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Autonomia, prazer e autocuidado

No documento Atenção Plena aplicada à Nutrição (páginas 39-45)

Unidade 2 - Comportamento alimentar, autonomia, prazer e

2.2 Autonomia, prazer e autocuidado

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Para exemplificar um pouco mais sobre a complexidade desse tema, vamos expor brevemente um estudo demonstraram a dificuldade de adesão aos tratamentos nutricionais, a manutenção dos resultados e os principais motivos.

Um estudo inglês realizado em 2005 avaliou 383 indivíduos obesos, de 15 a 82 anos de idade, durante um ano. A proposta consistia principalmente em dietas de redução calórica. Como resultado, 77% deles não concluíram o acompanhamento, sendo que 80% dos indivíduos que abandonaram já não retornaram após a primeira consulta. A maior taxa de abandono veio do grupo de indivíduos que trabalhava em tempo integral e tinha menos comorbidades associadas à obesidade. Entre aqueles que concluíram o acompanhamento, a maioria era representada por donas de casa e pensionistas. Os resultados apontaram que entre os fatores que podem dificultar a adesão ao tratamento da obesidade, além do trabalho, estão os problemas pessoais, a ausência de apoio familiar, a falta de motivação e os resultados negativos na perda de peso durante o tratamento (INELMEN et al., 2005).

O estudo acima é apenas um exemplo das inúmeras barreiras que as pessoas enfrentam na mudança de comportamento. Na sua unidade de saúde existe o atendimento nutricional individual e/ou grupos de alimentação saudável ou semelhantes? Há adesão dos usuários em ambos? Quais as principais barreiras que os usuários do seu território enfrentam para acessar os serviços e dar continuidade ao acompanhamento? É frequente observamos que o trabalho com grupos geralmente não envolve pessoas que trabalham em horário comercial, por não conseguir liberação no trabalho para participar. É possível pensar em conjunto com a equipe (e com a gestão municipal) estratégias para auxiliar as pessoas com esta questão.

Outro estudo realizado no Brasil, no âmbito da APS, no ano de 2013, na cidade de Pelotas/RS, entrevistou 1246 usuários com o objetivo de determinar a prevalência de percepção das dificuldades para uma alimentação saudável, seus fatores associados e seus motivos. As principais respostas mencionadas pelos usuários foram as dificuldades financeiras em adquirir os alimentos considerados saudáveis, seguidas das comportamentais (como necessidade de abrir mão de alimentos que consideram não saudáveis, por exemplo), além da falta de tempo e conhecimento (LINDEMANN; OLIVERA; MENDOZA-SASSI, 2016).

Santos e colaboradores (2012), em um estudo acerca do aconselhamento sobre alimentação e atividade física de usuários da APS encontrou resultados semelhantes, nos quais as dificuldades mencionadas foram a falta de tempo, de recursos financeiros e a dificuldade de mudar hábitos e de controlar impulsos alimentares. Lindemann, Olivera e Mendoza-Sassi (2016, p. 607) contribuem ainda, para essa reflexão, ressaltando o papel do profissional de saúde diante desse fenômeno, bem como, as condições do sistema:

Esse aspecto desafia os profissionais de saúde a modificarem a sua prática, em geral, padronizada e predominantemente informativa, normativa e proibitiva, no sentido de verdadeiramente estimular a mudança de hábitos, o que, por sua vez, exige também que o sistema de saúde ofereça adequadas condições de recursos para que isso se concretize (LINDEMANN; OLIVERA; MENDOZA-SASSI, 2016).

Tais autores, reconhecem a relevância do tema e a escassez de estudos investigativos, especialmente no SUS, sobre a prevalência e o tipo de dificuldades enfrentadas para a alimentação saudável, inclusive considerando seus fatores associados (LINDEMANN; OLIVERA; MENDOZA-SASSI, 2016).

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Faça a leitura do artigo intitulado “Atitudes de nutricionistas em relação a indivíduos obesos - um estudo exploratório”, que descreve a visão que nutricionistas brasileiros possuem sobre as pessoas obesas. Na discussão do estudo é possível observar, com a citação

de outras pesquisas internacionais, que outros profissionais como médicos, enfermeiros, psicólogos e profissionais de educação física também apresentaram atitudes negativas em

relação a obesidade.

CORI, G. C.; PETTY, M. L. B.; ALVARENGA, M. S. Atitudes de nutricionistas em relação a indivíduos obesos – um estudo exploratório. Ciências & Saúde Coletiva, v. 20, n. 2, p.565-576, 2015:

https://bit.ly/30DvzE6

Ainda, no que tange ao debate sobre a adesão aos usuários a tratamentos de saúde, é primordial trazer à tona o que se entende como adesão. Para alguns profissionais pode ser encarado como aquele usuário que segue estritamente a prescrição, por exemplo. Entretanto, para Borges e Porto (2014) a adesão a tratamentos deve diferenciar-se da “obediência” da prescrição fornecida pelo profissional de saúde e precisa ser encarada como uma postura ativa frente ao autocuidado.

Pensando na educação em saúde emancipatória, é essencial que os profissionais de saúde avaliem seus comportamentos frente ao usuário nos atendimentos, considerando na prática, a história de vida de cada um, as suas dificuldades e esforçando-se cotidianamente para compreender suas decisões. O não julgamento de si e do próximo são preceitos da atenção plena, que será abordada no próximo módulo.

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CONCLUSÃO

Esperamos que esta unidade de aprendizagem seja apenas o início do processo de compreensão do quão complexo é o ato alimentar e a importância de considerá-lo em nossas vidas e na rotina de trabalho.

Aqui conversamos sobre a quebra de paradigma na atenção nutricional e sobre o comportamento alimentar, seus influenciadores e sobre as possibilidades de alteração dos mesmos. Foram apresentados os diferentes tipos de fome e as diferenças entre o comer intuitivo e disfuncional. Falamos também sobre prazer, autonomia e autocuidado, reforçando a nossa responsabilidade enquanto profissionais de saúde em apoiar e não culpabilizar o usuário pelo insucesso dos tratamentos nutricionais, quando eles ocorrem.

Ficamos felizes que tenha chegado até aqui, aproveite para acessar os conteúdos sugeridos nas sessões de “Saiba Mais” para auxiliar nas reflexões aqui trazidas.

Na unidade 3 vamos conversar sobre a atenção plena - comer com consciência e o método Mindfulness.

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Contexto do Tabagismo

Mindful eating: o comer com

atenção plena

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