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Capítulo II – Fundamentação teórica

2.1 A aprendizagem de língua estrangeira por crianças

2.1.2 Aquisição ou aprendizagem?

Acredita-se que a aprendizagem de uma língua estrangeira por crianças pode ter aspetos em comum com o processo de aquisição da língua materna, iniciado anteriormente pelas crianças, aspetos que podem ser importantes para a nossa compreensão da aprendizagem da língua estrangeira (Pinter, 2009, p.21). A aquisição da língua materna (ou, num sentido mais lato, da linguagem) pressupõe sempre a exposição

a essa língua, conseguida através da interação social entre a criança e os seus cuidadores (Vygotsky, 1934). A aquisição da língua manifesta-se, em primeiro lugar, através da receção/compreensão e só depois através da produção, situação que se repete também no processo de aprendizagem (Krashen, 1985, Haynes, 2007). Ela beneficia do uso de simplificações e modificações, de repetições, de um discurso mais lento e mais expressivo ou da enfatização de determinados sons ou vocábulos, de modo a criar um “comprehensible input” (Krashen, 1985). Esta necessidade de exposição, em quantidade e em qualidade, e num ambiente seguro e descontraído, é também um fator de extrema importância para a eficácia da aprendizagem da língua estrangeira. Em todo o caso, este

input deve ser compreendido e provido de sentido, ainda que se situe ligeiramente acima

do nível de competência da criança. Este era um dos princípios da abordagem de ensino

Natural Approach (Krashen & Terrell, 1983). Embora nem todos aceitem a noção de

Krashen de que as crianças aprendem uma língua estrangeira através da simples exposição ao “comprehensible input”, este continua a ser hoje um dos fatores apontados como determinantes para a aprendizagem de língua estrangeira (Richards & Rodgers, 2014). Daqui advém a necessidade de exposição à língua Inglesa nas aulas do 1º Ciclo, ainda que não seja de excluir o uso pontual da língua materna (ver por exemplo, Medgyes, 1992, Harmer, 2012).

Uma última analogia com o processo de aquisição da língua materna que gostaríamos de realçar aqui é a natureza do conteúdo das interações entre a criança e os progenitores ou cuidadores: este centra-se em temas que são relevantes para a criança ou que lhe suscitam interesse por surgirem no seu mundo imediato e circundante e que estão integradas nele (Bourke, 2006, Pinter, 2009). O conteúdo que acompanha a nova linguagem deve ser significativo para as crianças, ou, nas palavras de Bourke, “The language has to be packaged in a way that makes sense to children “ (Bourke, 2006, p. 282).

Halliwell aborda a questão da aprendizagem indireta pelas crianças que aprendem uma língua estrangeira. Ao envolverem os alunos em atividades em língua Inglesa que captem a sua atenção e estimulem os seus processos cognitivos, os professores estarão também a criar condições para que ocorra uma aprendizagem inconsciente da língua

estrangeira, num processo gradual de interiorização da língua, e também semelhante ao que ocorre na aquisição da língua materna. As crianças são muito proficientes nesta aprendizagem indireta durante o período do ensino primário e os seus professores de Inglês não devem desaproveitar esta característica (Halliwell, 2004, p.4).

É igualmente referido como um dos requisitos para a aprendizagem formal durante a infância a criação e manutenção de rotinas na sala de aula (Cameron, 2001; Ellis & Brewster; 2002). O professor de língua estrangeira não deve descurar este aspeto, pois as rotinas, as regras e a repetição de certos momentos e atividades durante as suas aulas ajudam a criar um ambiente de aprendizagem estruturado e seguro para as crianças. No ensino de língua estrangeira a crianças, as rotinas da aula ajudam ainda as crianças a construírem o sentido, ou seja, a deduzirem o sentido e a intenção comunicativa dos enunciados em língua estrangeira, usados repetidamente pelo professor durante uma determinada rotina. Se estes se repetirem regularmente e estiverem contextualizados, a criança poderá compreendê-los e então interioriza-los/internalizá-los. Ela poderá ainda expandir as suas competências na língua estrangeira, se a linguagem usada nessas rotinas evoluir gradualmente na sua complexidade linguística, mas sempre dentro da ZDP da criança (Cameron, 2001).

As particularidades da aprendizagem de uma língua adicional na infância, bem como algumas boas práticas de ensino gerais, que foram aqui mencionadas, longe de esgotarem o tema, são aquelas que têm sido unanimemente referidas como pertinentes para a adoção de abordagens e estratégias adequadas e eficazes no ensino de Inglês a crianças do ensino primário.

Gostaríamos de voltar à noção de que as crianças aprendem de uma forma holística. Não é possível isolar o desenvolvimento de cada uma das suas competências, nem tão pouco separar o desenvolvimento linguístico do desenvolvimento intelectual, do desenvolvimento motor ou do desenvolvimento socio-afetivo. Esta última área do desenvolvimento reveste-se de grande importância neste nível etário e já vários especialistas o repetiram: a aprendizagem é muito favorecida por um ambiente onde as crianças se sintam descontraías e motivadas (Moon, 2004; Huang, 2011; Marsh; 2013).

Consequentemente, a sua atitude futura face ao Inglês pode ser positiva ou negativamente condicionada, consoante estas primeiras experiências lhes forem agradáveis ou penosas (Moon, 2004, Pinter, 2006). A este respeito, escreve também Phillips (1993, p.6) “It is common sense that if an activity is enjoyable, it will be memorable; the language involved will ‘stick’, and the children will have a sense of achievement, which will develop motivation for further learning.” É geralmente assumido que as crianças deste nível etário estão intrinsecamente motivadas para a aprendizagem. À medida que elas se vão desenvolvendo, vão ficando cognitivamente, fisicamente e socialmente mais capazes, mas simultaneamente torna-se menos garantida a sua empatia com o professor e a adesão entusiástica às atividades que lhes são propostas simplesmente pela satisfação de cumprir a tarefa que lhes foi atribuída – se a tarefa não se lhes afigurar como interessante ou estimulante, rapidamente desistem dela. Daí a vantagem, e a necessidade mesmo, de introduzir temas com ligação ao seu mundo próprio, e de fazer uso de métodos de outras disciplinas, que lhes sejam familiares ou mais significativos, tornando assim mais pertinente a aprendizagem e permitindo a sólida construção do seu saber pessoal.