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2.6.1. Obesidade: a inflamação crônica do tecido adiposo

Muitos aspectos das doenças em níveis molecular e celular podem ser atribuídos a danos provocados por radicais livres locais no microambiente imediato. DNA, lipídios e proteínas são vulneráveis ao dano oxidativo de radicais livres produzidos por macrófagos ativados e de reações espontâneas com glicose e outros açúcares. Por outro lado, moléculas oxidadas podem interagir com – e estimular – processos inflamatórios (Naves, 2009).

O Processo de defesa do organismo requer energia, dependente de trocas que determinam a duração e o tipo de resposta inflamatória e o nível de reparo e regeneração (Finch, 2007). A fase aguda da imunidade os sinais cardinais da inflamação em um dano localizado: calor, rubor, tumor, dor. A inflamação é reconhecida por incluir um sistema complexo, com multi-órgãos de defesa e reparo, com envolvimento de radicais livres na citotoxicidade direta e na sinalização celular normal (Naves, 2009).

A resposta inflamatória é caracterizada pela ativação coordenada de várias vias sinalizadoras que regulam a expressão de mediadores pró e antiinflamatórios. A inflamação aguda é caracterizada pelo recrutamento de leucócitos da circulação, classicamente definido pela passagem de granulócitos polimorfonucleares seguida pelos monócitos, que localmente se diferenciam a macrófagos. Invariavelmente essa resposta é desencadeada por mastócitos e macrófagos residentes, cuja degranulação e ativação sequencialmente liberam uma bateria de mediadores inflamatórios, incluindo aminas bioativas (por exemplo, histamina), citocinas, quimiocinas, bem como mediadores lipídicos que coletivamente recrutam e ativam células inflamatórias e atuam na formação de edema (Lawrence & Gilroy, 2007).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, desde 1980, a prevalência de obesidade aumentou mais do que o triplo em todo o mundo, sendo que esse dado não está limitado a nações desenvolvidas. A incidência da obesidade está crescendo mais agudamente naqueles países que se industrializaram rapidamente, aumentando a epidemia das doenças associadas com a obesidade, incluindo diabetes, dislipidemias, doenças hepáticas e arterosclerose (Subramanian & Ferrante, 2009).

Até pouco tempo atrás o papel do tecido adiposo, por si só, no desenvolvimento da obesidade e suas conseqüências, era apenas passivo; os adipócitos eram considerados

como pouco mais do que células de armazenamento de gordura. Entretanto, atualmente já está claro que os adipócitos representam um componente crítico do controle metabólico e endócrino, com efeitos positivos e negativos. A obesidade passou a ser reconhecida como uma condição como baixo grau de inflamação crônica. O aumento do tecido adiposo tem sido associado com o aumento em diversas outras moléculas inflamatórias, incluindo proteína C-reativa (PCR), inibidor da ativação do plasminogênio (PAI-1), proteína amilóide A sérica, fator inibidor da migração (MIF), resistina, óxido nítrico sintase indutível (iNOS), interleucina-6 (IL-6), fator estimulador de colônias de macrófagos (CSF-1) e proteína-1 quimiotática de monócito (MCP-1) (Hotamisligil, 2006).

A inflamação induzida pela obesidade, também denominada “metainflamação”, é considerada um mecanismo potencial envolvido em patologias metabólicas como resistência à insulina, diabetes tipo 2, esteatose hepática, aterosclerose, doenças imunológicas e diversos tipos de câncer (Yu et al., 2009).

A obesidade ocorre como resultado de um aumento de tecido branco, causado pela hiperplasia e/ou hipertrofia dos adipócitos. O tecido adiposo é um órgão secretório ativo que produz fatores conhecidos como adipocinas (que são polipeptídeos produzidos pelos adipócitos que agem de maneira autócrina, parácrina ou endócrina para controlar as funções metabólicas), incluindo leptina, adiponectina, resistina e muitas citocinas do sistema imunológico, como TNF-alfa, interleucina-6 (IL-6) e o fator complemento D (Inadera, 2008).

As adipocinas interagem com diversos processos metabólicos em diferentes órgãos/sistemas, influenciando diversos fenômenos sistêmicos. Assim, a produção desequilibrada de adipocinas está envolvida no desenvolvimento de doenças metabólicas e vasculares relacionadas à obesidade (Inadera, 2008). Além disso, as adipocinas influenciam a resistência à insulina sistêmica e têm papel na fisiopatologia da síndrome metabólica e de doenças cardiovasculares, além de contribuírem para o estado inflamatório local e sistêmico característico da obesidade (Inadera, 2008).

A relação entre obesidade e inflamação é fundamental, já que os adipócitos secretam diversas citocinas inflamatórias. Ainda, os níveis sanguíneos de citocinas pró- inflamatórias tendem a aumentar a obesidade. A adiposidade visceral está correlacionada com níveis plasmáticos de LDL-oxidada e PCR. Os níveis de peróxidos lipídicos podem estar duas vezes aumentados em obesos (Finch, 2007). O processo

inflamatório da obesidade implica aumento do estresse oxidativo. A produção de radicais livres é aumentada nos adipócitos (Keaney et al., 2003) .

A inflamação crônica de baixo grau é um aspecto comum de muitas complicações da obesidade que parecem emanar em parte do tecido adiposo. Nos indivíduos obesos, o acúmulo de macrófagos é componente crítico no desenvolvimento da inflamação induzida pela obesidade. Os macrófagos presentes no tecido adiposo são derivados da medula óssea, e seu número está fortemente relacionado com o peso corporal, com o IMC e com a gordura total. Os macrófagos recrutados no tecido adiposo expressam altos níveis de fatores inflamatórios que contribuem para a inflamação sistêmica e resistência à insulina. Intervenções que objetivam a redução do número de macrófagos ou a diminuição de suas características inflamatórias melhoram a sensibilidade à insulina e reduzem a inflamação. O acúmulo de macrófagos e a inflamação do tecido adiposo são processos dinâmicos sob controle de múltiplos mecanismos (Subramanian & Ferrante, 2009).

Indivíduos obesos apresentam níveis elevados de PCR, TNF-alfa e IL-6 quando comparado com indivíduos magros (Fantuzzi, 2005). O tecido adiposo é um órgão secretório ativo, que responde a sinais que modulam apetite, o gasto energético, a sensibilidade à insulina, o sistema endócrino, o sistema reprodutor, o metabolismo ósseo, a inflamação e a obesidade. Ele pode ser dividido em dois principais tipos: tecido adiposo branco e tecido adiposo marrom. O tipo branco representa a maior parte do tecido adiposo no organismo e é o sítio de armazenamento de energia; já a fração marrom tem como principal função manter a termogênese, principalmente em neonatos. O tecido adiposo branco é composto por muitos tipos celulares, sendo os adipócitos os mais abundantes; dentre as outras células presentes, cerca de 10% são macrófagos CD14 e CD13. O número de macrófagos presentes no tecido adiposo branco está diretamente correlacionado com a adiposidade e com o tamanho do adipócito, sem diferenças significantes entre o tecido subcutâneo e visceral. Esses macrófagos são a principal fonte de TNF-alfa produzido pelo tecido adiposo branco e contribuem com aproximadamente 50% da IL-6. A afirmativa que a obesidade está diretamente associada com o aumento no tamanho de adipócitos (hipertrofia), este fator se deve a uma forte indicação de infiltração de macrófagos. Células maiores secretam mais genes quimioatraentes e relacionados com a função imune, que podem estar envolvidos no recrutamento de macrófagos (Weisberg et al., 2003).

2.6.2. Obesidade e sua relação com a Resistência à insulina

A obesidade e a resistência à insulina têm sido apontadas como pontos-chave para a sequência de anormalidades metabólicas, inflamatórias e hemodinâmicas que contribuem para um maior risco de desenvolvimento do diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia, aterosclerose, níveis aumentados de ácido úrico, alterações dos fatores fibrinolíticos, entre outras ordens (Correa et al., 2003).

Sabe-se, hoje, que o tecido adiposo não é um órgão estático, mas um notável órgão endócrino, muito dinâmico, capaz de secretar uma série de citocinas com implicações diretas e indiretas não só no processo de inflamação sistêmica, mas, particularmente no processo da inflamação vascular. Entre essas citocinas, encontra-se o angiotensinogênio, a interleucina-6 (IL-6), o fator alfa de necrose tumoral (TNF-alfa), o inibidor da ativação do plasminogênio (PAI-1), a leptina, a resistina e a adiponectina. A maioria dessas citocinas encontra-se elevada na obesidade, criando um ambiente inflamatório crônico subclínico que deteriora a sensibilidade à insulina (como o TNF- alfa), provoca distúrbios da fibrinólise (aumento da PAI-1), aumento da adesão de moléculas ao endotélio, além de favorecer a elevação da pressão arterial (angiotensinogênio). Por outro lado, o acúmulo de gordura visceral provoca redução da única adipocina descrita até o presente que melhora a sensibilidade à insulina – a adiponectina (Kip et al., 2004).

Um estudo que procurou investigar a relação entre o estresse oxidativo, obesidade e resistência à insulina em homens demonstrou que a obesidade é um importante fator para o aumento do estresse oxidativo, disparando o desenvolvimento da resistência à insulina (Urakawa, 2003).

Na obesidade, o tecido adiposo torna-se inflamado, devido à infiltração de macrófagos quanto à produção de citocinas inflamatórias pelas células adiposas. A inflamação do tecido adiposo é uma etapa crucial no desenvolvimento da resistência à insulina (Naves, 2009). Também é conhecido que o adipócito, de acordo com a sua localização, apresenta características metabólicas diferentes, sendo que a adiposidade intra-abdominal é a que apresenta maior impacto sobre a deterioração da sensibilidade à insulina (Giorgino et al., 2005).

Sabe-se também que as vias de sinalização inflamatórias podem também ser ativadas pelo estresse metabólico originado no interior da célula ou de moléculas sinalizadoras extracelulares, como pela produção excessiva de espécies reativas de

oxigênio (EROs) e pelo estresse do retículo endoplasmático (RE). O aumento da produção de EROs está relacionado com a elevação dos ácidos graxos circulantes que ocorre na obesidade. Esses ácidos contribuem para o estresse oxidativo por acarretarem o desacoplamento mitocondrial e a Beta-oxidação (Rao & Reddy, 2001).

2.6.3. Obesidade e sua relação com o Estresse

O estilo de vida pouco saudável caracterizado pela modernização e industrialização, que culminou no aumento do consumo de alimentos processados, sedentarismo, exposição a diversas toxinas e estresse psicológico, formando um ambiente completamente diferente do que nossos antepassados conheceram (Naves, 2009).

O equilíbrio orgânico é mantido por uma complexa interação bioquímica que mantém a homeostasia e pode ser constantemente alterado por diferentes fatores intrínsecos e extrínsecos, denominados estressores (Mcewen, 1998). O estresse é definido como um estado de desarmonia orgânica, desencadeada pelos estressores, regulado por uma complexa interação fisiológica e comportamental que tem o objetivo de restabelecer o equilíbrio (resposta adaptativa ao estresse). A resposta adaptativa ao estresse é determinada, para cada indivíduo, por meio de fatores genéticos, ambientais e fisiológicos (Chrousos, 2007).

A alteração da habilidade de lidar com os estressores – como, por exemplo, a exposição inadequada, excessiva e/ou prolongada – podem levar ao aparecimento de doenças e impactar diversas funções fisiológicas, como o crescimento, reprodução e imunocompetência, bem como o desenvolvimento da personalidade e do comportamento do indivíduo (Tsigos & Chrousos, 2002). Como parte da resposta adaptativa ao estresse, as funções que demandam energia (reprodução e funcionamento do trato digestório, por exemplo) são transitoriamente inibidas a fim de preservar energia e promover o redirecionamento de oxigênio e nutrientes para sistema nervoso central (Kyrou & Tsigos, 2008). Esta má adaptação ao estresse crônico leva uma secreção excessiva e prolongada de cortisol, resultante da ativação freqüente do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA) e da produção periférica do hormônio no tecido adiposo. Esse hipercoticolismo está associado com doenças como hipertensão, osteoporose e depressão, além de contribuir para o desenvolvimento do fenótipo da

síndrome metabólica, caracterizada por obesidade visceral, resistência à insulina, dislipidemia e comorbidades cardiovasculares.

A obesidade visceral é conseqüência mais importante do excesso de cortisol, já que esse hormônio regula a diferenciação adipocitária, função e distribuição do tecido adiposo. Ainda, estudos demonstram que o tecido adiposo visceral é mais responsivo à ação do cortisol por conter um grande número de receptores para esse hormônio (Björntorp, 1991).

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