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5 VOZES QUE SE CRUZAM: DIÁLOGOS PARA FORMAR-SE E FORMAR NO

5.5 Práticas para instrumentalizar: perspectivas discentes e mediação

5.5.6 Teorias e temas da voz humana abordados no curso

5.5.6.1 Minha Voz, Minha Vida

5.5.6.1.4 As Características da Voz: Qualidade Vocal

Qualidade vocal é o termo técnico das características que identificam uma voz por meio de atributos que identificam o indivíduo. Antes se usava apenas a palavra “timbre”. As variações na qualidade vocal dizem respeito à produção da voz como um todo. São aspectos que podem modificar a voz de acordo com o contexto, as condições físicas e psicológicas da pessoa. Behlau e Ziemer (1988); Behlau et al.

(2001b) considera como principais dimensões que interferem na produção das diferentes qualidades vocais: a biológica, a psicológica e a socioeducacional.

A dimensão biológica diz respeito às características anatômicas e fisiológicas: sexo, idade, saúde geral, estrutura física geral e específica dos órgãos que formam o aparelho fonador, bem como a sincronia do funcionamento dos componentes da laringe entre si e com os demais órgãos. Exemplificando: na caracterização da voz na dimensão biológica, podemos pensar na frequência fundamental das vozes entre indivíduos de diferentes idades e sexos. O tamanho das pregas vocais influencia a movimentação, ou seja, à medida que o comprimento natural das pregas vocais aumenta, o som fica mais grave.

Desse modo, nos bebês recém-nascidos a frequência fundamental35 é bastante aguda, ao redor de 400HZ; em mulheres adultas a frequência média está em 200HZ; e em homens adultos, situa-se em 100HZ (BEHLAU, AZEVEDO, MADAZIO 2001). No controle de frequência da voz, pregas vocais alongadas vibram mais rapidamente e produzem um som mais agudo.

A dimensão psicológica fornece informações sobre a personalidade do indivíduo e o estado emocional no momento da produção da voz. São as impressões transmitidas pelo tipo de voz (BEHLAU, et al. 2001b). Como na intensidade36 forte ou fraca, no tom (a inflexão emocional aplicada à sua voz) uma expressividade do indivíduo e pode caracterizar seus aspectos emocionais: raiva (voz gutural, forte), medo (voz trêmula, fraca), sensualidade (voz soprosa, fraca).

A dimensão socioeducacional são os valores que são adquiridos de uma determinada cultura. Os parâmetros relacionados à qualidade vocal recebem influências expressando-se por meio do sotaque, dos regionalismos, de qualidades vocais que identificam grupos de indivíduos ou profissionais. Como a fala por meio de gírias que marca o tempo, o modo de vida e valores de um falante. Por exemplo, as falas que marcam o tempo e região... “Deixei de ser aquele cara joia que transava o amor no maior breu, curtindo adoidado. Nem tchum para as coisas do coração...” (RIBEIRO, 2007, p. 8). Uma pessoa nascida na região de Minas Gerais, mineira, é identificada quando fala: /uai só//, /Trem danado de bão/, /Belzonte/.

35 As pregas vocais quando vibram produzem ondas sonoras. A Frequência Fundamental (F) é o número de vibrações que as pregas vocais realizam em um segundo. A medida usada é Hertz (HZ). Alta frequência é um som agudo e baixa frequência é um som grave.

36 As ondas sonoras carregam energia. A Intensidade Sonora (I) mede a quantidade de energia que uma onda sonora é capaz de transferir a cada segundo em uma área de 1m². A medida usada é o Décibel (Db). Alta intensidade é um som forte e baixa intensidade é um som fraco.

Dessa maneira, a produção do som da voz apresenta uma correlação nas dimensões biológica, psicológica e socioeducacional. Assim, a voz sofre modificações segundo movimentos diferenciados das regiões anatômicas de cada indivíduo, sofre interferências emocionais, sociais, culturais, por isso não podemos ter uma voz padrão e que define a voz dentro de parâmetros como normal.

Considerando toda essa complexidade de relações, alguns pesquisadores e estudiosos da voz evitam usar o termo voz “normal” e usam o termo voz “adaptada”. Behlau, Azevedo e Pontes (2001) apresentam o seguinte conceito para a voz, justificando o uso do termo “adaptada” em substituição ao termo voz “normal”:

A voz deve ser produzida pelo falante, de modo adaptado, sem esforço adicional e com conforto, identificando corretamente o sexo e a faixa etária a que pertence; por outro lado, a voz deve ser adaptada ao grupo social, profissional e cultural do indivíduo, o que é definido pelos ouvintes, por consenso não necessariamente consciente (BEHLAU; AZEVEDO; PONTES, 2001, p. 65).

A produção da voz não apresenta um padrão definido, pois há um número de fatores e de modificações nesse processo. Mas desejamos que a voz seja agradável para os participantes do processo comunicativo: falantes e ouvintes. Usamos o termo subjetivo “agradável”, na área da fonoaudiologia, para o tipo de voz que passa a impressão ao ouvinte de que o falante não está realizando esforço, tensões ou transtornos durante a produção do som da voz e fala, ou seja, um som com uma boa adaptação às características do indivíduo e produzida sem dificuldades ou desconforto.

De acordo com Behlau, Azevedo, Pontes. (2001), um som dito de boa qualidade para os ouvintes é a eufonia, e o contrário é a disfonia. Desse modo, uma boa voz adaptada (normal) é aquela produção vocal:

• com uma qualidade aceitável socialmente;

• a produção não interfere na inteligibilidade da fala; • permite o desenvolvimento profissional do indivíduo;

• apresenta frequência, intensidade, modulação e projeção apropriadas para o sexo e a idade do falante;

• transmite a mensagem emocional do discurso.

Sendo a produção da voz um movimento de forças, podemos aceitar que a própria pessoa pode fazer mudanças na sua própria voz, ou seja, ela modifica os

parâmetros (tipo de voz, intensidade, frequência, ressonância...) que compõem a qualidade vocal. De acordo com Dragone:

o falante não percebe e comanda cada músculo intrínseco da laringe, mas tensões musculares, comandos respiratórios, capacidade de movimento das regiões envolvidas na articulação do som entre outros elementos são passíveis de serem observados e sentidos pelo falante, e a adequação desses padrões gera modificações nas diversas regiões envolvidas na produção da voz (DRAGONE, 2007, p. 58)

Dessa forma, a percepção de nossa voz falada pode ser trabalhada. Trabalhamos na formação do professor o autoconhecimento do corpo buscando a própria voz na própria experiência corporal, por meio de conhecimentos de compreensão de como o corpo funciona, a importância do processo respiratório, a produção da voz e o equilíbrio do corpo, que entre outros conhecimentos permite ao professor controlar elementos e comandos possíveis para a produção da voz de maneira mais consciente de limitações, potencialidades e produzir a sua melhor voz adaptada nos seus diversos contextos de discurso.