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2 SENHORAS E SENHORES, RECEBAM AS SUPERSTARS: A

4.2 As fronteiras da camaleônica cultura pop

Para uma melhor compreensão do dinâmico processo de criação dos signos na música pop, serão abordados alguns conceitos da Semiótica da Cultura (SC). Ana Paula Velho (2009), do Centro Universitário de Maringá, introduz a escola soviética de Tártu-Moscou e reflete sobre suas contribuições para o campo da Comunicação. A autora aponta que a SC é um referencial teórico que reflete sobre aspectos sociais, filosóficos e tecnológicos no que concerne à produção sígnica das culturas e aos processos de significação e de comunicação de um grupo social.

132 Disponível em: <https://www.revistaforum.com.br/anitta-e-cobrada-por-lgbtis-a-se-posicionar-contra- bolsonaro/>. Acesso em: 8 out. 2018.

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Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45700013>. Acesso em: 8 out. 2018.

134 Disponível em: <https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2018/09/23/interna_politica,991102/apos- polemica-anitta-entra-na-campanha-elenao-a-favor-da-democracia.shtml>. Acesso em: 8 out. 2018.

Tendo em mente que os gays compõem um grupo social (que possui uma cultura e identidade próprias), esta investigação analisa as representações midiáticas da identidade gay na música pop. Observando as relações entre os signos das distintas culturas gay e pop, a SC já começa a mostrar-se como uma proposta teórica e metodológica que dialoga com o tema, objetos e problemática deste trabalho e permite uma análise consistente das questões abordadas.

Iuri Lotman, semioticista e historiador cultural, inicia sua obra ―A semiosfera: Semiótica da cultura e do texto‖ alertando para a necessidade de revisões epistemológicas no campo da semiótica. O autor propõe uma visão relacional dos signos como pertencentes a sistemas que estão em contato dentro de um campo mais amplo. Esse espaço semiótico é definido pelo pesquisador como semiosfera.

Não existem sistemas [de signos] precisos e funcionalmente unívocos que realmente funcionem por si mesmos de forma isolada. A separação destes está unicamente condicionada por uma necessidade heurística. Tomados separadamente, nenhum deles tem, de fato, a capacidade de trabalhar. Funcionam apenas estando submergidos em um continuum semiótico, completamente ocupado por formações semióticas de diversos tipos que se encontram em diversos tipos de organização. A esse continuum, em analogia ao conceito de biosfera introduzido por V. I. Vernadski, damos o nome de semiosfera. Devemos nos precaver contra a confusão do termo noosfera empregado por V. I. Vernadski com o conceito de semiosfera por nós introduzido. A noosfera é uma determinada etapa no desenvolvimento da biosfera, uma etapa vinculada à atividade racional do homem. (LOTMAN, 1996, p. 22)135

Inspirando-se nos estudos do biólogo, filósofo e geólogo russo Vladimir Vernadski e em seu conceito de biosfera (a esfera da vida no planeta), Lotman concebeu o termo para designar o espaço abstrato no qual os signos se relacionam. Irene Machado, da Universidade de São Paulo, define a SC como ―desdobramento teórico da semiótica da comunicação rumo ao que Lótman denominava culturologia‖ (MACHADO, 2007, p. 19). A autora refere-se à semiosfera como o ―habitat e a vida dos signos no universo cultural‖ (MACHADO, 2007, p. 16), como o espaço no qual os signos de diferentes culturas interagem, processo necessário para que se faça cultura. Pode-se perceber, então, que nesse amplo espaço semiótico os universos gay e pop compõem duas semiosferas distintas que estão em constante contato. No videoclipe de ―Born This Way‖ (ver 5.2), Lady Gaga cria um diálogo com signos das culturas gay, pop, cristã, nazista...

135 ―No existen por sí solos en forma aislada sistemas precisos y funcionalmente unívocos que funcionan realmente. La separacíon de éstos está condicionada únicamente por uma necesidad heurística. Tomado por separado, ninguno de ellos tiene, en realidad, capacidad de trabajar. Sólo funcionan estando sumergidos en un continuum semiótico, completamente ocupado por formaciones semióticas de diversos tipos y que se hallan en diversos niveles de organización. A esse continuum, por analogia con el concepto de biosfera introduzido por V. I. Vernadski, lo llamamos semiosfera. Debemos prevenir contra la confusión del término de noosfera empleado por V. I. Vernadski y el concepto de semiosfera introducido por nosotros. La noosfera es una determinada etapa en el desarrolo de la biosfera, una etapa vinculada a la actividad racional del hombre.‖

A produção cultural vive das interferências que os signos exercem uns sobre os outros, sobretudo aquelas que acontecem nos encontros entre diferentes sistemas culturais. É próprio da cultura promover aproximações até mesmo entre diversidades. [...] A compreensão de semiosfera, tal como foi concebida por Lótman, representa uma possibilidade de considerar o imprevisível e, ao fazê-lo, criar condições para o nascimento intelectual de um complexo domínio teórico de investigação científica sobre as intrincadas relações, interações, tensões e conexões entre signos e sistemas de signos nos espaços culturais. (MACHADO, 2007, p. 18) Ramos et. al. (2007) discorrem, no texto ―Semiosfera: exploração conceitual nos estudos semióticos da cultura‖, sobre conceitos de suma importância para a compreensão da SC e de suas técnicas de análise. O primeiro deles é o de linguagem – um sistema de signos envolvidos na comunicação e na produção de cultura. O segundo é de modelização, processo pelo qual esses signos são organizados. Tal organização ocorre por referência à estruturação desses sistemas, ou seja, como os signos se manifestam em códigos na linguagem verbal, musical, cinematográfica, etc. Já o terceiro é o de texto cultural, o espaço semiótico no qual os signos de uma cultura interagem. Tanto a cultura pop quanto a cultura gay possuem linguagens, códigos e textos específicos que dialogam com os de outras culturas.

Lotman (1996) percebe, portanto, uma cultura como um sistema de signos, como uma semiosfera dentro de uma semiosfera mais ampla (ou seja, em uma organização que envolve diferentes níveis). Tal compreensão de cultura remete a uma das concepções elucidadas por Terry Eagleton: a de cultura como processo de significação da experiência humana (ver 2.1).

O estudioso de semiótica alemão Winfried Nöth (2007) reflete, em sua obra ―Iúri Lótman: A cultura e suas metáforas como semiosferas auto-referenciais‖, sobre a dificuldade enfrentada pelos intérpretes dos textos de Lotman em compreender a semiosfera como um espaço mais amplo ou como um dos diversos sistemas sígnicos que dialogam no universo cultural. De acordo com Lotman:

Posto que todos os níveis da semiosfera – desde a pessoa do homem ou do texto isolado até as unidades semióticas globais – representam semiosferas como se fossem postas uma dentro da outra, cada uma delas é, ao mesmo tempo, tanto um participante do diálogo (uma parte da semiosfera) como o espaço do diálogo (a totalidade da semiosfera). (LOTMAN, 1996, p. 42)136

Cada cultura organiza seus signos de forma autodescritiva, ou seja, projeta-se de acordo com a concepção que tem de si enquanto sistema de signos. Explicitam-se, então, os problemas advindos da dificuldade que uma cultura tem de observar e de lidar com a diversidade de outras culturas. Tal processo de organização sígnica está relacionado ao que Lotman (1996) denomina homogeneidade e individualidade características de uma semiosfera

136 ―Puesto que todos los niveles de la semiosfera - desde la persona del hombre o del texto aislado hasta las unidades semióticas globales - representan semiosferas como si puestas una dentro de la otra, cada una de ellas es, a la vez, tanto un participante del diálogo (una parte de la semiosfera) como el espacio del diálogo (el todo de la semiosfera).‖

(ou cultura). Ekaterina Américo, da Universidade Federal Fluminense, reflete sobre essas configurações no artigo ―O conceito de fronteira na semiótica de Iúri Lotman‖:

O caráter homogêneo e original da semiosfera permite defini-la como tal e diferenciá-la das outras semiosferas. Esse espaço homogêneo faz margens com outras semiosferas, que podem ser vistas pela semiosfera em questão como culturas ou não-culturas, ou até mesmo como anticulturas. Toda cultura (semiosfera) necessita de outra cultura para definir [...] os seus limites. (AMÉRICO, 2017, p.8) Embora a organização de uma cultura se dê de forma homogênea, sua convivência com outras culturas dentro da semiosfera se dá de modo heterogêneo. Assim como a produção da identidade depende da diferença, o mesmo é válido para as identidades culturais. Contudo, as semiosferas estão em constante interação e essa convivência relacional dos signos de sistemas distintos é de suma importância para a produção cultural. A heterogeneidade também se mostra dentro da própria semiosfera a partir do momento em que seus signos são colocados em parâmetros duais e refletem diferenças internas.

Se pensarmos em termos do nosso objeto de estudo, a cultura pop está em interação com diversas outras culturas e é nesse contato com a diferença que se dá o processo de produção cultural. Em primeira instância, a cultura baiana manifesta na expressão artística do Olodum137 em muito pouco ou nada se relaciona com a música industrial das celebridades. Eis que o cantor pop Michael Jackson decide gravar, em 1996, uma versão do videoclipe138 da canção ―They Don’t Care About Us‖ no Pelourinho (Salvador)139

e na comunidade de Santa Marta (Rio de Janeiro)140. Enquanto fenômeno da indústria cultural que reflete as subjetividades do artista e do público e que sensibiliza questões concernentes às manifestações culturais globais e locais, a música pop mostra que possui diversas facetas necessárias ao funcionamento de sua lógica de produção.

A mensagem da canção de Michael evoca um sentimento de revolta de um grupo que se percebe carente de atenção (do Governo, da mídia, da sociedade). A expressão ―eles não ligam para nós‖ remete à noção de núcleo e periferia de Iuri Lotman. O autor aponta que cada

137 Bloco carnavalesco de inspiração africana em Salvador, cidade localizada no estado da Bahia (Brasil). Configura-se como Organização Não-Governamental do movimento negro brasileiro que articula os

moradores da região do Pelourinho (em Salvador) em manifestações artísticas e culturais. Suas apresentações se concentram no período do Carnaval, feriado nacional festivo, cultural e religioso. Tem como característica musical predominante o uso de instrumentos de percussão.

138 Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=QNJL6nfu__Q>. Acesso em: 14 out. 2018. 139

Região localizada na cidade de Salvador e que concentra boa parte dos descendentes de povos africanos do Brasil. Na sociedade brasileira escravocrata (século XVI ao XIX), o Pelourinho costumava ser o local em que escravos tidos como criminosos eram expostos e torturados publicamente. Tornou-se, então, área de

resistência dos afrodescendentes e do movimento negro, articulando manifestações culturais, artísticas e políticas.

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Comunidade localizada no Morro Dona Marta, em Botafogo (região da zona sul da cidade de Rio de Janeiro). Geralmente localizadas em zonas periféricas (que consequentemente carecem de recursos estatais), as ―favelas‖ (termo comumente pejorativo) configuram-se como áreas de forte resistência comunitária.

semiosfera possui uma lei estrutural que a configura em núcleo (o espaço dominante, que comumente define os critérios de homogeneização de uma cultura) e em periferia (o espaço mais amorfo e mutável, que se apresenta como catalisador da produção cultural).

A divisão em núcleo e periferia é uma lei da organização interna da semiosfera. No núcleo se dispõem os sistemas semióticos dominantes. Entretanto, embora essa divisão seja absoluta, as formas que abrange são relativas ao ponto de vista semiótico e dependem em considerável medida da metalinguagem de descrição escolhida – ou seja, se estamos diante de uma autodescrição (descrição de um ponto de vista interno e em termos produzidos no processo de autodesenvolvimento da semiosfera dada) ou se a descrição é levada a cabo por um observador externo em categorias de outro sistema. As formações semióticas periféricas podem estar representadas não por estruturas fechadas (linguagens), mas sim por fragmentos das mesmas ou até mesmo por textos isolados. Ao intervir como ―forasteiros‖ para o sistema dado, esses textos cumprem a função de catalizadores no mecanismo total da semiosfera. (LOTMAN, 1996, pp. 30-31)141

Tal configuração denota uma relação de poderes que se manifesta tanto na estrutura de uma semiosfera como nas relações entre diferentes culturas (em que uma possui maior visibilidade e a outra se torna invisível, como evidencia a canção citada). Como a produção de identidades é um processo também cultural (ver 2.1), essa relação de poderes se mostra presente também na legitimação de determinadas identidades (e culturas) que se tornam a norma e na conseguinte opressão de identidades (e culturas) ―desviantes‖. A noção de desviante e errado é relativa ao parâmetro de uma cultura e da visão que ela tem de outra cultura. Como estamos enxergando o outro? Como ele nos observa?

Para Lotman é nas periferias, nas bordas da semiosfera, que se dá a transformação e a produção cultural mais intensas. É nesse espaço que se evidenciam as diferenças e que se produzem novos sentidos aos signos na semiosfera. Nessa perspectiva, o autor concebe a noção de fronteira, o espaço abstrato no qual uma cultura interage com aspectos de outra cultura.

Um dos conceitos fundamentais do caráter semioticamente delimitado é o de fronteira. Posto que o espaço da semiosfera tenha caráter abstrato, não devemos imaginar a fronteira desta mediante os recursos da imaginação concreta. Assim como na matemática se denomina fronteira um conjunto de pontos que pertence simultaneamente ao espaço interior e ao espaço exterior, a fronteira semiótica é a soma dos ―filtros‖ tradutores bilíngues por meio dos quais um texto se traduz em outra linguagem (ou linguagens). [...] A fronteira do espaço semiótico não é um conceito artificial, mas uma importantíssima posição funcional e estrutural que determina a essência do mecanismo semiótico da mesma. A fronteira é um

141 ―La división en núcleo y periferia es una ley de la organización interna de la semiosfera. En el núcleo se disponen los sistemas semióticos dominantes. Sin embargo, mientras que el hecho de esa división es absoluto, las formas que reviste son relativas desde el punto de vista semiótico y dependen en considerable medida del metalenguaje de descripción escogido - o sea, de si estamos ante una autodescripción (descripción desde un punto de vista interno y en términos producidos en el proceso de autodesarrollo de la semiosfera dada) o si la descripción es llevada a cabo por un observador externo en categorías de otro sistema. Las formaciones semióticas periféricas pueden estar representadas por estructuras cerradas (lenguajes), sino por fragmentos de las mismas o incluso por textos asilados. Al intervenir como ‗ajenos‘ para el sistema dado, esos textos cumplen en el mecanismo total de la semiosfera la función de catalizadores.‖

mecanismo bilíngue que traduz as mensagens externas para a linguagem interna da semiosfera e vice-versa. (LOTMAN, 1996, pp. 24-26)142

A fronteira se porta, então, como um filtro que traduz as informações do exterior para os códigos do funcionamento interior da semiosfera. Pensando o pop como semiosfera, percebo que essa cultura possui sua linguagem e sua dinâmica própria de produção de sentido, que, ao entrar em contato com outras culturas, apropria-se de determinados elementos e os aborda de acordo com a sua linguagem. É o que acontece quando, por exemplo, a cantora Beyoncé utiliza elementos de diversas expressões locais da cultura afrodescendente em ―Formation‖ (2016)143

– primeiro single do álbum ―Lemonade‖ – para afirmar a resistência da identidade negra. Entretanto, o que a faz se sentir segura de sua identidade e de seu poder também diz respeito ao seu vestido da marca Givenchy citado na canção. Voltando a Lotman, Ekaterina Américo reflete sobre o conceito de fronteira:

As margens da semiosfera tornam-se, portanto, um espaço de extrema importância. É nesse contexto que surge a noção lotmaniana de fronteira (granítsa). Obviamente, trata-se de um divisor abstrato e imaginário que possibilita a troca de informações entre a semiosfera e o espaço que a circunda. [...] Dentro da semiosfera, a fronteira desempenha as seguintes funções: primeiramente, o seu objetivo é limitar a invasão incontrolável dos elementos "alheios". Em segundo lugar, alguns dos elementos ―alheios‖ são selecionados, filtrados e adaptados, (ou traduzidos) para a linguagem da semiosfera em questão. (AMÉRICO, 2017, pp. 8-9)

As reflexões da semiótica da cultura permitem compreender a música pop como um fenômeno camaleônico que interage com diversos aspectos de outras culturas. Tal configuração também constitui um reflexo das subjetividades do artista e de um público que exige cada vez mais a representação de suas identidades (seja em relação a minorias sociais ou a culturas periféricas que não costumam estar em evidência na cultura midiática). Esse caráter mutável não diz respeito somente à cultura pop, mas às culturas em geral. Contudo, percebo que devido ao poder de produção de sentidos atribuído aos meios de comunicação e à indústria cultural (responsáveis por grande parte da produção e comunicação de informações no mundo globalizado), essa volatilidade da produção cultural no pop se intensifica tanto no que concerne ao volume como à velocidade.

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―Uno de los conceptos fundamentales del carácter semióticamente delimitado es el de frontera. Puesto que el espacio de la semiosfera tiene carácter abstrato, no debemos imaginarnos la frontera de ésta mediante los recursos de la imaginación concreta. Así como en la matemática se llama frontera a un conjunto de puentos perteneciente simultánearmente al espacio interior y al espacio exterior, la frontera semiótica es la suma de los traductores ‗filtros‘ bilingües pasando a través de los cuales un texto se traduce a otro lenguaje (o lenguajes) que se halla fuera de la semiosfera dada. [...] La frontera del espacio semiótico no es un concepto artificial, sino una importantíssima posición funcional y estructural que determina la esencia del mecanismo semiótico de la misma. La frontera es un mecanismo bilingüe que traduce los mensajes externos al lenguaje interno de la semiosfera y a la inversa.‖

É nas fronteiras do pop que artistas, empresários, gravadoras, críticos, público e sociedade transformam os signos e as culturas. É nesse fenômeno volátil (tão presente nas rotinas dos indivíduos) que podem ser observadas pertinentes questões socioculturais. Se o pop cria imaginários sociais tão fortes, por que não analisar seu mecanismo como sistema de signos e as subsequentes transformações que provoca?

No processo criativo da indústria fonográfica, Madonna conseguiu criticar o patriarcalismo instituído pela Igreja Católica em ―Like A Prayer‖ e traduzir a cultura gay dos bailes nova-iorquinos em ―Vogue‖; Michael Jackson trouxe a periferia brasileira para o centro midiático; Beyoncé discutiu negritude e feminismo; Lady Gaga, por sua vez, conversou com movimentos artísticos legitimados para defender o pop como arte. O pop atua por mediação e se mostra como um potente fenômeno da Comunicação que dialoga com diversas manifestações socioculturais e políticas.

Lotman (1996) dizia que uma cultura se processa em relação à diferença. A representação de outra cultura costuma envolver o estranho, o errado, o bizarro, o bárbaro. Ao longo de sua carreira, Gaga tem se deslocado pelas fronteiras da música pop para criar novos sentidos, novos universos, novas transformações. É na figura do monstro, do bizarro e do excêntrico que a artista encontrou uma potência criativa para elaborar novas representações.

Pelas lentes da SC, é possível fazer leituras consistentes sobre o videoclipe de ―Born This Way‖. No audiovisual, Gaga cria, por meio de signos, um diálogo entre representações comumente utilizadas em culturas de repressão de identidades sexuais e de gênero desviantes da norma e representações das culturas LGBT e pop. A artista ressignifica símbolos para a criação de uma nova sociedade livre de preconceitos, julgamentos e perseguições. O último capítulo desta monografia se debruça sobre a artista que tem transformado a música pop e criado novas formas de se representar a identidade gay, como é o caso da referida obra.

5 “AMO A MINHA VIDA, AMO ESSA CANÇÃO”: LADY GAGA E AS IDENTIDADES DE RESISTÊNCIA LGBT EM “BORN THIS WAY”

É no mínimo intrigante que a primeira estrofe da canção ―Born This Way‖ enuncie ―Minha mãe me disse quando eu era pequena/Que todos nascemos superstars‖ (GAGA, 2011)144, quando Madonna disse em ―Vogue‖ ―Você é uma superstar!/Sim, é isso que você é!‖ (MADONNA, 1990). Poderíamos dizer que Madonna é a mãe da ―Mãe Monstra‖?145

Essa é a imagem que a mídia tentou passar no início da atual década.

Desde o início de sua carreira, Gaga tem sido comparada à Madonna devido às suas referências artísticas, à inclusão de identidades de grupos minoritários em suas obras, à sua

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