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Mapa 6- Bacia platina

3. As práticas políticas: do governo Vargas no período de 1930 a 1945

3.2. As elites políticas na Primeira República

Durante a primeira experiencia republicana (1889-1930), poucos decidiram sobre a política mato-grossense. Os “mandões” da República foram Generoso Ponce e Joaquim Murtinho, depois, Pedro Celestino Corrêa da Costa e Antônio Azeredo. Eles comandaram as oligarquias e decidiram sobre os rumos do estado (ARRUDA, 2015; CORRÊA FILHO, 1969 e 1951; FANAIA, 2010; FRANCO, 2017; MENEZES, 2007; CORRÊA, 2006). Nesse período, os Müller, os Ponce, os Corrêa da Costa, Barbosa Martins, Villasbôas e Figueiredo foram educados e tiveram a juventude marcada pelos conflitos entre os seus

49“Na avaliação deste quadro, que se configurava como uma ameaça à longa tradição de domínio político, social e cultural do norte do estado [Cuiabá], os jornais cuiabanos expressaram, não raro, sentimentos de medo e angústia. Para alguns, o progresso da região sul parecia anunciar, inclusive, com a força de uma fatalidade, com o impulso irresistível das leis naturais, a decadência de Cuiabá e até mesmo, a perda da sua condição de capital. Por ironia da história, parte desta “fatalidade” era vista como resultado da construção de ferrovias em território mato-grossense, transformando o já velho sonho dourado que embalara gerações de mato-grossenses em um amargo pesadelo” (GALLETI, 2000, p.306-7). A partir da década de 1940, a via de transporte entre Cuiabá e o Rio de Janeiro pôde ser feita por avião (Jucá, 1998).

50 Conforme Antônio Antero Paes de Barros, Delegado fiscal do Estado de Mato Grosso em Guajará-Mirim- MT em 1934, a região era descolonizada, isolada e depende de Manaus. Alguns queriam se anexar ao Amazonas, outros ao Acre. Fonte: CPDOC, FM 36.02.12 chp/MT Pasta III, Correspondência de Antônio Antero para Filinto Müller.

parentes no poder, sofreram perseguições e perdas, sobretudo desfrutaram das vantagens da sua posição social. Nesse sentido, o objetivo dessa parte é destacar o posicionamento político dos grupos perante os conflitos das oligarquias.

O período pode ser dividido em dois: o primeiro entre 1889 a 1917, quando as oligarquias envolveram o estado em movimentos armados nas suas disputas pelo poder. Os maiores conflitos foram em 1892, 1899, 1906, no último o governador Antônio Paes de Barros foi assassinado. Os três confrontos foram promovidos por Generoso Ponce e Joaquim Murtinho, nos episódios de 1892 e 1906 estiveram unidos e em 1899 confrontaram-se. Depois de 1911, a disputa passou a acontecer entre Pedro Celestino Corrêa da Costa e Antônio Azeredo, que resultou no conflito armado de 191651, levando o governo decretar intervenção federal em 1917.

O segundo período, entre 1918-30, após a intervenção federal, Pedro Celestino e Antônio Azeredo compreenderam que ou se uniriam para mandar em seu estado ou teriam de suportar o presidente Wenceslau Brás e outros governadores interferindo nas decisões estaduais. Apesar dos conflitos menores e a violência persistirem, todos os governadores conseguiram terminar o seu mandato: Dom Aquino Corrêa, Pedro Celestino Corrêa da Costa, Estevão Alves Corrêa, Mário Corrêa da Costa, exceto Aníbal de Toledo devido à Revolução de 1930 teve o seu mandato interrompido. (CORRÊA FILHO, 1969 e 1951; FANAIA, 2010; FRANCO, 2017; MENEZES, 2007; CORRÊA, 2006).

51 No ano de 1916 as relações entre o Executivo e Legislativo estadual passaram por contínuos atritos. Os deputados estaduais, apoiados pelo senador Antônio Azeredo acusaram o governador Caetano de crime de responsabilidade, em contrapartida, o governador mandou prender os deputados. Os representantes do Legislativo solicitaram habeas corpus e a Assembleia passou funcionar protegida pelo Exército (MENDONÇA, 1974a). A Assembleia pretendia processar o governador, mas em julho de 1916 foi ocupada por milícia privada. O ápice das hostilidades ocorreu quando o Hotel Cosmopolita foi invadido, onde se hospedavam deputados do Partido Republicano Constitucional- PRC, favoráveis a Azeredo (ALVES, 2002; MENDONÇA, 1974a). A Assembleia transferiu-se para a cidade de Corumbá e em 06 de novembro de 1916, os deputados aprovaram por unanimidade perda de mandato do governador Caetano, sendo o 2º vice empossado em Corumbá. Diante do impeachment, o governador conseguiu habeas corpus para manter-se no governo do estado, gerando duplicidade de governo – em Cuiabá e Corumbá. Enquanto isso, desde julho os dois grupos lutavam. De um lado, os coronéis do PRC e trabalhadores da Companhia Mate Laranjeira. Do outro lado, a favor do governo estadual, forças compostas por seringueiros, garimpeiros e usineiros sob o comando de José Morbeck e Palmyro Paes de Barros. No Rio de Janeiro, após intervenção do senador Azeredo o presidente Wenceslau Brás decretou a intervenção federal em 10 de janeiro de 1917, assumindo o interventor federal Camilo Soares. Após a experiência da intervenção, os atores políticos começaram a tecer um acordo para as eleições em novembro de 1917. Segundo Alves (2002), depois de algumas indicações dos dois partidos, o PRC indicou Dom Aquino Corrêa. O religioso católico detinha prestígio no estado e apoio do Partido Republicano Paulista- PRP, do mineiro Antônio Carlos R. de Andrade e do presidente da República. Entretanto, em Mato Grosso a candidatura sofreu oposição dos partidos, dos protestantes, espíritas, membros dos cultos afros, da loja maçônica Acácia de Cuiabá. Diante dessa situação, Dom Aquino informou ao presidente da República que só assumiria se Pedro Celestino e Antônio Azeredo concordassem (ALVES, 2002), o que aconteceu.

Ponce foi um líder de considerável influência, mas, perdeu o predomínio político quando em 1899 ousou enfrentar Joaquim Murtinho, que contava com apoio do governo Campos Salles. (FANAIA, 2010; FRANCO, 2017). Cumpre destacar que, para o Mato Grosso, Campos Salles não permitiu que a política dos governadores se realizasse, pois Ponce era quem mantinha o apoio da maioria. Ainda assim, o presidente da República não se importou com o uso da violência por Antônio Paes de Barros para impor o predomínio de seu ministro Joaquim Murtinho na política estadual (ARRUDA, 2015).

Quando ambos políticos faleceram em 1911, Pedro Celestino e Azeredo passaram a disputar o comando do estado. Antônio Azeredo interferia em seu estado mesmo morando no Rio de Janeiro, do mesmo modo que Joaquim Murtinho o fez. Isto porque, Azeredo e Murtinho detiveram recursos sociais e políticos advindos de posição estratégica no governo federal (MILLS, 1975) e aproveitaram as relações federativas desequilibradas da Primeira República para se projetar politicamente em seu estado natal. O senador Azeredo tinha prestígio e participava dos arranjos políticos nacionais, mas não teve mesma influência do senador gaúcho Pinheiro Machado52, por exemplo. Machado

teve ampla esfera de atuação política e Azeredo estava subordinado aos interesses paulistas. (CARONE, 1970; LOVE, 1975).

Como os herdeiros consanguíneos de Ponce eram jovens em 1911, Pedro Celestino assumiu a liderança estadual e foi um dos mais relevantes líderes locais. Segundo Queiroz (1977, p.88) o meio de ascensão do coronel não necessariamente envolveu a transmissão do cargo por herança, ou seja, o pai coronel passar o posto de chefia ao filho.

Pedro Celestino foi uma liderança com esfera de influência estadual relevante, mas não manteve a rede de apoio tanto quanto Ponce. A partir do governo de Costa Marques 1911-1915, o grupo poncista se cindiu (Corrêa da Costa/Azeredo, entre outros) e o governador aderiu ao grupo de Azeredo, do Partido Republicano Conservador- PRC. Pedro Celestino criou o Partido Republicano Mato-Grossense – PRMG em 1913. (CORRÊA, 2006; CORRÊA FILHO, 1945; 1969). Além do mais, a própria oligarquia Corrêa da Costa se dividiu. Pedro Celestino indicou seu sobrinho Mário Corrêa da Costa para governadoria mato-grossense, que elegeu sem precisar sair de seu consultório

52 O senador gaúcho “[...] era o homem mais poderoso do Senado entre 1905-15” (LOVE, 1975, p.147; p.157). Controlava a eleição legislativa federal de 17 estados, menos de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Além disso, teve papel significativo na presidência de Hermes da Fonseca, pois o próprio presidente admitiu que governou com sua ajuda.

médico no Rio de Janeiro. Tempos depois, Mário rompeu com o tio e fundou seu próprio partido, o Partido Democrata Mato-Grossense.

O rompimento dos Corrêa da Costa levou ao reposicionamento dos demais políticos. O deputado estadual Júlio Frederico Müller, pai de Filinto Müller, apoiou o governador Mário Corrêa da Costa ao assinar moção de repúdio a Pedro Celestino na Assembleia (MENDONÇA, 1974a). Do mesmo modo, seu filho Fenelon Müller, havia sido nomeado prefeito de Cuiabá pelo governador.

Mas, os sulistas tiveram outro entendimento sobre a cisão. Em Aquidauana, José Alves Ribeiro, o coronel Jejé, apoiava Pedro Celestino. Como também, Eduardo Olímpio Machado53, já que tinha sido escolhido por Pedro Celestino vice-governador de Costa Marques em 1911. Outro aliado, Demosthenes Martins, tinha estabelecido aliança com os celestinistas, também exerceu cargos por nomeação pelo “chefe” Pedro Celestino e permaneceu leal mesmo quando Mário Corrêa da Costa tentou cooptá-lo.54

Estava, porém, já desenhada a divergência entre o Presidente Mário Corrêa e o Coronel Pedro Celestino, uma surpresa que a todos deixava estarrecidos, pois aquele fora guindado ao governo pelo prestígio deste que além do mais era seu tio e sempre foram amigos. (MARTINS, s/d, p.77).

Outro apoiador de Celestino, Arnaldo de Figueiredo tinha uma relação de lealdade pessoal para com Pedro Celestino, quando eleito governador (1947-1950) executou medidas de clara influência de seu antigo mentor político. Por exemplo, tinha a compreensão da relevância de colonizar o Sul do estado e enfrentar o monopólio de terras da Companhia Mate Laranjeira. Esses exemplos evidenciam a importância de Pedro Celestino para as futuras lideranças, sobretudo, sua influência e liderança sobre os sulistas.

Pedro Celestino, manteve apoio de vários líderes, mas na década de 1920 estava na oposição. Não estava sozinho, a Primeira República cada vez mais foi questionada e oposição cresceu, especialmente no governo Bernardes (1922-1926). O presidente foi

53 O governador Antônio Paes de Barros havia nomeado Eduardo O. Machado juiz de Nioaque-MS, mas com conflito de 1906 e a morte do governador, teve que se exilar no Paraguai e perdeu o cargo. Em 1911, Pedro Celestino o nomeou juiz novamente e recebeu vencimentos retroativos. (LINS, 2010).

54 Demosthenes conseguiu ser advogado com apoio do coronel Jejé e outros celestinistas. Como não tinha recursos para cursar Direito, a saída foi prestar um exame em Cuiabá para obter licença de advogado provisionado. Martins ficou um tempo na capital estudando e contou com apoio financeiro dos celestinistas e também com orientação sobre o exame da parte do presidente do Tribunal de Justiça, o desembargador Joaquim P. Ferreira Mendes. Foi admitido. Tempos depois, Pedro Celestino o convidou para ser intendente de Bela Vista. Quando Mário Corrêa da Costa assumiu governo estadual lhe ofereceu um cargo melhor, coletor de rendas em Aquidauana, mas não aceitou. (MARTINS, s/d).

eleito apesar de várias manifestações de desapreço, mas contava com apoio dos governos de São Paulo e Minas Gerais. Os protestos, devido à vitória de Bernardes, tiveram uma proporção que, pela primeira vez na história, um presidente assumiu sob estado de sítio, prorrogando-o por quase todo seu mandato. (CARONE, 1977).

Os mato-grossenses também se posicionaram sobre os acontecimentos do país. O deputado estadual João Villasbôas foi o líder da Reação Republicana no estado, movimento que promoveu a candidatura de Nilo Peçanha à presidência, que também concorreu naquela eleição. Com a vitória de Bernardes continuou fazendo oposição. Na rebelião tenentista de 1922 e 1924, o tenente Filinto Müller integrou as fileiras insurretas. Em Mato Grosso, Villasbôas, junto as lideranças do Sul, Vespasiano Barbosa Martins, Arlindo Gomes e Eduardo O. Machado foram simpatizantes. (ABREU, et al, 2010; LINS, 2010; LEITE, 1992).

Outro momento de demarcação de posições políticas foi na eleição de 1930. Em Cuiabá apenas 11 pessoas votaram na Aliança Liberal de Getúlio Vargas, entre elas, Pedro Celestino e Júlio S. Müller. (NEVES, 2001a). No Sul, Vespasiano B. Martins foi candidato pela Aliança à prefeitura de Campo Grande e não foi eleito. (MARTINS, 1989). Demosthenes Martins foi fiscal da eleição representando a Aliança, em suas palavras “[...] eu me alistara juntamente com numeroso contingente de eleitores locais, seguidores da liderança do Senador Pedro Celestino, o único parlamentar mato-grossense que apoiara aquelas candidaturas.” (MARTINS, s/d, p.90, grifo nosso). Os sulistas sob liderança de Pedro Celestino se mantiveram na oposição.

Durante a revolução de 1930, de acordo com o governador desposto Aníbal de Toledo, não ocorreu luta em Mato Grosso. (MENDONÇA, 1974a). Segundo o militar Souza (2010), o Sul estava preparado para tomar parte na luta, sob a chefia do tenente- coronel Antonino Mena Gonçalves, que vinha do Rio Grande do Sul com armamentos para iniciar o combate. Mas quando Mena Gonçalves estava no percurso, a Revolução triunfou. Segundo Lins (2010) Vespasiano Barbosa Martins, Machado, Gomes apoiaram da Revolução 1930. Demostenes Martins (s/d) ressalta que mantinha ligação com general Flores da Cunha em Uruguaiana-RS e acompanhava os preparos para a Revolução.

Um ponto de destaque da Primeira República, é que neste momento crescia a percepção que o governo estadual tratava as regiões de forma diferente. Segundo Corrêa (2006), como política estadual estava tão fechada e reservada aos cuiabanos que os coronéis do Sul começaram a propagar a ideia de criação de um novo estado para seu mando exclusivo. Porém, não existia um movimento organizado atuando em prol da

divisão, havia sim insatisfação e o desejo da separação. (BITTAR, 2009). Além disso, segundo Queiroz (2006) na década de 1920, tornava-se nítido os efeitos positivos da ferrovia na cidade de Campo Grande, com o crescimento econômico e populacional. Consequentemente, os cuiabanos se sentiram ameaçados, pois acreditavam que a mudança da capital era uma ameaça real desde o governo de D. Aquino (1918-1922), de acordo com um documento divisionista.55 (GALETTI, 200).

Outro fator relevante, a população de Mato Grosso estava aumentando. O censo publicado em 1937, aponta o crescimento entre 1872 a 1920 do estado e uma leve diminuição da população da capital. O quadro mostra que o número de habitantes quadriplicou no período. Mas Cuiabá teve uma perda pequena de população. É possível que tenha havido uma migração para as cidades sulistas, tornando-as mais populosas.

Quadro 1- População de Mato Grosso e da Capital 1872- 1920 Ano Mato Grosso Cuiabá

1872 60.417 35.987

1890 92.827 17.815

1900 118.025 34.393

1920 246.612 33.678

Fonte: APEMT56

A intenção nessa exposição foi mostrar a formação dos grupos políticos em disputa, sobretudo a união deles conforme interesses comuns, não existindo uma suposta polaridade na qual os mato-grossenses devido ao local de nascimento não poderiam lutar juntos em determinada causa ou movimento político. A composição dos grupos continha indivíduos provenientes de diversos locais e ocorreu conforme seus objetivos comuns. A liderança do cuiabano Pedro Celestino motivava os sulistas.

Outro ponto relevante, no período da Primeira República, duas formas se distinguiram de atingir o predomínio estadual. Uma baseada na manutenção da maioria das lideranças locais através de uma rede de lealdades pessoais. Como nos casos de Generoso Ponce e Pedro Celestino. O outro modo foi através de ocupação de cargo público em âmbito federal. Nos casos de Joaquim Murtinho e Antônio Azeredo.

55A autora mostrou o tom preconceituoso de documento de dois deputados sulistas, em 1912, que afirmaram que os nortistas seriam “... uma raça degenerada, contaminada pelo amarelão, incapaz de qualquer progresso, ao passo que o sul está sendo povoado por uma raça forte de aventureiros gaúchos que no futuro deverá dominar o Estado de Mato Grosso.” (apud Galetti, 2000, p.266).

Mato Grosso era frágil na Federação, nesse sentido, a capacidade do político demonstrar ter apoio do presidente da República importava. Dito de outra forma: “[...] em nosso Estado, não são os partidos que apoiam o governo e sim o governo que apoia os partidos ... Todos e tudo depende dos favores do governo.”57

A disputa ocorria pelo apoio do governo federal, especialmente de 1930-45 e em menor medida posteriormente. Então, o relativo prestígio e acesso aos recursos possibilitados pelo cargo em âmbito federal de Joaquim Murtinho, Antônio Azeredo e Filinto Müller se converteu em direito de mando sobre o estado. Mas, os dois primeiros tiveram apenas que combater líderes os carismáticos58 citados, em uma configuração institucional favorável ao seu domínio. Filinto Müller teve intensas possibilidades garantidas pela ditadura do Estado Novo, mas, após 1945, enfrentou diferente contexto de Murtinho e Azeredo.

3.3- Anos Vargas: 1930-1937

A década de 1930 foi marcada pela instabilidade política e uma das razões foi a composição heterogênea da aliança revolucionária. Formada tanto pelos oligarcas, como o gaúcho Borges de Medeiros (CASTRO, 1980) e os mineiros Arthur Bernardes e Antônio Carlos (BOMENY, 1980), mas também pelos tenentes, que foram perseguidos pelo ex-presidente Bernardes. Após a Revolução, dois grupos com propostas diferentes se formaram e entraram em oposição. De um lado, os tenentes acreditavam que o Brasil precisava de centralização contra as forças regionais e assim promover a integração do país.59 (CARONE, 1976a). As oligarquias regionais dos estados mais fortes esperavam a permanência do arranjo federativo anterior, especialmente a manutenção da autonomia

57 Carta de João Ponce para Filinto Müller. Fonte: CPDOC, FM 33.04.02 chp/MT Pasta II, 20/04/1934. 58 Conforme Queiroz (2006, p.176), “A liderança coronelística, que era sempre uma liderança econômica, e uma liderança de parentelas, assumia além de tudo um aspecto nitidamente carismático, pois o escolhido (fossem quais fossem o tipo de escolha e as razões de sua ascensão social) só chegava a grande chefe se apresentasse aquela inexplicável qualidade que despertava a adesão afetiva e entusiasmada dos homens, levando-os espontaneamente a obediência, qualidade que concorria para reforçar a solidariedade interna do grupo.”

59Intelectuais como Oliveira Vianna, Francisco Campos, Alberto Torres e Azevedo Amaral (2002) compartilhavam dessas convicções. Os autores criticaram a Primeira República (LAMOUNIER, 2006), o “artificialismo da Constituição” de 1891, pois as instituições deveriam ser inspiradas pela análise das condições sociais e políticas do país, e não transplantadas do exterior, desconsiderando a história nacional. Durante a década de 1930, o Federalismo, Liberalismo, Eleições, Parlamento, Partidos, Democracia foram considerados inautênticos para o povo brasileiro. Além disso, para Torres (1938) um ponto crítico era a manutenção da unidade nacional, ameaçada devido ao tamanho e a diversidade do país. Esses autores tentaram demonstrar como o transplante de instituições promoveria um descompasso entre as leis e a realidade (o Brasil “legal” e o Brasil “real”). Defendiam a centralização e o corporativismo (VIANNA, 1939). Viram a Revolução de 1930 com entusiasmo, mas consideraram a Constituição de 1934 um empecilho, seria apenas em 1937 que se completariam as mudanças.

estadual. (GOMES, 1980).

O governo Provisório mediou essas disputas e também implantou medidas para desmontar a configuração anterior, com o sistema de interventorias. Inicialmente, os interventores nomeados eram indivíduos de fora dos estados e militares. Depois, conforme as pressões locais, o governo nomeou elementos vinculados às elites, mas sem força política, aqueles com “pouca biografia” (SOUZA, 1990). Outra providência tomada foi restringir autonomia dos municípios por causa de sua situação de “desorientação administrativa”, de dívidas, “falta de métodos racionais” e lócus do coronelismo. Os interventores nomeavam e demitiam prefeitos. Também foram criados órgãos para supervisioná-los, como os conselhos60, mais tarde o Departamento das Municipalidades61. Em suma, a política de “tutela municipal.” (LEAL, 2012).

Além disso, o Código Eleitoral de 1932, através do decreto nº 21076, introduziu medidas necessárias para melhorar o processo eleitoral, que continha vícios62. A Justiça

Eleitoral foi criada, com responsabilidade de alistar os eleitores, apurar resultados e proclamar os eleitos, antes o processo era controlado pelos mandões locais. O voto passou a ser sigiloso e as mulheres conquistaram o direito de votar.

Em Mato Grosso, intensas disputas ocorreram por essa razão 10 pessoas assumiram o governo estadual até 1937. Os interventores/governador assistiram à oposição formar uma coalização de forças a fim de retirá-lo do Executivo estadual e nenhum deles permaneceu no cargo por período maior que dois anos e quatro meses. Os grupos em disputa foram: os Müller aliados aos Ponce, o grupo dos liberais liderado por Villasbôas, o grupo de Mário Corrêa da Costa e o grupo dos sulistas liderado por Vespasiano B. Martins. Os conflitos ocorreram em consequência da falta de consenso sobre as regras do jogo (DOGAN e HIGLEY, 1998), os políticos as questionaram e desrespeitaram princípios democráticos. Tanto foi assim que entre 1930-37 ainda houve ameaça de levantes armados e contestações aos resultados eleitorais.

60 Decreto nº 19.398 de 11/11/1930, que também dissolveu as câmaras municipais e assembleias.

61 Órgão estadual, que dava assistência aos municípios e os coordenava conforme os planos estaduais, fiscalizando-os na execução de seus orçamentos e opinava sobre medidas administrativas. Dependia do interventor. (LEAL, 2012).

62 O compromisso coronelista garantia a estabilidade do sistema e a votação importava pouco (CARVALHO, 1997; QUEIROZ, 1976). A oposição não competia nas mesmas condições da situação, se por ventura um oposicionista fosse eleito, a Comissão de Verificação de Poderes poderia negar seu diploma para posse no cargo, o processo conhecido como “degola”. Também existiu fraudes nas apurações. (LEAL, 2012).

Algumas características desse momento até 1937 lembram a Primeira República no que se refere aos confrontos e falta de coesão63. Entretanto, havia diferenças como a

crescente centralização64 e os confrontos armados não foram tolerados, as tropas federais estavam nas eleições para coibir violência. Vargas e seus ministros mediaram uma

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