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As interações entre as crianças nas sessões

implicação pedagógica com as crianças que demonstram algum tipo de limitação em suas atividades na sessão. O professor(a) deve perseguir a exteriorização corporal das crianças, adequar espaços, sugestionar, interpretar as dificuldades, utilizar as estratégias de comunicação verbal, estimular a interação entre as crianças, garantir um ambiente seguro e estimulante. A disponibilidade corporal do adulto é imprescindível, quando as crianças estão a experimentar, a brincar, a fazer exercícios na sessão. O simples gesto de estender a mão a uma criança que ainda não supera um obstáculo, significa apoiar a ZDP, como explica Vigotski (2001) e a progredir em suas aprendizagens.

As interações entre as crianças nas sessões de psicomotricidade relacional conduzem a prática. A partir das interações entre as crianças, pode-se avançar em diferentes aspectos relacionais e no enriquecimento do repertório psicomotor. Na próxima seção, destacam-se alguns estudos que trazem alguns pontos importantes na condução do método não-diretivo de enfoque relacional e na progressão das aprendizagens.

observações infantis. A ação pedagógica deve estimular a interação entre os gêneros e não rotular a brincadeira das crianças. Busca-se o enriquecimento das experiências, maiores processos imitativos, por conseguinte maior variação de brincadeiras e exercícios. Carvalho (2016), por exemplo, sugere que os materiais disponíveis nas sessões de psicomotricidade relacional não sejam estruturados26, a fim de não reforçar a divisão entre gêneros e limitar a criatividade das crianças.

Os comportamentos conflituosos são outro fator importante nas relações de interação entre as crianças, o qual merece atenção. Os conflitos entre as crianças são comuns e podem ser positivos no trato pedagógico. Para Negrine (2002), o termo correto às situações que envolvem agressividade ou agressão é “desequilíbrio afetivo emocional''. De acordo com Selau, Furini e Pinheiro (2010), há a necessidade de os educadores desenvolverem novos olhares a essas situações. Essas circunstâncias são comuns na vida de qualquer pessoa, originam-se a partir de algum acontecimento prévio. Não são doenças, tampouco comportamento de pessoas más para que sejam rotulados e negligenciados pelos docentes. Os autores citam a provisão ambiental não positiva na infância, falta de padrões de referência, problemas de comunicação e a organização social básica das atividades escolares como desencadeadoras de desequilíbrios afetivos emocionais. Faz-se relevante, pedagogicamente, compreender e incidir na causa de determinado comportamento proveniente de desequilíbrio afetivo emocional, buscar ajudar a criança na resolução do problema e destravar as suas interações. Para Negrine (2002), é necessário a demonstração de limites para o avanço da socialização das crianças, inclusive os limites demonstrados pelas próprias crianças em sessões de psicomotricidade relacional.

O ambiente familiar, o meio cuja criança está se desenvolvendo, implica diretamente nos problemas afetivo-emocionais. Não só a agressividade, como também as crianças que se excluem do grupo sem motivos aparentes são as que mais necessitam de uma intervenção no âmbito relacional. Segue o autor que, quando se oportuniza um espaço de permissividade, a criança expressa toda a sua afetividade27. Portanto, muitos são os indícios comunicados pelas crianças sobre algo que não está

26 Carvalho (2016) sugere brinquedos neutros, compostos de materiais não-estruturados, aqueles que podem ser utilizados por ambos os gêneros, próprios para meninas ou para meninos.

27 “utilizado para significar as atitudes, os interesses, e os valores que a criança exterioriza nas relações com o mundo dos objetos e dos iguais. São relações inter e intrapsíquicas” (NEGRINE, 2002, p. 128).

bem, sobre algo que as incomoda e que pode ser solucionado pela via da psicomotricidade relacional.

De acordo com Negrine (2002) e Selau, Furini e Guimarães (2010), os educadores devem formar vínculos com essas crianças por meio de diferentes estratégias. Chamar a criança pelo nome, reforçando a sua identidade; ter contato visual na comunicação; reforçar comportamentos positivos, não só os negativos; o contato físico também é tido como importante abertura comunicativa relacional, dentre outras na medida do desenrolar pedagógico. Psicomotricidade relacional requer que o professor(a) estreite vínculos com as crianças e seja para elas uma referência positiva.

O conteúdo do simbolismo toma como referência os aspectos socioculturais da criança, por conseguinte a brincadeira fica subordinada ao meio, aquilo que a criança vivencia/vivenciou no seu dia a dia. Negrine utiliza-se dos estudos de Wallon sobre a seguinte afirmação “as observações das crianças não estão ao abrigo de suas ficções, mas ao contrário, estas é que estão saturadas de suas observações” (NEGRINE, 1994, p.79). Portanto, o meio sociocultural toma a brincadeira como regra interna, influenciando o seu conteúdo. Disponibilizar à criança modelos comportamentais de seus pares e orientações pedagógicas do professor(a), nas sessões, vai ao encontro de novas aquisições, novas aprendizagens. Desvela-se, assim, compreensões cada vez mais elaboradas. Segundo Vigotski (2001), a imitação tem papel fundamental no avanço do processo de aprendizagem, pois a criança apenas consegue imitar aquilo

“[...] que se encontra na zona das suas próprias potencialidades intelectuais”

(VIGOTSKI, 2001, p. 328). Isto é, caso tenha-se a possibilidade de imitar, haverá a possibilidade de avançar no que ainda não se sabe fazer. Segundo Dos Anjos e Zocoler (2019), a tarefa da educação formal é ampliar as concepções da criança com a realidade, oferecendo materiais e ações intencionais ao enriquecimento e complexação de sua atividade (desenvolvimento). A estratégia imitativa torna-se um caminho eficaz para alcançar tal objetivo. Carvalho (2016), quando avaliou a prática psicomotriz relacional, nos anos iniciais do Ensino Fundamental, constatou que a atividade imitativa ocorreu em todas as sessões e incidiu diretamente em novas aprendizagens. Quando há atividade imitativa, sinaliza-nos o avançar de processos mentais elementares em direção a processos mentais superiores. Entretanto, pela perspectiva da via corporal, a imitação está mais associada a movimentos técnicos

que colaboram para a construção do vocabulário psicomotor, pois o entendimento quanto à imitação, segundo Negrine (1994-b), é que a criança copia apenas o gesto motor estereotipado da outra, não coincidindo a significação simbólica. As crianças podem estar realizando a mesma atividade motriz, só que com diferenças no significante do símbolo – específico, pessoal, intransferível. A imitação é fundamental na progressão da aprendizagem, haja vista que por ela há o trânsito da criança ao exercício e à simbolização.

Conforme Negrine (1994-b), existem dois tipos de simbolismo, fundamentado no pensamento Vigotskiano – simbolismo de primeira ordem e de segunda ordem. O primeiro refere-se à representação denotativa do significante pela criança, pouca abstração, representação real do fantasma28. Enquanto o segundo, mais tardio, representa o ato de fingir, o faz de conta, maior abstração, presente nas situações que predominam o imaginário. Para Furini (2010), por meio do movimento simbólico, a criança vai adquirindo conhecimento de mundo. Quando ela se expressa corporalmente, avança em sua motricidade, ativando mecanismos superiores de pensamento. Na imaginação e na representação, nas ações de jogar “como se fosse”, as crianças progridem. Essas observações no jogo da criança auxiliam o professor(a) a compreender o estágio do desenvolvimento que a criança se encontra. O simbolismo de primeira ordem está associado ao estágio inferior de desenvolvimento comparado ao simbolismo de segunda ordem. Algumas crianças, sem a implicação do professor e em situações totalmente espontâneas, podem prejudicar o desenvolvimento de outras: fala-se de poder, lei do mais forte29. Para Negrine (1994-a), algumas crianças podem manifestar conflitos internos próprios, exteriorizando atitudes negativas, coagindo, manipulando e/ou dominando a brincadeira de outras. Essas situações prejudicam o bom andamento da sessão, sendo necessária a intervenção do adulto, a fim de garantir a independência e o desenvolvimento de forma saudável.

A psicomotricidade relacional busca abordar a criança em sua totalidade, garantindo-se espaço lúdico-educativo. A metodologia serviu de estrutura didática para a introdução das atividades circenses a uma turma do 1º ano do Ensino Fundamental. Na próxima seção, preocupa-se em aproximar historicamente as artes

28 Fantasma significa, de acordo com Negrine (1994-a), o imaginário do simbolismo que determina através de regras arbitrárias o comportamento da criança em uma atividade lúdica ao brincar.

29 Sentido de prevalência física na disputa corpo a corpo entre duas ou mais crianças, ou dos mais ávidos, ou dos mais informados.

do circo e a trajetória desse objeto de ensino ao espaço formal da educação brasileira por meio da EF escolar.

3 CONTEXTUALIZAÇÃO DAS ATIVIDADES CIRCENSES

Este capítulo aborda algumas relações históricas das artes do circo e as significações dessa prática no meio escolar. Busca-se demonstrar, fundamentalmente, a historicidade das artes do circo até a produção pedagógica, a qual sustentou os processos de ensino e de aprendizagem da pesquisa. As denominações “circo moderno”, “circo clássico”, “circo de cavalinhos” significam a configuração dos espetáculos que surgiram a partir do século XVIII (SILVA; ABREU, 2009). Essas nomenclaturas são discutidas na literatura especializada por historiadores e estudiosos do circo, pois, de certa forma, trazem alguns problemas de ordem conceitual que reforçam aspectos de rupturas das concepções circenses ao longo dos tempos. O mesmo ocorre com a denominação “novo circo”, com a intenção de significar algo “novo” na conformação circense.

Sem a intenção de adentrar profundamente na discussão dos temas conceituais, os termos supracitados foram utilizados, a fim de situar o circo em períodos históricos de forma mais clara. No entanto, concorda-se com Silva (2022), quando utiliza a expressão circo itinerante de lona para distinguir os circos com essas características atuais do denominado “novo circo”. Esta última denominação surgiu a partir da década de 1990 na França, após movimentos de artistas circenses descontentes com os rumos das artes circense na década 1970 (BOLOGNESI, 2018).

No “novo circo”, os artistas não são provenientes de famílias “tradicionais” circenses, costumam ser egressos das escolas de circo, atletas de modalidades esportivas, dentre outras áreas de formação. Essas duas configurações do espetáculo circense possuem mais em comum do que aspectos que os diferenciam. Concorda-se com Duprat (2007), quando se refere que o circo, independente do espaço temporal, sempre se constituiu como moderno e contemporâneo: “pois em sua contemporaneidade busca o que há de mais moderno e tecnológico para compor seus espetáculos e suas concepções” (p. 20).

Os saberes das artes circenses eram restritos apenas às dinastias familiares circenses em épocas passadas. Atualmente, os elementos do circo inserem-se em outras camadas da sociedade, inclusive, na educação brasileira. As atividades circenses chegam à escola, principalmente, ressignificando a riqueza de sua herança cultural. De acordo com De Blas e Mateu (2000), para que haja o desenvolvimento

humano de forma integral, é necessária a aproximação da herança cultural acumulada pela história do homem. A escola, cuja função precípua é de garantir acesso à cultura, torna-se lugar privilegiado ao estabelecimento dessa relação pedagógica. Na escola, mediam-se os conhecimentos construídos do mundo. A mudança dos aspectos formativos para a composição do novo circo30 aproxima o circo à EF escolar, tornando-se possível na escola.

A fim de propor as atividades circenses pela perspectiva da cultura corporal de movimento (BRACHT, 2010), contextualizou-se a historicidade do circo, o saber sobre esse fazer. Procurou-se, a seguir, elaborar uma linha do tempo, sem pretensões de aprofundar toda a história desse fenômeno artístico-cultural, haja vista o complexo e não-linear caminho percorrido (DUPRAT, 2007). Tem-se consciência das diferentes relações, perspectivas, personagens, movimentos e conjunturas circenses. Procurou-se sistematizar esProcurou-se objeto de ensino conforme Nascimento (2018), através de alguns episódios históricos sobre as práticas corporais circenses e os conhecimentos pedagógicos produzido