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5.1 Análise dos casos

5.1.6 Stach

5.1.13.6 ASIS e Comportamento Suicida

Quando o entrevistado começa a falar sobre a prática de ASIS, revela que “nem

sempre vinha aquele pensamento de me matar, mas vinha aquela questão do porquê d’eu estar ali, o porquê d’eu estar existindo. Porque eu tava ali, se eu tava sentindo tudo aquilo e não tava vivendo bem”. Hugo foi motivado pelo sentimento de que não faz nada direito e pela

depressão, motivo de ter sido acompanhamento por psiquiatra durante um período. Entre outros transtornos mentais, a depressão pode levar o indivíduo à prática da ASIS através da sua sintomatologia (Hawton et al., 2012). O estudo de Klonsky e Muehlenkamp (2007) mostra uma relação entre depressão e transtornos de ansiedade com comportamentos

autodestrutivos, inclusive ASIS. Além da tristeza, Hugo expressa que sente “uma dor no

coração” para aqual busca na ASIS uma tentativa de alívio.

Verifica-se que Hugo tem ideação suicida simultaneamente à prática de ASIS: “frequentemente eu penso eu pegando uma arma, atirando aqui… Aqui na nuca. Eu sei os

pontos críticos do corpo”. Ele disse sentir um desânimo no viver:

Ah, eu já ouvi falar que suicídio é uma fraqueza… Que você é pego num momento de fraqueza. A depressão é um momento de fraqueza, a angústia e tudo isso pode te levar a procurar uma solução que é o suicídio. Você não tem nada nessa vida mais aqui que possa… A vida não está fazendo sentido…Você já não tem mais nada nessa vida aqui, o que você está fazendo aqui ainda? A perda do sentido da vida. Não tem mais sentido. Após o esclarecimento do pesquisador sobre o conceito do suicídio ao entrevistado, ele então refaz sua “conta” e diz que teve duas tentativas nas quais ele intencionava acabar com a própria vida, “duas vezes”, as duas tentativas ocorreram após completar onze anos. Explicou que na primeira, buscava não sentir dor, simplesmente adormecer “eu ia morrer por

gás, ia ligar o gás e fechar o ambiente. A vida tava sem sentido, a minha vida tava uma merda”. Não morreu porque a irmã chegou a tempo. A segunda tentativa de suicídio foi

A que eu tentei me jogar na frente de um carro, só que o carro num pegou. A rua tava cheia. Qualquer coisinha…Qualquer um que passasse ali ia pegar uma ‘barroada’ e eu pensando assim ‘O que que eu vou perder se eu morrer?’, aí eu passei. Por incrível que pareça nenhum carro pegou em mim. Eu passei a rua todinha. Com a pista toda cheia de carro passando, nenhum carro pegou em mim. Os carro tudo em velocidade. Desviando não, passando. Nenhum carro pegou em mim e eu passei caminhando. Segundo a Organização Mundial de Saúde (2010), a tentativa de suicídio é o principal preditor, ou fator de risco, para o suicídio. Hugo apontou a irmã como o único fator de proteção para preservar a vida, dizendo que desistiu de cometer suicídio naquele momento ao lembrar dela.

Faltou assim ó para eu me matar. Bem pouquinho. A minha irmã. A única pessoa que eu me importo. Aí passava o que na tua cabeça? Se eu me matar… Como é que ela vai ficar. Ela ia ficar arrasada porque ela é fraca. Ela não é do mesmo jeito que eu, não é forte que nem eu, ela é fraca.

Um dos critérios clínicos para se ajudar alguém em risco de suicídio, é buscar fatores de proteção, o que no caso do Hugo é a irmã (Botega, 2015; Montenegro & Tavares, 2012). Atualmente, Hugo considera que tem melhorado, o que atribui ao seu desempenho acadêmico: “no estudo, tá me deixando bem melhor”. E relata também a importância do esporte na sua vida “o esporte também está me deixando contente”. A prática de atividade física, de esportes regularmente, cumpre um papel de muita relevância para uma boa qualidade de vida do indivíduo, ainda mais para quem está em sofrimento grave e com comportamentos autodestrutivos (Boone & Brausch, 2016).

O entrevistado relatou que o pai fez uma tentativa de suicídio e o avô paterno suicidou-se, nem teve oportunidade de conhecê-lo. Conta que seu pai fez comentário sobre o avô, julgando o suicídio como uma atitude de fraqueza. No entanto, não esconde que ele próprio pensou em fazê-lo, mas não repetiria o ato do pai. O entrevistado se refere a essas “coincidências” como algo natural,

Meu vô se matou. Meu pai também contou uma história que quando ele era pequeno ele tentou… Ele queria se matar. Queria porque ele também teve uma infância muito ruim com os irmãos dele, o pai dele e tal. Ele falou para mim que quase ia sendo fraco que nem o pai dele. Isso, ele falou para mim desse jeito. Quando eu perguntei para ele porque meu avô tinha se matado, ele disse ‘seu avô foi fraco, filho’, aí eu “tá bom. Pai o senhor nunca pensou? ‘Não, eu já pensei, mas não vou ser fraco não.

O histórico familiar está entre os três maiores fatores de risco para o suicídio, juntamente com transtornos mentais e a tentativa prévia de suicídio (OMS, 2010). Na narrativa do entrevistado, nota-se que os três preditores acima citados estão presentes; Hugo tem depressão, fez duas tentativas e tem histórico de comportamento suicida na família paterna. Hugo relata estar melhor da depressão, estar cuidando melhor do corpo com a prática sistemática de esportes, sentir mais autoestima e mais racionalidade sobre eventos estressores da sua vida. Apesar de se sentir melhor, as vulnerabilidades observadas e a falta de vínculos seguros e suporte emocional com genitores indica a necessidade de tratamentos psicológico e psiquiátrico. É também importante fortalecer o vínculo e apoio com as figura materna como cuidadora principais.

Obs.: foi feita a recomendação pelo pesquisador para que Hugo continuasse o tratamento da depressão e buscasse na rede pública o atendimento psicológico. Por último, houve uma conversa com a mãe para expor os cuidados a serem tomados por ela em relação ao filho.

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