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2.1 O PLURALISMO CULTURAL

2.1.2 As Religiões num Mundo Globalizado

Não dá para negar que esse fenômeno da globalização esteja presente no mundo atual e que ele tenha influência direta na vida das pessoas e das culturas locais. Além dos benefícios que acabamos de citar, a globalização também mostra todo o seu lado cruel de segregação e violência às culturas locais, quando inculca no seio destas, tendências que não são próprias destes ambientes. Em relação às religiões, o fenômeno não deixa de ser diferente.

A globalização nos confronta num mundo multicultural ou pluricultural, onde cada pessoa, cidade ou nação convive com formas culturais variadas em uma diversidade muito grande. Aqui aparecem duas tendências que estão se desenvolvendo em nossa sociedade atual, que tem sua origem no processo de globalização: a relativização e a secularização. Relativização, como nome já diz, é tornar relativo, ou seja, o valor das coisas depende dos critérios de escolha de cada um. Esta perda de verdades absolutas, normalmente vem acompanhada de um forte pragmatismo e utilitarismo, subordinando coisas, pessoas e instituições ao que é subjetivo. Em última análise, pode levar ao ceticismo, que é atitude pelo qual não se encontra mais validade e satisfação nos valores religiosos.

Outra tendência é o secularização, que pode ser caracterizada “pela busca de um novo humanismo, centrado na autonomia responsável do indivíduo como valor máximo”72. Segundo o teólogo Félix Alejandro Pastor, a secularização da sociedade

pode ser vista de três formas distintas:

Primeiro, numa visão integralista e fundamentalista, representa um fenômeno essencialmente antirreligioso; Numa segunda forma, para certo ecletismo religioso, é um fenômeno religiosamente neutro, que consiste na superação cultural de modelos de pensamento próprios de uma época pré- científica. Por fim, para o otimismo religioso de certo progressismo teológico, por detrás do processo secularizante, descobre-se a ação de

72 LATOURELLE, R.; FISICHELLA, R. Dicionário de Teologia Fundamental. In.: BARAÚNA, L.J.

(TRAD.). Secularização-Secularismo. In.: PASTOR, F.A. Petrópolis: Vozes; Aparecida: Santuário, 1994, p. 872.

Deus, já que a secularização que deriva daí permite ao homem atingir sua autonomia e maturidade73.

Em muitos casos, professa-se que a religião não tem nada a dizer sobre a vida das pessoas, sociedades e culturas nos tempos atuais. O processo de secularização tende a reduzir a fé e a Igreja ao âmbito do privado e íntimo, favorecendo um estilo de vida que debilita o desenvolvimento e a estabilidade dos vínculos entre as pessoas, distorcendo as relações familiares. Para o Papa Francisco, é preciso propor uma “ação pastoral que cure, promova e fortaleça os vínculos interpessoais” (EG 67). Por vezes, utiliza-se também, a palavra laicização para designar esse fenômeno da secularização. Normalmente esta é utilizada para referir-se a diminuição da influência da religião na vida cotidiana das pessoas e, enquanto a outra, na relação entre Estado e Igreja. Hoje, fala-se também, de uma pós-secularização, referindo-se ao fenômeno que se desenvolveu na virada do milênio, com a redescoberta do valor do sagrado e da religião como mediação na vida das pessoas e das culturas.

Nesse mundo globalizado, a religião aparece como uma escolha a ser feita ou não pelas pessoas. Contra todas as expectativas do mundo moderno do século passado, onde a religião estava fadada a desaparecer frente ao desenvolvimento das ciências e da tecnologia, constatamos nos últimos anos, um reflorescimento do desejo e da importância em pertencer a algum segmento religioso. Contudo, este universo religioso se tornou bastante diversificado. Apesar da diminuição do número de cristãos no continente europeu, há um aumento significativo das religiões tradicionais como o Cristianismo, o Judaísmo, o Islamismo, o Hinduísmo e o Budismo em várias partes do mundo. Encontramos também, o aumento em participação de movimentos espirituais diversos como a New Age na América do norte e Europa, o pentecostalismo entre os cristãos da África e América latina, e grupos fundamentalismos espalhados por todo o planeta.

73 LATOURELLE, R.; FISICHELLA, R. Dicionário de Teologia Fundamental. In.: BARAÚNA, L.J.

(TRAD.). Secularização-Secularismo. In.: PASTOR, F.A. Petrópolis: Vozes; Aparecida: Santuário, 1994, p. 873.

Por estar no mundo, às religiões e, em especial, o cristianismo, são influenciados diretamente pela globalização. Porém, as religiões não seguem os mesmos padrões globais como seguem a economia, a ciência, a medicina e a educação, entre outras. Para o teólogo e pesquisador da temática sobre a Igreja e a globalização, Robert Schreitter, são três os fatores há considerar74: primeiro, a falta

de uniformidade geral nas religiões, o que não acontece com outros sistemas como a economia; Segundo, elas não são direcionadas pelos valores e ideais desses sistemas; E, por último, elas não têm níveis de organização baseados nas novas tecnologias de comunicação, como que acontece com os outros sistemas. Assim sendo, não podemos entender a Igreja como um sistema homogeneizado e uniforme, apesar da Igreja católica estar presente no mundo inteiro. Todavia, é no âmbito local que encontramos o maior desafio da globalização. Nesse ambiente, o encontro da cultura local com o mundo globalizado, faz florescer reações diversas, passando da aceitação, indo até às tensões e violências. Assim, a globalização se apresenta, cada vez mais, como um desafio para a Igreja e às religiões.

Nesse novo contexto da história da humanidade, a proclamação do Evangelho será uma base para restabelecer a dignidade da vida humana nesse novo momento, sempre tendo presente o mistério da encarnação de Jesus Cristo. A cidade multicultural é um grande desafio para o cristão. Mas viver a fundo a realidade humana e inserir-se nela melhora o cristão e melhora a cidade. Frente a tudo isto, “a Igreja é chamada a ser servidora de um diálogo difícil” (EG 74), segundo Papa Francisco, reafirmando às identidades culturais e promovendo uma evangelização que ilumine os novos modos de se relacionar com Deus, com os outros e com o ambiente, suscitando valores fundamentais. Mas aqui podemos nos perguntar: o que é necessário levar em conta na formação das identidades culturais e no diálogo com a sociedade globalizada?

74 Cfe. SCHREITTER, R. A Nova Catolicidade. A Teol. entre o Global e o Local. São Paulo: Loyola,