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Como afirmamos anteriormente, desenvolvemos um trabalho de leitura mediada apoiado em uma tríade, que tem como eixos: o professor como modelo de leitor, as ações do professor para realizar a leitura mediada e a biblioteca como dispositivo pedagógico facilitador. As análises, portanto, foram realizadas considerando esses três aspectos fundamentados nos estudos teóricos apresentados. Mais uma vez ressaltamos que esses elementos são

interdependentes, pois eles interagem entre si durante toda a leitura mediada. A separação feita nesta análise é didática, elaborada para uma melhor compreensão da mesma.

Como uma das características do trabalho é a rotina com os alunos, os encontros foram muito semelhantes, não apenas no que diz respeito às ações do professor, estratégias de leitura utilizadas e interferência do espaço, como também em relação ao conteúdo, ou seja, as obras escolhidas. Por esse motivo optamos por descrever todos os encontros, mas realizamos a análise contemplando aspectos que nos pareceram de maior relevância para atingir os objetivos da pesquisa.

Em relação ao primeiro eixo, o professor como modelo de leitor, destacamos a consciência e a clareza que o professor precisa ter de seu papel de modelo de leitor fluente, de leitor que lê com prazer e por prazer, compreendendo o que lê; de leitor que aproveita o texto, ampliando seus conhecimentos e estabelecendo relações.

O ato ou processo de fruir relaciona-se, na leitura, ao aproveitamento satisfatório e prazeroso do texto. O termo tem sua origem na idéia de “gozo” e é o que também se busca na leitura mediada: o prazer de ler um texto literário, a diversão pela leitura. Disso não decorre que se eliminem conhecimentos de uma forma geral, a partir de leituras de fruição.

Para a leitura ser prazerosa é necessário que o leitor compreenda o texto, e a compreensão de todo texto está sujeita a pontos de ancoragem, determinados pelos conhecimentos prévios do leitor. Por isso, é fundamental a demonstração e exploração dos conhecimentos prévios do grupo pelo professor na preparação, no aquecimento e na sensibilização para a leitura a ser feita.

Assim, toda exploração é feita antes da leitura ser iniciada, quando o professor pode informar os alunos sobre o contexto histórico da obra, sobre alguma particularidade relativa ao autor, ou mesmo fazer algum comentário relevante.

Nesse sentido, a leitura da história para os alunos precisa ser preparada previamente pelo professor. É importante que ele tenha definidas as estratégias

de leitura, tenha claras as características do gênero escolhido, o vocabulário a ser explorado e as interferências e recortes que devem ser realizados durante a leitura para a classe.

Um outro recurso apresentado pelo professor leitor é a intertextualidade, que diz respeito à relação que o autor e o leitor estabelecem com outros textos. Esse recurso faz uma interface com os conhecimentos prévios e constitui elemento auxiliar na compreensão do texto lido. O trabalho com a intertextualidade também amplia a possibilidade de fruição do leitor, pois ao fazer conexão com outros textos ele experimenta uma sensação de satisfação por estar diante do já conhecido. O trabalho com contos maravilhosos, por exemplo, possibilita relações intertextuais bastante produtivas.

Por meio da leitura mediada é possível promover também a construção de vínculo entre professor e aluno, o que, por sua vez, representa um aspecto de importância no processo de aprendizagem, por duas vias: uma em que o professor leitor vincula o aluno à leitura e a outra em que a leitura vincula o aluno ao professor leitor. Ambas favorecem a construção de vinculo afetivo do aluno não só com o professor, mas também com a própria leitura e com seu grupo.

Em relação ao segundo eixo elegemos algumas ações efetivas do professor para realizar a leitura mediada. A aula deve ser, pois, preparada pelo professor, para que ele, de fato, em cada gesto, em cada ação torne evidente para o aluno o ato de ler como meio para conquistar prazer, conhecimento etc.

Uma ação importante é convocar a participação efetiva do aluno no processo de compreensão do que está sendo lido. Com efeito, além de “emprestar” sua voz aos alunos durante a leitura, é importante o professor “dar” voz ao aluno, autorizando diferentes leituras presentes na leitura de obras literárias, pois o texto e a vida se falam, dialogam. Assim, por meio de suas perguntas o professor auxilia o aluno a emitir sua opinião sobre o livro, a explicitar a razão de ter ou não gostado do livro.

Estabelecer combinados e regras e fazê-los cumprir é uma outra ação importante. O papel centralizador do professor, ao exigir o silêncio por parte do grupo para ouvir a história e as informações sobre ela, ao significar a necessidade

de organização do grupo ao falar antes e após a leitura, torna a leitura mais agradável e, com isso, o trabalho se mostra mais eficaz.

Uma outra ação do professor consiste em escolher as obras literárias e/ou gêneros que propiciem um maior envolvimento do grupo e sejam adequados ao objetivo do trabalho proposto. No nosso caso, escolhemos os contos maravilhosos, por serem histórias universais, que, por razões culturais, fazem parte do conhecimento de mundo dos alunos, inclusive daqueles que nunca freqüentaram biblioteca e nem tiveram acesso aos livros. Ao serem apresentados o título, os personagens, os alunos identificam elementos que fazem parte de aventuras emocionantes, ora dramáticas, ora divertidas, que desafiam leitores e não leitores infanto-juvenis.

Outra ação importante a ser feita pelo professor é a proposta de registrar o resultado da leitura, sendo esta uma forma de fixação importante, para a ampliação do saber do aluno. Pode ser um desenho, que, ao mesmo tempo em que cumpre esta função, também contribui para a manutenção do prazer e para a expressão da leitura individualizada do aluno. Além do desenho, a verbalização feita por intermédio de um pequeno comentário abre espaço para o exercício escrito decorrente da leitura. Acrescente-se a isso o fato de o registro se constituir um meio eficaz para que o aluno vá construindo sua história de leitura, pessoal e única, e possa participar da história de leitura de todo o grupo.

O terceiro eixo diz respeito à utilização da biblioteca como dispositivo pedagógico facilitador. Leitura pede silêncio, tranqüilidade e um ambiente agradável. Além disso, o espaço da biblioteca também exige do usuário determinado tipo de comportamento no que diz respeito ao cumprimento de algumas regras como: não correr, não falar alto, não comer, não beber, não sair com livro sem avisar. Esses fatores reforçam a importância de regras e combinados com os alunos, como mencionamos acima, e dão relevância a atitudes e rotinas que vão desde o silêncio necessário durante a leitura até os procedimentos necessários para a renovação de um empréstimo de livro.

Um outro fator inerente a esse espaço é ter acesso ao acervo e empréstimo de livros. Nele o aluno tem a oportunidade de adquirir o hábito de ir às estantes e

explorar o acervo livremente, ou “tutelado” pelo professor mediador, o que é essencial na formação do usuário de biblioteca. Ter a oportunidade de estar com os livros, explorá-los, escolher um título para empréstimo e levá-lo para casa concretiza, para os alunos, o papel de leitores.

O empréstimo de livros viabiliza a experiência do aluno de aproximar-se efetivamente da leitura, para além do espaço da biblioteca. Dessa forma, o livro, e, conseqüentemente, a leitura, participam de maneira concreta da vida pessoal e social do aluno. Retirar um livro da biblioteca e levá-lo para casa é poder vivenciar a experiência de ser leitor. Devolvê-lo no tempo certo e sem danos é respeitar regras e vivenciar a experiência de leitor socialmente comprometido.

Outrossim, o fato de tomar contato com uma organização de informação, presente na biblioteca, mostra para o aluno sua importância social. O grande número de informações presentes em diversos suportes, como livros, vídeos, CDs, jornais, revistas etc. ganham, na visão do aluno um arranjo próprio e seu contato com essa diversidade o capacita para que ele possa vir a ser, em outro momento, um usuário autônomo de biblioteca.

A rotina, conquistada com um trabalho semanal e sistemático, na mesma hora, no mesmo lugar, usando as mesmas estratégias, cumprindo todos os momentos durante os encontros, permite que o trabalho se desenvolva com segurança, para o aluno e para o professor. Esta previsibilidade, que faz parte da rotina, vincula o aluno e lhe dá segurança, na medida em que ele sente familiaridade com o trabalho.

A leitura mediada realizada na biblioteca escolar busca ser um estímulo a mais para levar o aluno à leitura autônoma, principalmente se o aluno tiver acesso ao acervo, se for mediado pelo professor em suas escolhas e se a biblioteca tiver disponíveis para empréstimos os títulos lidos durante a leitura mediada.