• Nenhum resultado encontrado

5.2 Caso Watusi

5.2.1 Apresentação de Watusi

Watusi será chamado desse modo, pois, quando solicitei que escolhesse um nome fictício para ser usado nesta tese, expliquei que a outra participante havia escolhido o nome de um personagem, então, ele resolveu escolher um personagem também. Contudo, não se trata de um personagem qualquer. Watusi é o personagem principal de uma história criada pelo participante, que se tornou um livro, ilustrado por um amigo, a espera de publicação. O livro conta a história do povo negro a partir dos movimentos da capoeira, tratando-se, assim, de uma metodologia para ensinar capoeira e história. Watusi já levou essa vivência a inúmeras cidades e instituições (escolas, universidades, organizações da sociedade civil, entre outras).

Em Iorubá, Watusi significa “gigante africano”. O participante é um homem negro de 40 anos de idade, uma pessoa simples, muito carismática e falante. Seu sorriso se destaca. Profissionalmente, é muito provável que seja consenso entre colegas, educandas(os) e famílias, que uma de suas principais características é a humildade. Natural de Cachoeira do Sul, município localizado a cerca de 200 km da capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Watusi nasceu em 1979. De família pobre da região, o caçula de 7 irmãos, dos quais apenas 5 estão vivos, enfrentou uma série de dificuldades financeiras, as quais impactaram, inclusive, a capacidade de alimentação da família e também o processo de escolarização e inserção no mundo do trabalho, assim como ocorre com grande parte das famílias mais pobres do país. Seu pai trabalhava nas lavouras de arroz no interior de Cachoeira do Sul; adoeceu em virtude do uso de agrotóxicos e por recomendação médica teve de abandonar a atividade. Algum tempo depois, pouco antes de falecer, conseguiu um trabalho de zelador de uma praça em Cachoeira do Sul. Foi levando comida para o pai na praça que Watusi conheceu a capoeira. Um grupo de meninos se reunia no local para, entre outras coisas, jogar capoeira; Watusi aproveitava que ia levar a comida do pai e observava atento o jogo, e, com o tempo, começou a participar e a aprender capoeira.

Porém, em seguida seu pai falecera e as condições financeiras da família pioraram. Nessa época, as duas irmãs mais velhas tinham ido morar em Porto Alegre, em busca de melhores condições de vida, haja vista que era bastante difícil ter emprego na cidade em que viviam. Cerca de um ano depois, um dos irmãos mais velhos de Watusi descobriu que tinha câncer e foi transferido para fazer o tratamento em um hospital da capital. Watusi e a mãe acompanhavam o irmão nas quimioterapias e ficavam na casa de uma das irmãs e foi então que

ele acaba ficando na casa da irmã para morar, ajudando com a sobrinha que era pequena e cuidando da casa, enquanto a irmã e seu esposo trabalhavam.

Com desejo de continuar jogando capoeira, Watusi descobriu um centro comunitário na Zona Norte de Porto Alegre, perto da casa da irmã, no qual havia um professor de capoeira. Um jovem, formado em Educação Física, com formação em Educação Popular, muito organizado e sistemático, nas palavras de Watusi, era quem dava as aulas de capoeira nesse centro e em vários outros centros da cidade. De acordo com Watusi, esse professor tornou-se um grande incentivador para que ele e suas(seus) colegas conhecessem autoras(es) negras(os) e contassem a história do seu povo. Ele ressalta que vivia a cultura africana desde pequeno, cresceu ouvindo as histórias do seu povo, participando de rituais da religião africana, os quais eram frequentados por sua mãe, mas que o professor de capoeira foi o primeiro a apresentar-lhe a história do povo africano de forma mais intelectualizada, a partir de outras(os) autoras(es) negras(os), pessoas que buscavam de alguma forma disseminar a história do seu povo.

No ano de 1996, Watusi retornou para a cidade de Cachoeira do Sul, onde iniciou um projeto no qual ensinava capoeira para as crianças da comunidade na qual residia. Em 1997, iniciou um trabalho com aulas de capoeira em uma escola, no contraturno escolar. Watusi relata que naquela época oficineiras(os) trabalhavam questões mais relacionadas a cultura, música e esporte, enquanto professoras(es) se detinham às questões de alfabetização, grande parte com formação de magistério em nível médio e seguindo a vertente da Educação Popular.

Concomitante ao trabalho como educador, Watusi se dedicava a diferentes atividades, tendo em vista que a remuneração era baixa e que a instabilidade como oficineiro era constante. Assim, por vários anos trabalhou em outras ocupações, entre elas construção civil e pintura.

Watusi explica que o batuque é, no Rio Grande do Sul, a religião mais fiel ao que se tem como religião na África, da região que ele acredita que seus antepassados tenham vindo. De acordo com o participante, Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Recife são os estados nos quais o candomblé é mais forte e menos transformado, mantendo fortemente as características da religião de matriz africana da região da Nigéria. Ainda assim, no batuque, o qual frequentava sua mãe, as rezas são em dialeto Iorubá, contam-se muitas histórias do povo e busca-se manter as tradições africanas.

Os bisavôs de Watusi foram escravos trazidos da África, seus avôs ainda foram escravizados, depois tornaram-se escravos “livres”. Com o precoce falecimento do pai, e com o trabalho nas lavouras durante toda sua infância no interior, ele acabou estabelecendo uma relação bastante próxima com a mãe, mesmo depois de ir morar em Porto Alegre com a irmã,

haja vista que os laços afetivos com a mãe eram fortes. Watusi relatada que foi a mãe quem ensinou ele e seus irmãos a “se virarem no mundo”, quem os ensinou a cuidar da casa e de si.

Nos anos 2000, Watusi retornou para Porto Alegre e começou a trabalhar como oficineiro de capoeira. Por volta de 2006, foi contratado pela primeira vez como educador social, para trabalhar com capoeira, em uma proposta que já modificava o que fazia como oficineiro, já que progressivamente o trabalho começou a ocorrer nos moldes da política pública de assistência social, com a participação de diferentes educadoras(es), com foco amplo em cidadania e garantia de direitos. Nessa época, a partir do contato com outros profissionais que ocupavam a função de educador(a) social, Watusi começou a repensar suas práticas e a expandir sua visão a respeito da capoeira e da Educação Social. Esse movimento fez com que, aos poucos, ele fosse integrando às suas propostas exercícios e ideias de outras áreas, como Artes e Educação Física.

Já trabalhando como educador social em Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), em 2014 Watusi ingressou no curso de Pedagogia, com auxílio de financiamento estudantil (FIES), muito motivado pela possibilidade de obter melhor salário ou de ascender a um cargo mais elevado nas instituições nas quais trabalhava, algo que ele descobriu durante o curso. Após fazer uma análise crítica sobre sua motivação para ingressar no curso e diante das muitas dificuldades enfrentadas na graduação, no que se refere ao racismo e à discordância em relação a posturas ou mesmo a linhas teóricas utilizadas mais hegemonicamente no ensino superior, ele optou pelo trancamento do curso, quando estava por volta do 5º semestre. Entretanto, Watusi reconhece que a experiência na Pedagogia lhe possibilitou a construção de muitos conhecimentos, principalmente no que se refere a uma perspectiva mais ampla de Educação.

Watusi relata que aos poucos, no cotidiano, a partir das reflexões propostas no curso de Pedagogia, sua prática como educador social foi se voltando cada vez mais para uma perspectiva de promoção de uma educação mais integral, voltada para o exercício da cidadania, do conhecimento de direitos. Ao mesmo tempo, ele se aproximou mais da militância negra, passando a discutir questões relacionadas a essa luta e a pensar mais sobre ela.

Assim, nessa altura de sua vida profissional, Watusi trabalhava em SCFV, sendo educador de referência de grupos, um trabalho que, de acordo com ele, o realizava muito, considerando que ao longo da vida passou a entender seu papel como educador de modo mais amplo. Posteriormente, ele atuou também como educador social da Abordagem Social, no programa específico de Porto Alegre, à época chamado de Ação Rua, trabalhando especificamente com população em situação de rua.

A mãe de Watusi faleceu há cerca de 5 anos, e sua perda foi bastante dura para ele, pois pouco tempo antes também perdera a filha mais nova, com cerca de 12 anos, que padecia de leucemia. Além da filha, Watusi tem um filho de 19 anos, que vive em Cachoeira do Sul com a mãe, e que recentemente saiu do serviço militar e agora começa a se organizar, pois deseja fazer faculdade de Psicologia.

Atualmente, Watusi trabalha em um SCFV específico para pessoas adultas em situação de rua, o que se difere um pouco da maioria dos SCFV, os quais em sua maioria atendem crianças, adolescentes e idosas(os) no país. Especificamente na organização do serviço no qual trabalha, Watusi constrói suas propostas socioeducativas na perspectiva de redução de danos, no intuito de pensar estratégias com as(os) usuárias(os) para melhorar a sua qualidade de vida, haja vista que as pessoas atendidas no espaço estão em situação de rua, muitos delas usuárias de substâncias psicoativas, com questões de saúde mental, com quebra de vínculos familiares ou comunitários, entre outros aspectos. Há, no mesmo serviço, propostas voltadas a artes plásticas, música e capoeira. Trabalham nessa instituição educadoras(es) sociais e oficineiras(os): as últimas trabalham com oficinas mais pontuais e as(os) educadoras(es) sociais acompanham mais o processo socioeducativo das pessoas atendidas, desde a acolhida até as diversas atividades que são ofertadas no espaço e o acesso às redes de atendimento necessárias. Watusi é conhecido em Porto Alegre pelo trabalho que realiza e, também, porque, de modo geral, relaciona-se muito bem com as pessoas. Nas comunidades nas quais trabalha, costuma conhecer as famílias de suas(seus) educandas(os), circular pelas ruas e becos, sentar na calçada para conversar, usar o tempo do seu intervalo para estar na rua com as pessoas e conhecê-las. Watusi conhece as pessoas pelo nome, sabe de suas histórias e também é conhecido por elas. Na investigação de mestrado (ROCHA, 2016), as(os) adolescentes o citam como um educador e amigo, que dá os limites necessários e está sempre disposto a escutar, questões que se sobressaem na construção feita com ele.

5.2.2 Entre roças39 de candomblé, jogos de capoeira e culturas: resistir e reeducar – Construção da informação

A característica falante de Watusi permitiu que as dinâmicas conversacionais se desenvolvessem sem que houvesse necessidade de muito esforço meu ou apoio de disparador

de diálogo. Contudo, o desafio dessa construção foi conseguir manter o foco e separar das muitas horas de gravação aquilo que de fato nos auxiliaria a: 1) compreender como as vivências pessoais e profissionais se configuram subjetivamente na experiência de ser educador social; 2) investigar como as configurações subjetivas dele se expressam em posicionamentos pessoais e profissionais frente às(aos) educandas(os) que atende; 3) compreender as crenças de Watusi a respeito dos processos de aprendizagem; e 4) analisar como ele percebe o aprender das(os) suas(seus) educandas(os).

Muito implicado com a construção a ser feita por nós nesta pesquisa, Watusi sempre chegava aos encontros com frases como:

“Pode começar a gravar o que eu vou falar...”

“Tive pensando no que nós falamos no último encontro e acho que...” “Eu pensei numa coisa e quero compartilhar contigo...”

“É que é tanta coisa que eu quero falar...”

Esses trechos ilustram essa implicação e evidenciam o quanto a própria pesquisa também o mobilizou a pensar sobre as questões que íamos discutindo. A partir das frases, podemos desenvolver duas ideias: a primeira refere-se justamente a essa implicação com a pesquisa, que parece transcender o estudo em si e relacionar-se com a área, visto que, apesar de falar muito, o próprio participante direcionava os diálogos para a temática, para as pessoas com as quais trabalha, retomando muitas vezes suas ideias e construções a respeito das(os) educandas(os) e da área como um todo, construindo conceitos e refletindo constantemente sobre o seu papel como educador social. Construímos, então, um indicador inicial da implicação

emocional de Watusi com a área, o que se evidencia ao longo das dinâmicas conversacionais,

por meio de falas explícitas e, também, pelos fluxos de sentidos subjetivos expressos por emoções, pelo envolvimento com a pesquisa, com o trabalho que realiza e com o público o qual atende. A segunda ideia se refere ao posicionamento ativo de Watusi na pesquisa, à forma como ele se coloca no diálogo, como contra-argumenta e apresenta seus pontos de vista. Isso, somado aos trechos supracitados, nos permite construir um segundo indicador, que se refere à confiança

de Watusi em sua capacidade de contribuir para o desenvolvimento da área da Educação Social.

Entretanto, inicialmente, vamos nos deter no primeiro indicador: da implicação emocional de Watusi com a área. Desse modo, observemos o trecho a seguir:

Watusi: “Eu quero que isso seja uma conversa mesmo, porque se eu me propor a ser um objeto, eu vou falar só o que tu quer ouvir.”

Pesquisadora: “Nem eu quero. Nem acredito nisso.”

Watusi: É por isso que eu estou aqui, por dois motivos: uma pelo carinho, admiração, que eu tenho por ti, e outro porque eu sei que tu não vai fazer isso. Eu já recusei, inclusive, participar de pesquisas, inclusive de parceiros meus, negros.” Pesquisadora: “Ah, mas por que, Watusi?”

Watusi: “Tu entrou na faculdade por cotas, tem bolsa, e tá fazendo o que para devolver isso para a comunidade? Tu conhece os quilombos urbanos de Porto Alegre? Não, nem isso conhecem. Se tivesse devolvendo isso tudo de alguma forma, tudo bem. Então... eu tenho alguns critérios e é por isso que eu estou aqui.”

Em nosso segundo encontro, Watusi refere que se dispõe a participar da pesquisa porque acredita que minha postura não seja a mais comum entre as(os) pesquisadoras(es) que conhece, o que, de acordo com ele, refere-se a “fazer as(os) participantes de objetos” e não “devolver” para a sociedade os investimentos feitos em pesquisa ou mesmo a disponibilidade das pessoas de compartilhar seus saberes. A partir desse trecho é possível, então, corroborar o indicador da implicação emocional de Watusi com a área da Educação Social, haja vista que ressalta a importância de que pesquisadoras(es) na área “devolvam” de alguma forma o investimento público ou a disponibilidade dos diferentes atores desses espaços ou populações nas pesquisas. Ainda, é possível pensar nesse indicador a partir da história de vida de Watusi, pois ele é oriundo de uma família com condições de vida muito semelhantes às condições de vida do público o qual atende. Ademais, sua relação com a capoeira iniciou-se em um projeto social e tornou-se uma centralidade ao longo de sua trajetória, tanto que ele se tornou educador de capoeira. Foi a capoeira que de um modo mais direto oportunizou que Watusi trilhasse caminhos distintos da maioria das pessoas de seu círculo de relacionamento, de sua família (pessoas que de acordo com ele trabalham na construção civil, como empregadas domésticas, entre outras), trajetórias estas que oportunizaram um processo de maior reflexão sobre sua própria ação no mundo.

Com o intuito de investigar um pouco mais a respeito do envolvimento de Watusi com a área, em um outro encontro provoco:

Pesquisadora: “Me fala mais sobre essa questão que para ti é importante, de quem faz pesquisa devolver algo para a comunidade na qual a pessoa faz pesquisa.” Watusi: “Eu sempre dou o exemplo da Antropologia. As pessoas estão fazendo Antropologia, daí tipo, Antropologia tem um trabalho muito bacana, assim, mas, o que acontece: a galera vai, entra e fica uns dois anos estudando a comunidade, dormindo com as pessoas, convivendo. Mas aí termina e vai lá defender a tese e o primeiro erro: não convida a liderança daquela comunidade para estar na sua banca, ou alguém para estar ali também enquanto banca, uma forma de a pessoa

poder dizer ‘Pera aí, não foi isso que nós conversamos, essa informação que tu está passando não foi isso que eu quis te dizer’, algo assim. O segundo erro, que eu considero grave, perigoso, tu termina tua pesquisa e morreu a história, e não devolve de alguma forma tudo o que tu absorveu, tudo o que tu te nutriu naquele tempo que tu estava lá. Tu foi lá e pegou todas as informações que tu precisava e não devolveu nada, e que não seja de uma forma material, seja em serviço, em troca de conhecimento [...].”

A partir desse trecho, podemos pensar que a implicação do educador com a área se desdobra em outro indicador: de que Watusi tem uma postura ética de profundo respeito

para com as pessoas, principalmente aquelas populações às quais a produção de subjetividade

social no Brasil, segundo ele, tende a marginalizar – negros, indígenas, pobres e mulheres. Esse respeito se expressa no trecho citado, na preocupação com o fato de os estudiosos explorarem essas culturas para a produção de conhecimento, no sentido de usufruírem desses espaços, dos saberes dessas pessoas, de sua cultura, mas não darem a devida importância àqueles que são, muitas vezes, o cerne de seus estudos, fazendo delas “objetos”, como ele refere que não quer ser nesta pesquisa. Parece-nos, então, que existe uma preocupação a respeito de os pesquisadores se utilizarem da participação das pessoas sem que essa produção de conhecimento se reverta, de alguma forma, em melhorias às condições de vida dessas populações, ou então, sem que se compartilhe esses conhecimentos com elas.

Assim, podemos pensar que a história de exploração desses povos, principalmente dos povos negros e dos povos originários da América, faz parte da subjetividade das pessoas pela vivência e pelas marcas históricas deixadas pela escravização e/ou extermínio, tanto pela produção de subjetividade social quanto pela produção de subjetividade individual. Nesse sentido, não nos referimos a quais marcas seriam essas, pois entendemos que sempre existe a possibilidade de uma produção individual que se distancie da subjetividade social, “assumindo a sociogênese do indivíduo sem que esta signifique a expressão direta e linear do social sobre o indivíduo” (ALMEIDA; MITJÁNS MARTÍNEZ, 2019, p. 91), mas, nos referimos à experiência desses povos, com uma história demarcada por uma cultura diferente que lhes é de algum modo imposta, pelos direitos negados, pelo não reconhecimento de sua humanidade (BENTO, 2002), que de certa forma os constitui subjetivamente. Entendemos, então, no que se refere especificamente a produção subjetiva do participante, que o movimento da subjetividade de Watusi é contra-hegemônico, no sentido de superar a subjetividade social, produzindo sentidos subjetivos a partir de sua própria experiência como pobre e negro no Brasil, expressando-se nesse posicionamento crítico para com a academia e, ao mesmo tempo, pelo respeito para com essas pessoas.

Dando continuidade à essa ideia, destacamos o seguinte trecho:

“Não existe saber mais, saber menos, existem saberes diferentes. Mas, muitas vezes, isso é só teoria. Na hora de se apresentar a pessoa, diz o que ela faz, os títulos, não fala dela. Currículo lattes vem antes da pessoa. Eu não quero saber teu currículo, quero saber quem tu é. Eu quero te conhecer, não conhecer teu currículo.”

Tal crítica à academia – que reconhece mais o currículo do que a pessoa em si –, corrobora a ideia anterior de uma produção subjetiva que se expressa pelo respeito às pessoas, haja vista que a sua vivência como indivíduo negro e educador social ocorre basicamente com pessoas, o que inclui ele mesmo e sua família, que não tiveram oportunidade de acessar uma educação escolarizada, o Ensino Superior e o emprego digno. Nesse caso, se as pessoas não forem reconhecidas como pessoas, pela sua humanidade, seriam reconhecidas pelo quê? É preciso, então, reconhecer o ser humano, não seu currículo, para que ele mesmo seja “gente”, como refere Paulo Freire (1996), e para que os seus também o sejam.

Nesse sentido, em uma outra conversação, ele ressalta que:

“O importante não é ter, é ser. Na religião africana é ser mais um, compartilhar com o outro que também é. Trazendo esse ser para a educação é isso também, então, enquanto eu estou passando esse meu saber que eu tenho, que não me faz

Documentos relacionados