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AS DINÂMICAS NATURAIS E SUA DEGRADAÇÃO PELAS DINÂMICAS

No documento DISPERSÃO, FRAGMENTAÇÃO E PAISAGEM (páginas 78-89)

2.2. CONCEITOS

2.2.4. AS DINÂMICAS NATURAIS E SUA DEGRADAÇÃO PELAS DINÂMICAS

2.2.4. 2.2.4.

2.2.4. AS DINÂMICAS NATURAIS E SUA DEGRADAÇÃO PELAS DINÂMICAS URBAAS DINÂMICAS NATURAIS E SUA DEGRADAÇÃO PELAS DINÂMICAS URBAAS DINÂMICAS NATURAIS E SUA DEGRADAÇÃO PELAS DINÂMICAS URBAAS DINÂMICAS NATURAIS E SUA DEGRADAÇÃO PELAS DINÂMICAS URBANASNASNASNAS FUNCIONAMENTO

FUNCIONAMENTO FUNCIONAMENTO FUNCIONAMENTO

A urbanização dispersa e fragmentada ocupa naturalmente, pelas suas características processuais, extensas áreas não urbanizadas, sejam elas campos, bordas de matas, vizinhanças de alagados, charcos, manguezais, etc. Muitas vezes esse processo de ocupação é responsável por expressivas alterações das dinâmicas naturais pré3existentes, mas em outra tantas, acaba atuando pela sua conservação, ainda que de modo não intencional. Tal fato seria impossível em um processo de urbanização tradicional, compacta e extensiva, típica no país até o final do século XX.

Por meio desses processos são conservadas as dinâmicas naturais presentes em diversos fragmentos e corredores florestais, fato este ainda consolidado pelas exigências das leis de proteção florestal, tais como as Áreas de Preservação Permanentes (APP) urbanas e rurais.

Fragmentos significativos de matas entremeadas por áreas urbanizadas no vetor oeste da RMSP. Loteamentos São Paulo 2 (à direita) e Residencial Golf Village (à esquerda)  Cotia – SP. Condomínios verticais no empreendimento Tamboré. Santana de Parnaíba  SP

Para conceituar essas dinâmicas, é aqui adotada a definição de sistema natural feita por Forman (2014), que o considera como sendo “a estrutura e funcionamento da natureza”. Natureza, por sua vez, é definida pelo autor como aquilo que não foi produzido ou fortemente alterado por seres humanos, sendo composta pelo ar, solo, plantas, animais

e/ou micróbios127. Considerando diferentes graus de interação com as áreas urbanizadas,

Forman subdivide os suportes para os sistemas naturais em quatro tipos distintos de espaços:

• as áreas construídas – locais urbanizados que podem comportar pequenos espaços cobertos com vegetação, tais como canteiros, arborização viária e jardins residenciais;

• áreas verdes criadas pelo homem – parques e praças urbanos, por exemplo;

• áreas verdes seminaturais 3 definidas como pequenos ou grandes espaços que se parecem com áreas naturais, mas foram alteradas de forma significativa pelo homem, às vezes mesclados com espaços construídos. Por exemplo: uma trilha ecológica na mata;

• áreas naturais – aquelas sem plantio e sem manejo ou uso intenso pelo homem, tais como as florestas de áreas afastadas dos centros urbanos.

Para leitura tanto das dinâmicas naturais quanto das urbanas, serão aqui adotadas as ferramentas definidas pelo autor em Landscape Ecology128, por meio das quais se trabalha

o entendimento da paisagem como um mosaico de usos, no qual distinguem3se espacialmente três arranjos bidimensionais: matrizes, corredores e manchas.

O autor define manchas como os elementos mínimos compositivos da paisagem, compostas por áreas que apresentam um padrão que as diferem dos elementos circundantes. Matrizes são os maiores e mais conectados elementos, que exercem papel dominante no funcionamento da paisagem. E os corredores são definidos como estreitas faixas de uso do solo que diferem da matriz em ambos os lados.

127(FORMAN, 2014, p. 7, tradução nossa) 128(FORMAN, 1986)

Em primeiro plano, Serra do Japi, em Jundiaí  SP. Área desempenha papel de matriz florestal.

Fragmentos florestais próximos à rodovia Raposo Tavares, em Cotia – SP

Corredores florestais decorrentes da implantação de loteamentos no Município de Cotia – SP Os mosaicos de usos são caracterizados pelos seguintes elementos:

• Estrutura – refere3se aos componentes espaciais e seus arranjos;

• Função – refere3se aos fluxos, movimentos e interações presentes na água, animais, pessoas e transporte;

(a) a (c) Tipos de matrizes, manchas e corredores. (d) a (f)  Características dos mosaicos da paisagem. Montagens do autor com base em Forman (2014, p. 45).

Tais características são intimamente conectadas, de modo que uma estrutura determina em muito as funções e, reciprocamente, o funcionamento altera ou pode criar estruturas. Ambas, por sua vez, podem provocar condições de mudança que alterarão tanto funcionamento quanto estrutura. Juntamente, tais relações entre essas características compõem um ciclo de retroalimentações, no qual todos esses elementos se afetam mutuamente.

Tanto as dinâmicas naturais quanto as urbanas se manifestam por meio de fluxos, movimentos e transporte pelo espaço129. Existem quatro tipos de fluxos e movimentos

129 (FORMAN, 2014, p. 65)

mais importantes em áreas urbanizadas: de ar, de água, por locomoção própria, e por locomoção com motores que utilizam fontes externas de energia. Alguns deles são verticais, como as chuvas, evapotranspiração, quedas de árvores e sucessão ecológica. Outros são horizontais, geralmente cruzando espaços heterogêneos e conectando diferentes usos do solo e habitats. Estes podem ser exemplificados pelos ventos, escoamento superficial e subterrâneo de águas, polinizações, dispersão de semestres, erosão, sedimentação, movimentos de animais e migrações. Diferentemente de diversos fluxos relacionados ao homem, os fluxos naturais são frequentemente curvilíneos. A medição dos fluxos e movimentos pode ser realizada por meio de três parâmetros130:

• direção 3 em dinâmicas de metapopulações, por exemplo, os movimentos das

espécies tendem a ir das manchas grandes para as pequenas;

• rota 3 um corredor verde funciona como via preferencial para circulação da fauna; • taxa ou quantidade – os movimentos ao longo de um corredor verde crescem com

o grau de conectividade que o mesmo estabelece e também em função da sua maior largura.

Aplicando esses conceitos em uma abordagem projetual, observa3se que os corredores se constituem como os condutores mais eficientes de fluxos e movimentos, comparativamente à articulação de manchas com finalidades ambientais (chamada de

stepping stones ou trampolins ecológicos).

DEGRADAÇÃO DEGRADAÇÃO DEGRADAÇÃO DEGRADAÇÃO

Os conflitos entre dinâmicas naturais e urbanas ocorrem por meio de processos de perturbação, que são definidos por Forman como eventos que causam uma significativa mudança em um ecossistema ou área urbana131. Esta, por sua vez, pode ser subdividida

em três tipos: cíclica (como as marés, por exemplo), esporádica (um incêndio, uma enchente, um terremoto) e aquela intensa a ponto de fazer um sistema não conseguir retornar ao seu estado inicial. Muitas das alterações promovidas pela urbanização de

130 (FORMAN, 2014, p. 70)

áreas anteriormente naturais enquadram3se nesse último tipo de perturbação, no qual as antigas formas de vida existentes no local são substituídas por outras, mais tolerantes às novas condições urbanas.

O autor menciona que os graus de perturbação das dinâmicas naturais em função das dinâmicas urbanas podem ser lidos por meio do modelo espacial denominado gradiente rural3urbano132. Para exemplificá3lo, Forman o subdivide nas seguintes situações

recorrentes (e mais pertinentes às paisagens norte3americanas), classificadas em ordem decrescente de perturbação: centro da cidade, cinturão de bairros mais distantes, subúrbio interno, subúrbio externo, áreas periurbanas, áreas agrícolas e áreas naturais. A partir de situações como essa, podem ser elaborados gráficos que evidenciem o valor de um indicador de qualidade de um recurso natural (tamanho das manchas vegetadas, por exemplo) em função da distância do centro urbano.

Gráficos de gradientes ecológicos para a cidade de Phoenix, Arizona – Estados Unidos. No gráfico à esquerda, temse no eixo y o tamanho médio das manchas agrícolas, de deserto e residenciais em hectare e no eixo x a distância percorrida em km em uma secção oesteleste na cidade. Percebese a queda de áreas desérticas em direção ao centro da cidade. No mapa à direita é medida a variação do tamanho nessas mesmas manchas. Percebese aumento quando realizado deslocamento semelhante ao anterior tanto para a para as manchas de deserto quanto de urbanização e redução da mancha agrícola.

Dentro desse modelo, Forman considera que, de diversos modos, os subúrbios e as áreas periurbanas133 são as zonas de maior tensão entre o rural e o urbano e onde os conflitos

132 (FORMAN, 2014, p. 43)

133 O autor define como periurbanas as áreas que contêm algumas das estruturas típicas das áreas urbanas, sendo localizadas próximas à mancha metropolitana contínua, e suburbanas como sendo as áreas residenciais de baixa densidade, caracterizadas pela dependência do transporte por automóvel.

entre dinâmicas naturais e urbanas se mostram mais presentes134. Embora se aplique de

um modo mais direto às paisagens norte3americanas, tal modelo se mostra bastante pertinente à abordagem deste trabalho em função de o recorte de estudo abranger justamente a área de transição entre o urbano e o rural, com as figuras definidas pelo autor como periurbano e suburbano.

Considerando o gradiente urbano rural, os impactos das dinâmicas urbanas nas dinâmicas naturais são classificados por Forman de acordo com cinco processos espaciais principais:

• perfuração (criação de buracos);

• dissecação (fatiamento, criação de faixas ou tiras de largura constante); • fragmentação (quebra em pedaços);

• encolhimento (redução do tamanho); • desaparecimento (perda ou eliminação)

Processo de desaparecimento, dissecação, perfuração, fragmentação e encolhimento de fragmentos florestais. Fonte: Forman, 1996.

134 (FORMAN, 2014, p. 39)

Processos de fragmentação, dissecação e perfuração de florestas na Serra da Cantareira – São Paulo. Fonte: Google Earth 2014

Considerando esses processos aplicados a uma área de transição entre o densamente urbanizado e as áreas naturais, observa3se normalmente que:

• Os processos de perfuração e dissecação predominam nas porções iniciais da modificação de uso do solo decorrente da urbanização.

• A fragmentação e o encolhimento são mais recorrentes na fase intermediária da ocupação urbana. As áreas agrícolas, vilarejos, áreas urbanas e corredores de transporte costumam ser os primeiros fragmentadores das áreas naturais.

• O encolhimento e desaparecimento predominam nas áreas em que a urbanização se encontra mais consolidada.

Em geral, as perdas de habitat (desaparecimento), a degradação (redução da qualidade ambiental) e a fragmentação (fracionamento em pedaços) decorrentes da expansão urbana ocorrem, em sua maioria, nas áreas agrícolas e, secundariamente, nas áreas naturais, visto que estas últimas costumam ser protegidas por legislações de cunho ambiental.

A degradação diretamente em áreas naturais costuma ocorrer de forma mais intensa quando há redução do estoque de áreas originalmente agrícolas a serem incorporadas para fins de urbanização. Essa degradação em áreas naturais causa impactos ecológicos

mais graves por não ocorrer uma transição dos níveis de perturbação dos habitats inerente à implantação prévia de áreas agrícolas.

Segundo o autor135, existem 3 fases sequenciais que caracterizam a degradação ambiental

por meio do processo de urbanização em áreas periurbanas:

1) Fase dos padrões de vida selvagem alterados Fase dos padrões de vida selvagem alterados Fase dos padrões de vida selvagem alterados Fase dos padrões de vida selvagem alterados –––– fase inicial, na qual ocorre: • Introdução de alguns poucos núcleos urbanizados;

• Alteração significativa das rotas, padrões de movimento e distribuição das formas de vida selvagem com o avanço da urbanização;

• Abertura de vias locais;

• Aumento do tráfego de veículos;

• Maiores níveis e distúrbios de ruído resultantes.

2) Fase da metapopulação e interrupção das águasFase da metapopulação e interrupção das águasFase da metapopulação e interrupção das águasFase da metapopulação e interrupção das águas – fase intermediária, na qual ocorre: Fauna e flora

• Fragmentação e redução notáveis dos habitats136 existentes em propriedades rurais; • Degradação de muitas manchas de vegetação seminatural;

• Redução do tamanho das populações;

• Interrupção e rompimento dos movimentos da vida selvagem pelas áreas residenciais e pelo tráfego das vias;

• Proliferação de metapopulações137, em que geralmente pequenas populações de uma espécie são isoladas em diferentes locais e apenas ocasionalmente os indivíduos são bem3sucedidos em suas tentativas de deslocarem3se entre esses locais;

• Flutuação em tamanho das populações e ocorrência de hibridações genéticas; • Aumento da probabilidade de uma pequena população desaparecer (extinção local);

135 (FORMAN, 2014, p. 322), tradução nossa.

136 Metzger define de forma mais abrangente o processo de fragmentação de habitats, considerandoOa “uma modificação da estrutura da paisagem onde há perda de habitat nativo, formação de fragmentos isolados e aumento das áreas de contato, as chamadas bordas, entre ambientes nativos e áreas de uso humano”. METZGER, Jean P. Uma visão global da fragmentação. Revista Página 22. Edição 5. 01.02.2007. Disponível em: http://www.pagina22.com.br/index.php/2007/02/umaOvisaoOglobalOdaOfragmentacao/. Acessado em: 12.02.2015

137 Segundo o conceito de Richard Levins (1969), metapopulação é o conjunto de subpopulações interconectadas que funcionam como unidade demográfica. CaracterizaOse por uma dinâmica na qual uma população fragmentada em um conjunto de subpopulações reduz sua possibilidade de extinção em manchas por meio de recolonizações provenientes das manchas vizinhas (Cf. LEVINS, R. Some demographic and genetic consequences of environmental heterogeneity for biological control. Bulletin of the Entomological Society of America 15:237–240. 1969).

• Difusão de animais relacionados a atividades humanas, como os ratos, em função da abundância das fontes de alimento nas proximidades das casas;

• Decréscimo da biodiversidade de espécies nativas;

• Difusão e crescimento de espécies não nativas em quantidade. Águas

• Aumento das superfícies impermeáveis; • Aumento das enchentes locais;

• Redução da qualidade das fontes de água subterrâneas pelos sistemas sépticos, se existirem, ou contaminação por esgoto;

• Poluição de lagoas e córregos;

• Degradação da diversidade dos habitats dos córregos; • Estreitamento do curso de alguns córregos;

• Redução das raras áreas naturalmente inundáveis; • Irrigação artificial de jardins e gramados;

• Poluição dos solos por resíduos químicos provenientes dos usos residenciais, somando3se àqueles dos rurais.

Urbanização

• Redução notável das áreas agrícolas;

• Ampliação dos empreendimentos residenciais; • Construção de novas estradas;

• Aumento do tráfego.

Essas mudanças nas características das áreas periurbanas catalisam tanto a aceleração quanto a proliferação das mudanças ecológicas.

3) Fase da dispersão de habitatFase da dispersão de habitatFase da dispersão de habitatFase da dispersão de habitat – fase da urbanização consolidada, na qual ocorre: Fauna e Flora

• Encolhimento ou desaparecimento da maioria das áreas seminaturais;

• Persistência das metapopulações com poucas manchas e pouco movimento entre elas; • Risco de extinção na área de muitas pequenas espécies;

• Redução da biodiversidade de espécies;

• Abundância das espécies não nativas e difusão das espécies invasoras; • Difusão dos animais atraídos pelo lixo gerado pelos seres humanos;

• Encolhimento e eliminação das manchas seminaturais pelos empreendimentos; Águas

• Redução da largura do curso da maioria dos córregos, com perda dos habitats correspondentes;

• Canalização de alguns cursos d’água; • Aumento das enchentes locais;

• Poluição de todos os corpos d’água devido, sobretudo, a contaminações pelos esgotos; • Escassez e risco de poluição do sistema de águas dos núcleos urbanizados;

• Transformação das áreas rurais remanescentes em manchas abertas. Urbanização

• Predominância das áreas construídas;

• Aumento de áreas impermeáveis, resultando em aumento das ilhas de calor e do escoamento de águas superficiais e inundações locais;

• Congestionamentos frequentes das vias locais;

• Cobertura da área por rede de transporte coletivo (muitas vezes, precariamente, no caso brasileiro);

• Surgimento de uma estrada principal, atendendo tanto aos moradores locais quanto ao tráfego de passagem.

Apesar dos diversos conflitos citados, inerentes às interfaces das dinâmicas naturais com as dinâmicas urbanas, existem linhas de pesquisa que consideram possíveis abordagens conciliatórias entre elas138 e serão detalhadas a seguir.

No documento DISPERSÃO, FRAGMENTAÇÃO E PAISAGEM (páginas 78-89)

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