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3 MINISTÉRIO DA CULTURA: GESTÃO GILBERTO GIL

3.6 ATUALIZAÇÃO DA LEI ROUANET E IMPACTOS ECONÔMICOS DA LEI

Após a criação do Ministério da Cultura em 1985 no governo Sarney, o Brasil teve a primeira experiência com incentivo fiscal na área das atividades artísticas, que foi através da Lei Sarney, Lei nº 7.505 de 1986, que durou cinco anos, mais precisamente até 1990. Nela só existia a modalidade de mecenato (Incentivo Fiscal), que prevê a concessão de benefícios fiscais federais, permitindo a dedução no imposto de renda, de até 2% do imposto devido para pessoas jurídicas e 10% para pessoas físicas, concedido a projetos de caráter artístico cultural. Com ela, as empresas podiam financiar projetos de caráter cultural e artístico, por meio de abatimento no imposto de renda. No entanto, não existia um controle efetivo sobre os projetos: não havia análise prévia para sua aprovação e nem mesmo fiscalização durante sua execução; o cumprimento das exigências legais era avaliado somente através da prestação de contas. Neste período, também havia sido criado o Fundo Nacional de Cultura, pelo qual o Estado contribuía com a cultura, a maior parte dos valores por meio da renúncia fiscal. A Lei ganhou este nome porque em 1978 foi proposta pelo então Senador José Sarney (DONATO, 2019).

Uma das maiores críticas à Lei Sarney foram os resultados divergentes em relação a seus objetivos, pois não havia análise de mérito do projeto, nem de orçamento, apenas a prestação de contas. Desta maneira, a análise só acontecia na pós-produção, e não na pré-produção como acontece hoje com a Lei Rouanet (DONATO, 2019, p. 8).

Em 1990, quando o governo Collor transformou o Ministério da Cultura em Secretaria da Cultura, Sérgio Paulo Rouanet, diplomata, sociólogo e doutor em ciência política pela USP, exerceu o cargo de Secretário de Cultura e foi responsável pela edição de nova lei de incentivo à cultura.

Em 1991, foi sancionada a Lei n° 8.313, conhecida como Lei Rouanet, regulamentada em 1995, através do Decreto n° 1.494 de 1995, que instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) e deu outras providências. O Pronac tem o objetivo de fomentar e promover a produção cultural brasileira em suas mais diferentes áreas. A nova lei ampliou funcionalidades, manteve alguns princípios da Lei Sarney e foi considerada um aprimoramento da Lei de Incentivo na época, pois ela permitia maior controle, através de maior rigor formal no cadastramento do projeto, na análise de seu conteúdo e na prestação de contas.

Redimensionou-se assim o objetivo de “captar e canalizar recursos para o setor” (DONATO, 2017). Foi atualizada pelo Decreto nº 5.761, de 2006, que regulamentou novas funcionalidades da Lei.

Entre 1985 e 1991, os gastos públicos com o setor cultural foram drasticamente reduzidos, passando da média de R$ 200 milhões, durante o governo Sarney (1985-1990), para R$ 131 milhões em 1991 (REIS, 2003).

Em decorrência a essa redução no orçamento, a partir de 1992, foi incluída a previsão orçamentária de recursos do Tesouro Nacional, para designar uma parte do orçamento do Imposto de Renda, através do incentivo fiscal, por meio das Leis de nº 8.313 (Rouanet) e de nº 8.685 (Audiovisual).

O Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) – popularmente conhecido por Lei Rouanet, não é somente o incentivo fiscal, como mostram as notícias. A Lei n° 8.313/91 ampliou o instrumento de fomento e contempla três modalidades: Incentivo Fiscal (Mecenato), que redefiniu o modelo da lei anterior, no caso a Lei Sarney; o Fundo Nacional de Cultura (FNC) e o Fundo de Incentivo Cultural e Artístico (FICART), este último não ativado.

O Mecenato, popularmente conhecido por sua política de incentivos fiscais2, faculta às pessoas físicas com base nas declarações completas ou pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, a opção pela aplicação de parcelas do Imposto sobre a Renda, a título de patrocínios a projetos culturais. O mecenato possibilita a dedução de até 100% do imposto devido, sobre o valor que foi aplicado no projeto, dentro dos limites: pessoas físicas podem deduzir do imposto de renda até 6% do imposto devido e pessoas jurídicas podem deduzir do imposto de renda até 4% do imposto devido. O Art. 18 da Lei nº 8.313/91 estabelece:

[...] a União facultará às pessoas físicas ou jurídicas a opção pela aplicação de parcelas do Imposto sobre a Renda, a título de doações ou patrocínios, tanto no apoio direto a projetos culturais apresentados por pessoas físicas ou por pessoas jurídicas de natureza cultural, como através de contribuições ao FNC [...] desde que os projetos atendam aos critérios estabelecidos no art. 1º desta Lei (BRASIL, 1991).

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Ele existe para estimular algum setor ou atividade econômica, por meio de desconto, isenção ou abatimento na carga tributária.

O parágrafo § 1 informa que os contribuintes poderão deduzir do I.R as quantias efetivamente despendidas, ou seja, 100%, exclusivamente, nos projetos elencados no parágrafo §3.

São apenas oito áreas: artes cênicas; livro de valor artístico, literário ou humanístico; música erudita ou instrumental; exposições de artes visuais; doações de acervos para bibliotecas, museus [...]; produção de obras cinematográfica de curta e média metragem [...]; preservação do patrimônio material e imaterial; e construção e manutenção de salas de cinema e teatro, apenas para municípios com até 100 mil habitantes (BRASIL, 1991).

Desta forma, somente os projetos aprovados – exatamente nas áreas conforme prescrito no artigo 18 da Lei Rouanet, permitem ao patrocinador 100% de dedução do imposto de renda. A música cantata, por exemplo, não se enquadra no Art. 18.

Caso os projetos não se enquadrem no Artigo 18, as empresas terão benefício fiscal conforme o art. 26. O patrocinador pessoa física poderá deduzir no I.R de 80% a 60% de dedução. Pessoas jurídicas poderão deduzir de 40% a 30%, podendo também descontar em despesas operacionais. Um exemplo são os projetos da área da música em geral (exceto música erudita e instrumental), eventos como shows de cantores diversos, Rock in Rio etc., são enquadrados no Art. 26, ou seja, as empresas que patrocinam estes eventos não recebem 100% do benefício fiscal do valor que foi investido no projeto.

Contudo, quando a Lei Rouanet foi criada não era previsto a dedução de 100% no Imposto, por isso para muitos críticos a adoção das alíquotas de 100% foi um erro. Mas as justificativas não são plausíveis, visto que se já havia dedução no imposto maior para a Lei do Audiovisual, por que então não se poderia estender para outras áreas culturais? Considerando ainda que tais necessidades eram demandas vindas dos próprios agentes culturais (SILVA, 2018, p. 46).

O Fundo Nacional de Cultura (FNC) visa captar e destinar recursos para projetos culturais, através de editais e convênios do Ministério e de suas vinculadas, que estejam compatíveis com as finalidades do Pronac (BRASIL, 1991).

O Fundo Nacional de Cultura destina recursos a projetos culturais por meio de apoio a fundo perdido ou empréstimos reembolsáveis. Os recursos do FNC provêm de orçamento próprio, recursos do Tesouro Nacional definido pela Lei Orçamentária Anual (LOA), contribuições, transferências, subvenções, auxílios ou doações dos

setores públicos ou privados, resultado de convênios, contratos ou acordos celebrados com instituições públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, na área cultural. São considerados, ainda, outros recursos, como créditos e rendas adicionais que, por sua natureza, possam lhe ser destinados como, por exemplo, reembolsos de empréstimos e 3% da arrecadação bruta das loterias federais (BRASIL, 1991).

Os editais e prêmios do Ministério e de suas vinculadas são: ANCINE, FUNARTE, IBRAN, IPHAN, FBN e FCRB. Os Pontos de Cultura e o Programa de Difusão e Intercâmbio Artístico e Cultural, que viabiliza o repasse de recursos para a compra de passagens para a participação em eventos de natureza cultural a serem realizados – no Brasil ou no exterior, bem como outros editais e prêmios, por exemplo o Cultura na Copa, entre outros, também recebem recursos deste Fundo (BRASIL, 1991).

Salientamos que a lei de incentivo fiscal quando foi criada, em tese, deveria ter vigência temporária. Caso a cultura adquirisse autosustentabilidade, a Lei se extinguiria, uma vez que perderia sua finalidade. Em 2010, foi encaminhado um Projeto de Lei nº 6.722/2010, pelo então Ministro da cultura Juca Ferreira, ao Congresso Nacional, com a finalidade de “Instituir o Programa Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura – Procultura”. Esse PL, por exemplo, previa um prazo para a extinção das ações de captação através do mecenato. O projeto tramitou até 2014, porém foi arquivado (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2019).

Contudo, uma característica importante de destacar é que Mecenato e Fundo tem objetivos diferentes, e desta forma o Mecenato não pretende e nem poderia substituir o FNC.

Existe um discurso que se propaga no sentido de acabar com a Lei de incentivo fiscal, o que é uma ideia totalmente descabida, pois sem a Lei de incentivo fiscal estaríamos abrindo mão de uma parcela significativa dos recursos públicos. Seria o mesmo que dizer: não queremos receber uma parte do dinheiro público para a cultura. A Lei Rouanet financia um percentual expressivo da cultura no Brasil, boa parte dos equipamentos culturais utiliza a Lei, entre museus, fundações culturais, casas de cultura, espaços de teatro, bibliotecas etc. Sem considerar os projetos e as ações culturais, as Feiras do Livro, os livros, os grupos artísticos, os artistas em geral. Lembrando que o incentivo fiscal existe em diversas áreas, como na indústria

automobilística, na área da informática e desenvolvimento tecnológico, e os outros setores não discutem sobre acabar com os incentivos.

Em 2018, foi aprovado pela Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados o projeto de Lei 10.835/18, que alterou a Lei Rouanet permitindo o uso de mecanismos para financiar equipamentos culturais em instituições de ensino superior pública e para a confecção de esculturas e peças artísticas de caráter permanente a serem instaladas em espaços públicos. Esses equipamentos são museus, espaços culturais, bibliotecas, arquivos, dentre outros, que funcionam dentro das universidades, abertos ao público em geral, não estando restritos apenas aos estudantes (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2019).

A crítica na realidade tem maior relação à iniciativa privada, segundo os questionamentos, já que as empresas promovem cultura usando recursos públicos, como se o dinheiro público fosse, a grosso modo, canalizado para as mãos do setor privado. Nas palavras do economista e cientista social Eduardo Giannetti da Fonseca, em seu livro Trópicos utópicos, não é o mercado quem decide “em nome dos que nele atuam”, os resultados dependem “dos valores e das escolhas das pessoas” (GIANNETTI, 2016, p. 46). Esse tema sobre liberdade de escolhas é abordado no terceiro capítulo desta tese.

Rubim inclusive considera que o incentivo fiscal inibiu o uso de outros dispositivos de financiamento previstos no próprio Pronac – a Lei Rouanet. O próprio reconhecimento da Lei apenas pelo mecanismo do Mecenato por si só já demonstra a supremacia do incentivo fiscal. Ele defende que a reforma da Lei deve abolir a dedução de 100% para os patrocinadores (RUBIM, 2016, p. 272-273).

Outros pesquisadores da economia da cultura, como por exemplo Hélio Henkin, Lucas Paes e Leandro Valiati (2016), professores da UFRGS, entendem que através do incentivo fiscal o poder de decisão está nas mãos das empresas, inclusive chegam a dizer que o poder de agenda sobre a natureza dos recursos públicos está com a iniciativa privada. Para eles, o modelo de financiamento adere à lógica do mercado e abstém-se da função social da política pública, e que “a Lei Rouanet delega aos agentes privados a gestão do fomento à cultura” (HENKIN; PAES; VALIATI, 2016, p. 259-265).

Todavia, trata-se de uma análise reducionista dizer que a promoção cultural, enquanto política de patrocínio institucional, é apenas uma estratégia para seduzir e se relacionar com o cliente, enaltecendo a sua marca. Há também que se refletir

sobre os aspectos positivos da promoção cultural por parte da iniciativa privada, em contraponto a essas críticas. Esses apontamentos por vezes são demasiados, pois na prática, não é exatamente o que acontece.

Nesse sentido, Danilo Miranda (2010) concorda que a utilização do recurso público não pode ter caráter privado, com cunho de publicidade empresarial e que ela deve ser cuidadosamente cumprida conforme suas regras, para promover cultura e não financiar propaganda das empresas.

A possibilidade do incentivo fiscal através desta lei, ou seja, um projeto para obter recursos, antes deve ter aprovação pelo ministério e ser publicado em Diário Oficial, e para isso passa por uma análise criteriosa e diversos trâmites burocráticos. A Lei 8.313/91 tem exigências, regras, vedações, objetivos e, inclusive, obrigações sociais, como democratização, medidas de ampliação do acesso, acessibilidade para deficientes, fruição, ações formativas, formação de plateia, entre outras. Com posterior acompanhamento em sua execução e prestação de contas, caso haja alguma não conformidade, a Lei prevê devolução dos recursos (BRASIL, 1991).

Somente serão concedidos a projetos culturais cuja exibição, utilização e circulação dos bens culturais, deles resultantes, sejam abertas ao público em geral, sem distinção, independentemente de serem gratuitas ou se cobrado ingresso. Se houver cobrança o valor é limitado pela Instrução Normativa, sendo hoje o limite de R$ 225,00 (duzentos e vinte e cinco reais). O projeto também deverá prever: 50% do quantitativo dos ingressos comercializados, em razão da meia entrada; percentual mínimo de 20% para distribuição gratuita; mínimo de 10% no valor que não ultrapasse o valor do Vale Cultura; e máximo de 10% para distribuição gratuita para os patrocinadores (I.N Nº 2/2019).

Entre muitas controvérsias em torno desse formato de fomento, a gestão Gilberto Gil teve como um de seus principais objetivos a reformulação da Lei Rouanet. Em entrevista para o JORNAL ESTADO DE SP em 2003, Gil afirma que em sua gestão não está previsto o desaparecimento das leis de incentivo, e sim que iria buscar a manutenção dos incentivos fiscais, que para ele não implicavam em guerra fiscal e, portanto, não deveriam ser tratados como os outros. Assim, pretendia fazer modificações tanto na Lei Rouanet quanto na Lei do Audiovisual, pois entendia que a Lei deveria ter novas regras para “tratar os desiguais de forma desigual” (GIL, 2003, IN: GIL & FERREIRA, 2013, p. 90-94).

Em sua gestão ocorreram diversas atualizações, através de portarias e instruções normativas, com novas exigências relativas à democratização e ampliação do acesso, acessibilidade, descentralização dos recursos, limites para cachês artísticos, limites para a venda dos produtos culturais, cobranças de ingressos, entre outras mudanças. De outro lado, tornou o processo menos burocrático. Gil ampliou o acesso à Lei, tanto para os proponentes, quanto para o público que usufruía das atividades culturais, quanto para os patrocinadores.

A aplicação da Lei Rouanet ao longo do período de sua vigência apresentou aspectos positivos, afirmados pelos números crescentes na economia da cultura, no número de projetos enviados/aprovados (com captação e aprovação de prestação de contas), exposições, eventos, livros, criação de instituições culturais e restaurações de patrimônio cultural no Brasil inteiro.

Em 2003, as atividades culturais registraram uma receita líquida de 156 bilhões de reais e custos de 114 bilhões de reais3. O Sistema de Informações e Indicadores Culturais entre 2007 e 2010 registrou que atividades culturais movimentaram cerca de R$ 374,8 bilhões de receita líquida (IBGE, 2014).

Naquele mesmo ano, o setor foi responsável pela geração de 4,8% dos empregos brasileiros – o índice era de 0,8% em 1983. Em 2003, em um discurso, Gil explicava sobre a importância dos incentivos fiscais para a cultura e da Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura (SEFIC), que era responsável pela Lei Rouanet. Segundo os dados trazidos por ele, em apenas um ano a renúncia fiscal já havia apresentado um crescimento significativo. “Conseguimos elevar o teto da renúncia fiscal, de 160 para 401 milhões; o orçamento também cresceu 70%; graças a uma ação articulada, obtivemos no Congresso 900 milhões a mais em emendas parlamentares” (GIL, IN: GIL & FERREIRA, 2013, p. 283).

Entre 2002 e 2005, os investimentos em projetos culturais, através da captação de recursos via Lei Rouanet, obtiveram um salto. Em 2005, os recursos aplicados em projetos culturais somaram 704 milhões de reais, e segundo o Ipea esse foi o “maior valor desde que a lei entrou em vigor”. Um dos impactos apontados pela pesquisa foi o aumento na geração de emprego na área cultural, que teve um aumento de 4,8%. Antes o índice era de 0,8% (IPEA, 2007).

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3ª edição da pesquisa em parceria com o MinC, por meio da Secretaria da Economia Criativa e o IBGE.

Imagem 1 - A Lei Rouanet e a cultura: Volume de recursos captados (em milhões de reais)

Fonte: IPEA, 2007

Contudo, alguns aspectos negativos também foram apontados, entre eles a centralização de recursos no eixo Rio-São Paulo e a centralização de alguns segmentos culturais que se destacam no ranking, como por exemplo, a área da música, os shows e os grandes eventos em geral, o que dificulta a captação de recursos entre os demais segmentos. As artes visuais, a música erudita e a literatura são os que aparecem com menor captação ou execução de projetos durante esses anos. Também houve críticas no que se refere à burocracia excessiva, que se tornou mais exigente a partir da fiscalização do Tribunal de Contas, quando a prestação de contas ficou mais complexa (DONATO, 2017).

Frederico Augusto Barbosa da Silva, pesquisador na Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do IPEA (2018), entende que não é consistente atribuir aos incentivos fiscais os problemas das desigualdades regionais. Em suas palavras, ainda “não desenvolvemos muito sobre a questão das desigualdades de uso dos recursos dos incentivos fiscais” no Brasil. Em sua pesquisa realizada pelo Ipea em 2018 mostra que as desigualdades variam conforme cada segmento cultural, assim como mostram os mapas da distribuição dos recursos por município. Lamenta que “os gastos tributários ou incentivos fiscais foram banalizados” (SILVA, 2018, p. 47).

O autor argumenta que mexer nas alíquotas dos incentivos fiscais é algo sério e que de fato poderia trazer mudanças interessantes no padrão de escolha a quem financiar por parte das empresas. Entretanto, essa mudança poderia ser gradual, discutidas e negociadas com os principais atores, os agentes culturais. Enfatiza que gostaria de mudar o eixo da discussão, lembrando que “grande parte, os incentivos fiscais geraram projetos de forte interesse público, produziram ações privadas

relativamente articuladas – talvez, inclusive, políticas privadas de interesse público”. Sem esquecer também que boa parte dos proponentes é ou tem origem dos setores públicos (SILVA, 2018, p. 47).

Danilo Miranda entende que o financiamento da cultura, muito embora ainda hoje seja tão criticado, deve sim fomentar a arte para que ela se desenvolva, para ela tenha importância e seja justificada como elemento chave para desenvolvimento no país. Fala-se muito em falta de estrutura, mas se investirmos em cultura assim se estará dando base para que o país desenvolva infraestrutura. Economia é importante, mas é decorrência, economia não é causa (MIRANDA, 2020).

Gil defendia a manutenção da lei de incentivo (Lei Rouanet) que fora a principal política na gestão Weffort, porém de forma mais democrática, levando em consideração críticas formuladas. Ele entendia que a Lei deveria ser utilizada por todos, ou seja, manifestações populares de interesse das parcelas mais pobres, que não têm acesso aos incentivos, e que por isso algumas modificações foram realizadas. Assim como defendia que “temos de tratar os desiguais de forma desigual”, postura que lhe rendeu muitas críticas (GIL, 2003, IN: GIL & FERREIRA, 2013, p. 94).

Inclusive, foi criticado por aqueles que já se utilizavam da Lei, argumentando que com as novas regras dificultou o processo, trazidas pelas novas exigências de democratização do acesso e acessibilidade, limitações para valor na venda dos ingressos, teto para os cachês artísticos e etc.

Ocorre que o orçamento e a captação de recursos, na gestão Weffort, aumentaram a cada ano. A partir de 1995 alguns aspectos da Lei mudaram, os percentuais do I.R que eram passíveis de abatimento aumentaram e desta forma aumentou o número de empresas que patrocinavam projetos (IPEA, 2007). Contudo, ampliou também a participação daqueles que já realizavam ações culturais através da Lei e não daqueles que não a utilizavam.

Ou seja, o público/plateia que participava dos eventos eram os mesmos, e foi nesse sentido que Gil realizou mudanças na Lei, mantendo seus objetivos principais, que eram: fomento, incentivo, disseminação e preservação da produção cultural brasileira. Porém, estabeleceram-se novas regras nas contrapartidas sociais, como por exemplo, ampliou a democratização do acesso, estabelecendo limites no valor da cobrança de ingressos, aumentou o percentual da distribuição gratuita do produto resultante e também criou a exigência das medidas de acessibilidade para pessoas

com deficiência, entre outras mudanças. Cabe destacar que estes limites também foram motivados a partir de críticas sobre cobranças de ingressos do Cirque du Soleil que tinham incentivo da Lei Rouanet, bem como outros projetos.

Sobre isso, em fevereiro de 2016, o Tribunal de Contas da União (TCU) manifestou-se contrário ao uso de recursos oriundos de renúncia fiscal para financiar espetáculos e eventos com “potencial lucrativo”. Contudo, consideramos essa decisão bastante preocupante, pois como haverá desenvolvimento de um mercado cultural sem que haja a respectiva oferta de produtos? (DONATO, 2017).

A operação boca livre, investigação que iniciou em 2011 pelo Ministério