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A Associação Wyty Catë das Comunidades Timbira do Maranhão e Tocantins

1 DESENVOLVIMENTO E POVOS INDÍGENAS NO CONTEXTO DAS QUESTÕES

2.2 ATORES SOCIAIS EM QUESTÃO: ASSOCIAÇÃO WYTY CATË E CENTRO DE

2.2.2 A Associação Wyty Catë das Comunidades Timbira do Maranhão e Tocantins

A Associação Wyty Catë é uma entidade sem fins lucrativos que agrega cerca de 20 aldeias pertencentes aos povos indígenas Krahô, Krikati, Kanela Apãnjekrá, Kanela Rãkokamekrá e Gavião Pykobjê, cujas terras estão localizadas ao sul do estado do Maranhão e norte do estado do Tocantins. A Wyty Catë possui sede própria em Carolina, no estado do Maranhão. É, sócia proprietária da FrutaSã Indústria e Comércio LTDA, juntamente com o CTI.

A história de criação da Wyty Catë confunde-se com a própria da criação do Projeto Frutos do Cerrado, no qual a FrutaSã está inserida como vertente econômica. As discussões precursoras da Wyty iniciaram-se com os Krahô, com a interlocução do CTI, no

58 final da década de 1980 e foram impulsionadas pelo que o CTI classifica de “intenso intercâmbio cultural entre os Timbira” (CTI, 2005).

Foi a intenção de criar uma organização que refletisse a diversidade desses povos nos processos reivindicatórios da região que estimulou a fundação da associação indígena. Vale lembrar que no país a promulgação da Constituição de 1988 e o fim, no plano oficial, da tutela para os povos indígenas facilitaram o processo de surgimento de associações indígenas em todo o território nacional. Soma-se a esse dado a globalização das questões ambientais, marcadas dentre outros eventos, pela Eco 92 realizada no Rio de Janeiro e o incentivo financeiro dados por organismos internacionais à organizações que unissem ações de conservação ambiental ao desenvolvimento comunitário. O movimento indígena passa nesse contexto, por uma transição entre o caráter extremamente político cujo maior interlocutor era apenas o Estado, para uma intervenção mais aberta e uma relação mais ampla com atores sociais, para o que Bruce Albert (2000) chama de etnicidade de resultados.

A intervenção do CTI dá-se, portanto, nesse contexto. No início desse processo, promove a articulação política e cultural entre as aldeias Timbira, por meio de reuniões em que estavam presentes representantes de diversos povos e também com o incentivo a realizações de rituais com o intercâmbio entre as aldeias dos Timbira, o que foi um fator decisivo para a constituição da Wyty. É claro, nada disso seria possível sem a própria articulação indígena, realizada naquele contexto por lideranças que atualmente são consideradas os conselheiros da organização. A associação foi fundada em 1994 e registrada em cartório em 1996. Dentre os Timbira, foi uma das primeiras organizações instituídas, precedida pela Associação Mãkrakré, fundada em 1988 e que congregava inicialmente todas as aldeias Krahô. A associação Mãkraré foi uma referência para Wyty Catë em seu início, de acordo com o que relata Jonas6 Gavião:

A gente também tem problema interno, entre nós mesmos. A família, o grupo, a comunidade. No início, foi criada a Associação Mãcraré, em Itacajá. Lá, tiveram desentendimento entre eles (os Krahô) e isso foi dividindo. E aí eles tiveram uma idéia brilhante, o pessoal da Aldeia Nova com o Rio Vermelho. Que assim, como estavam, eles se sentiam fracos, lutando muito para adquirir uma coisa para o benefício deles, pro futuro. Então eles pediram para o Gilberto e Maria Elisa (fundadores do CTI) ajudarem. Eles trabalhavam há muito tempo com os Krahô e também com os Canela, e estavam trabalhando com os Krikati na demarcação da terra.

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Em 1994, nós tivemos um encontro aqui. Foi o período em que eles começaram a fazer a articulação: o José Torino, o Hapyhi, o Zé Diniz, o Moisés, que é do Canela… Nesses percursos que eles faziam, divulgando a criação da Wyty Catë, iam escolhendo as pessoas. Faziam reunião na aldeia e lá na comunidade as lideranças, os caciques, escolhiam as pessoas para fazer parte da organização, ter um cargo na associação. (Jonas Gavião, 2007)

Os Timbira, mesmo sendo povos que compartilham uma série de elementos culturais classificados no que chamamos de forma Timbira, possuem, entre si, uma memória de lutas, de disputas que chegavam a ser bélicas no processo do contato com a sociedade envolvente. A Wyty Catë é uma associação que congrega povos indígenas que, apesar de serem classificados dentro de um mesmo padrão cultural, possuem estranhamentos culturais entre si. Siqueira (2007) questiona em sua análise a respeito da Wyty Catë, até que ponto essa associação, fomentada em um primeiro momento pelos antropólogos do CTI, não estaria situada no conceito apontado como “comunidade imaginada”, alimentada atualmente pelos próprios dirigentes da Wyty em sua relação com o universo dos projetos e ações de etnodesenvolvimento. Iramar Hojawen Krahô, diretor da associação, relata a experiência da Unidade Timbira:

Só através da Funai, através de outras entidades nós nunca tivemos como que dê certo pra juntar os mehi que estão espalhados no Maranhão e Tocantins. Que a gente somos povos indígenas que é os Krahô, mas tem outros nossos povos, parentes que estão no Maranhão. Então o pessoal se juntaram e criaram uma organização indígena que hoje é uma associação, a

Wyty Catë que é nossa organização, que pega 14 aldeias que são

associadas hoje e a gente vem vindo, conversando, trocando idéia, fazendo intercâmbio, conversa com cacique, nas aldeias do Maranhão e a gente faz o rodízio com os nossos Krahô (Iramar Hojawen , 2006).

A associação passou a ser um espaço de convívio político dos povos Timbira, provocando e alimentando o que muitos pesquisadores chamam de Unidade Timbira. O amálgama dessa relação é o trabalho realizado por essa associação ao longo dos anos e sua rede de relações estabelecida durante todo esse tempo, seja com instituições públicas esferas municipal, estadual e federal, seja com organizações não governamentais ou com agências financiadoras internacionais.

60 A Wyty Catë, como afirma Nascimento (2005), é uma espécie mista de associação, pois ao passo que incorpora o aparato institucional e burocrático que a permite dialogar com o universo não indígena, compartilha em sua organização social, de idéias e princípios relacionados à cultura Timbira. A Assembléia Geral da associação, por exemplo, realizada anualmente, é um grande conselho de caciques e lideranças indígenas. É um momento político singular, onde o respeito pelos mais velhos, fundadores e conselheiros da organização, prevalece na tomada de decisões. É um momento, também, de intenso intercâmbio político e cultural entre lideranças Timbira.

Ainda seguindo o princípio da Forma Timbira, o nome da associação, Wyty Catë, possui um significado determinante para a organização. Pode significar uma grande casa, que recebe a todos, que acolhe sem distinção. Pode se referir também a uma festa grande, cuja referência é a casa que recebe e alimenta a todos, que oferta.

Eles pensavam em vários nomes de festas indígenas, de organização, mas eles acharam melhor que fosse Wyty Catë. Que essa festa, quase todos os Timbira realizam. E nessa festa é pra juntar todo mundo. Então, a Wyty

Catë, como é de todos os Timbira, acharam que esse nome é viável pra

todo mundo, porque vai trazer todas as pessoas indígenas que são de cinco povos: Krahô, Canela, Gavião e Krikati e Apinajé (Jonas Gavião, 2007).

O nome da associação confere a ela uma grande responsabilidade. Os diretores da Wyty Catë sentem-se, em muitos momentos, “compelidos” a receber e acolher a todos os visitantes indígenas que chegam à Carolina, na sede da organização, com as mais diversas demandas, em função da complexa nominação que foi dada a esta associação. Mariano Carokré Krikati (2005), um jovem coordenador da entidade chegou a afirmar que “somente indígena pode entender porque que ele chama Wyty Catë”. Creuza Prym Cwy Krahô (2005), afirma que “o Wyty Catë é pra juntar todo mundo, não pode reclamar, tem que guentar”. Nesse sentido, a Associação Wyty Catë é uma organização cuja responsabilidade não diz respeito apenas á sua relação com a sociedade envolvente, mas também em congregar, juntar e zelar pelo bem estar dos Timbira, que como parentes que são, devem chegar e sempre ser bem recebidos nessa grande casa.

Sob a perspectiva histórica, Siqueira (2007) aponta três grandes fases da associação indígena. A primeira delas, entre os anos de 1992 e 1995, é marcada pela fundação da associação, por maior presença dos Krahô e pelo que o autor chama de “ecologização dos

61 discursos políticos”. A segunda fase, entre 1996 e 1999, é o período marcado pela aliança inter-étnica entre os indígenas e pequenos produtores, na Rede Frutos do Cerrado, que será descrita no tópico seguinte. A terceira fase, que em sua análise englobou os anos 2000 até 2006, diz respeito ao crescimento e a institucionalização da entidade, marcada também por maior presença do povo Krikati e Gavião nos cargos de diretoria e coordenação da associação. É justamente esse o período de maior profissionalização da fábrica FrutaSã, de acordo com o que será descrito no capítulo seguinte.

2.3 AS TABOCAS PARIRAM SEMENTES: A HISTÓRIA DO PROJETO FRUTOS DO