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Os alunos docentes, nas entrevistas, foram questionados sobre as dificuldades que enfrentam para desenvolver o trabalho matemático com seus alunos. Atribuíram a dificuldade dos alunos às suas próprias dificuldades em relação à Matemática, embora por motivos diferentes. Keila, Juliane e Letícia creditam suas dificuldades ao fato de não gostarem de Matemática.

Eu não sei se é porque eu tenho dificuldade, meus alunos também têm. Tenho dificuldade de passar a lógica da matemática, porque eu não gosto da disciplina. Eu sempre fugi da Matemática, então na hora de explicar eu sinto dificuldade... (Keila, UniB).

Eu, nunca tive interesse em ler nada sobre a Matemática. Eu não gosto de Matemática. Eu trabalho, mas já comentei com a dona da minha escola que eu não gosto da matéria, por isso eu deixo a desejar. (Juliane, UniA).

Não sou fã da Matemática. Se eu pudesse optar na educação infantil por uma disciplina, eu escolheria Português, porque eu gosto muito mais de Português do que Matemática. (Letícia, UniA).

Pelo exposto, podemos supor que elas podem não gostar da disciplina porque não compreendem os conteúdos matemáticos. Entre as categorias de conhecimentos necessários para o professor desenvolver o seu trabalho docente propostas por Shulman (1986), o conhecimento do conteúdo da disciplina, isto é, a compreensão do professor sobre os conceitos a serem ensinados merece destaque, porque, como ensinar as operações aritméticas para os alunos, por exemplo, se elas não compreendem as regularidades do sistema de numeração decimal?

Natália (UniD), também declarou não gostar da disciplina. Analisando sua resposta, pode-se atribuir essa rejeição a um trauma que tem em relação à Matemática.

Não sei se é porque eu tive um trauma quando ainda estava no ensino básico. Não sei se era por causa dos professores, que às vezes não tinham paciência para ensinar. Eu acho que para ensinar Matemática você tem que ter muita paciência, porque cada uma aprende de um jeito, cada um tem um raciocínio diferente.

No entanto, disse gostar de ensinar Matemática. Para Gonçalvez e Brito (2001), “as atitudes dos professores têm grande influência nas atitudes de seus alunos e em seu desempenho. Professores hostis, impacientes e que não possuem domínio do conteúdo podem influir no surgimento de atitudes negativas em seus alunos” (p. 225).

Vanessa (UniB), Cristina (UniD), Maria (UniC) e Antônio (UniC) demonstraram

não sentir preconceito em relação à Matemática. Disseram gostar da disciplina, mas revelaram dificuldades em trabalhar com ela por questões pessoais ou familiares dos alunos. Vanessa disse gostar da disciplina, mas assim mesmo com ressalvas:

Gosto, mas como eu já disse, não é uma coisa que me chama a atenção. (Vanessa, UniB)

Cristina (UniD) disse gostar de Matemática, mas explicitou suas dificuldades em relação ao conhecimento do conteúdo e da didática do conteúdo.

A minha maior dificuldade às vezes é a falta do conhecimento de conteúdo para passar para eles [...]. Sei o que os alunos deveriam saber, o que eles deveriam estar aprendendo, mas às vezes eu fico em dúvida em como passar os conteúdos para eles. Me falta a didática de ensino. (Crisitna, UniD)

Lee Shulman (1986), defende que os professores não devem entender somente o conteúdo da disciplina que lecionam, mas também os porquês, além de conhecer o arcabouço teórico que fundamenta o conteúdo da disciplina e deter os conhecimentos para ensinar, isto é, os meios que utiliza para favorecer a aprendizagem dos seus alunos. Para o autor, esses conhecimentos não são excludentes, porque “ter somente o conhecimento do conteúdo das matérias é tão inútil pedagogicamente como ter apenas habilidades pedagógicas sem saber bem as matérias” (p. 8). Entretanto, o professor não terá uma única fonte de informação para compreender melhor o conteúdo e desenvolver as práticas docentes, mas, sim, múltiplas, como afirma Tardif (2002).

Maria (UniC) credita suas dificuldades ao ensino tradicional que recebeu à época da educação básica e ao fato de seus alunos serem muito novos. Porém, disse que seus alunos são receptivos às propostas de atividades, mesmo com baixo nível de concentração, o que é normal para crianças da faixa etária com a qual trabalha. No entanto, ela procura superar suas dificuldades fazendo cursos na área de Matemática.

Gosto. Tenho dificuldades porque eu estudei no ensino tradicional, então eu tenho algumas dificuldades. Agora eu trabalho com crianças pequenas. [...] Tenho facilidade com eles porque eles são abertos a toda atividade que você dá. Agora a concentração delas é pequena. (Maria, UniC)

Antônio (UniC) atribui suas dificuldades para trabalhar com os alunos a fatores externos, principalmente os familiares e acredita que as crianças têm familiaridade com a Matemática porque ela faz parte do seu cotidiano.

São vários os fatores, na verdade. Mas a questão familiar é o principal. A Matemática se torna um pouco fácil para criança de 1ª a 4ª série por conta de elas terem um contato mais direto com o número, então não há tanta dificuldade. As questões do comportamento, da atenção, da concentração, interferem no trabalho matemático.

Foi solicitado a ele exemplificar melhor esse “contato mais direto com o número”.

Ele acompanha a mãe em uma compra, acompanha a mãe na feira, para comprar bala, ele utiliza o dinheiro, ele utiliza a conta de menos, de mais, da subtração ele precisa ver quanto vai sobrar ou faltar. Essas coisas são o contato mais direto com o número. É mais palpável.

Na resposta desse aluno docente há indicações de que ele faça relações entre a Matemática da escola e a “Matemática da vida real” (Lins, 2004, p.93), pois considera as atividades do cotidiano dos seus alunos, como fazer compras, receber troco, como fatores que podem favorecer a compreensão dos conceitos de adição e subtração, por exemplo.

Podemos depreender, dos depoimentos dos entrevistados, que o desenvolvimento do trabalho matemático em sala de aula pode estar comprometido pela fragilidade dos seus conhecimentos acerca do conteúdo e do pedagógico do conteúdo da Matemática.

O conhecimento didático53 do conteúdo adquire particular interesse porque identifica os corpos dos conhecimentos distintos para o ensino. Representa a mescla entre matéria e didática, porque se leva a uma compreensão de como determinados temas e problemas se organizam, se representam e se adaptam aos diversos interesses e capacidade dos alunos e se expõem para o ensino. (SHULMAN, 2005, p.11)

No caso desses sujeitos, gostar ou não da disciplina pode ser considerado como fator secundário. Pelas observações realizadas durante a pesquisa há similitudes no desenvolvimento do trabalho matemático desses alunos docentes.

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