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ANEXO I Vista aérea da sede da associação de assentamentos e

1.5 As estruturas da Conaterra: organização, produção e comercialização

1.5.2 As estruturas de produção e de comercialização da Conaterra

No que perpassa o “caminho percorrido” pelas sementes produzidas em regime agroecológico, desde a saída do lote dos produtores até o consumidor final, buscamos mapear os processos de beneficiamento que ocorrem dentro da Conaterra. O esboço que visualizaremos a seguir é composto de cinco imagens que foram coletadas durante nossa pesquisa de campo e que tem como objetivo demonstrar esse “caminho” da semente.

Encontro Nacional da Rede Bionatur Assembléia da Conaterra (a cada 3 anos) Direção Administrativa Conaterra (gestão de 2 anos) Conselho Fiscal (mandato de 2 anos)

Reunião dos Coordenadores dos Grupos dos Agricutores

(2 a 3 por ano) Grupo de Agricultores do Assentamento (reunião mensal) Grupo de Agricultores do Assentamento (reunião mensal)

Fonte: Elaboração do pesquisador a partir do arquivo pessoal do entrevistado P7.

A primeira imagem trata do processo de pesagem das sementes pelo produtor no seu próprio lote, após o processo de colheita. As sementes in natura, depois de colhidas e pesadas, chegam de diferentes formas até a cooperativa, podem ser levadas pelo produtor, coletadas pela cooperativa ou até enviadas pelo correio, no caso especifico de produtores que não residem em regiões próximas.

Após a chegada da semente na sede da cooperativa, ocorre o processo de beneficiamento que consiste na seleção das sementes, armazenamento e processo de embalagem. A seleção das sementes é realizada mecanicamente, como pode ser visto na segunda imagem, quando ocorre a separação das impurezas e classificação das sementes. Concomitante ao processo de seleção das sementes acontece o processo de amostragem de qualidade, que mede as taxas de umidade e de germinação. Esse processo de amostragem não ocorre na cooperativa, mas em um laboratório especializado na cidade de Bagé.

“É tudo centralizado aqui, o coração da Bionatur é aqui, e lá tem grupos de produção, a Bionatur não trabalha com agricultor individual, trabalha tudo com grupos. Nós temos grupos de produtores em Candiota, Hulha Negra, Pinheiro Machado, Piratini, Herval, Canguçu depois lá em Viamão, depois

na região das Missões, perto de Santa Rosa, São Miguel das Missões, Itacurubi. Em Guapé – Minas Gerais, tem 49 famílias. O assentamento é lá, aí o pessoal produz e vem pra cá. A logística às vezes é meio maluca, mas ela funciona, porque a semente você pega 20 quilos e fraciona em gramas. Vem in natura de lá, vem o volume sujo, ainda com muita impureza, e aqui que é feito o beneficiamento, toda classificação, todo o empacotamento e comercialização, tudo por aqui, ai a partir daqui que vai pra origem, isso vem via transportadora, correio, o produtor manda lá e aí faz todo o beneficiamento aqui” (Entrevista com P1 – Agosto de 2014).

Enquanto não se tem o resultado da amostragem, as sementes ficam armazenadas em tambores plásticos, como demonstrado na terceira imagem, com um número de série. Após a obtenção do resultado de amostragem o produto começa a ser embalado em sache ou em latas. A questão do armazenamento em tambores com número de série trata-se de uma estratégia para minimizar riscos, evitando a contaminação de sementes de boa qualidade com sementes de baixa qualidade e também funciona como uma demarcação de origem do produto possibilitando a identificação do produtor que entregou uma semente de baixa qualidade.

O armazenamento ocorre da seguinte forma: o produtor entrega sua produção e ela recebe um número de série. Enquanto a semente é beneficiada uma amostra está sendo testada em outra cidade, apenas depois do teste de amostragem, e se o resultado for positivo para uma alta qualidade, a semente é embalada e o produtor recebe seu pagamento. Em caso de amostragem negativa como uma alta taxa de umidade ou baixa taxa de germinação, o produto é descartado.

“Tem uma peleia pelo capital de giro, o produtor normalmente entrega a semente e depois de 3 meses, 4 meses ele recebe, e as vezes nem comercializou ainda essa semente, ele tem a semente do ano anterior pra ser vendida” (Entrevista com P1 – Agosto de 2014).

A comercialização ocorre de maneiras distintas. Como já descrito, o maior consumidor das sementes agroecológicas produzidas pela Conaterra e comercializadas sob a marca Bionatur é o Estado, que age por meio da CONAB, que por sua vez, adquire as sementes por meio do PAA, desde sua implementação em 2011, e pelo Banrisul, que as adquire pelo programa de responsabilidade socioambiental. Há também a venda direta ao varejo.

“A Bionatur tem uma estrutura legal, se você é o nosso cooperado você tem que ser o tal do produtor, onde você entregou 10 quilos de rúcula, ai nós

vamos e tiramos a nota dos 10 quilos, trazemos para o beneficiamento. Essa semente é beneficiada é mandada para análise de germinação, aí logo em seguida é feita a compra, tá com germinação ok, a semente está ok para comercializar é feita a compra, aí que nós vamos pagar você, por exemplo, se o quilo de rúcula está 30 reais aí nós vamos te pagar o referente aos 10 quilos. A partir daí a gente pega ela e transforma em saches em gramas, 2 gramas, 5 gramas ou uma lata de 100 gramas, 500 gramas ou 1 quilo. Aí tem um consumidor aqui em Bagé que quer comprar, aí ele liga ou manda e-mail pra Bionatur, dizendo que tem interesse, nós mandamos nossa lista de variedades e aí através disso ele escolhe, eu quero rúcula, repolho, acelga, quero sache, quero lata, faz o depósito bancário aí a gente envia por transportadora, por correio” (Entrevista com

P1 – Agosto de 2014).

Outro fator que particulariza a comercialização das sementes agroecológicas produzidas na Conaterra é a ausência da figura de “atravessadores”, tanto na relação entre os produtores e a cooperativa, como entre a cooperativa e o consumidor final. Essa afirmação ganha destaque na fala do entrevistado A, ao explicar sobre quem intermedia a relação com o consumidor final.

“Até que a gente saiba não [sobre a existência da figura do atravessador], já houve, quando a gente viu a gente estava vendendo para um atravessador, ele comprava de nós a R$ 1,50 e vendia a R$ 4,00 no mercado, e nós nem estávamos sabendo disso, quando ficamos sabendo ligamos educadamente e explicamos que esse não era a proposta da cooperativa e que nós não íamos mais estar lhe fornecendo as sementes” (Entrevista com P1 – Agosto

de 2014).

Essa “política” de relação direta entre cooperativa e consumidor final – cooperativa e produtores – particulariza as relações econômicas estabelecidas nessa realidade social, e objetiva a construção de novas formas de comercialização que, de certa forma, buscam garantir produtos com custos menores. A relação direta estabelece laços de confiança que permitem, em certa medida, uma participação mais efetiva, um maior conhecimento sobre a história do produto, e certa “intimidade” entre os atores do processo.

Esses fatores, em nossa percepção, contribuem, como já destacado nos capítulos anteriores, para a construção de uma ideia de fidelidade e pertencimento que abarca não somente os atores envolvidos nos processos de produção de sementes agroecológicas associados a Conaterra, como também seus consumidores finais.

2 A construção social dos mercados pela lente teórica da “nova” sociologia