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A diversidade tecnológica atual está transformando o cenário mundial por meio de ininterruptas inovações. Mobilidade e portabilidade são os termos em ascensão que caracterizam o século vigente. Para exemplificar a tendência de crescimento no uso das TICs, a expansão do número de celulares no Brasil já ultrapassa mais de 197 milhões de linhas27, superando o próprio índice populacional do país. Os indicadores do CGI.br28demonstram que os computadores portáteis (laptops e notebooks) cresceram cinco vezes mais desde 2005, alcançando 5% da população brasileira em 2009; a maior concentração de posse desses aparelhos está presente nas classes A e B. Diante desse quadro, visualizamos que a convergência tecnológica e digital é um fenômeno cada vez mais evidente na sociedade contemporânea. Toda essa transformação está diretamente relacionada à comunicação e às novas tecnologias, que desafiam as mídias tradicionais diante da proposta da constante inovação. Sendo assim, a cada dia surgem novos aparelhos que, constituídos por gramáticas específicas, criam hábitos, formam novas alfabetizações e práticas de interação e, consequentemente, essas transformações afetam diversos setores que dependem dessa tradição midiática, inclusive as instâncias televisivas.

27 Dados divulgados pela Anatel em 21 de dezembro de 2010. Disponível em: <http://tecnologia.terra. com.br/noticias/0,,OI4855022-EI15606,00-Brasil+ultrapassa+os+milhoes+de+linhas+de+celular.html>. Acesso em: 22 dez. 2010.

28 Comitê Gestor da Internet no Brasil. 5

ª Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias da Informação e da

A televisão atual vivencia um período de transformações tecnológicas que registram um novo processo de transição. Desde a sua constituição no Brasil, em 1950, a televisão sofreu transformações que implicaram a transição entre a TV clássica e a moderna. A década de 1980 destaca-se como um período de importante demarcação para essa transição: de paleotelevisão para neotelevisão (ECO, 1984). O autor define que uma das características mais marcantes da neotelevisão é que ela fala de si mesma (autorreferencialidade) e estabelece um contato direcionado com o próprio público, visando diluir a dicotomia entre ficção e realidade– fortemente demarcadas na paleotelevisão –, tornando as diferenças entre informação e espetáculo cada vez mais tênues. Para Casetti e Odin (1990), a neotelevisão rompeu o modelo pedagógico da paleotelevisão ao proporcionar interatividade ao telespectador por meio de perguntas diretas, que, por sua vez, abriram o diálogo através da participação. Rafaeli (1988, p. 110) aborda a interatividade nos meios tradicionais de comunicação: “A interatividade está presente também no funcionamento da mídia tradicional. Os fenômenos de cartas enviadas ao editor, talk shows em rádio e televisão, a participação do ouvinte em programas e na programação são todos caracterizados pela interatividade”29. No entanto, a transição não consiste na ruptura imediata dos paradigmas, visto que esse processo se deu de forma sutil e gradativa, podendo ainda ser encontrados resquícios que transitam entre a paleotelevisão e a neotelevisão.

A característica mais preponderante da mídia televisiva é o seu caráter doméstico. Na paleotelevisão, a televisão ocupa seu lugar na sala, tornando-se o objeto central para a integração da família. Com a transição para a neotelevisão, essa perspectiva se altera e a televisão passa a ocupar outros ambientes da casa, como a sala mais íntima, o quarto ou até mesmo a cozinha. Ainda no contexto doméstico, esse deslocamento espacial atribuiu caráter de individualização à televisão, e o ambiente familiar, consequentemente, começa a se fragmentar. A neotelevisão também é demarcada pela interatividade e o rompimento do fluxo televisivo (WILLIAMS, 1997), que podem ser relacionados ao “aperfeiçoamento do zapping”, ou seja, uma ação que permite ao telespectador transitar pelos canais e selecionar o que deseja assistir, conferindo-lhe uma dimensão autônoma e individualizada com o dispositivo e atribuindo características próprias e particulares a essa relação.

29“Interactivity is present in the operation of traditional media, too. The phenomena of letters to the editor, talk shows on radio and television, listener participation in programs, and in programming are all characterized by

Toda a dimensão da interatividade televisiva pode ser entrecruzada com o que Castells (2000) denominou de sociedade interativa. De acordo com o autor, as novas tecnologias trouxeram inovações às chamadas mídias tradicionais no decorrer dos anos 1980, ou seja, os jornais impressos passaram a ser escritos à distância, o rádio se segmentou com estações temáticas e subtemáticas e a televisão, com a multiplicação de canais e o progresso de difusão via satélite. Nessa década, surgiram novas tecnologias como videocassete, Walkman, controle remoto, câmeras filmadoras portáteis, videojogo, entre outras. Para Alzamora (2004), essa década marcou o início da personalização da segmentação devido à entrada dos videocassetes, permitindo às audiências a possibilidade de gravar programas televisivos para assisti-los em outros horários. As transmissões via satélite e a diversificação de canais pagos fortaleceram ainda mais o processo de individualização e segmentação da informação. Assim, a sociedade iniciou um processo de substituição do conceito de “massa” pelo de “sociedade segmentada”, resultante dessas tecnologias que agregaram novos valores, ideologias e estilo de vida que mudaram o cenário histórico daquela geração.

O momento atual, marcado pela utilização de diversos mecanismos tecnológicos e de informação, constitui um terceiro período de transição da televisão, também denominado pós- televisão. A convergência midiática permite que a televisão tenha seu conteúdo replicado nos dispositivos móveis − computador ou telefone celular –, atribuindo-lhe características ainda mais individualizadas. Para Pavlik (2007, p. 24), “a tecnologia digital e a convergência da televisão e da Internet provocaram uma transformação radical na maneira como a televisão é fornecida”, alterando-se os modos de transmissão digital de sinais e os locais de recepção atualmente assistidos por telefones móveis ou computadores portáteis. Por isso, diversos programas televisivos atuais já estão adequados para o formato Internet. Amparados pelas novas tecnologias de transmissão via streaming30 ou pelo IPTV31, as tecnologias digitais possibilitam o armazenamento do conteúdo, tornando-se cada vez mais assimiláveis por seus usuários. Essas possibilidades tecnológicas modificam as formas de produção e deslocam o telespectador para uma nova relação com a televisão. Assim, é possível considerar que a Era

30 Streaming é uma forma de distribuir informação multimídia em uma rede por meio de pacotes. Ela é frequentemente utilizada para distribuir conteúdo multimídia por meio da Internet.

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Internet Protocol Television– IPTV – é uma tecnologia para entrega de serviços de televisão digital e outras

Digital vem transformando o conceito de produção, transmissão e consumo de um novo modo de fazer televisão, ainda emergente.

Se o novo período de transição prenuncia o declínio da televisão aberta, devemos também questionar por que a televisão continua tão presente no cotidiano brasileiro. Para França (2009), as teorias alarmistas sempre anunciaram o fim das coisas; no entanto, a experiência histórica vem demonstrando que “os novos meios não vêm substituir formas anteriores, mas provocar modificações e adaptações, reconfigurando continuamente o ambiente midiático de uma sociedade” (FRANÇA, 2009, p. 28). A terceira fase – denominada pós-televisão – constitui o aprofundamento e a continuidade do processo de identificação iniciado pela neotelevisão, e as mudanças mais profundas dessa nova era estão no hibridismo tecnológico e na imbricação dos polos de produção e de recepção, que mantêm uma forte relação com a dimensão informacional, além do surgimento do gênero infotainment32. Para a autora, a pós- televisão é a marca da era do individualismo positivo, sendo a televisão o vetor e o espaço para a sua afirmação: qualquer indivíduo pode estar ali, porque existe uma interpenetração de duas instâncias, que marcam uma troca de valores entre a televisão e a sociedade. Com os novos adventos tecnológicos, a sociedade é reorientada e reorganizada de acordo com os usos e os múltiplos recursos tecnológicos que imprimem a nova dinâmica da vida social (FRANÇA, 2009). O enfrentamento dado ao novo período converge a televisão para um estreito diálogo com a Internet e a comunicação digital. Mais do que pensar em concorrência, declínio ou fins apocalípticos para os meios, o desafio consiste na adaptação aos novos recursos que tendam a promover mais diálogo e proximidade com os telespectadores.