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2 REVISÃO DE LITERATURA

2.2 Atresia folicular

As fêmeas dos mamíferos, com exceção das murinas, nascem com os ovários contendo sua reserva total de gametas, os quais são mantidos em bloqueio meiótico até a puberdade, quando uma porção deles é estimulada a crescer até culminar na ovulação (BYSKOV, 1982). Entretanto, evidências em murinos sugerem que os oócitos que são constantemente perdidos podem vir a ser substituídos a partir de uma pequena população de células tronco germinativas presente nos ovários adultos, durante a vida reprodutiva do animal (JOHNSON et al., 2004). Em humanos, o cultivo do epitélio germinativo ovariano permitiu o desenvolvimento de células da granulosa e oócitos (BUKOVSKY; SVETLIKOVA; CAUDLE, 2005). Em caprinos e em bovinos, o cultivo do epitélio da superfície ovariana gerou células que foram posteriormente diferenciadas em células semelhantes à oócitos (PARTE et al., 2011; SOUZA et al., 2016).

Independente disso, ao longo da vida das fêmeas, há uma significativa redução na população de folículos pré-antrais (SHAW; ORANRATNACHAI; TROUNSON, 2000). Isto se deve a um processo fisiológico degenerativo irreversível conhecido como atresia (morte celular), que acomete cerca de 99,9% dos folículos ovarianos (FIGUEIREDO et al., 2008). Portanto, apesar do expressivo contingente da população folicular no ovário, poucos são os oócitos que serão ovulados e potencialmente serão fecundados, caracterizando a gônada feminina como um órgão de baixo rendimento.

Durante a atresia, a morte celular não se limita a um tipo específico de célula e o folículo todo é degradado durante este processo. Várias formas de morte foram reportadas para as células ovarianas, incluindo apoptose, autofagia, necrose e cornificação (JOLLY et al., 1994, VAN WEZEL et al., 1999, D'HAESELEER et al., 2006).

A atresia está associada a uma série de mudanças morfológicas e bioquímicas, que variam de acordo com o estágio do crescimento folicular e também com a espécie animal (CUNNINGHAM; KLEIN, 2011). Este processo, pelo qual o folículo perde completamente a sua integridade, pode se dar por duas vias distintas: (1) via degenerativa (SAUMANDE et al., 1981), na qual pode ser observada alterações no fornecimento de oxigênio e nutrientes para o ovário, além de ser causada por isquemia, que resulta em algumas alterações na permeabilidade da membrana celular. Essas alterações podem levar ao aumento de água intracelular e do volume das células, vacuolização citoplasmática e, consequentemente, degeneração (BARROS; HERMOSILLA; CASTRO, 2001). Além disso, a atresia folicular pode ocorrer pela (2) via apoptótica (FIGUEIREDO et al., 1995), na qual observa-se um

processo de morte celular individual e ativo, caracterizado pela fragmentação nuclear e pela formação de corpos apoptóticos (RACHID; VASCONCELOS; NUNES, 2000), em que o desbalanço entre os genes pró e anti-apoptóticos determinam a morte celular (HURWITZ; ADASHI, 1992). Apesar de causar a perda de vários folículos ovarianos, a atresia é um evento crucial para manutenção da homeostase ovariana em mamíferos, assegurando a ciclicidade dos animais e prevenindo o desenvolvimento de múltiplos embriões durante a gestação (AMSTERDAM et al., 2003; CELESTINO et al., 2009).

A iniciação, execução e regulação da apoptose envolve vários fatores bioquímicos e a família de enzimas caspases desempenham um papel central na rede de sinalização da apoptose. As caspases são membros da família altamente conservada de proteases de cisteína com especificidade a aspartato. As caspases são expressas como pró-enzimas que sofrem processamento proteolítico para gerar a forma ativada após estímulo apoptótico. Existem 14 tipos de caspases identificados como caspase-1, 2, 3 até caspase-14 (TIBBETS et al., 2003). Alguns membros da família funcionam especificamente na morte celular por apoptose e são subdivididos em iniciadoras (caspases-2, -8, -9 e -10) e executoras ou caspases efetoras (caspase-3, -6 e -7; STRASSER et al., 2000). Caspases iniciadoras são clivadas em resposta a estímulos apoptóticos e ativam as caspases efetoras (GREEN, 2003; 2004). Durante a apoptose, as caspases efetoras clivam numerosas proteínas localizadas na membrana da célula, no núcleo e no citoplasma (NAGASE et al., 2003). No sentido de evitar a morte celular por apoptose, existem processos de sobrevivência celular que promovem a transcrição de várias proteínas anti-apoptóticas, tais como alguns membros da família Bcl-2, que bloqueiam a progressão da apoptose em diferentes etapas ao longo deste processo (JOHNSON, 2003). A família Bcl-2 compreende tanto membros anti-apoptóticos, como o Bcl-2 (Linfoma de células B2) e membros pró-apoptóticos, incluindo Bax (Proteína X associada as células B de linfoma 2), Bid (Proteína BH3 semelhante à Bax), Bak (Proteína- killer antagonista homóloga à Bcl-2) e Bik (Proteína Killer que interage com Bcl-2) (SHI et al., 2002).

A apoptose pode ser desencadeada por vários estímulos e condições e é ativada por duas vias principais: a via extrínseca ou via do receptor de morte, e a via intrínseca ou via mitocondrial, que convergem mutuamente através da cascata de reações proteolíticas que envolvem a ativação das caspases (ELMORE, 2007; IGNEY e KRAMMER, 2002). A via extrínseca é mediada pela ligação de ligantes a certos receptores existentes na superfície celular – os receptores de morte (ELMORE, 2007), pertencentes à família dos fatores de necrose tumoral (TNF). Estes receptores de morte incluem uma subfamília que é caracterizada

por terem domínios extracelulares ricos em cisteína e um domínio intracelular – o domínio de morte – que é essencial para a transdução do sinal apoptótico (IGNEY e KRAMMER, 2002). A via intrínseca pode ser desencadeada por diversos fatores, como por exemplo, espécies reativas de oxigênio (EROs), ausência de fatores de crescimento e hormônios. Independente da via, as características morfológicas que indicam apoptose são colapso e enrrugamento do núcleo, segmentando-se em corpúsculos heterocromáticos para o interior do citoplasma (cariorréxis), picnose do núcleo, bem como a condensação da cromatina, edema, irregularidade dos limites celulares e nucleares e fragmentação no citoplasma (ZEISS, 2003). Subsequentemente, as membranas nuclear e citoplasmática se desprendem e formam corpos apoptóticos (cariólise) (Figura 6) (GRIVICICH et al., 2007).

Figura 6 - Alterações morfológicas encontradas em uma célula apoptótica.

Fonte: Adaptado de Grivicich et al. (2007).