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CAPÍTULO II – PARA CONHECER O REAL

1. As fontes e a delimitação da amostra

Para o desenvolvimento desta pesquisa, foi retomado o banco de dados organizado por CHAVES (2005) a partir da elaboração de sua tese de Pós-doutoramento A produção do conhecimento em Educação Física nos Estados do Nordeste (Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe): balanço e perspectivas - 1982-2004. A tese, enquanto pesquisa matricial sobre a produção do conhecimento em Educação Física no nordeste do Brasil reuniu informações sobre 70 pesquisas (teses e dissertações produzidas pelos docentes de Instituições de Ensino Superior ‘IES’ da região).

Os dados sobre as 70 pesquisas foram organizados de duas formas, a saber: 1) a partir das temáticas que abordavam, utilizando-se para isso a classificação por Grupos de Trabalho Temático50 (GTT’s) do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE)51. 2) a partir das abordagens epistemológicas (empírico-analíticas; fenomenológico-hermenêuticas e crítico- dialéticas52).

A partir dessas classificações foi possível identificar o número de pesquisas realizadas com as seguintes temáticas: as três áreas temáticas mais desenvolvidas somam 42 pesquisas e correspondem a 60% da produção, sendo estas, Memória, Cultura e Corpo (21%), Escola (20%) e Formação Profissional e Campo de Trabalho (19%). Um segundo grupo de temáticas que integram mais 31% da produção são, Epistemologia com 9%, Políticas Públicas também com 9%, Atividade Física e Saúde (7%) e Recreação e Lazer (6%). As

50 A classificação dos GTT’s foi modificada em 2005, porém levamos em consideração a classificação anterior visto que grande dos dados já haviam sido registrados e organizados com esta referência.

51 Os registros foram organizados em função das temáticas abordadas de acordo com a classificação utilizada pelo Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte - CBCE. Esses temas se identificam com os Grupos Temáticos de Trabalho (GTT) que ajudam a selecionar os trabalhos encaminhados aos congressos – CONBRACE - e expressam a abrangência de temáticas pesquisadas no Brasil nos últimos anos. (Chaves, 2005).

demais constituem 09% e se distribuem nas áreas temáticas Pessoas Portadoras de Necessidades Especiais (4%), Movimentos Sociais (4%) de Rendimento de Alto Nível (1%). Não foi identificada nenhuma produção nas áreas temáticas de Comunicação e Mídia e Pós- graduação. (CHAVES, 2005, p. 61-63).

Dentre as áreas temáticas acima mencionadas, optamos, para que pudéssemos alcançar nosso objetivo, por analisar o grupo de pesquisas que abordam a temática da Escola, instituição que se constitui como uma parte do sistema global de internalização. As experiências sistematizadas e tratadas nas teses e dissertações deste grupo específico, permitem seu confronto com as possibilidades de realização da educação: a) a que Mészáros (2005) denomina de Internalização, ou; b) de contra-internalização, na qual o papel da educação é de importância vital para romper com a internalização predominante nas escolhas políticas circunscritas à “legitimação constitucional democrática” do estado capitalista que defende seus próprios interesses. (MÉSZÀROS, 2005, p.63). Essa compreensão de internalização/contra-internalização nos permite verificar a realidade e as possibilidades, considerando o conhecimento produzido na área da Educação Física a partir de experiências no âmbito da Escola, de uma educação para além do capital.

De forma específica o grupo “Escola” se insere no âmbito da Educação Formal, que se constitui como uma parte importante do sistema global de internalização, como demonstram as problemáticas abordadas pelas pesquisas desse grupo temático, que em maioria (10%) se referem à prática pedagógica. As demais discutem fundamentos, concepções, teorias, avaliação escolar e o desenvolvimento do aluno.

Para Mészáros (2005), a educação formal não é a força ideologicamente primária que consolida o sistema do capital, porém, uma das suas principais funções é, retomando o conceito, produzir tanta conformidade ou “consenso” quanto for capaz, a partir de dentro e

por meio dos seus próprios limites institucionalizados e legalmente sancionados. (MÉSZÀROS, 2005, p.45).

Segundo o autor, o que precisa ser confrontado e alterado é todo o sistema de internalização, com todas as suas dimensões, visíveis e ocultas. Porém, neste momento, visando iniciar um debate acerca das relações entre o ensino e a pesquisa em Educação Física, Esporte e Lazer, nos valemos das informações explicitadas pelos autores sobre suas pesquisas realizadas no âmbito escolar. Concordamos com Duarte, quando, ao abordar a questão da apropriação da cultura na formação do indivíduo, considera que [...] o processo de apropriação não se apresenta como um processo educativo apenas no âmbito da educação escolar, mesmo concordando que a educação escolar deve desempenhar um papel decisivo na formação do indivíduo. Ainda, segundo este autor, O caráter mediatizado do processo de apropriação da cultura assume características específicas na educação escolar, diferenciando-a qualitativamente das apropriações que ocorrem na vida cotidiana. Corroborando com a idéia de Mészáros acerca da totalidade dos processos educativos, Duarte (2003) aponta que, Na realidade, a apropriação em qualquer uma das esferas da prática social assume sempre a característica de um processo educativo53. (DUARTE, 2003, p.33).

Outras características do grupo da escola, composto por 14 pesquisas, ou 20% da amostra, é que este apresenta pesquisas nas três abordagens epistemológicas: 8 crítico- dialéticas; 2 fenomenológico-hermenêuticas; e 3 empírico-analíticas, além de uma que não foi possível classificar dada à incoerência interna entre o que anuncia e o que elabora. Constitui a segunda maior temática abordada na amostra, atrás do grupo de Memória, Cultura e Corpo (21,43%) e seguido pelo de Formação Profissional/Campo de Trabalho (18.57%).

53 No sentido de a internalização/contra-internalização não se limitar à educação formal, consideramos que em um outro momento é de grande valia que sejam identificadas formas de internalização em outras frentes de atuação do professor de Educação Física (como é o caso da formação de professores, do lazer, da Pós- Graduação, do rendimento de alto nível, da atividade física voltada para saúde, para os movimentos sociais etc.). Isto requereria um tempo maior do que o disponibilizado para cursos de Mestrado atualmente.

Em relação ao movimento da categoria empírica Educação Física nas pesquisas analisadas, estas foram abordadas relacionando-as às abordagens epistemológicas que as caracterizam, as quais apresentamos a seguir54.

Nas pesquisas de caráter empírico-analítico (21,43%), a Educação Física é considerada enquanto sinônimo de esporte, bem como elemento educacional capaz de desenvolver competência corporal-cinestésica - fenômeno encarado como criatividade, responsabilidade e autonomia (p.180), relacionados com aspectos antropológicos e sócio- culturais das pessoas (n.28, p.180).

Na abordagem fenomenológica (14,29%), a concepção de Educação Física se apresenta como componente curricular – prática desportiva (n.53), e como uma visão que possa ser abrangente o suficiente para interpretar o fenômeno do ser humano em movimento, tanto sob o ponto de vista de suas particularidades, como também a partir de sua contextualização na sociedade em que vivemos (n.63, p.55).

Nas pesquisas de abordagem crítico-dialética (57,14%), a concepção de Educação Física destaca sua perspectiva de reflexão crítica superadora, o que pode ser expresso nas compreenções em que “A Educação Física é uma disciplina que trata pedagogicamente, na escola, do conhecimento da cultura corporal, tendo como objeto de estudo a expressão corporal como linguagem e o jogo, a dança, a ginástica, o esporte, o malabarismo, a mímica, entre outros, como os ‘temas’ ou ‘formas’ da cultura corporal que constituem o seu conteúdo” (n.20 p.24) [...] e “apontam entendimentos no sentido da compreensão da Educação Física enquanto prática social e disciplina escolar no sentido restrito” (n.20, p.25). Outra concepção apresentada em uma das pesquisas se refere a como a “possibilidade da prática pedagógica aberta para considerações das opiniões e decisões dos alunos, para a construção coletiva do conhecimento e para a avaliação crítica do processo de ensino e aprendizagem” (n.27, p.25).

54 As concepções de Educação Física e homem/sociedade foram reorganizadas e sintetizadas a partir da tese de Chaves (2005).

E ainda, duas pesquisas (n.50 e 59) destacam a Educação Física como atividade pedagógica compreendendo-a como componente curricular capaz de instrumentalizar o sujeito dentro da dimensão da realidade (n.50, p.48), e outra como disciplina escolar onde seja defendida a possibilidade de resgatar práticas que possam, de um lado, contribuir efetivamente para o desenvolvimento da consciência crítica e, do outro, constituir formas efetivas de resistência (n.59).

Esta caracterização da amostra e sua relação com o universo de análise, nos permitiram uma maior aproximação com nosso objeto de estudo, bem como, possibilitou uma análise mais consciente, sinalizam um esforço em discutir as possibilidades e a realidade da Educação Física inserida num projeto educacional atrelado a um projeto de sociedade para além do capital.