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Aritmética do Sistema dos Números Reais

No documento Paula Cristina Reis Lopes (páginas 138-142)

4.4 Construção dos Números Reais como Sucessões de Intervalos Encaixados

4.4.2 Aritmética do Sistema dos Números Reais

Com o intuito de definir a operação de adição no conjunto dos números reais iremos, primeiramente, definir a adição de sucessões de intervalos encaixados de números racionais. Definição 4.4.7 Sejam ζ e η duas sucessões de intervalos encaixados de números racionais, onde

ζ = {I1, I2, I3, ...} e η = {J1, J2, J3, ...} .

ζ + η corresponde à sucessão

{I1+ J1, I2+ J2, I3 + J3, ...} ,

onde, para cada número natural n

In+ Jn= {a + b com a∈ In e b ∈ Jn} .

Assim, com o objectivo de adicionar dois números reais, iremos escolher quaisquer sucessões de intervalos encaixados de números racionais representando esses dois números reais. Adicionamos essas sucessões, adicionando os intervalos correspondentes e os inter- valos, por sua vez são adicionados, estabelecendo essa mesma operação a cada par de números dos dois intervalos.

Em última análise verificamos que a operação acima descrita corresponde à adição definida no conjunto dos números racionais.

É necessário contudo garantir que a adição de intervalos encaixados de números racionais continue a ser um intervalo encaixado de números racionais, o que se traduz no seguinte:

Teorema 4.4.3 Se I e J são dois intervalos encaixados de números racionais então também o é I + J.

Se tomarmos a adição de dois pares de sucessões de intervalos encaixados de números racionais representativas de dois números reais, é necessário provar que estas são equiva- lentes.

Com efeito, a definição da adição ζ + η, como base da adição de dois números reais, necessita de um teorema que justifique a sua validade.

A razão é que ao adicionarmos dois números reais ζ e η, seleccionamos uma de muitas possíveis sucessões de intervalos encaixados para representar ζ e igualmente uma de muitas hipóteses de sucessões de intervalos encaixados para representar η. Existem pois várias hipóteses de escolha.

Se escolhermos ζ representado por

{I1, I2, I3, ...} e {X1, X2, X3, ....}

e η também representados por

{J1, J2, J3, ...} e {Y1, Y2, Y3, ....} .

Além de {In} e {Xn} serem equivalentes necessitam não ser idênticas. O mesmo deve

acontecer com {Jn} e {Yn} .

Assim, não poderemos esperar que as duas sucessões

{I1+ J1, I2+ J2, I3+ J3, ...} e {X1+ Y1, X2+ Y2, X3+ Y3, ...}

sejam idênticas.

O problema reside no facto de que elas podem não ser equivalentes.

Uma vez que é suposto que ambas determinem a mesma adição ζ +η, as duas sucessões acima devem ser equivalentes ou teríamos uma ambiguidade na definição da adição de números reais.

Para garantir que esta ambiguidade não tenha lugar é suficiente estabelecer o seguinte: Teorema 4.4.4 Sejam ζ e η números reais. Consideremos ζ representado por duas sucessões de intervalos encaixados {In} e {Xn} e η representado por duas sucessões de

intervalos encaixados {Jn} e {Yn} . Então as duas sucessões de intervalos encaixados

{In+ Jn} e {Xn+ Yn} são equivalentes, donde originam o mesmo número real ζ + η.

Demonstração. Suponhamos ζ e η números reais, consideremos ζ representado por duas sucessões de intervalos encaixados {In} e {Xn} e η representado por duas sucessões

de intervalos encaixados {Jn} e {Yn} .

Suponhamos ainda, com vista a um absurdo, que a sucessão {In+ Jn} representa o

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Atendendo a última condição, as duas sucessões {In+ Jn} e {Xn+ Yn} não são equiv-

alentes, então, deverá existir algum intervalo da forma Ik+ Jkdisjunto de algum intervalo

da forma Xm+ Ym.

Suponhamos, sem perda de generalidade, que m ≥ k, então, uma vez que Im+ Jm ⊂ Ik+ Jk,

decorre que Im+ Jm e Xm+ Ym são igualmente disjuntos.

Mas, atendendo ao facto de que {In} e {Xn} são equivalentes, existe pelo menos um

número racional a pertencente a Im e Xm.

Similarmente, existe um número racional b pertencente a Jm e Ym.

Consequentemente, podemos afirmar que o número racional a + b pertence tanto a Im+ Jm como a Xm+ Ym. Está encontrado o absurdo, uma vez que Im+ Jm e Xm+ Ym

são disjuntos.

É obvio que se {In} e {Jn} são sucessões de intervalos encaixados fechados de números

racionais também o é a sucessão {In+ Jn} .

Seguidamente, por conveniência iremos estabelecer que todo o número racional é um número real, isto é, que cada número racional pode ser tomado como uma colecção de sucessões equivalentes de intervalos encaixados de números racionais.

Assim, podemos afirmar que Q ⊂ R onde R denota o conjunto de todos os números reais.

Teorema 4.4.5 Seja r um número racional, então r é um número real. Demonstração. Para cada número natural n, consideremos

In= ∙ r 1 n, r + 1 n ¸ .

Claramente {In} é uma sucessão de intervalos encaixados fechados de números racionais.

É fácil verificar que se {Jn} é uma outra sucessão nestas condições, então é equivalente

à sucessão {In} se e só se todo o intervalo Jn contém o número r. Além disso, se tal

acontecer, r é o único número comum a todos os intervalos da sucessão {Jn}, se atendermos

à condição que diz-nos que a sucessão {λ (Jn)} tende para zero.

Consequentemente, o número racional r é representado por uma sucessão de intervalos encaixados e portanto é um número real.

Retomando a adição, temos duas formas de adicionar números racionais.

Se r e s são racionais podemos adicioná-los pela adição usual definida em Q ou então podemos tomá-los como números reais e adicioná-los utilizando as sucessões de intervalos encaixados. Os dois resultados obtidos são iguais, e assim a definição de adição de números reais corresponde à usual adição de números racionais, quando ambos os métodos são aplicados a dois pares de números.

Atendendo à Definição 4.4.6, de número real, como uma colecção de sucessões equiva- lentes de intervalos encaixados de números racionais, e ao facto de, como acabamos de ver, a adição de números reais resultar, em última instância, na adição de números racionais podemos, obviamente, enunciar os seguintes:

Teorema 4.4.6 A adição de números reais é comutativa, isto é, para quaisquer dois números reais ζ e η temos

ζ + η = η + ζ.

Teorema 4.4.7 A adição de números reais é associativa, isto é, para quaisquer números reais ζ, η e θ temos

(ζ + η) + θ = ζ + (η + θ) .

Teorema 4.4.8 O número racional 0, quando tomado como número real, é o elemento neutro da adição, isto é, para todo o número real ζ temos

ζ + 0 = 0 + ζ = ζ.

Teorema 4.4.9 Para todo o número real ζ existe um número real −ζ tal que ζ + (−ζ) = (−ζ) + ζ = 0.

Analogamente, podemos definir a multiplicação de números reais com base nas sucessões de intervalos encaixados de números racionais e enunciar o seguinte:

Teorema 4.4.10 Sejam ζ e η números reais. Consideremos ζ representado por duas sucessões de intervalos encaixados {In} e {Xn} e η representado por duas sucessões de

intervalos encaixados {Jn} e {Yn} . Então as duas sucessões de intervalos encaixados

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São igualmente válidos os seguintes:

Teorema 4.4.11 A multiplicação de números reais é comutativa, isto é, para quaisquer dois números reais ζ e η temos

ζ · η = η · ζ.

Teorema 4.4.12 A multiplicação de números reais é associativa, isto é, para quaisquer números reais ζ, η e θ temos

(ζ · η) · θ = ζ · (η · θ)

Teorema 4.4.13 A multiplicação de números reais é distributiva em relação à adição, isto é, para quaisquer números reais ζ, η e θ temos

ζ · (η + θ) = ζ · η + ζ · θ e (η + θ) · ζ = η · ζ + θ · ζ.

Teorema 4.4.14 O número racional 1, quando tomado como número real, é o elemento neutro da multiplicação, isto é, para todo o número real ζ temos

ζ · 1 = 1 · ζ = ζ.

Teorema 4.4.15 O número racional 0, quando tomado como número real, é o elemento absorvente da multiplicação, isto é, para todo o número real ζ temos

0· ζ = ζ · 0 = 0.

Teorema 4.4.16 Para todo o número real ζ, distinto de 0 existe um número real 1 ζ tal

que

ζ ·1 ζ = 1.

Na próxima secção iremos ver como podemos definir a ordenação em R com base na ordenação definida em Q.

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