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As Concepções do Educador de Infância sobre a Familiarização da

2. Enquadramento Teórico

2.2. A Educação Pré-Escolar e a sua Importância na Sensibilização para a

2.2.2. As Concepções do Educador de Infância sobre a Familiarização da

Nas décadas de 70 e 80, iniciaram-se as investigações em torno da aquisição de competências de leitura antes do ensino formal da leitura, na educação pré-escolar. Segundo Alves Martins (1996) foram diversos os autores como Alegria e Morais (1979), Alegria, Pignot e Morais (1982), Berthoud-Papandropoulou (1978, 1980), Berthoud-Papandropoulou e Sinclair (1974), Bradley e Bryant (1978, 1983, 1985, 1991), Gombert (1990, 1992), Goswami e Bryant (1990), Lundberg, Frost e Petersen (1988), Morais, Alegria e Content (1987) entre outros, que realizaram trabalhos de investigação cujos resultados indicaram que a sensibilidade às rimas, a consciência da palavra, de sílaba e de fonema, antes do ensino formal da leitura, têm importância nos desempenhos em leitura durante os primeiros anos de escolaridade primária.

Fernandes (2004) menciona alguns estudos da década de 90, apresentados por Chard e Dickson (1999), Neilson, (1999) Neuman e Dickinson (2001), Silva e Alves

26 Martins (2002), Villalon e San Francisco (2001), Whitehurst e Lonigan (1998) destacaram as competências metalinguísticas (consciência e manipulação dos elementos da língua falada: fonemas, sílabas, palavras e frases), e estreitaram a relação entre essa capacidade de manipular os sons da fala - consciência fonológica e o sucesso na aprendizagem da leitura (p.66).

Também Whitehurst e Lonigan (2001), Fernandes (2000), Wagner, Torgesen e Rashotte (1994) citados por Fernandes (2004) referiram nos seus estudos que o conhecimento precoce das correspondências letra-som, em particular o nome das letras, é um bom preditor de sucesso nas tarefas de processamento fonológico e consequentemente no sucesso da aprendizagem da leitura e escrita (p.71). O conhecimento da relação entre a letra e o som só se consolida se as crianças contatarem com material impresso e manipularem diversas fontes. Gunn et al. (1998) refere que “A experiência partilhada com o educador que modela comportamentos de leitura desperta a consciência de que é o material impresso – e não as ilustrações – que «transporta» a informação.” (citado em Fernandes, 2004, p.71).

Por outro lado, autores como Chaveau (1991), Chaveau e Rogovas-Chaveau (1989), Downing (1987), Downing e Fijalkow (1984), Downing et al. (1982), Kroll (1983), Wells (1981, 1985), citados por Alves Martins (1996), vieram demonstrar que além das capacidades metalinguísticas, os conhecimentos que as crianças têm sobre as utilizações funcionais da leitura e a apropriação que delas fazem, desempenham um

papel importante na aprendizagem da leitura (p.21). Alves Martins (1996) apresenta também um estudo empírico de sua autoria,

onde o objetivo era perceber a relação existente entre um conjunto de conhecimentos e de representações sobre os objetivos e a natureza da tarefa de ler, no início do ensino formal – 1.º ano de escolaridade e os resultados em leitura no final do 1.º ano de escolaridade. Entre várias conclusões destacamos a que confirma que o conhecimento e apropriação das funcionalidades da leitura, por parte das crianças, tem fortes relações com a aprendizagem da leitura. Isto porque os dados revelaram que as crianças que no início do ano letivo, já possuíam um projeto pessoal de leitor (querendo aprender a ler para…), tiveram resultados superiores em leitura no final do ano letivo, em comparação com as crianças que não reconheciam qualquer interesse ou prazer na leitura (p.205).

Embora sejam resumidos os estudos aqui mencionados, fazem parte de um universo de investigações cujo objetivo foi relacionar variáveis como a consciência fonológica; o conhecimento da linguagem escrita; o conhecimento sobre as utilizações

27 funcionais da leitura; o conhecimento sobre os objetivos da tarefa de ler, com a aprendizagem da leitura. São estudos importantes, na medida em que revelam que o trabalho lúdico desenvolvido no contexto pré-escolar ou no familiar, em torno da linguagem oral, da linguagem escrita e da construção de um projeto pessoal de leitor contribuem para o desenvolvimento de competências de leitura e consequentemente para o sucesso na aprendizagem da leitura na escolaridade primária.

No entanto, interessa-nos particularmente a literatura que retrate o paradigma do desenvolvimento das competências de leitura na educação pré-escolar através da exploração de livros infantis e neste âmbito Wells (1988 – 1991), citado por Mata (2004), desenvolveu um estudo onde identificou num grupo de crianças, uma associação da frequência de leitura de histórias, aos conhecimentos de literacia dessas crianças aos 5 anos e a sua compreensão da leitura aos 7 anos (p.96). Além deste estudo, Mata (2004) refere um trabalho de Sénechal e LeFévre (2001) onde foi identificada uma associação entre os hábitos de leitura e o vocabulário aos 5 anos e alguns anos mais tarde, com os níveis de leitura no 3.º ano de escolaridade (p.96).

Podemos ainda referir outras abordagens recentes e fundamentadas no contexto português, sobre o processo de apreensão de competências de leitura, por parte das crianças. São vários os autores que referem que o processo de aquisição de competências de leitura não se concretiza apenas quando se inicia o ensino formal da leitura, nem quando já se domina um conjunto de técnicas da leitura, mas muito antes quando se inicia, no dia-a-dia, o contato com material impresso.

Alves Martins e Neves (1994) defendem a ideia de que se as crianças ouvirem ler coisas que lhes interessem e lhes proporcionem momentos de prazer, vão desejar ser elas próprias leitoras, construindo um projeto pessoal de leitor:

As crianças têm de começar por descobrir a funcionalidade da leitura, ou seja, perceber que esta é uma forma de comunicação, tomar consciência da variabilidade de objectivos da leitura (da leitura de contos e histórias à leitura de cartazes e notícias) e da sua relação com as diferentes formas de ler (leitura em voz alta, leitura silenciosa, leitura atenta, leitura em diagonal) e construir um projecto pessoal de leitor (quero aprender a ler para ler histórias, para conhecer mais coisas sobre um dado assunto) (p.20).

28 Em 1997, surgiram, em Portugal, as Orientações Curriculares para a Educação Pré- Escolar, cujo objetivo foi criar “pontos de apoio” para a prática pedagógica dos educadores, visando uma melhoria da qualidade da educação pré-escolar. Este documento deu os primeiros passos para a sensibilização dos profissionais de educação de infância quanto à importância dos conhecimentos emergentes de leitura e escrita na educação pré-escolar. Encontra-se neste documento um conjunto de propostas de atividades, estratégias e atitudes do educador que promovem nas crianças o gosto e interesse pela leitura e escrita.

Nas Orientações Curriculares (2002), as referências à leitura aparecem de soslaio no Domínio da linguagem oral e abordagem à escrita, no entanto são referidas coisas muito importantes, tais como “É através dos livros, que as crianças descobrem o prazer da leitura e a sensibilidade estética.”; “As histórias lidas ou contadas pelo educador, recontadas e inventadas pelas crianças, de memória ou a partir de imagens, são um meio de abordar o texto narrativo que, para além de outras formas de exploração, noutros domínios de expressão, suscitam o desejo de aprender a ler.”; e “O modo como o educador lê para as crianças e utiliza os diferentes tipos de texto constituem exemplos de como e para que serve ler.” (p.70). Assim como, incentivam os profissionais a frequentar espaços biblioteca com as crianças, no sentido de diversificar as experiências e vivências relacionadas com os livros.

Passada uma década da publicação deste documento, certamente muitos profissionais mudaram as práticas pedagógicas no âmbito da promoção de conhecimentos de literacia. Assim como, outros profissionais continuaram a investigação sobre o desenvolvimento de competências precoces de leitura nas crianças. Mata (2008) refere mais um estudo de sua autoria, realizado em 2006, onde ficou reforçada a ideia de que existem benefícios associados à prática de leitura de histórias, tanto ao nível das concepções emergentes da literacia como da aprendizagem e desenvolvimento de competências de leitura (p.78)

Do mesmo modo que Cerrillo (2006) afirma que em pleno início do século XXI ninguém contesta a necessidade de expandir o hábito leitor a um número alargado de pessoas, porque já se percebeu que a prática habitual da leitura traz benefícios ao nível do desenvolvimento pessoal, da facilidade para compreender o mundo e dos instrumentos para a crítica e capacidade de comunicar com os outros em diversos contextos (p.35).

29 Na tentativa de um entendimento sobre o que são as concepções dos educadores apresentamos um breve resumo de acordo com alguns autores que encontrámos em Marques (2011) num estudo recente: Cassidy e Lawrence (2000) referem que “as concepções ou crenças dos educadores e professores são suposições implícitas sobre os alunos, a aprendizagem, as salas de aula, as estratégias de ensino, o currículo, a pedagogia e o programa educativo.” (p.22). Assim como consideram que as crenças dos professores são concebidas com base na experiência direta, antes de qualquer informação fornecida por fontes externas, tais como cursos universitários, bibliografia específica ou formação contínua.

Segundo Tseng e Ivanic (2006) as crenças dos professores são influenciadas pelas suas vivências sociais, políticas e culturais. Também Wang et al, (2008) referiu que essas crenças atravessam o conhecimento dos professores e afetam o seu comportamento na sala de aula. Ou seja, as crenças que os professores e educadores desenvolvem são importantes porque através delas vão apreender, processar e interpretar a informação dos contextos educativos onde atuam, influenciando a tomada de decisões e determinando o seu comportamento na sala de aula (citado em Marques, 2011, p.22).

Brown, Molfese e Molfese (2008) reforçam a ideia de que os objetivos de um professor, do que pretende atingir com seus alunos na sala de aula estão enraizados na sua opinião/crença; tal como, foi constatado por McMullen et al (2006) num grupo de educadores que a forma como organizavam a sala e as rotinas estabelecidas estavam claramente associadas às suas concepções (citado em Marques, 2011, p.22).

Relativamente às concepções dos educadores face à familiarização das crianças com a leitura, durante a educação pré-escolar, Moniz (2009) refere que estudos realizados nesse âmbito demonstram que os educadores consideram que o processo de abordagem à leitura deve ser iniciado no contexto pré-escolar. Neste sentido, a autora supra referida mencionou um estudo de Santos (2007) em que os educadores questionados consideravam que “as crianças devem compreender para que serve a leitura e a escrita, observando e experimentando situações onde os atos de ler e escrever tenham objetivos explícitos e sejam significativos” (p.67).

Outro estudo interessante é o de Marques (2011) onde o objetivo era caraterizar as concepções de um grupo de educadores acerca da aprendizagem da literacia na educação pré-escolar e verificar a relação com a sua prática. Os resultados obtidos indicaram que existia relação entre as concepções dos educadores e a sua prática. Pois

30 os educadores que revelaram concepções holísticas (orientadas para uma perspectiva de literacia emergente) desenvolviam mais atividades de literacia emergente e referiram mais objetivos relacionados com a literacia (o gosto pela leitura, o envolvimento em tarefas de escrita e a compreensão das funcionalidades da escrita), tal como revelaram uma maior sensibilidade para os aspetos do ambiente físico e emocional. Enquanto que os educadores que apresentaram concepções mais tecnicistas (orientadas numa perspectiva tradicional da aprendizagem da linguagem escrita) demonstraram que a sua prática era direcionada para as habilidades de ensino direto. Parece assim, existir uma coerência entre as concepções dos educadores questionados sobre a forma como as crianças adquirem competências de literacia e os objectivos que consideram prioritários estarem presentes na abordagem à leitura e à linguagem escrita em educação pré- escolar.

É importante realçar que neste último estudo referido, além do tempo de carreira e experiência direta, evidenciaram-se mais duas componentes que influenciam as concepções e as práticas dos educadores, são elas, a formação contínua e os hábitos de leitura pessoais (Marques, 2011, p.59)