• Nenhum resultado encontrado

Aproximações entre enquadramentos midiáticos e o campo jornalístico

enquadramento ao estudo sociológico da produção de notícias

2 Jornalismo: um campo de produção simbólica

2.3 Aproximações entre enquadramentos midiáticos e o campo jornalístico

Através da análise de enquadramento se busca um aprofundamento sobre as condições de produção, ou seja, os marcos cognitivos contextuais que definem as tomadas de posição que os textos jornalísticos são capazes de (re)produzir. Entende-se, pela disposição teórica apresentada que, através da framing analysis, é possível responder aos questionamentos apontados por Weber (1992) sobre os estudos das notícias sob a perspectiva sociológica, visto que o autor considera a importância da subjetividade coletiva na exposição de fatos e opiniões feita pelo jornalismo.

O enquadramento também possui relação com a visão da construção da realidade a partir do “fenômeno social partilhado” de

Tuchman (2002), pelo qual os jornalistas utilizam estruturas institucionalizadas que favorecem certas maneiras de se observar os acontecimentos. Como viu-se esta autora reflete sobre a importância da noção de quadro simbólico para a produção das notícias. Desta maneira, a contribuição o enquadramento já é reconhecido por estudiosos da área como de importância para se entender o processo de construção da realidade a partir das notícias.

As noções de reflexividade, pela qual as notícias estão inseridas na mesma realidade por elas anunciada, e indexicalidade, através da qual os atores sociais podem atribuir sentido às notícias independentes dos contextos de produção dos acontecimentos, possuem afinidade com a ideias de enquadramento midiático e individual, respectivamente. Demonstra-se, mais uma vez, a contribuição da análise dos enquadramentos utilizados por jornalista para tratar os acontecimentos e, de outro lado, os enquadramentos acionados pelo público para entender a sucessão de ocorrências ao seu redor.

Além disso, a noção de agências que transpassam as notícias e interferem nos tipos de acontecimentos públicos que viram conteúdo jornalístico ajuda a refletir sobre como o processo de transformação de ocorrências em notícias são importantes para o jornalismo. Neste sentido, a análise de enquadramento pode ajudar a desvendar os processos sociológicos e individuais pelos quais passam esses acontecimentos. Esta ideia vai de encontro ao papel das“ressonâncias culturais, atividades promotoras e ajuste com as normas e práticas midiáticas” na produção de pacotes de interpretação bem-sucedidos (GAMSON E MODIGLIANI, 1989). Neste sentido, Morlotch e Lester (1999) reconhecem a importância de se entender os propósitos subjacentes à produção de notícias e da construção da realidade através delas, que leva à sociedade a demarcar os acontecimentos que farão parte de um tempo público.

Por tratar da forma como o jornalismo organiza o mundo e como seus agentes atuam dentro do campo a fim de influenciar outros campos, os conceitos de enquadramento se adequam à visão

Thaize Ferreira Macêdo | 107 de jornalismo como campo de produção simbólica, visto que os bens simbólicos são carregados de significados e possuem força no campo e o enquadramento pode ser considerado como o conjunto de componentes que exercem influência fundamental sobre o modo que as notícias se apresentam ao público. Esta relação pode ser observada mais ainda na definição de frame como ideia central organizadora de uma sequência de acontecimentos e o fato de que o enquadramento é o componente que sugere a essência do assunto, ou seja, do produto simbólico.

O conceito de Gitlin (1980, apud SCHEUFELE, 1999) sobre o enquadramento como rotina de produção é outro dispositivo que demonstra a afinidade com a visão de campo jornalístico de Bourdieu. Estudar os enquadramentos presentes nas mensagens jornalísticas permite contribuir para esclarecer as regras próprias do campo e os meios pelos quais os jornalistas empacotam as informações oriundas de outros campos para sua retransmissão. Assim, analisar os frames como variáveis dependentes de estruturas sociais e organizacionais também é pertinente à visão de campo do jornalismo

Essas áreas de estudo da comunicação podem se encontrar, pois estão interessados em saber quais forças atuam para que o jornalismo seja como é e quais enquadramentos são influentes na produção simbólica da mídia. Em geral, pesquisas que vem o jornalismo como um campo e se focam sobre seus produtos buscam responder a perguntas relacionadas aos fatores de influência na produção simbólica dos jornalistas e como seus produtos refletem as suas posições dentro do campo, bem como qual o impacto da produção jornalística dentro do próprio campo e de campos que são tangenciados por ele. Como foi explicado por Scheufele (1999), pesquisas que analisam os enquadramentos de mídia também são marcadas pela preocupação com valores, enquadramentos utilizados e ação na percepção do público pelo jornalismo para tratar de determinados assuntos. Denota-se, então, a aproximação entre essas reflexões teóricas sobre o jornalismo e a mídia.

Outra importante contribuição de Sheufele (1999) para as pesquisas de framing e, no caso desse estudo, para a relação entre enquadramento e a visão de campo do jornalismo é o seu modelo de processo em pesquisas de enquadramento. Como viu-se, diversos são os fatores de entrada, como pressão organizacional, ideologias, atitudes e outros grupos na produção dos enquadramentos de mídia. A pesquisa de jornalismo como um campo considera justamente esses e outros componentes na produção simbólica e na tomada de posição dos agentes no campo.

Ademais, essa relação é observada com a noção dos fatores de autonomia dos jornalistas, que são grau de concentração da imprensa, posição do seu jornal no campo, a própria posição no veículo em que trabalha (que influencia nas garantias trabalhistas) e na capacidade de produção autônoma da informação. Os enquadramentos utilizados pelo profissional possuem ligação com estes fatores e a análise desses frames pode evidenciar de forma mais precisa a dependência, consciente ou não, do jornalista das ações sobre seu campo.

3 Considerações finais

Conclui-se, portanto, a partir da revisão teórica aqui realizada, que os estudos de enquadramento possuem importantes contribuições para a análise sociológica da produção jornalística, especialmente à visão de campo de produção de bem simbólicos. O enquadramento pode ser a forma pela qual as pesquisas sobre a mídia podem carregar mais cientificidade e interpretatividade.

A noção de campo jornalístico pode ser estudada através de métodos de análise de framing, principalmente aqueles voltados à construção dos enquadramentos e ao efeito dos frames externos provenientes de outros campos, como o político e o econômico, sobre os midiáticos. Estes estudos podem ter como objetos tanto as pesquisas sobre as posições dos agentes no campo e sua influência sobre os enquadramentos da mídia, quanto os próprios produtos

Thaize Ferreira Macêdo | 109 jornalísticos, que revelam os enquadramentos e, de forma consequente, as tomadas de posição pelos agentes.

A partir dessa reflexão, é possível que mais pesquisas sejam realizadas utilizando esses dois dispositivos teóricos para a investigação sociológica da mídia. A análise de enquadramento fornece, ainda, métodos confiáveis pelos quais são inferidos os

frames utilizados pelo campo jornalístico mídia ao tratar diferentes

assuntos, em especial aqueles que possuem influência sobre ou originadas em outros campos de produção simbólica ou de poder. Referências

BIROLI, F. Limites da política e esvaziamento dos conflitos: o jornalismo como gestor de consensos. Revista Estudos Políticos: a publicação eletrônica semestral do Laboratório de Estudos Hum(e) anos (UFF) e do Núcleo de Estudos em Teoria Política (UFRJ). Rio de Janeiro, nº 6, pp. 126-143, Jul. 2013. Disponível em: http://revistaestudospoliticos.com/. Acesso em jun 2016.

BOURDIEU, P. O poder simbólico. Lisboa: Difel, 1989.

BOURDIEU, P. O mercado dos bens simbólicos. In. A Economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2007. p. 99-181.

BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

BOURDIEU, P. A oferta e a demanda de opiniões. In: A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre, RS: Zouk, 2007. p. 412-421. CHONG, D; DRUCKMAN, J. N. A Theory of Framing and Opinion Formation in

Competitive Elite Environments. Journal of Communication 57 (2007) 99–118 ª International Communication Association, 2007.

D’ANGELO, P. News Framing as a Multiparadigmatic Reseach Program: A Response to Entman. Journal of Communication, dez. 2002.

ENTMAN, R. M. Framing: toward clarification of a fractured paradigm. Journal

FARACO, C. A. e TEZZA, C. Oficina de texto. 3ª ed. Petrópolis: Vozes, 2003. GAMSON, W.; MODIGLIANI, A. Media discurse and public opinion on nuclear

power: a construcionist approach. American Journal of Sociology, v. 95,

p. 1–37, 1989.

MACHADO, A. A televisão levada a sério. São Paulo: Editora SENAR São Paulo, 2000.

MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONISIO, Ângela Paiva et al. Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucena, 2003, p. 20-36.

MENDONÇA, R. F.; SIMÕES, P. G. Enquadramento: diferentes operacionalizações analíticas de um conceito. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 27, p. 187-201, 2012.

MOLOTCH, H; LESTER, M. As notícias como procedimento intencional: acerca do uso estratégico de acontecimentos de rotina, acidentes e escândalos. In: TRAQUINA, N (Org.). Jornalismo questões, teorias e “estórias”. Lisboa: VEJA, 1999. pp. 34-51.

PORTO, M. Enquadramentos da mídia e política. In: RUBIM, A. A. C. (org).

Comunicação e política: conceitos e abordagens. Salvador: EDUFBA,

2004.

REESE, S. D. Prologue - framing public life: A bridging model for media research. In: REESE, S. D.; JR, O. H. G.; GRANT, A. E. (Ed.). Framing public life: perspectives on media and our understanding of the social life. New Jersey: Lawrence Erlbaum Publishers, 2001. p. 7–31.

REESE, S. D. The Framing Project: A Bridging Model for Media Research Revisited. Journal of Communication 57 (2007) 148–154 ª International Communication Association, 2007.

SCHEUFELE, D. A. Framing as a Theory of Media Effects. Journal of

Thaize Ferreira Macêdo | 111 TUCHMAN, G. A objectividade como ritual estratégico uma análise da noção de objectividade dos jornalistas. In: TRAQUINA, N. (Org.). Jornalismo: questões, teorias e “estórias”. Lisboa: VEJA, 1999.

TUCHMAN, G. As notícias como uma realidade construída. In: Pissarra, E.J. (org.).

Comunicação e Sociedade – os efeitos sociais dos meios de comunicação de massa. Lisboa: Livros Horizonte, 2002.

WEBER, M. Sociologia da imprensa: um programa de pesquisa. In Revista

Capítulo 6