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1 A CONDIÇÃO DOCENTE NO BRASIL: FORMAÇÃO E TRABALHO

1.5 Aspectos do desenvolvimento da carreira docente

As reformas em implementação no campo da formação de professores encontram na LDB nº. 9.394/1996 e em legislação complementar, a base institucional para se consolidar e para definir novas políticas nesse. As diretrizes curriculares nacionais para o curso de Pedagogia e demais licenciaturas, em discussão desde o final dos anos de 1990, sob o embate de diferentes concepções de formação – umas, em estreita conexão ao modelo de ajuste neoliberal, outras, distanciadas desse modelo por conceberem a formação a ser construída “em bases teoricamente sólidas se fundada nos princípios de uma formação de qualidade e relevância social” (FREITAS, 1999, p. 29), – têm o seu formato legalmente instituído na primeira década do século atual.

Outra demanda dos professores se refere à regulamentação profissional e valorização do magistério, apesar da Constituição Federal de 1988 dispor sobre a necessidade de Plano de Carreira para o Magistério Público com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, como um dos requisitos a serem garantidos para a valorização dos profissionais da educação, porém, segundo Oliveira (2008), verifica-se que a maioria destes direitos são usurpados do trabalhador da educação.

As leis garantem os recursos que devem ser destinados à carreira, salário, estrutura e recursos necessários para a realização do trabalho docente, entretanto, diversas regiões, estados e municípios apresentam baixos níveis de investimento e pouco recursos para a educação, especialmente a partir da municipalização, com a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, a Emenda Constitucional 14/96, a Lei nº. 9424/96 e o Decreto Federal nº. 2264/97 que reorganizaram a descentralização do ensino e repasse de recursos.

A realidade das escolas é precária, as instalações são inadequadas e os recursos escassos para que os professores realizem seu trabalho, sendo que a maioria dos trabalhadores se utiliza dos seus salários para custear os materiais necessários e básicos para o exercício do trabalho docente. O agravante desta situação ocorre, ainda, porque estes trabalhadores possuem baixos salários, são desvalorizados e os direitos a carreira e remuneração adequada são usurpados. Este cenário ocasiona, como consequência, a perda da qualidade da educação, pois não é possível a realização de um trabalho sem estrutura adequada, escassez de recursos básicos, inexistência de salários adequados e com carga horária de trabalho exaustiva.

Outro ponto a ser destacado e que interfere no trabalho docente, refere-se às transformações políticas, sociais e tecnológicas, que colocam os professores em uma busca de aprimoramento permanente, de domínio das novas tecnologias e instrumentos didáticos; em contrapartida, as formações (inicial e continuada) para estes profissionais é precária, ineficiente e verticalizada e/ou é inexistente. O educador, por conta própria, necessita ir em busca desses conhecimentos, utilizando recursos do pouco salário que recebe em formações na iniciativa privada e de qualidade duvidosa, sacrificando o pouco tempo livre que lhe resta para o lazer, utilizando os fins de semana e férias para estudar; fatores estes que sobrecarregam, massificam e precarizam a qualidade de vida deste trabalhador.

As reformas educacionais trouxeram as ditas inovações pedagógicas, reestruturação e padronização curricular, as avaliações formativas e em larga escala para a realidade desses profissionais; demandas que aumentaram a responsabilidade e obrigações dos professores, ampliando sua carga horária de trabalho, que já era extensa, promovendo a culpabilização docente pelos baixos índices das avaliações nacionais.

A precarização nas relações de trabalho é oriunda das mudanças neste setor, a busca da flexibilização nessa relação que leva à desregulamentação da legislação trabalhista. Castel (1997 apud OLIVEIRA, 2009, p. 166-167) discorre sobre esta análise, discutindo

[...] as metamorfoses da questão social, considera como um questionamento da função integradora do trabalho hoje na sociedade. Esse autor demonstra que o sistema de proteções e garantias sociais vinculadas ao trabalho vai sendo desmontado para chegar ao que caracteriza como “um processo de precarização que atinge as situações do trabalho, no sentido da sua re-mercantilização e de soluções na ordem do mercado, como efeito particular da globalização.

Nessa perspectiva, a precarização do trabalho se dá pela incessante flexibilização das regras de contratação, baixos salários, ausência de estabilidade, informalidade nas relações de

trabalho, o mínimo de direitos sociais, visando sempre beneficiar o empregador com a desculpa de se evitar a crise do capitalismo e o desemprego.

A precarização do trabalho é justificada pela busca de crescimento econômico que não leva à ampliação do número de empregos, ocasionando o aprofundamento das desigualdades sociais. A flexibilização nas relações de trabalho, enfraquecimento das legislações social e trabalhista, baixas taxas de sindicalização e a quase inexistência de greves, demonstram a força dos empregadores e o domínio dos seus trabalhadores. Segundo Oliveira (2008), o magistério público se enquadra neste cenário devido ao alto número de contratos temporários de trabalho, no qual os professores contratados usufruem de poucos direitos trabalhistas, sendo controlados e tendo sua voz calada pela ameaça do desemprego eminente no caso de se rebelarem contra o sistema.

A relação dos profissionais do magistério com o seu sindicato é relativamente conciliável, onde 55% são associados, 14% são associados e militantes e 28% não associados. Entretanto, ao se analisar o engajamento em movimentos sociais, se tem um índice pequeno. Os sindicatos estão enfraquecidos, pois as mudanças nas relações de trabalho trouxeram inúmeras demandas que estes não conseguem atender. Oliveira (2008) destaca que “nos países latinos-americanos, a organização sindical sofre direta ou indiretamente limitações que resultam em organizações fragmentadas e fracas, aumentando as dificuldades de integração efetiva dos trabalhadores”.

Diante deste cenário, as organizações sindicais recebem críticas sobre seu papel e função efetiva, favorecendo seu enfraquecimento, pouco prestígio e confiança por parte dos trabalhadores do magistério, mesmo que os sindicatos tenham sua origem a partir do movimento de professores, de acordo com o percentual de docentes associados mostrados neste trabalho, o mesmo perdeu sua identidade e crédito diante os docentes.

O Brasil, ao longo de sua história, desenvolveu uma política salarial do setor público diversificada, na qual os vencimentos dos docentes se diferenciam por diversos aspectos como: carreira, contrato de trabalho, regime de trabalho, nível e classe, tempo de serviço, investidura em cargos de confiança, gratificações incorporadas, titulação, etc.

A diferenciação econômica regional contribuiu para as diferenças salariais dos docentes, nos âmbitos federais, estaduais e municipais; professores com os mesmos cargos não possuem isonomia de salários. A busca dessa igualdade é o grande desafio enfrentado pelos sindicatos, além de condições de trabalho adequadas, jornada reduzida, carreira, reconhecimento.

A massificação, intensificação e precarização do trabalho docente trazem inúmeras consequências para a categoria de professores, tais como desvalorização, descontentamento, evasão e o adoecimento.

Thurler (2002, p. 90 apud PERRENOUD, 2002), afirma que o século XXI e suas transformações para o campo educacional exigiu dos professores novas competências, modificando também a formação para o desenvolvimento de competências para nova escola, contrapondo-se à didática passiva de transmissão de conhecimentos. Dentre as transformações trazidas para a educação, destacam-se as reformas educacionais que desafiaram o professor a reinventar seu local de trabalho, a escola, e a si próprios como pessoa e profissional.

As transformações políticas e sociais modificaram o público escolar, levando o docente a lidar com a heterogeneidade discente em sala de aula, fator que o obriga a rever e transformar sua prática e didática todos os dias para atender positivamente às necessidades e dificuldades de seus estudantes. Esta mudança vai além de algo pessoal, já que exige modificar sua concepção de trabalho e propiciar a cooperação e o trabalho coletivo. Por conseguinte, o professor deverá ser capaz de adequar sua prática para a complexidade trazida pela transformação dos sistemas educacionais e diversificação do púbico escolar.

No que se refere à formação de professores, o docente não pode ser visto como um “tarefeiro”, executor de tarefas; deve ser considerado integrante e transformador de um sistema que necessita do seu empenho para o alcance da qualidade, promovendo a criação de novas competências. Voltando-se para a inovação do desenvolvimento escolar, o foco principal é o aprendizado do aluno que está intimamente ligado ao trabalho do professor; segundo Thurler (2002), para melhorar o desempenho dos alunos é necessário que o docente construa coletivamente um ponto de vista comum quanto a forma de aprendizado dos discentes; se comprometam e se responsabilizem pelo avanço dos seus estudantes; desenvolvam um ambiente de integração e cooperação para que o aluno se envolva no processo de desenvolvimento; trabalhem coletivamente para praticar as ações pensadas conjuntamente.

Aprofundando a questão da formação contínua, é preciso substituir práticas antigas, engessadas e passivas por formações construídas coletivamente pelos professores, objetivando a criação de projetos e alternativas para resolução de problemas do cotidiano escolar. Entretanto, segundo Thurler (2002), o trabalho nas escolas ainda segue uma perspectiva burocrática, hierarquizada e regulada dos processos de gestão. A autora ainda contribui afirmando que “a cultura administrativa e profissional da maioria dos sistemas escolares, ainda é fortemente enraizada no individualismo e em uma visão hierárquica dos

procedimentos de gestão e de controle”. Portanto, é preciso romper com esta realidade, fomentando a gestão participativa que é pautada na diversidade, independência, autonomia, cooperação, prática do contrato e avaliação, transparência na informação, negociação e acordo.

A formação contínua para o desenvolvimento profissional do professor deve se reinventar em uma perspectiva de transformação da realidade escolar a partir da coletividade, cooperação, contextualização e integração entre todos os atores envolvidos no processo juntamente com o governo e intelectuais que formulam tais políticas de formação. A autonomia precisa da cooperação de todos os envolvidos para se realizar.

Diante deste cenário, a massificação e precarização do professor se mostram evidentes e as soluções para estes problemas precisam ser implantadas. Oliveira (2009) comenta sobre o adoecimento docente em virtude das inúmeras exigências do âmbito escolar, onde necessitam de habilidades e conhecimentos diversos para atender as novas demandas que lhe são impostas. Dessa forma, a jornada de trabalho amplia e a qualidade de vida do docente diminui com tantas exigências e pouco retorno do trabalho realizado. Por conseguinte, a perda da qualidade de vida reflete em doenças, que, segundo a autora, as doenças psíquicas são as mais comuns e causadas pelo excesso de trabalho e ambientes estressantes, tais como: depressão, ansiedade, alcoolismo, cansaço físico e mental que trazem consequências para realização do trabalho docente, para o ambiente familiar e custos sociais devido ao aumento de licenças saúde.

Assunção e Oliveira (2009) propõem medidas preventivas para melhorar o ambiente psicológico da escola, como: racionalizar o regime de trabalho/descanso, regular a carga de trabalho, eliminar excessos de carga de trabalho extraclasse e implantar política de vigilância para distúrbios mentais nos docentes. Aspectos relacionados às precárias condições de trabalho, falta de reconhecimento profissional, diferenças culturais, relações interpessoais conflituosas com seus pares, comunidade e gestão, e a perda de autonomia são, também, causadores da insatisfação no ambiente de trabalho.

A incessante busca pela qualidade e universalização levou a educação brasileira às reformas educacionais para a implementação de novas políticas para educação. A universalização, a partir da ampliação da oferta do ensino fundamental, aumentou as demandas das escolas, sem o apoio e suporte necessário para tal objetivo. O professor, colocado como protagonista do processo educacional, acabou sendo responsabilizado e tendo seu trabalho intensificado, precarizado e massificado.

A sobrecarga devido as múltiplas tarefas e responsabilidades, regulação e controle levam ao sofrimento no trabalho com pressões e frustrações diárias que causam estresse e adoecimento. As doenças físicas e os transtornos psíquicos estão presentes na realidade docente e são as grandes causadoras do afastamento destes profissionais dos seus locais de trabalho. Tal cenário prejudica o processo de ensino, precariza a profissão, compromete a qualidade da educação e apresenta altos custos sociais, fatores estes que levam à morbidade, que se instaura a partir de um ambiente de trabalho e organizacional precário, massificante e estressante, desvalorizando e desprestigiando o profissional do magistério, tornado a profissão pouco atrativa e valorizada, o que favorece os péssimos cursos de formação, salários baixos, condições precárias de trabalho e exploração profissional com contratos de trabalho inadequados.