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4. GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO

4.1. Aspectos Teóricos e Conceituais

Buscou-se examinar a literatura e procurar identificar agrupamentos dos conceitos de informação e conhecimento. BUCKLAND (1988) já salientava que as definições podem não ser satisfatórias, inteiramente. As fronteiras entre esses usos podem ser indistintas, e tal abordagem poderia não satisfazer alguém determinado a estabelecer o significado correto de "informação”. Mas se os principais usos podem ser identificados, classificados e caracterizados, então algum progresso poderá ser alcançado.

Para esse exercício, adota-se como ponto de partida a discussão dos paradigmas epistemológicos propostos por CAPURRO (2003), a saber: paradigma físico, paradigma cognitivo e paradigma social.

O paradigma físico está relacionado à Teoria da Informação de SHANNON & WEAVER (1949) e a Cibernética de NORBET WIENER (1948). Tal paradigma tem a intenção de vincular a veiculação física (o caminho que os sinais percorrem através de suportes físicos) e a transmissão de mensagens. Nesse paradigma, o usuário (aquele que usa a informação) tem seu papel cognoscente excluído ou pouco considerado.

Em abordagem semelhante, BUCKLAND (1988) apresenta três significados de "informação": informação-como-processo; informação-como- conhecimento e informação-como-coisa.

1. Informação-como-processo: quando alguém é informado, o que sabe é mudado. Nesse sentido, "informação" é “o ato de informar...; comunicação do conhecimento ou da notícia de algum fato ou ocorrência; a ação de se contar ou o fato de ser informado sobre alguma coisa”;

2. Informação-como-conhecimento: "informação” é usada também para denotar aquilo que é percebido na "informação-como-processo": o "conhecimento" comunicado relativo a um fato em particular, assunto, ou evento; aquilo que se informa ou conta a alguém; inteligência, notícia. A noção da informação como aquela que reduz incerteza poderia ser vista como um exemplo especial de ”informação-como- conhecimento". Ressalva-se que, às vezes, a informação aumenta a incerteza;

3. Informação-como-coisa: o termo “informação" é usado também como atributo para objetos, tais como dados e documentos, a que se refere como "informação" porque são considerados como informativos, como "tendo a qualidade de transmitir conhecimento ou de comunicar informação; instrutivo”. Variedades de "informação-como-coisa" incluem dados, texto, documentos, objetos, e eventos. Aquilo que os sistemas de armazenamento e de recuperação da informação armazenam e recuperam é necessariamente "informação-como-coisa".

Uma característica-chave de "informação-como-conhecimento" é ser intangível: não se pode tocá-la ou medi-la de forma direta. Conhecimento, crença e opinião são pessoais, subjetivos e conceituais. Por isso, para comunicá-los, eles têm que ser expressos, descritos ou representados de alguma maneira física, como sinal, texto ou comunicação. Tal expressão, descrição ou representação seria "informação-como-coisa".

O paradigma cognitivo nasce numa iniciativa conseqüente da intenção de se acumular toda a produção registrada pelo homem, ou seja, não basta somente acumular os suportes dos registros informacionais, mais importante que isso, são os conteúdos de tais suportes. É nesse paradigma que nasce, formalmente, os estados cognitivos anômalos de BELKIN et. al. (1982), em que o conhecimento do sujeito frente a um problema não é suficiente, portanto ele precisa se instruir com o intuito de resolvê-lo.

Para os autores, esse processo tem início com um problema (ou uma dúvida) que motiva o usuário a buscar informação para resolvê-lo ou “preencher uma lacuna” em seu conhecimento. A essa lacuna ou "gap", BELKIN et al. (1982) denominaram de estado anômalo do conhecimento e criaram a sigla ASK - Anomalous State of Knowledge.

Conforme o conceito ASK, a necessidade de informação, apesar de desconhecida pelo indivíduo, está subjacente à tarefa de resolução de um problema ou da aquisição de um novo conhecimento. Isto ocorre quando o usuário, diante de um problema, reconhece que o seu conhecimento não é suficiente para resolvê-lo e, por isso, precisa obter novas informações. Essa é a motivação necessária, a qual deverá desencadear o processo de busca de informação.

um documento reflete aquilo que o autor sabe sobre um tópico ou assunto, refletindo o seu conhecimento sobre aquele tópico ou assunto, enquanto a expressão de necessidade do usuário é, ao contrário, uma declaração daquilo que o usuário não sabe sobre o assunto. Em outras palavras, um documento é a expressão do conhecimento de uma pessoa, já a necessidade de informação é a representação de uma dúvida ou, um estado anômalo do conhecimento. (BELKIN et al.,1982, p. 63)

Para WERSIG & NEVELING (1975), o problema da Ciência da Informação estaria na definição de “informação” que, conforme as origens profissionais dos especialistas, teria sentidos e conotações próprias e diferenciadas. WERSIG (1993) citado por FREIRE (1995) sugere que se adote para a ciência da informação uma estratégia metodológica que envolva a interação com conceitos e modelos de outras áreas científicas, de modo a construir um quadro referencial teórico que possa trabalhar com as formas de expressão do conhecimento como estruturas que transformam e são transformadas no processo de produção e comunicação social. Sua idéia (...) é que: ‘Informação é conhecimento (para) ação’ (...). Esse conhecimento tem se transformado historicamente, mas sempre no sentido de representar alguma informação que apóie uma ação dentro de uma situação específica, diminuindo a incerteza sobre o comportamento do sistema em sua interação com o meio ambiente”.

Já o paradigma social reside na busca de relação entre o conceito de informação com as práticas sociais. Como bem afirmam CAPURRO & HJØRLAND (2003, p. 08) “o objeto da ciência da informação é o estudo das relações entre os discursos, áreas de conhecimento e documentos em relação às possíveis perspectivas ou pontos de acesso de distintas comunidades de usuários”. O usuário, nesse contexto, tem um papel ativo e a idéia de estado cognitivo anômalo é encarada como um estado existencial anômalo em que as necessidades informacionais estão imbricadas numa rede social.

NASCIMENTO & MARTELETO (2004) concordam com CAPURRO & HJÖRLAND (2003), ao ressaltarem que as teorias da informação nada mais são do que distinções frente às propriedades transcendentais da informação.

SHANNON & WEAVER (1949) não asseguram a construção do saber pela quantificação da informação, assim como BUCKLAND (1988) atrela sua proposta às premissas de se medir e processar a informação, o tangível, ou representar o conhecimento e estar informado, o intangível. Estes quadros conceituais, auxiliados pelas teorias e técnicas da Biblioteconomia, fundamentam o pensamento dos que estudam, desenvolvem e desenham sistemas de informação, armazenagem e sistemas de recuperação de dados, tendo a informação como objeto físico passível de quantificação, padronização, classificação, controle e certificação. Mas, não a informação construída como prática social (NASCIMENTO & MARTELETO, 2004, p. 01).

As definições no presente estudo estão mais relacionadas ao paradigma social porque busca o entendimento da inter-relação entre os termos informação e conhecimento em seus aspectos coletivos ou no contexto social conforme sugerido por NASCIMENTO & MARTELETO (2004), evitando a abordagem tradicional focada no usuário ou no sistema.

Não há dúvidas que os processos de produção, transferência e uso das informações são sociais, já que eles acontecem entre a sociedade e suas relações sociais. E, por isso, estão concatenados ao desenvolvimento social, que é fruto do crescimento urbano e comercial, da diferenciação de classes, da especialização do trabalho, das inovações tecnológicas, do acesso educacional, do bem-estar social e do entretenimento, no quadro da modernidade ocidental. [...] Neste cenário, entende-se que as dimensões históricas, culturais, econômicas, tecnológicas, sociais e políticas são pré- condições para o entendimento da ‘informação’ (NASCIMENTO & MARTELETO, 2004, p.02).

No entanto, não é tarefa fácil chegar a uma distinção clara e precisa entre informação e conhecimento em função da pluralidade de conceitos e porque, na maioria das vezes, os termos são utilizados indistintamente. STENMARK (2002) fala sobre esta dificuldade e apresenta o quadro 07 com a definição dos termos por alguns estudiosos.

QUADRO 07

Dado x Informação x Conhecimento

AUTOR(ES) DADO INFORMAÇÃO CONHECIMENTO

WIIG (1993) - Fatos organizados para

descrever uma situação ou condição Verdades e crenças, perspectivas e conceitos, julgamentos e expectativas, metodologias e Know-how NONAKA & TAKEUCHI (1997) - Um fluxo de mensagens

com significado Crenças e compromissos criados a partir das

mensagens com

significado DAVENPORT

(1998) Simples observações Dados com significado (relevância e propósito) Informação proveniente da mente valiosa humana.

DAVENPORT &

PRUSAK (1998) Um grupo discreto de dados Uma significado para mudar a mensagem com percepção do receptor

Experiências, valores, insights e informação contextualizada

CHOO (2000) Fatos e mensagens Dado com significado Crença justificada, verdadeira

Fonte: Adaptado de STENMARK, 2002, p.2

ALVARENGA NETO (2005) questiona a falta de linhas divisórias claras, distintas e precisas dessas comparações conceituais entre os termos e busca em CHOO (2002) a proposta de que, para se compreender as distinções entre dado, informação e conhecimento, deve se fazer uma análise sob a perspectiva de um continuum de valores fundamentalmente marcados pela contribuição humana crescente – processamento, gestão, ação, resultado, aprendizagem e retroalimentação.

O objetivo do continuum é a ação que leva a resultados, visto que as organizações agem para resolver problemas, explorar oportunidades e evitar crises e ameaças. O escopo das possíveis ações é extremamente amplo e inclui o desenvolvimento de estratégias, alianças e novas iniciativas, além de inovações em produtos, serviços e processos organizacionais (ALVARENGA NETO, 2005, p. 36).

NONAKA & TAKEUCHI (1997), assevera que apesar dos termos informação e conhecimento serem usados com freqüência como termos análogos, existe distinção entre eles:

1) A informação possibilita uma nova maneira de interpretar eventos ou objetos, o que torna palpável significados antes invisíveis [...]. Por isso, a informação é um meio ou material indispensável na extração e criação do conhecimento.

2) O aspecto semântico da informação é mais importante para a criação do conhecimento, pois concentra no significado transmitido.

3) A informação é um fluxo de mensagens, enquanto o conhecimento é construído por esse fluxo de informação, aportado nas crenças do seu possuidor. O conhecimento está essencialmente relacionado com a ação humana.

4) Tanto a informação como o conhecimento são específicos ao contexto e relacionais na medida em que dependem da situação e são criados de forma dinâmica na interação social entre as pessoas.

Dessa forma, a distinção entre os termos fica mais clara quando se resgata a dimensão tácita do conhecimento. Para POLANYI (1966), o conhecimento subjacente ao conhecimento explícito é mais fundamental; todo conhecimento é tácito ou tem raízes no conhecimento tácito. E, portanto, o conhecimento não é privado ou subjetivo e, embora pessoal, ele é construído também de forma social.

SVEIBY (1998) apropria das contribuições de POLANYI (1966) e apresenta as quatro características do conhecimento: 1) o conhecimento é tácito, 2) o conhecimento é orientado para a ação – estamos constantemente gerando novos conhecimentos por meio da análise das impressões sensoriais que recebemos; 3) o

conhecimento é sustentado por regras – existem regras também para processar o conhecimento de forma consciente ou inconsciente; e 4) o conhecimento está em constante mutação.

Da mesma forma, DAVENPORT & PRUSAK (1998) também descrevem sobre a natureza tácita do conhecimento ao afirmar que:

conhecimento é uma mistura fluida de experiência condensada, valores, informação contextual e insight experimentado, a qual proporciona uma estrutura para avaliação e incorporação de novas experiências e informação. Este tem origem e é aplicado na mente dos conhecedores. Nas organizações, ele costuma estar embutido não só em documentos ou repositórios, mas também em rotinas, processos, práticas e normas organizacionais (DAVENPORT & PRUSAK, 1998, p.6).

No entanto, ainda ressaltam que não se tem a intenção de simplificar o debate teórico, mesmo porque “os espistemólogos passam a vida tentando entender o que significa conhecer”. A complexidade do conhecimento humano inviabiliza qualquer tentativa de explicação a partir de uma linha teórica isolada. MORIN (1999) defende que o conhecimento pode ser investigado sob diversas perspectivas porque envolve subsistemas culturais, sociais e psicológicos, além do biológico. “O conhecimento é, portanto, um fenômeno multidimensional, de maneira inseparável, simultaneamente físico, biológico, cerebral, mental, psicológico, cultural, social” (MORIN, 1999, p. 18).

Portanto, adota-se como recorte nesse estudo uma visão pragmática do que pode ser chamado de conhecimento organizacional ou inter-organizacional que posso ser segmentado em dois tipos básicos de conhecimento: 1) conhecimento explícito entendido como informação (tangível), ou seja, relacionado aos registros, documentos, à materialidade de algum tipo de suporte como papel, disquete, fitas magnéticas, cd-rom, redes eletrônicas, dentre outros. E o conhecimento tácito relacionado ao fazer humano, ou seja, à habilidade, a experiência, os valores, as redes sociais dentre outros.