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O autor e[m] sua época

No documento alanaadaesdegouvea (páginas 55-59)

3. A CASA DO MINEIRO NA INOCÊNCIA DE TAUNAY

3.1 DUAS CASAS: O AUTOR E[M] SUA ÉPOCA E O ESCRITOR E[M]

3.1.1 O autor e[m] sua época

O Romantismo foi um movimento ou escola de âmbito universal que aconteceu entre meados dos séculos XVIII e ao longo do século XIX na Europa, com destaque para o século XIX no Brasil. Alguns escritores, rompendo com as regras de

composição e estilo de autores clássicos, passaram a falar da natureza, dos sofrimentos amorosos, tentando escapar de um mundo real para outro mundo – ilusório − desenvolvido e concebido por eles mesmos. No entanto, o movimento Romântico, tal qual situado acima, não deve ser confundido com o estado da alma do romântico, ou o temperamento romântico. Este é uma invariável universal, através da qual o homem expressa sua apreensão do real de forma artística.

Historicamente, o Romantismo remonta ao século XVII com as narrativas de heroísmo, aventura e amor. Esse movimento estético representou um estilo de vida e de arte, dominando a civilização ocidental desde meados do século XVIII e chegando à metade do século XIX.

O professor, ensaísta e crítico literário Afrânio Coutinho, em sua obra intitulada A literatura no Brasil (1986), menciona que:

[...] A imaginação e o sentimento, a emoção e a sensibilidade, conquistam aos poucos o lugar que era ocupado pela razão. A noção de natureza e seus corolários – a bondade natural, a pureza da vida em natureza, a superioridade da inspiração natural, primitiva, popular – atraem cada vez mais o interesse e o pensamento dos homens (COUTINHO, 1986, p. 5-6).

Segundo o autor, uma melhor forma de ver o movimento é perceber que ver o mundo através da poesia - registrando a realidade de uma maneira mais profunda e utilizando a imaginação - levou a “uma concepção da natureza como um todo vivo e como uma interpretação do mundo, e um estilo poético constituído primordialmente de mitos e símbolos” (COUTINHO, 1986, p. 6).

Coutinho (1986) caracteriza o romântico como apaixonado, entusiasmado com a vida e extremamente emocional. Essa pessoa busca na natureza, no regional e no pitoresco seu contentamento e, imaginando livrar-se do mundo real, tenta se salvar em um mundo fantasioso, criado por ela mesma e distante de sua realidade, ou ainda, foge para o passado longínquo ou para lugares distantes. Seu estímulo essencial, fundamental, é a fé. A regra que segue na vida é a da liberdade, “suas fontes de inspiração a alma, o inconsciente, a emoção, a paixão. O romântico é temperamental, exaltado, melancólico. Procura idealizar a realidade, e não reproduzi-la” (COUTINHO, 1986, p. 7).

Dessa forma, o romântico é espontâneo e movido por suas emoções e suas considerações sobre a vida em suas múltiplas faces. Assim, como consegue conviver com uma variedade de emoções, também se permite pluralizar e misturar

os gêneros, fazendo com que apareça “lado a lado a prosa e a poesia, o sublime e o grotesco, o sério e o cômico, o divino e o terrestre, a vida e a morte” (COUTINHO, 1986, p. 11).

O autor registra que no Brasil aconteceu:

[...] entre os anos de 1800 e 1850, mostra um grande salto na literatura brasileira, passando-se das penumbras de uma situação indefinida, misto de neoclassicismo decadente, iluminismo revolucionário e exaltação nativista, para uma manifestação artística, em que se reúne uma plêiade de altos espíritos de poetas e prosadores, consolidando, em uma palavra, a literatura brasileira, na autonomia de sua tonalidade nacional e de suas formas e temas, e na autoconsciência técnica e crítica dessa autonomia (COUTINHO, 1986, p. 14).

Devido ao movimento Romântico que se adaptava à realidade brasileira, valorizando-a e permitindo a exaltação do passado e das particularidades locais, o país alcançou sua independência literária, triunfando então a liberdade de pensamento e expressão, precipitando o amadurecimento do processo literário (COUTINHO, 1986).

As características do Romantismo brasileiro são: nacionalidade; inspiração e improvisação; conotação político-social; indianismo; culto ao sertão e regionalismo. Já as raízes do romantismo são sentimentos como melancolia, pessimismo, religiosidade e dúvida, caracterizado como “o mal do século” (COUTINHO, 1986, p. 24). Essas características difundiram-se através dos heróis e heroínas nos romances românticos, incluindo-se aqui os protagonistas da obra que é objeto deste estudo.

Coutinho (1986) divide o Romantismo brasileiro em quatro grupos, baseados no amadurecimento do movimento. O autor da obra estudada, Visconde de Taunay, está inserido no quarto grupo, depois de 1860. Nesse grupo, o autor evidencia que o

Romantismo brasileiro foi:

[...] liberal e social: intensa impregnação político-social, nacionalista, ligada às lutas pelo abolicionismo [...] É quase um grupo de transição, de “romantismo realista”, preludiando a “arte pela arte” [...] algumas figuras penetrando mesmo o Parnasianismo ou servindo de traço de união entre os dois estilos (COUTINHO, 1986, p. 22, grifos do autor).

A ficção literária, nesse momento, torna-se maior que o romance. Este “se esgota no sentimentalismo e no sertanismo” (COUTINHO, 1986, p. 22), passando depois de 1870 a uma forma mais realista, na análise dos costumes, na maneira de vida urbana, consolidando-se como literatura ficcional nacional e autônoma.

Antonio Candido de Mello e Souza, professor, escritor e sociólogo, em sua obra intitulada Formação da Literatura Brasileira (2000), defende que, no clímax do Romantismo brasileiro, tendo como carro-chefe o patriotismo, a literatura foi considerada um fator de grande impulsão do sentimento de dever patriótico. Assim, os autores cantando sua terra contribuíram para o progresso nacional. O autor declara que:

A Independência importa de maneira decisiva no desenvolvimento da ideia romântica, para a qual contribuiu pelo menos com três elementos que se podem considerar como redefinição de posições análogas do Arcadismo: (a) desejo de exprimir uma nova ordem de sentimentos [...] como o orgulho patriótico, extensão do antigo nativismo; (b) desejo de criar uma literatura

independente, diversa, não apenas uma literatura [...] (c) a noção já referida

de atividade intelectual não mais apenas como prova de valor do brasileiro e esclarecimento mental do país, mas tarefa patriótica na construção nacional (CANDIDO, 2000, p. 12, grifos do autor).

Cabe ressaltar que patriotismo e nacionalismo não são sinônimos. O primeiro pode ser definido como um sentimento de amor à pátria, já o segundo abarca esse mesmo sentimento, porém manifestado de uma forma aguda, ou como em um estado febril, podendo acontecer em momentos, pode-se dizer, de crise nacional.

Assim, Candido (2000) acrescenta que o Romantismo foi dependente e contribuinte do nacionalismo. Este movimento literário foi propulsor das atividades literárias de maneira geral, sendo assim, o autor afirma que

[...] Descrever costumes, paisagens, fatos, sentimentos carregados de sentido nacional, era libertar-se do jugo da literatura clássica, universal, comum a todos, preestabelecida, demasiado abstrata – afirmando em contraposição o concreto espontâneo, característico, particular (CANDIDO, 2000, p. 15-16).

Candido (2000) considera que em uma etapa inicial entre 1843 a 1857, na ficção romântica brasileira, surge o entendimento da ação ou enredo na construção da escritura, assim como da descrição da vida do homem e de seus costumes. Em uma segunda etapa de 1857 a 1872, com a descrição dos costumes regionais, vem à tona a beleza e a ideia da complexidade do ser humano. Por fim, encaminha-se para uma terceira etapa, a qual se delineia com maior esmero. Conforme o autor, esse momento “consiste em dar refinamento à análise, sentido ao regionalismo, fidelidade à observação, naturalidade à expressão” (CANDIDO, 2000, p. 266).

Alguns feitos de Visconde Taunay são estudados e apresentados pela professora Maria Lídia Lichtscheidl Maretti, a qual pesquisou a vida e a obra do Visconde de Taunay e publicou seu trabalho intitulado O Visconde de Taunay e os

fios da memória (2006).

Segundo ela, no âmbito da política, quando da passagem de Taunay pela administração da Província do Paraná, em Curitiba, baseada em um longo relatório sobre esta administração, no qual ele próprio expõe sua atuação, a autora registra que o mesmo se destacou por ser “coerente com suas idéias, tidas como avançadas para a época” (MARETTI, 2006, p. 32). Um exemplo foi a inauguração do passeio público na cidade mostrando um “traço reformista-modernizador” (MARETTI, 2006, p. 32).

A autora registra também que Taunay empreendeu inúmeras campanhas, entre elas a abolição da escravatura, a instituição do casamento civil e o “incentivo à imigração européia como forma de solucionar os problemas de mão-de-obra advindos da abolição da escravidão” (MARETTI, 2006, p. 46). Ficando assim manifesto que, acima de tudo, Taunay era um homem além do seu tempo.

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