e a Educação para a Saúde na Adolescência

O enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública precisa compreender que para que os adolescentes efetuem uma mudança positiva nos seus comportamentos de saúde, necessitam não só de estar informados sobre as razões e os fatores de risco da emissão de comportamentos indesejáveis, como de competências, recursos e apoio social para realizarem essa mudança de forma efetiva. A autorregulação de comportamentos de saúde requer certas competências de tomada de decisão, auto-motivação e auto-orientação

(Bandura, 1981 citado por Veloso, 2005). Por outro lado, existe ainda uma diferença entre possuir as competências necessárias para regular os comportamentos de saúde, e ser capaz de aplicar essas competências eficaz e consistentemente nos diversos contextos da vida, onde se encontram inúmeros obstáculos que dificultam a adoção de comportamentos positivos. Neste contexto, para que o adolescente use as suas competências autorreguladoras com sucesso, ele tem que ter uma forte crença na sua eficácia (autoeficácia).

Constatamos assim que, quer os comportamentos prejudiciais quer os preventivos para a saúde são socialmente aprendidos, propositados, e que o comportamento funcional resulta da interação entre fatores sócio-ambientais e pessoais. Assim, “comportamentos como atividade física, ver televisão, jogar jogos de vídeo, são aprendidos através de processos de modelamento e reforço que são mediados por fatores pessoais, tais como as cognições, atitudes e crenças” (DuRant & Hergenroeder, 1994 citado por Veloso, 2005).

De acordo com Bandura, para se reduzir o risco de adoção de comportamentos prejudiciais à saúde e aumentar a probabilidade de adesão a comportamentos saudáveis (como por exemplo: atividade física), existem quatro fatores que, provavelmente, podem alterar cada um dos três determinantes referidos atrás:

1º) “Aumentar a atenção e o conhecimento sobre a saúde, riscos e benefícios sociais inerentes à adoção de comportamentos particulares;

2º) Melhorar as competências sociais e autorreguladoras que os adolescentes possuem, necessárias à implementação de ações de prevenção efetivas;

3º) A quantidade de situações formais e informais nos gabinetes dos médicos, nas escolas, nos grupos religiosos, nos grupos de pares, na comunidade que providenciam oportunidades que permitem aumentar as competências e construir uma autoeficácia resiliente – guiar a prática e fornecer feedback corretivo – e aplicar essas competências a situações com barreiras à prática de comportamentos saudáveis;

4º) A quantidade de apoio social que previne a adoção de comportamentos prejudiciais à saúde, que promove os comportamentos der saúde preventivos e que está disponível aos adolescentes” (DuRant & Hergenroeder, 1994 citado por Veloso, 2005).

Verificamos que, na realidade, nem sempre estes quatro fatores estão disponíveis para os adolescentes, principalmente para aqueles que partilham ambientes sociais de risco eminente. Neste contexto, e com base na literatura, procuramos de seguida descrever algumas estratégias de intervenção que pretendem justamente desenvolver esses quatro fatores promotores da mudança, e que são suscetíveis de aplicação pelo enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública.

Com o desígnio de melhorar o primeiro ponto, é importante começar por proporcionar informação, analisar formas de desencadear ações e formular objetivos. As estratégias de promoção da saúde mais eficazes nos jovens são as que procuram desenvolver neles a

convicção de que têm a capacidade para modificar o comportamento ou hábito de saúde, e as que ensinam formas práticas de conseguir essas mudanças.

Somos remetidos para a noção de perceção de autoeficácia, que à luz da teoria de Bandura consiste na crença, por parte do adolescente, de que é capaz de exercer controlo sobre a sua motivação, o seu comportamento e o ambiente social. Vários estudos apontam que a perceção de autoeficácia dos adolescentes referente ao comportamento de saúde é o preditor mais importante do nível de resposta às mensagens de saúde. Esta convicção influencia a direção, intensidade de esforço e persistência que o adolescente dedica a um comportamento face às dificuldades e, influencia também, o padrão de pensamento que poderá ser auto- depreciativo ou auto-encorajador. Em suma, se os adolescentes acreditarem que não têm controlo suficiente sobre o seu próprio comportamento, ou sobre os comportamentos ou influência social dos outros, então eles anteverão poucas razões para tentar mudar o seu comportamento.

Neste encadeamento, é fundamental que a informação proporcionada pelo enfermeiro aos adolescentes não os atemorize quanto ao comportamento de saúde, mas sim lhes propicie informação factual sobre o comportamento, isto é, os benefícios e perdas associados aos diversos comportamentos de saúde positivos e negativos, e as “dicas” essenciais para que exercitem controlo sobre os seus hábitos de saúde.

É importante que os adolescentes compreendam que uma mudança bem sucedida só acontece quando se efetuam novos esforços seguidos de várias tentativas falhadas, e que por isso a perseverança é fundamental para que a perceção de eficácia do adolescente não diminua, quando confrontado com alguns obstáculos. Cabe ao enfermeiro reforçar a mensagem sobre a saúde nas sucessivas sessões com os adolescentes.

Em relação ao segundo fator, para se poder intervir a este nível, é essencial ensinar competências e estratégias para começar a mudança. As competências a desenvolver devem ser próprias para o tipo de comportamento de saúde a alterar, e também para o ambiente social em que o adolescente vive.

Segundo Veloso (2005), “se o componente de modelamento de um programa de educação para a saúde for conduzido por alguém com quem o adolescente se possa identificar étnica ou culturalmente será mais provável que venha a adquirir o conhecimento, competências e perceção de autoeficácia necessários para mudar o seu comportamento”.

Para corresponder adequadamente a esta necessidade, com vista a aumentar a sua eficácia, o enfermeiro poderá recorrer a vídeos educativos com atores adolescentes para promover o comportamento de saúde em causa.

Por forma a dar resposta ao terceiro fator, deve-se direcionar os adolescentes para as oportunidades que possam encontrar e proporcionar feedback relativamente ao comportamento que conseguem desenvolver. Se for o caso, numa fase inicial pode dar-se oportunidade de praticar as competências em situações fictícias onde o adolescente não terá receio de cometer erros ou parecer inadequado. Neste contexto, “o role-playing é uma estratégia útil, através da qual o adolescente pratica a forma como pode lidar com o tipo de situações que tem de enfrentar no seu ambiente social real” (Veloso, 2005). É importante que o enfermeiro vá continuamente dando feedback corretivo, eventualmente, até que o adolescente desempenhe as competências de uma forma consistente e espontânea. Numa fase posterior, e se for o caso de o adolescente colocar em pratica as competências em situações reais, então é importante que o processo seja acompanhado por feedback e reforço; e ainda, é importante que se reforcem as competências de autoeficácia aprendidas, para que ele consiga realizar o comportamento de saúde em qualquer situação, principalmente em situações de maior risco.

Por último, deve-se encaminhar os adolescentes para formarem as suas próprias redes de suporte. Neste sentido, é importante manter presente que qualquer mudança nos comportamentos de saúde acontece no âmbito de redes de influência social e que a natureza dessas redes pode ajudar, protelar ou limitar os esforços de mudança dos jovens (Bandura, 1986, Veloso, 2005). O enfermeiro precisa de formas práticas de ajudar o adolescente a cortar a ligação com as redes sociais que não promovem a modificação, e a desenvolver fortes envolvimentos com redes de apoio à mudança positiva.

Documentos relacionados