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Aspectos legais da gestão das águas

Atualmente, diferentes fóruns internacionais discutem as formas de preservação e utilização dos recursos hídricos. Nesse caminho, o Brasil dá os primeiros passos para a concretização da utilização racional desse recurso, em oposição à falta de planejamento que até então marcou seu uso em território nacional.

Embora ainda seja considerado um texto exemplar na doutrina jurídica brasileira, o Código das Águas, de 1934, requeria avanços conceituais e instrumentação jurídica de gestão, relativos à preservação e utilização dos recursos hídricos. Isso porque esses recursos não apenas se tornaram mais escassos considerando-se a relação oferta/demanda, principalmente nas áreas mais povoadas, como também por sua qualidade ter se deteriorado, em função da poluição, além de terem se exacerbado os conflitos de interesse por sua utilização.

Uma modificação importante em relação ao Código das Águas, foi introduzida pela Constituição de 1988, que extinguiu o conceito de domínio privado da água, ainda considerado como possível, em alguns casos, por aquele diploma legal.

A partir da Constituição Federal de 1988, todos os corpos d’água, passaram a ser de domínio público, sendo de domínio da União os rios e lagos que banham mais de um Estado, ou que servem de fronteira para o território nacional ou entre dois Estados. São de domínio dos Estados, os corpos d’água completamente inseridos em seus territórios.

No entanto o mais importante avanço em relação ao Código das Águas foi dado pela Lei nº 9.433, de 08/01/97, que introduz princípios e instrumentos de planejamento e gestão para a utilização dos recursos hídricos em território nacional.

Dentre esses princípios e instrumentos, chama-se atenção para os seguintes: • a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento;

• o uso múltiplo da água;

• a gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos;

• a elaboração de Planos de Recursos Hídricos, como elementos programáticos de planejamento para as bacias hidrográficas;

• a outorga do direito de uso e cobrança pelo uso da água;

• o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (órgão superior de Sistema Nacional de Recursos Hídricos), os Comitês de Bacias e as Agências de Água (órgãos gestores dos recursos hídricos no âmbito de cada bacia, que contam com a participação dos governos estaduais e/ou federal, além da sociedade civil organizada);

• o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos, cujo objetivo é organizar e difundir a base de dados a respeito das bacias hidrográficas e seus respectivos recursos hídricos.

Deve-se ainda considerar, como importante passo no sentido do gerenciamento da utilização da água em território brasileiro, a aprovação da Lei nº 9.984, de 17/07/01, que criou a Agência Nacional de Águas – ANA, à qual caberá implantar a Política Nacional de

Recursos Hídricos, além de estabelecer, para os rios federais, os princípios e instrumentos de planejamento e gestão instituídos pela Lei nº 9.433/97.

A primeira legislação descentralizadora sobre a gestão de recursos hídricos do Brasil foi implantada pelo Estado de São Paulo em 1991, portanto, anterior à Lei Federal 9.433 de 1997. Observa-se que a condução dos sistemas de gestão de recursos hídricos no país, na direção de uma maior participação dos usuários, sociedade civil e órgãos governamentais nas decisões já completa mais de duas décadas (CARRERA-FERNANDEZ, 2002), No entanto, da teoria para a prática o caminho é longo e difícil. Atualmente ainda se observam grandes dificuldades na implantação de um sistema mais descentralizado de gestão. Apenas a legislação não é suficiente para garantir a execução do modelo proposto, pois há muitas variáveis influenciando na sua prática. Mesmo com a criação ou as reformas das legislações Estaduais e Distrital sobre recursos hídricos baseadas na legislação federal, há ainda muitas diferenças e peculiaridades entre as bacias hidrográficas ao longo dos diferentes territórios de um Estado ou no Distrito Federal.

Dentre essas peculiaridades vale ressaltar as diversas condições ecológicas, socioeconômicas e políticas, o que pode propiciar uma maior velocidade de implantação do modelo institucional de gestão em algumas bacias em relação a outras, ou a criação de comitês mais representativos dos interesses públicos e privados em relação à água em determinadas bacias. Destacamos ainda, a existência de comitês de bacias hidrográficas ou organismos de gestão mais pragmáticos em diferentes bacias, com diferentes capacidades de resolução de seus problemas.

Considerando essas diferenças e dificuldades, constata-se que, apesar de grande parte dos autores concordarem que estamos seguindo um caminho promissor na gestão das águas, ainda há muito que se progredir para que os comitês de bacia exerçam de fato o papel que lhes é determinado na legislação Federal, Estadual e Distrital.

Um exemplo dessa necessidade de progresso, segundo Ramos (2005) é a freqüências de ingerências políticas ou interferência de organismos centrais e centralizadores na definição de políticas para determinadas bacias do país. Sendo assim, constata-se que a aplicação da legislação, por si só, não é garantia de sustentabilidade tanto do sistema nacional de gestão de recursos hídricos, como do sistema de exploração desses recursos.

É necessário evoluir para além da legislação, buscando modelos locais de gestão que abordem a sustentabilidade, não somente do sistema nacional, mas também dos recursos hídricos e dos recursos naturais como um todo, envolvendo-se todo o ambiente do qual o homem também é integrante, considerando-se a sustentabilidade ambiental, política e

socioeconômica de cada local. (RAMOS, 2005). A constituição do Índice de Sustentabilidade de Bacias Hidrográficas proposto nesse estudo almeja contribuir nesse contexto.