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inexistência de atividades econômicas na área) reivindicando a divisão da área entre produtores rurais sem

3 PERMANÊNCIA E ABANDONO DOS LOTES NO ASSENTAMENTO

3.2 AS DIFERENTES TRAJETÓRIAS FAMILIARES DO ASSENTAMENTO MACALI

A ideia inicial da pesquisa dessa Dissertação estava centrada numa observação empírica da pesquisadora com relação ao abandono dos lotes no assentamento. De fato, constatava-se que muitas das famílias que receberam lotes no projeto de assentamento não residiam mais no mesmo. No entanto, essa era apenas uma observação “empírica” e, para aprofundar o estudo, era preciso apurar a veracidade dessa observação.

Assim, uma das primeiras etapas desse estudo foi a realização de uma pesquisa no Registro de Imóveis de Ronda Alta/RS. Essa pesquisa objetivou verificar quais dos produtores rurais que faziam parte do assentamento em 1998, ainda possuíam a propriedade da terra em 2017. A pesquisa foi realizada entre os dias 30 de novembro e 01 de dezembro de 2017. Os dados coletados nas matrículas de cada lote foram posteriormente tabulados nas planilhas do software MS Excel.

De imediato, ao estudar mais atentamente os dados, a primeira observação que deve ser feita refere-se ao número de famílias, pois aa lista fornecida pelo INCRA, continha um nome a mais. Ora, das 57 famílias informadas na lista do INCRA, um nome estava repetido (em um lugar estava o nome, e em outro o apelido), então na verdade a amostra consiste em 56 famílias que estavam no assentamento em 1998 no momento em que esse se transformou em assentamento federal. O Gráfico 1 a seguir trata da situação da patrimonial dos lotes em 2017, tendo por base a lista de moradores do ano de 1998 e, desta forma, fornecendo um panorama sobre a evolução da situação patrimonial dos lotes do assentamento.

Gráfico 1 − Situação da propriedade dos lotes do assentamento Macali I em 2017 - Ronda Alta/RS (2017)

Fonte: Elaborado pela Autora, com base nos dados coletados no Cartório de Registro de Imóveis de Ronda Alta/RS, entre março e dezembro de 2017.

O Gráfico 1 logo acima contribui para revelar alguns elementos a respeito de quais foram as diferentes trajetórias percorridas pelas famílias que compunham originalmente o assentamento em 1998, em relação à propriedade do lote. Com efeito, em 2017, como a imagem do Gráfico 1 denota, se 55% das famílias ainda possuíam a propriedade do lote, o que, em números absolutos, significava um contingente de trinta e um proprietários; outros 34% das famílias não possuíam mais a propriedade do lote no assentamento, ou seja, um total de dezenove das cinquenta e seis famílias que residiam originalmente no assentamento em 1998. Da mesma forma, observa-se que, em 2017, 7% das famílias havia vendido o lote parcialmente, ou seja quatro famílias; enquanto que, os 4% de registros não encontrados corresponde a dois moradores que estão na lista, mas não foi possível localiza-los nos dados do Cartório de Registro de Imóveis. Por fim, cumpre ressaltar que, 41% das famílias que estavam no assentamento em 1998, se desfizeram total ou parcialmente da área de terras que possuíam na ocasião.

No ano de 1998 - o qual marca o ponto de partida desse estudo com relação as trajetórias familiares - o assentamento Macali I já possuía dezenove anos de história. De fato, atentando para essa situação, logo surge mais uma segunda indagação: qual era a origem dessas famílias? Será que todas elas eram fundadoras do assentamento? Assim, de posse dessa lista original, quando se iniciou a segunda etapa da pesquisa de campo – a qual objetivava entrevistar informantes-chaves pra analisar a trajetória histórica do assentamento - foi então

55% 34%

7% 4%

Possui a propriedade Não Possui

adicionada uma nova questão nos roteiros metodológicos com o intuito de descobrir quais dos assentados eram compradores e quais deles eram fundadores. O resultado dessa análise foi interessante, como se observa no Gráfico 2, apresentado a seguir:

Gráfico 2 – Origem dos agricultores que faziam parte do assentamento no ano de 1998

Fonte: Elaborado pela Autora com base nos dados da pesquisa (2018).

No ano de 1998, das 56 famílias que faziam parte do assentamento, conforme lista do INCRA, 56% eram compradores, 27% eram fundadores e 14% haviam feito permuta de outro assentamento. Entende-se como “compradores” aquelas famílias que compraram o lote e o termo “fundadores” é usado para designar aquelas famílias que residem no assentamento desde a sua ocupação em 1979. Da mesma forma, o termo “permuta” refere-se a aqueles assentados, que fizeram troca do lote, ou seja foram assentados em outros projetos, e trocaram o lote recebido naquele projeto por um lote na Macali. Assim, quando o ponto de análise é a ligação dos agricultores com assentamentos as porcentagens de permuta e fundadores podem ser somadas. Sendo assim pode-se afirmar que 41% dos moradores do assentamento em 1998, possuíam origem ligada ao MST.

Por outro lado, na Tabela 2 a seguir, foram cruzados os dados do Gráfico 1 e 2, relacionando a situação da propriedade em 2017 e a origem do produtor.

27%

14% 59%

Tabela 2 – Situação da propriedade versus origem do produtor

Propriedade em 2017

Origem do produtor

Total Fundador Permuta Comprador

Possui 7 1 23 31

Não Possui 6 5 8 19

Parcial 2 1 1 4

Sem Registro 1 1 2

Total 15 8 33 56

Fonte: Elaborado pela Autora (2018).

De acordo com as informações do Gráfico 1, 55% dos proprietários de lotes do Assentamento Macali I de 1998 ainda possuíam a propriedade em 2017. Isso representa trinta e um proprietários de um total de cinquenta e seis. Desses trinta e um proprietários, sete deles são assentados fundadores. Assim, se somarmos a esses sete fundadores, outros dois que venderam parcialmente o lote, então pode-se supor que nove das sessenta e seis famílias que foram assentadas no ano de 1979 ainda continuam possuindo a propriedade do lote em 2017. Essa constatação é de suma importância para a problemática desta pesquisa e comprova, de forma científica, a observação empírica da pesquisadora mencionada anteriormente, de que várias das famílias assentadas originalmente não possuíam mais, nos dias atuais, a propriedade do lote.

Entretanto, a informação de que, em 1998, havia trinta e três dos agricultores que eram “compradores” pode gerar uma dúvida. Afinal, qual a evidência de que esses trinta e três “compradores” eram de fato agricultores familiares? Bem, um ofício do INCRA nº 212 do ano de 1992, o qual trazia orientações sobre a conversão dos assentamentos em projetos federais, ressaltava que a aprovação dos projetos estava condicionada a vistorias “in loco” quanto a forma de organização dos lotes no assentamento para verificar se a distribuição da terra atende os princípios de propriedade familiar (INCRA, 1992). Igualmente, os entrevistados por diversas ocasiões relataram que, antes da titulação dos lotes, era preciso residir no local, pois caso contrário era possível perde-los. Essa restrição acabava atraindo para compra dos lotes, famílias com características inerentes à agricultura familiar e, certamente, dispostas a residir nos lotes do Assentamento.

Além disso, é importante ressaltar que, o projeto de Assentamento previa uma capacidade de 66 famílias e, na realidade, apenas 56 famílias foram beneficiadas, sendo assim subentende-se que, naquele momento, 10 lotes já não se enquadravam na condição de propriedade dos agricultores familiares. Essa suposição é igualmente confirmada ao confrontar a quantidade de hectares do projeto original e a quantidade de hectares tabulada

pela pesquisa realizada no Cartório de Imóveis. Ora, no projeto original a área do assentamento era de 1066 hectares e a soma da área dos lotes registrados no Cartório de Imóveis foi de apenas 881 hectares. A diferença entre essas duas áreas, equivale a 184 ha. Se multiplicarmos a diferença de lotes (10), pela área media dos lotes de (16,5), tem-se uma quantidade de 165 ha, um valor aproximado aos 184 ha. Portanto, pode-se mais uma vez subentender-se que, alguns lotes, no momento da conversão em Assentamento federal, não foram incorporados ao Assentamento, por não se enquadrarem nas características de agricultura familiar.

Finalmente, deve-se ressaltar que, o trabalho de campo buscou entender o por quê dessa realidade. Afinal, porque quase quatro décadas transcorridas na história do Assentamento apenas nove famílias ainda possuem propriedade nos lote. O texto que segue continuará discutindo essa questão; no entanto, será feito um parêntese no próximo item, para abordar o que aconteceu antes de 1998, que pode ter influenciado a elevada comercialização de lotes que aconteceu antes do assentamento se tornar federal e ser incorporado ao INCRA.