• Nenhum resultado encontrado

5 INDÍCIOS DE AUTORIA EM CINCO NARRATIVAS DE

5.4 AS CINCO NARRATIVAS

De acordo com a proposta do Paradigma Indiciário, o pesquisador deve sempre estar atento ao objeto de pesquisa, partindo do genérico para o particular, à procura de singularidades que possam revelar hipóteses explicativas para aspectos da realidade que não se mostram aparentes, mas que se percebem e se recuperam através de indícios e sintomas.

Como início de análise, inscreve-se agora os elementos principais de cada uma das cinco narrativas43, procedimento que busca situá-los como representativos de dados que se constituirão reveladores do que se pretende buscar: traços de autoria.

5.4.1 Primeira narrativa: Desencontros

O mais longo dos cinco textos, a narração é feita na terceira pessoa, o narrador está fora dos acontecimentos, mas é onisciente, isto é, tem ciência de tudo que acontece.

Cinthya, jovem advogada moradora da cidade de São Paulo, que perdeu os pais e uma irmã (sobrou apenas um irmão, mecânico de motos) em um acidente quando ainda adolescente, vira-se praticamente sozinha na grande metrópole.

Como profissional, defende um cliente – Kail Petersen – no tribunal, ganha o processo e, a partir dessa vitória, passa a ter um relacionamento afetivo com seu cliente, que a fará vivenciar momentos trágicos: Cinthya engravida de Kail e descobre, através da morte de seu irmão, que Kail e sua irmã gêmea Rebeca são espécies de vampiro.

O final é dramático e surpreendente: Cinthya mata Kail em situação bastante horripilante, é ferida durante a luta com Kail e é levada ao hospital por Rebeca, a irmã incestuosa; quatro anos depois, Rebeca vem buscar os descendentes vampiros – seus sobrinhos Ivan e Karine, os filhos gêmeos de Cinthya.

5.4.2 Segunda narrativa: Um monte atrás do monte

Texto narrado em primeira pessoa, destacando-se o narrador como personagem principal. Percebe-se o mundo do personagem através do seu relato sobre o maior acontecimento do ano – a festa da cidade, a realizar-se na Praça do Sol Poente. O narrador, ao iniciar o segundo parágrafo do texto, prepara a cena que irá se desenrolar: o aparecimento de nuvens maquiavélicas no céu, onde, ao contrário do sentido macabro da palavra usada para qualificar as nuvens, costuma acontecer o terceiro por-do-sol mais belo do mundo. Segue-se, então, o relato do surgimento de luzes estranhas, o que estabelece um pânico geral pelas possibilidades de uma invasão alienígena. Paralelo à descrição das luzes, o narrador envereda por divagações, apontando lembranças de pessoas e familiares.

Pretendendo ser dono de poder anormal, responsável pelo destino da população, o narrador atravessa a multidão que havia se reunido novamente após o desaparecimento das luzes (supostamente localizadas agora atrás dos montes) e tenta reagir contra os invasores. Vê, então, todos comemorando e, no céu, uma

frase, parabenizando a cidade pelo quadragésimo sexto aniversário; logo a seguir, desmaia. Acorda no hospital e, pela voz da enfermeira, fica sabendo que foi encontrado desacordado antes do início do show de “As Marcianas”...

5.4.3 Terceira narrativa: O fruto do eucalipto

Esse conto, narrado na primeira pessoa, centraliza um episódio na vida do narrador- personagem, que exerce papel fundamental nos acontecimentos. O protagonista, aos dezesseis anos de idade, viaja de férias para a casa de primos no interior do estado do Espírito Santo. Participa, então, da vida na roça, ajudando na plantação de mudas de eucalipto, contagiado pela alegria de rever Drácula, nome de seu cachorro que vivia na casa dos tios. A alegria transforma-se em tristeza profunda com a cena trágica do extermínio do cão. A partir daí, o enredo envolve o conflito do personagem com o sentimento de perda do animal de estimação. Iniciam-se, então, cenas fantásticas, marcadas por delírios, sugestão de uma cena de sexo, como também a fecundação de um eucalipto por sangue humano.

Após a suposta fecundação, o protagonista envolve-se em uma idéia fixa: o pé de eucalipto. O tempo passa, e agora, já como um adulto de 26 anos de idade, encontra-se internado e mostra-se louco: tem desejos de fuga, quer ardentemente ver sua árvore e morrer. Em vez da morte, o que consegue no final é uma cadeira de rodas, resultado de uma queda do alto dos oito metros de altura de seu querido eucalipto.

5.4.4 Quarta narrativa: O rio amaldiçoado

Assim como na segunda e na terceira narrativas, o texto acontece na primeira pessoa, sendo este o mais curto escrito da coletânea. Ao iniciar a narrativa, o personagem encontra-se em um trem a caminho do interior. Ao notar, olhando a paisagem, meninos brincando em um rio, seu pensamento volta ao passado e começa então uma outra narrativa – uma história de um garoto que havia se

afogado em um rio e que, após sua morte, seu espírito vagava em busca de vingança por não ter sido salvo.

Após esse relato, o personagem conta sua própria experiência em relação ao caso: certa vez, ao voltar com seus amigos do rio que costumavam nadar, ouvem um zumbido intenso, seguido de vento, originando uma forma humana de duas mãos, que perseguem o personagem e o sufocam; aparece, então, a visão do menino se afogando, restando no final apenas as mãos. O susto foi tanto, que o protagonista acorda somente no hospital, achando que havia morrido.

No final da narrativa, há um retorno ao início do texto: ele é acordado pelo bilheteiro do trem.

5.4.5 Quinta narrativa: Tormento

Narrado na terceira pessoa, o texto conta a história de Radegaz, assaltante viciado em drogas. Divide-se em três partes. Na primeira, o personagem é mostrado: seu passado exemplar, amigos, família; depois, o recente vício das drogas e o hábito do assalto – atitude mais freqüente – com um detalhe especial: a narrativa começa no dia do primeiro assalto a um banco. A cena dos momentos iniciais do assalto é contada, Radegaz é atingido e aponta a arma para um velho que havia deixado cair uma pistola.

A segunda parte é formada por quatro parágrafos constituídos de três narrativas distintas seguidas de um desfecho. São três histórias de delírios: um encontro com um anfíbio gigante que se confundia com o próprio Radegaz; a aproximação, em um ambiente desértico, de uma menina ainda viva mas em estado de putrefação e que, ao espirrar, o contamina; a inusitada tentativa de sexo em um banheiro onde se depara com uma linda mulher. Ao término dos três devaneios, o pensamento volta para sua vida antes da droga, lembrando-se de sua mãe e de Deus.

A parte três é um retorno à cena do assalto: Radegaz, ao encarar o pavor do velho, chora, sorri agradecido e morre.

Documentos relacionados