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2.3 Conforto Ambiental e o Conforto Térmico

2.3.1 Avaliação do conforto térmico

Segundo Frota e Schiffer (2001), os primeiros estudos acerca da influência das condições termo-higrométricas no rendimento de trabalhadores foram desenvolvidos pela

Comissão Americana de Ventilação, em 1916, com foco no rendimento de operários visto o aumento da produção no período pós Revolução Industrial. Olgyay (2004), por sua vez, destaca os estudos realizados por Ellsworth Huntington, referentes à avaliação da influência do clima na saúde humana e a relação desta com a produtividade de operários.

São encontradas hoje, na literatura, duas abordagens diferentes no que se refere à interpretação e avaliação do conforto térmico bem como a maneiras de se administrar as condições microclimáticas nas edificações. A primeira e mais tradicional delas é conhecida como Modelo Estático, no qual se considera o homem como simples receptor das condições térmicas do ambiente. A segunda abordagem, mais recente na literatura, conhecida como Modelo Adaptativo, admite o homem como um agente ativo, que interage com o meio no qual se encontra, na busca por melhores condições de conforto (NICOL; HUMPHREIS, 2002, apud VECCHI, 2011).

Dentre os estudos realizados com foco no modelo estático são os de Fanger (1970) os que apresentam maior aceitação e utilização no meio científico. O pesquisador elaborou uma equação geral de conforto térmico, a qual combina variáveis ambientais – temperatura radiante média, temperatura do ar, umidade e velocidade do ar – e variáveis pessoais – atividade e vestimenta – para a determinação dos índices de conforto (LAMBERTS et al, 1997). Através de trabalho experimental desenvolvido em câmaras climatizadas na Dinamarca, e de estudos nos Estados Unidos, avaliou pessoas de diferentes nacionalidades, sexos, idades, obtendo o Voto Médio Predito – PMV (predicted mean vote), o qual traduz a sensibilidade humana a condições de frio e calor através de valores numéricos. No total são sete valores em escala que caracterizam a sensação de frio, passando por neutro, chegando ao calor (Tabela 4). Conjuntamente, Fanger propôs o conceito de Porcentagem de Pessoas Insatisfeitas – PPD (predicted percentage of dissatisfied) relacionando-o ao PMV (Figura 3).

Os valores obtidos pelo pesquisador, bem como suas equações e métodos, são reconhecidos e aplicados internacionalmente, sendo referência para estudos e análises com foco em ambientes climatizados artificialmente. Apesar de tal limitação, a pesquisa de Fanger foi utilizada como parâmetro para a elaboração de normas de referência internacional tais como a ASHRAE 55 e a ISO 7730, sendo suas principais vantagens a flexibilidade e abrangência das principais variáveis que interferem no conforto térmico. Segundo a ISO 7730 (2005), por exemplo, para espaços de ocupação humana, o PPD deve ser inferior a 10%, correspondendo a uma faixa de -0,5 a +0,5 do PMV. Tais valores indicam obtenção de conforto térmico.

Tabela 4 – Escala de sensação térmica em sete pontos – PMV.

-3 -2 -1 0 +1 +2 +3

Muito frio Frio Levemente frio

Neutro Levemente quente

Quente Muito quente

Fonte: ISO 7730 (2005). Tradução da autora.

Figura 3 – PPD em função do PMV. Fonte: ISO 7730 (2005).

Embora de grande relevância, o uso do voto médio estimado (PMV) como um valor universal e absoluto vem sendo questionado por pesquisadores. Primeiramente, pelo fato de que, contrariamente ao que se considera no modelo estático, as pessoas são, de fato, agentes ativos na busca pelo conforto térmico, tal qual o modelo adaptativo avalia. Não obstante, o modelo estático não considera fatores importantes que interferem na percepção térmica, fatores estes relevantes sob a ótica do modelo adaptativo, tornando a análise mais realística. Tais aspectos têm como base conceitos de aclimatação, podendo considerar ainda questões referentes à demografia (gênero, idade, classe social), contexto (composição da edificação, estação, clima) e cognição (atitudes, preferências e expectativas) (VECCHI, 2011).

Ainda, conforme já expresso, os índices de Fanger, PMV e PPD, foram criados para ambientes climatizados artificialmente, onde as variáveis que interferem no ambiente podem ser controladas de maneira a garantir os níveis de conforto. Desta maneira, para edificações naturalmente climatizadas, a metodologia mostra-se inadequada.

Por fim, embora, em seus estudos, Fanger não tenha encontrado diferenças consistentes relativas a índices de conforto entre habitantes de climas tropicais e habitantes de climas temperados, resultados atuais revelados em pesquisas de campo têm colocado tal conclusão à prova, conforme destaca Nicol (2000). As condições relatadas como confortáveis pelos usuários diferem daquelas indicadas por normativas que apresentam como embasamento os estudos de Fanger, principalmente em climas quentes, em edificações não refrigeradas mecanicamente (deDEAR e BRAGER 1998, apud NICOL, 2000). Como resultado, o autor destaca que, para altas temperaturas, superestima-se a resposta dos usuários, prevendo desconforto para situações em que as pessoas respondem como confortáveis.

Neste viés, de maneira a acompanhar os estudos desenvolvidos pela comunidade acadêmica ao longo dos anos, a ISO 7730, embora se baseie nos índices de Fanger, acrescentou, em sua última revisão, em 2005, um breve conceito de adaptação para ambientes climatizados naturalmente. Neste, segundo o documento, os ocupantes apresentam maior liberdade de adaptação quanto à vestimenta, de acordo com os hábitos locais, e a condição térmica do ambiente é controlada pela abertura e fechamento das janelas. O documento reconhece, ainda, que em tais ambientes os ocupantes mostram-se mais tolerantes a temperaturas superiores às estipuladas pelo PMV. É importante ressaltar, no entanto, que, embora a versão de 2005 da norma demonstre preocupação com a qualidade de ambientes climatizados naturalmente, para regiões de clima quente, a normativa não estipula limites e, portanto, não se enquadra como parâmetro de avaliação de conforto térmico para espaços ventilados naturalmente (ISO 7730, 2005; KNOP, 2012).

Na mesma linha, a ASHRAE 55, documento que também se baseia nos valores propostos por Fanger para ambientes climatizados artificialmente, aborda, em sua revisão datada de 2010, a temática do conforto adaptativo. Segundo a norma, a aplicabilidade do conceito de conforto adaptativo está diretamente relacionada à possibilidade de controle das condições térmicas do ambiente pelos usuários, através da abertura e fechamento de janelas. Ao encontro de Nicol (2000), reforça que experimentos de campo vem apontando para as diferenças entre repostas dos usuários de edificações ventiladas naturalmente quando comparadas a ambientes climatizados artificialmente, tendo em vista experiências térmicas, mudanças nas vestimentas, possibilidade de controle de estratégias e as expectativas pessoais. A norma estabelece enquanto critério para aplicação do conforto adaptativo a edificações que as temperaturas externas estejam no intervalo dado pelas temperaturas 10°C

e 33,5°C, sendo que, a partir da temperatura externa, é possível determinar-se a temperatura operativa interna de conforto através da equação 1.

t = 18,9 + 0,255 ∗ t (1) Onde:

toc = temperatura operativa de conforto

text = temperatura externa

O documento indica, ainda, possibilidades de aumento na temperatura operativa de conforto em função do aumento da velocidade do ar acima de 0,30m/s. Os valores encontram- se na tabela 5.

Tabela 5 – Aumento de temperatura no conforto adaptativo resultante do aumento da velocidade de ar acima de 0,3m/s.

Velocidade de vento (m/s)

0,6m/s 0,9m/s 1,2m/s

Aumento da temperatura

1,2o C 1,8 o C 2,2 o C

Fonte: ASHRAE 55 (2010). Tradução da autora.

A figura 4, também apresentada na ASHRAE 55 (2010), indica os limites de temperatura no conforto adaptativo para situações de 90% de aceitabilidade, quando a temperatura operativa interna pode oscilar em +2,5°C ou -2,2°C da temperatura calculada, e para 80% de aceitabilidade, os limites podem variar de +3,5°C ou -3,2°C. A norma destaca que, para aplicação de tal gráfico, não há limite para velocidade de ar ou umidade.

Figura 4 – Limites temperatura operativa interna aceitável para espaços condicionados naturalmente. Fonte: Adaptado de ASHRAE 55 (2010).