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O artista faz a arte e a arte faz o artista: o percurso semântico da arte

6. O ESPETÁCULO DAS IDENTIDADES

6.1 O A RTISTA E SUA ARTE DE VIVER

6.1.1 O artista faz a arte e a arte faz o artista: o percurso semântico da arte

Entendendo-se aqui a arte como atividade de transcendência do homem, como a busca pelo belo, bom e verdadeiro, o percurso semântico da arte se descola naturalmente do percurso semântico do trabalho. Apesar de na vida prática dos sujeitos pesquisados os sentidos de arte e trabalho se confundirem, é possível destacar momentos em que os enunciadores atrelam o exercício da arte a seus ideais éticos e estéticos. Ademais, quando demandados pela pesquisadora para definir o vocábulo arte, eles revelaram sentidos que vão além da esfera do trabalho. O percurso semântico da arte recebeu atenção específica nesta análise, pois considerou-se a arte um elemento constitutivo da identidade dos entrevistados, assim como o discurso dos próprios artistas é determinante na definição da arte na sociedade contemporânea. Dessa forma, artista e arte se definem reciprocamente. A análise, portanto, visou compreender a série de sentidos implícita nessa relação.

O primeiro tema a ser analisado se refere aos ideais estéticos dos enunciadores. Esse tema já foi identificado durante o percurso semântico do trabalho, mas entende-se que merece maior destaque no percurso semântico da arte. Ao falarem de suas práticas como artistas, os sujeitos entrevistados revelam suas preferências a respeito da forma como fazem arte. O ideal estético, nesse sentido, não remete necessariamente à aparência final do produto da atividade artística, mas sim à busca pelo processo de fazer arte considerado verdadeiro, realizador e transcendente.

129 Só fazer teatro pra ganhar dinheiro, não é isso. Meu interesse é artístico também, desvendar coisas, desvendar coisas é... dentro de mim, descobrir coisas e descobrir do outro. O outro me trazer coisas. Eu, eu gosto dessa troca e sempre trabalhei em grupo. Nunca trabalhei de elenco. [...] gosto de trabalhar em grupo. Não me vejo, posso até pagar língua um dia, mas não me vejo fazendo monólogo. (GG2)

Eu estava cheia de angústia, com vontade de fazer coisas, aprender outras coisas, mas, assim, sendo uma atriz sozinha, convidada pra outros trabalhos. Assim, que estímulos eu vou ter, sabe? Pra... assim, é difícil você ... Onde que eu vou desaguar isso tudo que eu estou querendo?. (GG6)

Eu percebi que quando eu assistia um espetáculo que era de algum grupo e que vinha de um processo de pesquisa eu tinha uma atração... Eu me encantava assim. Eu via um bom material, algo que me chamava atenção. (MA1)

Então, o processo colaborativo eu nunca vou deixar ele. [...] Então, eu escolhi esse lugar, escolhi estar em grupo, porque eu estou o tempo todo mexendo com teatro, tô estudando, tô avaliando, eu tô me conduzindo a fazer alguma coisa. É isso que me dá vontade de continuar. [...] Então, o colaborativo, pra mim, tem um significado muito importante na minha vida. Eu mudei muito depois que eu comecei a fazer processo colaborativo. Eu me acho melhor como pessoa fazendo teatro em processo colaborativo. Aprendi muito a ouvir, a abrir a escuta. (MA3)

Então, já era uma pesquisa que muito me interessava, de ocupação do espaço. Desde o início, eu não me interesso muito pela investigação de palco italiano. É uma coisa que não me afeta. Então, pela minha relação com ele, assim, pelo meu corpo. Eu gosto muito mais da minha relação meio e espaço. (CH1)

[...] por isso que nos interessa o teatro de ocupação, porque ele faz com que o ator e todo mundo da equipe tenha que fazer de novo tudo, repensar todas as relações... É muito instigante... Pra mim como ator é um exercício fabuloso. (OF2)

Foi o que me fez querer mexer com bonecos porque é muito poético assim. Eu queria fazer algo daquele tipo com teatro de bonecos. Na verdade, eu queria ter um grupo que começasse do zero, sabe, tipo fundar com pessoas que também queiram alguma coisa nova. [...] Acredito naquele (teatro) que tenha alguma coisa que você quer dizer dentro dele. Não importa qual seja. (OF4)

Eu acho que é isso que me interessa do teatro. Essa, assim, como se fala... mostra de graça da vida, entendeu? Eu não tenho limite, eu posso fazer o que eu quiser. É, então, essa liberdade. [...] Eles me davam os exercícios e eu comprovava na minha prática como que isso era. [...] E eu assistia a muitos teatros, muita coisa que eu não

gosto. E eu falava: “Não é possível que seja isso. Tem que ter mais alguma outra

coisa”. Ou seja, eu acho que o teatro mexe comigo em algum lugar, que: “Não é isso que eu estou vendo. Então, se eu não estou conseguindo ver, eu vou fazer”. (OF7) Esse tipo de manipulação eu acredito. Não na questão de outro, que eu vou falar: “Mas isso aqui não é minha questão, mas eu vou fazer porque....” Não, “isso aqui é realmente, está aqui, preto no branco. É isso aqui. Não está diferente”. Aí, eu consigo chegar mais próximo da verdade, tem que estar a verdade, porque senão eu vou estar mentindo para mim, vou estar me escondendo o tempo todo. Seria uma grande máscara. (OF1)

Escrever, para mim, é como se fosse um dom que eu já nasci com ele. Mas aí eu sou mais apaixonada mesmo pelo teatro, pelo atuar, porque eu acho que é coisa da paixão mesmo, né. Você quer aquela dedicação, aquela confusão, assim... (OF6)

130 Eu quis ser cantor, compositor. Eu comecei a estudar instrumento. Mas me faltou disciplina, me faltou... Aí, o teatro foi abraçando. [...] Tinha alguma coisa a ver com performance, com palco. Tenho fascínio pela mentira, fascínio pela grande verdade. (GG7)

Ao revelar a forma como preferem fazer arte, os enunciadores demonstram acreditar em algum tipo de ação criativa, como se essa ação fosse mais autêntica ou verdadeira do que outras. A crença explícita em uma forma de processo artístico, como caminho para se chegar à essência, seja da arte teatral ou da própria identidade substantiva do artista, conduz a sentidos implícitos sobre a existência de um ideal estético por parte dos enunciadores que eleva o significado da prática teatral além da esfera existencial e instrumental do trabalho. GG2 explicita, por exemplo, a elevação do fazer teatral acima do objetivo de ganhar dinheiro.

Dentre os relatos dos sujeitos entrevistados, identificam-se dois tipos de processo a respeito das preferências artísticas individuais: aquele representado por sujeitos que descobriram suas preferências ao longo de suas trajetórias, a partir das experiências de vida; e aquele representado por sujeitos que demonstram já se interessar intrinsecamente por certos tipos de práticas. GG6, MA3, OF4 e GG7 fariam parte do primeiro grupo, pois narram momentos de suas vidas em que descobriram formas melhores de fazer teatro ou momentos em que se identificaram com certas práticas. Esses sentidos estão implícitos nas expressões verbais: estar cheia de angústia, mudar, começar a fazer, me fazer querer, abraçar. Por outro lado, GG2, MA1, CH1, OF2, OF7, OF1 e OF6 se colocam implicitamente como artistas que já sabiam das suas preferências, por meio das expressões verbais: gostar, perceber, ter atração, sempre ter trabalhado, não se interessar desde o início, interessar-se, acreditar, ser apaixonada. Portanto, a identificação com um ideal estético, de forma análoga ao tema da descoberta do gosto pela arte ou da vocação, permite elencar duas práticas discursivas distintas sobre a formação da identidade substantiva dos enunciadores: aquela associada a sujeitos que afirmam descobrir aos poucos suas identidades a partir das contingências da vida e aquela associada a sujeitos que revelam suas preferências autênticas como uma essência inata.

O tema do ideal estético está ligado diretamente às relações de identificação dos sujeitos captadas em nível textual por meio dos elementos de avaliação ou de modalidade (FAIRCLOUGH, 2003). Alguns enunciadores expressam suas preferências artísticas por meio da avaliação; ou seja, discursam sobre o que é desejável ou indesejável, bom ou ruim. Outros

131 explicitam suas preferências por meio da modalidade; ou seja, falam sobre o que é verdadeiro e necessário. Ambas as práticas remetem a convicções e valores dos enunciadores. Contudo, na avaliação o enunciador relativiza explicitamente suas ideias, ao passo que na modalidade absolutiza suas opiniões como verdades. A avaliação, nesse sentido, seria uma estratégia discursiva de empatia, em que o enunciador revela sua identidade, mas coloca-se aberto a aceitar diferenças. A modalidade, por sua vez, seria uma estratégia mais persuasiva, em que o enunciador impõe sua visão de mundo, afirma sua identidade a partir da sustentação de suas verdades.

Indícios de avaliação estão presentes, por exemplo, nos trechos de GG2 (eu gosto), GG6 (é difícil), MA1 (bom material), MA3 (melhor) e OF2 (é instigante). Já práticas discursivas de modalidade estariam implícitas quando os enunciadores afirmam, sem o uso da primeira pessoa, algum tipo de verdade. Por exemplo, OF2 relata o que o teatro de ocupação provoca na equipe, OF7 salienta sua busca por alguma outra coisa no teatro que ela afirma sentir falta, OF1 enfatiza a necessidade de ter que estar a verdade em sua representação. Consciente ou não, a escolha entre práticas discursivas de avaliação ou de modalidade são reveladoras de aspectos identitários dos enunciadores, não apenas em termos de conteúdo e representação (com que ideias eles se identificam), mas também em termos de formas de ação do sujeito (o que ele demonstra ser ao escolher determinado estilo discursivo).

Ainda sobre as preferências artísticas, destacam-se as formas ideais dos enunciadores: teatro de grupo (GG2, GG6, MA1), processo colaborativo (MA3), teatro de ocupação (CH1 e OF2), teatro verdadeiro (OF4, OF7 e OF1) e o próprio teatro em comparação a outras artes (OF6 e GG7). Independentemente da forma preferida, contudo, os enunciadores relatam momentos de autoconhecimento ao realizarem a arte segundo seus ideais. Esse sentido encontra-se implícito nas expressões: desvendar coisas dentro de si, desaguar, conduzir-se, afetar-se, repensar, comprovar, chegar próximo da verdade, as quais remeteriam a um processo de transcendência, de contemplação, em que os sujeitos se aproximariam de suas verdades, suas identidades substantivas. O fazer artístico, neste ponto, transcende seu resultado: a obra de arte, para ganhar sentido subjetivo, enquanto um processo único vivenciado pelo artista.

Além da busca pelo ideal estético, alguns enunciadores revelam também um sentido ético implícito na prática artística. A arte como forma de agir no mundo assumiria algum tipo de função transcendental, despertadora e educadora, entre outras. Enquanto o tema do ideal estético se relaciona mais com o processo e com a forma do fazer artístico, o tema do ideal

132 ético estaria mais ligado ao produto da arte e aos resultados que ela poderia gerar na sociedade.

Antes de tudo, assim, eu acho que a arte tem uma função social, assim, a priori. [...] A pessoa se assiste alguma coisa, já tá abrindo a cabeça dela, tá adquirindo

conhecimento, ela tá adquirindo valores civilizatórios, né? (GG11)

Eu acho que o teatro tem uma função educativa [...]. Não é balela, não é retórica quando você diz, quando você ouve dizer que o nível cultural de um lugar se mede pelo teatro que ele faz. (GG3)

Eu faço teatro porque é a maneira que eu encontrei de me colocar no mundo, né. Isso é um ato político [...] Se tem uma resposta, ela deve gerar uma outra pergunta, e não... não aceitar ela. E, nesse ponto de vista, a gente é político. Eu gosto de espetáculos que quando você assiste você leva um pouco pra casa. (GG10)

Esse é um dos nossos projetos [...] apresentar num processo comunitário, envolver as mulheres das periferias, que é isso que tem alimentado o trabalho, né. A questão delas que tá na gente e volta pro trabalho. Então, nos interessa dialogar com essas pessoas né, mais do que com grupo de teatro. [...] E tentar sanar de alguma maneira... A gente tem tido muito trabalho ainda. Às vezes, as mulheres nos xingam na rua. (CH1)

Eu acho que a única possibilidade da gente conseguir modificar um pouco o

caminho que as coisas estão tomando é através da arte, da cultura e da educação.

Então, nesse sentido assim, se um grupo, se ele pode promover, ele pode criar alguma esperança, uma esperança, fazer com que as pessoas enxerguem uma possibilidade de uma vida melhor, eu acho que isso é maravilhoso. (GG6)

Eu acho que é uma maneira assim de... aguçar, assim... a sensibilidade das pessoas, da imaginação, o poder da imaginação, né? Fazer com que as pessoas sonhem. É...

saiam desse mundo pequeno do dia a dia. Acho que a arte tem muito a ver com

isso, assim. (GG9)

No projeto infantil, a gente viu que nós temos que dar as ferramentas às crianças para criar um juízo critico, pronto. Este... aproximar da forma lúdica e estimular o ato da leitura e pápápá... objetivo. Na verdade, para mim, a função verdadeira para mim é levar o momento mágico na vida da criança. (MA2)

É a pincelada da humanidade. É o que salva, porque de resto, é tudo concreto, tudo matemático. Sobra nós, humanos. Nossa humanidade é o que sobra. Arte, para

mim, a arte – olha só que viagem: a arte é uma lembrança para a gente de que

somos humanos, sabe? (OF1)

Eu acho que a função é justamente essa de abrir, abrir a sensibilidade das pessoas para o que não está, o que está e você não consegue ver, e de repente a arte pode te

trazer esse start. Começar a perceber que as coisas podem ser vistas por uma outra

forma, com uma outra sensibilidade. Acho que tem essa função sensibilizadora, de abertura de universo. (OF6)

Um teatro que toque as pessoas e que seja bem feito, bem feito, principalmente. É um trabalho, né, que a gente esteja ali pra alguma coisa. Acho que o teatro, toda arte, né, no fazer, você já esbarra numa ética. Então, eu acho que trabalhando, né, a ética vem. [...] Então, não é tanto pela forma, né, mas como que a gente se engaja nesse fazer se isso tem verdade pra você e tal. (OF3)

133 Teatro é uma possibilidade de contato, de atravessamento, de ruptura. Por isso que eu falo num despertador. Porque, no mínimo, é a tentativa de se acordar, né. Eu acho que pra isso gerar o outro, e não consequência, volto a dizer: Então, pra mim teatro é um break, uma interrupção mesmo. Tento criar um pouco essa mudança de

perspectiva assim, de olhar... Tanto que eu acho que quando o teatro vem nesse

lugar pra mim eu fico muito, fico sentido que ainda vale a pena lutar sim. (OF2)

Os trechos destacados trazem sentidos implícitos de avaliação sobre o que os enunciadores acreditam ser bom ou desejável para os outros – no caso, os receptores da arte. Trata-se, portanto, de expressões de julgamento baseadas em conjuntos de valores que podem revelar significados éticos relacionados ao produto da prática artística. Tais significados conferem sentido ao fazer artístico, sendo a arte representada como forma de transformar o mundo. Assim, o tema da transformação se relaciona diretamente ao tema do ideal ético. Ao agir guiado pela ética, o indivíduo transcende a esfera instrumental da existência para buscar uma participação ativa no mundo, vislumbrando modificá-lo em prol de um vir-a-ser diferenciado (MANNHEIN, 1986). Nos trechos destacados, a arte é representada como forma de provocar a mudança nos espectadores. Isso fica explícito nas várias expressões verbais que caracterizam a prática artística: abrir a cabeça, adquirir conhecimento, ter função educativa, levar um pouco pra casa, sanar, modificar, criar esperança, aguçar a sensibilidade, fazer sonhar, criar juízo crítico, levar o momento mágico, ser pincelada da humanidade, salvar, ser a lembrança, abrir a sensibilidade, trazer esse start, tocar as pessoas, esbarrar numa ética, despertar, acordar, mudar de perspectiva.

Ao representar a arte enquanto forma de agir no mundo, contudo, os enunciadores diferem em relação a sua função transformadora, revelando sentidos diversos sobre o ideal ético a ser buscado pela prática artística. GG11 e GG3 reproduzem o discurso da cultura afirmativa, ou seja, da arte como instrumento pedagógico a serviço da afirmação da cultura (MARCUSE, 2001). A função atribuída à arte seria, portanto, a disseminação de valores culturais. Infere-se que a situação ideal para os enunciadores seria que tais valores fossem igualmente acessíveis a todos. Neste ponto, questiona-se a própria existência de ideal ético nos discursos, entendendo-se que o sentido atribuído à arte está menos relacionado à transformação do que à suavização do funcionamento da sociedade. Por exemplo, GG11, ao explicitar a importância da aquisição de valores civilizatórios, deixa implícita a ideia de que importa menos o conteúdo intrínseco desses valores do que sua função de aculturamento ou inclusão social. O sentido, portanto, distancia-se de um ideal ético e aproxima-se da moralidade funcional.

134 GG10 e CH1, por outro lado, relacionam a prática artística a um posicionamento político. A arte não seria uma forma de homogeneização de valores, mas sim um instrumento para gerar provocação e questionamentos na vida dos espectadores. O ideal ético dos enunciadores seria obtido por meio da arte ao causar polêmica e levar à revisão das condições existenciais de quem a aprecia. A ideia da função polêmica está explícita em gerar uma outra pergunta (GG10) e as mulheres nos xingam (CH1). A ideia de que os espectadores revisem suas condições existenciais está implícita em levar um pouco pra casa (GG10) e a questão delas (CH1). Dessa forma, o ideal ético dos enunciadores ao fazerem arte seria o de transformar os espectadores em suas vidas cotidianas.

GG6, GG9 e MA2 representam a arte como instrumento lúdico. Contudo, de um lado, GG6 explicita que a arte deveria estimular os espectadores a crer em um futuro melhor, transformando permanentemente o mundo, o caminho que as coisas estão tomando; de outro, GG9 e MA2 representam a arte como uma forma de elevar os espectadores além da esfera cotidiana momentaneamente. Para esses dois enunciadores, a função da arte seria transcendente, porém transitória, ideia implícita em sair desse mundo pequeno do dia a dia e momento mágico. OF1, OF6, OF3 e OF2 relacionam a arte à função de provocar a mudança de perspectiva nos espectadores. Pressupõe-se que essa mudança seria boa e desejável para todos. Pressupõe-se também que as condições existenciais da atualidade são consideradas ruins. A arte, portanto, seria necessária para se lembrar da humanidade, sensibilizar e despertar os espectadores. A arte seria o momento em que o artista poderia iniciar um processo de transformação nas pessoas. Contudo, os enunciadores silenciam sobre o tipo de transformação as pessoas poderiam causar no mundo a partir do despertar que a arte desencadeia.

Embora a maioria dos entrevistados relacione a prática artística a certo tipo de ação em prol de um ideal ético, alguns sujeitos negam o potencial de transformação que a arte em si possa resultar no mundo.

Mas eu acho que o teatro, ele complementa. Eu acho que não é muito não. Não é muito, não. Eu acho que é pouco assim só se apresentar. É pouco, a troca social, assim. Você vai lá, a pessoa assiste... viaja... acha bonito... distrai um pouco das coisas da realidade né, porque ela vê a realidade aumentada ou diminuída ali... Eu acho que é uma questão importante, mas a prática social mesmo, mesmo o teatro não consegue dar. (GG2)

135 Essa é uma discussão que eu tento pôr fogo nela desde muito tempo, que é assim: quão importante é as atividades além do espetáculo pra a sobrevivência dos grupos, né. Assim, quão importante é as atividades é, enfim, pra criar uma

sociedade melhor [...]. Sabe, o quão importante é você tá preocupado com a

educação, com a formação, com o desenvolvimento, com a discussão, com a reflexão, com o trabalho que a gente faz dentro de uma sociedade ainda muito precária. (GG1)

Acho que a arte é integração. Arte só, só por arte não me interessa. Eu consigo fazer arte me integrando com as pessoas, e, integrando efetivamente, estar discutindo questões sociais, me envolvendo com essas questões sociais. (MA3) Acho que, claro, você pode colocar um cunho social. Acho várias coisas. O teatro, a arte pode ajudar, mas não é tão necessário ter uma função. Ela pode ser entretenimento, ela pode ser várias coisas. Mas ela pode ser, só. Ela é. Mais do que ter uma razão. Não precisa de uma razão. Não preciso falar qual a razão da arte. Não precisa ter uma função assim. (OF4)

Os três primeiros trechos destacados trazem implícita a ideia de que a arte por si só não

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