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O Projeto Escola Cabana – (PEC) se insere no âmbito das propostas de re- orientação curricular, ou de reforma pedagógica e curricular, decorridas no Brasil a partir da década de 1980, e especialmente na década de 199028.

A proposta político-pedagógica denominada Projeto Escola Cabana passou a ser desenvolvida em Belém a partir de janeiro de 1997, quando a Frente Belém Popular sai vitoriosa nas eleições de 1996, elegendo o prefeito de Belém e iniciando, assim, uma nova administração municipal denominada de Governo do Povo29.

O Projeto se configura também como parte do conjunto de propostas inovadoras, propugnadas pelos partidos de esquerda para a problematização da escola que referenda o modelo de desenvolvimento excludente.

Essa nova proposta se caracteriza no enfrentamento da questão da evasão, repetência e exclusões escolares, localizadas, sobretudo entre os(as) alunos(as) das classes populares. Assim ela se expressa:

Como parte desse movimento de repensar a escola burguesa e da tentativa de construção de uma escola pública de caráter popular e cultural, buscamos nos referenciar nas práticas que vem se consolidando, nas últimas décadas, em todo o país, através de diversas experiências implementadas por governos populares, a exemplo da Escola Plural, em Belo Horizonte, da Escola Cidadã, em Porto Alegre e da Escola Candanga, em Brasília (BELÉM, 1999, p.5).

O PEC, na concepção do Governo do Povo, recebe esse nome em alusão ao movimento da Cabanagem, que ocorreu no Estado do Pará entre os anos de 1835 a 1840. A

28 Sobre essa questão é interessante consultar Torres et. al. (2002), DALBEN (2004), SANTOS (Tese de

Doutorado) e Bertolo (Tese de Doutorado) os dois últimos trabalhos tematizam sobre o Projeto Escola Cabana.

29 O PEC como proposta político-pedagógica vigorou durante os dois mandatos da esquerda em Belém do Pará

que compreende o período de 1997 a 2004. No ano de 2005 uma nova conjuntura política assumiu a Prefeitura Municipal de Belém iniciando um processo de transição política sobre a qual não podemos afirmar a continuidade ou ruptura do PEC como projeto educacional.

expressão “cabanagem” aufere esse sentido por envolver pessoas humildes do povo, que residiam em cabanas, que habitavam vilarejos ribeirinhos, além de índios, negros e mestiços que lutaram contra a exploração da população local pelo poder imperialista da época.

Assim, a proposta político-pedagógica Escola Cabana recebe o adjetivo “cabano” por intencionar o resgate dos ideais de cidadania do movimento cabano, segundo os propostos ainda não concretizados. Dessa forma, o projeto “homenageia e resgata esta rebeldia e esta coragem de nossos ancestrais” (BELÉM, 1999, prefácio).

A Escola Cabana também se caracteriza por ser:

[...] pautada em valores que expressam a nossa cultura tendo como objetivo a construção de novos homens e mulheres em direção a efetivação da democracia econômica, social, cultural e política entre os cidadãos (Ibid, p. 20).

A partir dessa leitura o PEC representa uma política de educação e de currículo, que, aliadas aos demais compromissos de Governo, pretende contribuir na administração da cidade de Belém do Pará.

Pautando-se nos princípios da inclusão social, participação popular, cidadania e democratização do Estado, pretende-se garantir os anseios da classe trabalhadora e dos setores socialmente marginalizados, bem como fomentar a idéia de uma escola pública popular com qualidade social e inclusiva, propondo para isso um currículo interdisciplinar por temas geradores.

O PEC defende como proposição de uma escola inclusiva a seguinte dimensão:

A inclusão pressupõe uma escola que promova o sucesso do educando no contexto escolar. A escola na perspectiva inclusiva assume a diversidade e dá conta das peculiaridades de todos os alunos, de forma que contemple suas necessidades e potencialidades, questione a forma convencional da prática pedagógica e de exercício da ação docente, requerendo aprimoramento permanente do contexto educacional (BELÉM, 1997, p. 57).

Apostando numa nova organização da ação educativa escolar via ciclos de

formação e num currículo interdisciplinar, via temas geradores, a proposta pretende superar a

lógica da seriação do modelo tradicional de educação, dos padrões tradicionais de avaliação via mensuração cognitiva e da fragmentação do conhecimento. Advoga também uma organização que prima por um trabalho educativo interdisciplinar, pela democratização dos tempos de ensinar e aprender, pela avaliação emancipatória e pela formação integral dos sujeitos.

Essa nova forma de organização educativa prevê:

1 - O trabalho com o conhecimento, na perspectiva interdisciplinar como meio de superar a fragmentação e a alienação entre os diferentes saberes culturais que fazem parte da vida cotidiana dos educandos;

2 - A organização do processo escolar em ciclos de formação, como estratégia de superação da estrutura seletiva do regime seriado e de construção de uma escola inclusiva;

3 - A avaliação na perspectiva emancipatória, rompendo-se com o caráter burocrático e com a função classificatória que tem contribuído para a exclusão do direito a continuidade dos estudos de uma enorme parcela de crianças e adolescentes, oriundos das classes populares (BELÉM, 1999, p. 7).

O PEC assume a concepção dos ciclos de formação numa base teórica sustentada nos princípios da dialética materialista, na teoria crítica de educação de Paulo Freire, nas teorias do desenvolvimento infantil e na perspectiva construtivista e sócio-construtivista. Partindo dessa premissa, o trabalho pedagógico é entendido como um processo contínuo que destitui o conhecimento fragmentado, a linearidade e a seqüenciação de conteúdos estanques, defendendo o conhecimento humano como prática que encontra mediatização no contexto que é físico, social, histórico e cultural.

Para desenvolver o trabalho pedagógico nos ciclos de formação, a proposta se fundamenta nos seguintes pressupostos:

• Concepção do conhecimento como processo de construção e reconstrução que, enquanto processo, não está pronto, sendo revestido de significado, a partir das experiências dos sujeitos-educandos;

• Percepção dos envolvidos no processo pedagógico, enquanto sujeitos históricos, o que implica a valorização e reconhecimento dos diversos saberes socioculturais que são fundamentais para a construção de conhecimentos mais elaborados;

• Construção de propostas interdisciplinares como alternativas para a superação da fragmentação do trabalho escolar, seja em relação ao conhecimento científico, às disciplinas curriculares ou ao trabalho pedagógico no seu sentido mais amplo de organização de horários e tempos escolares;

• Efetivação da Gestão Democrática, através do fortalecimento dos espaços de participação popular no interior da escola tanto das instâncias representativas (Conselhos Escolares, Eleição para Diretores, Grêmios Estudantis.), como também das relações interpessoais efetivadas no cotidiano escolar (sala de aula, reuniões, articulação com a comunidade extra-escolar);

• Utilização da avaliação escolar como estratégia para a formação emancipatória e para a garantia do direito à educação para todos os segmentos sociais;

• Adoção da prática do planejamento participativo, enquanto instrumento democrático e elemento fundamental para a construção do Projeto Político-Pedagógico da Escola. É através do Planejamento Participativo que os diferentes segmentos que compõem a comunidade escolar são chamados a opinar, planejar, avaliar e implementar a proposta de educação a ser efetivada na escola. A responsabilidade, desta forma, é compartilhada entre o coletivo, ampliando as possibilidades de sucesso (Ibid, p. 8-9).

O PEC, além de pontuar a inclusão social, a construção da cidadania e a democratização como princípios centrais de sua proposta, apresenta como marcas de governo a “Participação Popular” e “Dar um Futuro às Crianças e Adolescentes”. Tais perspectivas declaram-se garantir acesso e permanência às crianças e adolescentes que se encontram fora do âmbito escolar. Para tanto, a proposta se apóia nas seguintes diretrizes: a democratização

do acesso e a permanência com sucesso / a gestão democrática do sistema municipal de educação/ a valorização profissional dos educadores/ e a qualidade social da educação, estas

O Projeto ancora-se também em programas, projetos e atividades implementadas na área da educação os quais servem como elementos basilares da materialidade da proposta, são eles:

A Bolsa Escola; o PROALFA (Programa de Alfabetização de Adultos); as Escolas Referência para os PNEES (Portadores de Necessidades Educativas Especiais); a ampliação do Número de Vagas com a construção de novas escolas e a criação dos anexos; a transformação das creches em Unidades de Educação Infantil; os Projetos na área de Esporte, Arte e Lazer; o estabelecimento de uma Nova Lógica de Organização do Ensino em Ciclos de Formação (Ibid, p. 3).

Assim, tendo como sustentáculo uma nova concepção de educação e currículo, a proposta cabana, professa o compromisso de consolidar uma educação de qualidade social, através de programas e projetos. Também elege eixos norteadores para a re-significação do processo de organização da ação educativa escolar quais sejam: “A organização do ensino em ciclos, a avaliação emancipatória, o trabalho com o conhecimento de forma interdisciplinar e a vivência da escola como espaço cultural” (Ibid, p. 65).

Os propósitos do projeto se estendem para a Educação Infantil e trazem reflexões para o trabalho educativo com as crianças de 0 a 6 anos.