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2 AVALIAÇÃO FORMATIVA NO ENSINO-APRENDIZAGEM DE

2.2 AVALIAÇÃO FORMATIVA

Os termos avaliação somativa e avaliação formativa, propostos por Scriven, estabelecem uma diferença entre objetivos e funções da avaliação: o primeiro sendo associado à prestação de contas e a controles sistemáticos e o segundo ao desenvolvimento, ao valor qualitativo da avaliação e aos processos de formação (ÁLVAREZ MÉNDEZ, 2007). Depresbiteris (1989, p. 21) explica a distinção do seguinte modo:

Para o autor [Scriven] o objetivo da avaliação é julgar o mérito de alguma coisa. As funções da avaliação são de duas ordens: formativa e somativa. A avaliação formativa consiste no fornecimento de informações a serem utilizadas na melhoria de um programa em suas partes ou em seu todo. A avaliação somativa consiste no fornecimento de informações sobre o valor final de um programa institucional.

A autora ainda considera que outra das propostas inovadoras de Scriven foi a possibilidade de encarar uma avaliação não atrelada aos objetivos de um programa, concluindo que “a avaliação de fins é importante, porém não reflete tudo” (DEPRESBITERIS, 1989, p. 21).

Segundo Fernandes (2005), não obstante, no período em que surge o conceito de avaliação formativa, na década de 60, ainda predominavam as concepções de aprendizagem que advinham das teorias da psicologia behaviorista. O autor sustenta que, neste ponto, a avaliação considerada formativa destinava-se a ir corrigindo e ajustando o ensino e a

aprendizagem; a avaliação somativa, por sua vez, fazia um balanço e emitia um juízo final a respeito do que os alunos sabiam e eram capazes de fazer.

Conforme esclarece Perrenoud (2008), dessa perspectiva resulta a chamada “pedagogia de domínio” (pédagogie de la maîtrise, em francês), termo que muitos autores brasileiros traduzem por pedagogia de maestria ou pedagogia por objetivos, em que há uma concentração na fixação de objetivos claros, comportamentais e observáveis, uma vez que, para os precursores dessa teoria, o que não pode ser observado, tampouco pode ser avaliado (FERNANDES, 2005). Esses constituem os critérios de desempenho a serviço da avaliação.

Mottier-Lopez (2010, p. 45) descreve assim as principais características da pedagogia do domínio, proposta por Bloom e colaboradores em 1971:

As informações coletadas são processadas pelo docente, para a produção de um feedback útil para ele e para os alunos. O docente propõe fórmulas e métodos orientados a solucionar as dificuldades de aprendizagem que a avaliação permitiu identificar. A ação corretiva pode aparecer de diversas maneiras: exercícios complementares, novo tipo de material pedagógico (verbal vs. representações visuais), debates em pequenos grupos, tutoria individual, utilização de ferramentas informáticas.

Esta versão da avaliação formativa, denominada de clássica por Melo (2009) sofreu várias críticas. Porém, Mottier-Lopez (2010) argumenta que, apesar das muitas críticas às concepções de Bloom sobre a avaliação formativa, é importante reconhecer que as suas contribuições e de seus colaboradores favoreceram a introdução de uma mudança paradigmática, para “a avaliação escolar deixa de estar vinculada somente a questões de certificação e seleção e passa a estar em condições de apoiar as aprendizagens dos alunos além de sua certificação”16 (MOTTIER-LOPEZ, 2010, p. 46).

No ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras, essa forma de pensar a avaliação durante o processo de aprendizagem fez-se fortemente presente na metodologia de ensino conhecida como “audio-oral” ou “áudioligual”. Por ser interiamente estruturada em pressupostos behaviorisatas, nos quais o erro era considerado como marca de não aprendizagem, os defensores dessa metodologia valeram-se da tecnologia (a gravação em bandas duplas nos chamados “laboratórios de lígnua”) para que toda produção dos alunos em resposta aos estímulos fosse imediatamente corrigida, de modo que as produções corretas fossem reforçadas e as produções errôneas fossem corrigidas, sendo a resposta correta então

16 Do original: “[…] la evaluación escolar ya no está solamente vinculada a cuestiones de certificación y de selección, sino que está vista como en condiciones de sostener el aprendizaje de los alumnos por encima de su certificación”.

disponibilizada para repetição. Desse modo, entendia-se que o erro não se fixaria. Tínhamos, então, uma compreensão redutora da avaliação formativa, porém coerente com os pressupostos teóricos ligados às respectivas concepções de língua e de aprendizagem.

Conforme Silva (2014), a falta de integração dos processos de ensino, aprendizagem e avaliação e a pouca importância da função da regulação neste processo foram fatores que contribuíram fortemente para que investigadores francófonos propusessem uma reformulação dos pressupostos de Bloom. Deste modo, os estudiosos francófonos ampliaram o modelo em várias direções teóricas, como as da psicologia da aprendizagem, das teorias socioculturais de ensino-aprendizagem e da cognição da aprendizagem situada (MOTTIER-LOPEZ, 2010).

Em 1979, Linda Allal contrastou as duas concepções de avaliação formativa existentes: a neobehaviorista, apresentada por Bloom e colaboradores, e a abordagem construtivista/ cognitivista “que prioriza o modelo de avaliação formativa centrada nos processos cognitivos de aprendizagem e não apenas no rendimento dos alunos e nas correções” (MOTTIER-LOPEZ, 2010, p. 62). Dentro da perspectiva construtivista/cognitivista os processos vêm antes dos resultados da avaliação, o que não implica ignorar a importância dos mesmos. “Trata-se de uma avaliação interativa, centrada nos processos cognitivos dos alunos e associada aos processos de feedback, de regulação, de autoavaliação e de autorregulação das aprendizagens” (FERNANDES, 2006, p. 23).

A partir da nova interpretação e ampliação dos conceitos da avaliação pelos estudiosos francófonos, emerge a distinção entre duas principais tradições teóricas da avaliação formativa: a anglo-saxônica e a francófona.

Dentre as características que diferenciam essas duas tradições se poderia destacar quatro, segundo Fernandes (2008): primeiro, a presença da noção de feedback na perspectiva anglo-saxônica e a da noção de regulação na perspectiva francófona; segundo, a relevância dada ao feedback na perspectiva anglo-saxônica e a sua relativização na perspectiva francófona; terceiro, o protagonismo do professor na perspectiva anglo-saxônica e a sua relativização na perspectiva francófona; e quarto, a relação explícita entre a avaliação formativa e um referencial curricular bem determinado na perspectiva anglo-saxônica e a integração da avaliação com os processos de ensino-aprendizagem na perspectiva francófona. A seguir serão abordados mais detalhadamente cada um destes aspectos.