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1. PERCURSO METODOLÓGICO

3.2 ASPECTOS GERAIS DA CONJUNTURA DA CHEGADA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

3.2.3 Atores

Atores são os outros elementos a serem examinados numa análise de conjuntura. Trata-se é alguém ou instituição que representa um papel ativo dentro de um acontecimento. Denomina-se ator social quando esse indivíduo ou instituição atua em favor de alguma ideia, reivindicação para a sociedade, seja um grupo, uma classe, ou até mesmo um país (SOUZA, H., 2006).

O primeiro ator que se destaca no Brasil é o Poder Judiciário, esfera independente e encarregado da distribuição de justiça. Por ser composto por um grupo heterogêneo, seus setores mais progressistas, estimulam a inovação e a busca de alternativas mais equitativas de justiça. Assim, incentivando o desenvolvimento de projetos de justiça alternativa no Brasil, o Poder Judiciário tem se tornado mais comprometido com a justiça social (CARVALHO, L., 2005).

Cabe ao Poder Judiciário fornecer um conceito de Justiça Restaurativa uniforme no território nacional, para evitar disparidades de orientação e ação, mas sempre se atentando às particularidades de cada segmento da Justiça. Além disso, cabe a este poder buscar o aperfeiçoamento das suas respostas às demandas sociais quanto aos conflitos e violência, objetivando a paz social (BRASIL, 2016b).

A sensação de justiça e coesão do corpo social aumenta, na medida em que experiências de justiça alternativa começam a apresentar bons resultados, pois a comunidade beneficiada muda seu comportamento direcionada pelos princípios da justiça. Isso ratifica a ação judicial, pois está atendendo as expectativas sociais em matéria de segurança para todos e a melhoria das oportunidades e da qualidade de vida aos cidadãos e dos serviços públicos disponibilizados (CARVALHO, L., 2005).

Como corolário lógico dos resultados positivos trazidos pela aquela intervenção localizada, a pressão social aumenta em favor de políticas públicas de

74 justiça. Portanto, o Poder Executivo é chamado para institucionalizar a Justiça Restaurativa em seus documentos de políticas públicas.

A teor disso, destaca-se o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH- 3, aprovado através do Decreto nº 7.037, de 21.12.2009 (BRASIL, 2009), o qual contempla expressamente a Justiça Restaurativa nas diretrizes 17 e 19, dentre as 25 que estabelece.

A diretriz 17 trata da promoção da justiça mais acessível, ágil e efetiva, para garantia e defesa de direitos. Um de seus objetivos é a utilização de modelos alternativos de solução de conflitos, através de ações programáticas, tais como: o fomento de iniciativas de mediação e conciliação, estimulando a resolução de conflitos por meios autocompositivos, voltados à maior pacificação social e menor judicialização; capacitação de lideranças comunitárias sobre instrumentos e técnicas de mediação comunitária, incentivando a resolução de conflitos nas próprias comunidades; incentivos de projetos de Justiça Restaurativa (BRASIL, 2009).

Por sua vez, a diretriz 19 cuida do fortalecimento dos princípios democráticos e dos Direitos Humanos no âmbito da educação formal. Busca o desenvolvimento de estratégias de mediação de conflitos e de Justiça Restaurativa nas escolas, e outras instituições formadoras e de ensino superior, inclusive promovendo a capacitação de docentes para a identificação de violência e abusos contra crianças e adolescentes, dando o devido encaminhamento e a reconstrução das relações no âmbito escolar (BRASIL, 2009).

Verificando essas mudanças da forma de aplicação de justiça no Brasil, o Poder Legislativo também tratou de legislar sobre o assunto. O Novo Código de Processo Civil, Lei Federal nº 13.105/15 (BRASIL, 2015), prevê no artigo 165 que tribunais devem criar centros judiciários de solução consensual de conflitos, os quais são responsáveis pela realização de audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas para auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

Os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) são órgãos do Poder Judiciário, que proporcionam um ambiente neutro, no qual os interessados em solucionar um determinado conflito têm a chance de conversar, negociar e chegar a um acordo satisfatório, com o auxílio de um facilitador, isto é, um terceiro imparcial e capacitado em métodos consensuais de solução de conflitos.

Mais timidamente, o Ministério Público vem se despertando e se situando sobre seu papel na implementação de práticas restaurativas. No Banco Nacional de

75 Projetos do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) procurando em todas as unidades ministeriais brasileiras, utilizando como parâmetro de pesquisa os termos ‘restaurativo’ e ‘restaurativa’ encontrou-se sete projetos (BRASIL, 2017b).

Destacam-se dois projetos. O primeiro é do ano de 2015, vinculado ao Ministério Público do Paraná, que implantou o projeto intitulado “MP Restaurativo e a Cultura da Paz”, tendo por objetivos, sensibilizar integrantes do Ministério Público para a importância da utilização de práticas restaurativas na atuação ministerial e disseminar a cultura da paz. O segundo, do ano de 2017, é do Ministério Público do Rio de Janeiro, que criou o Centro de Mediação, Métodos Autocompositivos e Sistema Restaurativo do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, CEMEAR, que visa prestar auxílio aos órgãos de execução do Ministério Público na pacificação de conflitos com o emprego da técnica de mediação, do sistema restaurativo e de outros instrumentos não adversariais.

Finalmente, o último ator citado são os usuários demandantes da Justiça Restaurativa, ofensor, ofendido e comunidade. Por se tratar de uma justiça consensual, baseada no diálogo e na voluntariedade, imprescindível a participação ativa tanto de quem praticou o dano, quanto de quem o sofreu.

A Justiça Restaurativa eleva a importância da vítima, olhando-a como sujeito interessado na resolução do conflito, buscando, ao máximo, reparar o dano sofrido. Em igual medida, a Justiça Restaurativa tece um olhar diferenciado ao ofensor, se comparado com o dado pela justiça retributiva, oportunizando reconhecer seus erros e repará-los. Finalmente, a comunidade tem papel de destaque na Justiça Restaurativa, porque é convidada a auxiliar na resolução daquele problema, uma vez que pode ter sido prejudicada pelo dano cometido.

Visualiza-se que os atores elencados são tanto coletivos como individuais e têm papéis importantes na história, pois todos portam a intencionalidade de transformar a realidade, que é a aplicação da justiça de forma mais equânime.

Todavia, o que se mostra notório no Brasil é que, diferente do que ocorre no Norte, em que os atores principais são as partes envolvidas no conflito, aqui as experiências de Justiça Restaurativa são fundamentalmente advindas do Estado. Assim, as partes estão submetidas a um papel secundário, fazendo sua atuação como destinatários das políticas (ousa-se nomear dessa forma) determinadas por cada um dos Poderes. Com isso, o sentido comunitário, base da Justiça

76 Restaurativa, pode ser afetado, porque não se tem uma prática oriunda das próprias comunidades, observando suas singularidades.

Nos moldes como os atores estão agindo no Brasil - Estado como protagonista e partes envolvidas como coadjuvantes - o trato da Justiça Restaurativa não verifica em profundidade as particularidades de cada comunidade e respectivo conflito. Desta feita, a única maneira de dar solidez à Justiça Restaurativa é vinculando-a aos Direitos Humanos, respeitando a dignidade da pessoa humana.